Tenho recebido esta pergunta algumas vezes, de pessoas com NF, geralmente pais preocupados com a saúde de seus filhos. Isso mesmo, geralmente pais (masculinos) preocupados com a saúde de seus filhos (masculinos). Esta primeira impressão já me faz pensar se haveria uma preocupação (social) discriminatória para com o destino das meninas e dos meninos com NF.

Ir ou não para os Estados Unidos em busca de tratamento tem sido uma pergunta de pessoas de classe média para cima, com situação econômica suficientemente boa para pensar nesta possibilidade, porque para a maioria da população brasileira não existe a liberdade (econômica) de sair do país por qualquer motivo, inclusive de saúde.

A pergunta habitualmente vem de pessoas que possuem planos de saúde e não se utilizam dos serviços de atendimento do Sistema Único de Saúde (SUS) e que, com frequência, perguntam se eu tenho consultório particular. Percebo que elas gostariam de ser atendidas (pagando) em outros locais que não o nosso Centro de Referência em Neurofibromatoses (CRNF) do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais, onde todos são atendidos de forma igual, sem privilégios, pelo SUS.

Compreendo esta ansiedade, especialmente dos pais, porque estamos todos submetidos à grande difamação (estimulada por algumas seguradoras de saúde, alguns médicos e clínicas particulares) contra todos serviços públicos, especialmente o SUS, que é um programa público de saúde dos mais avançados do mundo, criado na Constituição Brasileira de 1988. Várias tentativas de diminuir a estrutura do SUS têm sido feitas desde sua criação pelo Congresso Nacional e Governo Federal nos últimos anos.

Assim, acho interessante comparar o que poderia ser diferente, especificamente no tratamento das neurofibromatoses, entre o Brasil e os Estados Unidos.

Aqui no CRNF somente adotamos condutas clínicas que são desenvolvidas em conjunto por estudiosos das NF de várias partes do mundo, especialmente dos Estados Unidos, da Inglaterra e de outros países da Europa, assim como da Austrália. São consensos estabelecidos dentro da visão ocidental da medicina, fortemente influenciada pela medicina norte-americana, é claro, mas, no caso das neurofibromatoses, com grande participação do grupo de Manchester, na Inglaterra.

Assim, somente orientamos as pessoas que nos procuram no CRNF-SUS a seguirem aquilo que é consenso internacional, ou seja, as mesmas condutas que deve também estar em vigor nos Estados Unidos (ver aqui nosso artigo sobre o manejo clínico publicado em 2015, na revista científica Arquivos de Neuropsiquiatria). Portanto, nestas condutas clínicas com base científica não deve haver diferenças entre nosso atendimento e aquele realizado nos Estados Unidos.

Neste sentido, a Dra. Juliana Ferreira de Souza, que fez seu mestrado e doutorado conosco, incluindo um ano de doutorado “sanduiche” em Salt Lake City (Utah) com o Dr. David Viskochil[1], e que está fazendo seu pós-doutorado na Califórnia (ver aqui o projeto da Juliana), afirmou que nosso atendimento clínico no CRNF é semelhante àquele que ela observou nos lugares onde estudou nos Estados Unidos.

Por outro lado, todos sabem que vivemos uma escassez de recursos no SUS, motivada por decisões econômicas atuais e passadas, entre elas a divisão desigual dos impostos entre o atendimento público e o privado: mais da metade dos impostos recolhidos vai para os planos de saúde e serviços médicos e hospitalares particulares, os quais atendem apenas um quarto dos brasileiros.

No Brasil, quando precisamos de um exame complementar, uma cirurgia, algum tratamento (de consenso internacional) nas neurofibromatose, podemos encontrar a escassez de recursos públicos no SUS. Infelizmente, o desvio de verbas públicas para outras finalidades produz mais filas, aumenta o tempo precioso perdido na espera para os tratamentos ambulatoriais e reduz os meios terapêuticos nos hospitais públicos.

Mas, mesmo no Brasil, quem tem dinheiro suficiente poderá contornar muitas destas dificuldades do SUS pagando por elas diretamente ou através de planos de saúde. É preciso lembrar que, no final, quem vai pagar o tratamento dos mais ricos é a população como um todo, pois aquilo que eles pagam aos médicos particulares e aos planos de saúde é descontado do seu imposto de renda, ou seja, a sociedade, no final, é que paga o tratamento dos mais ricos.

E nos Estados Unidos? Lá, as pessoas com recursos financeiros poderão pagar pelos mesmos tratamentos de consenso internacional nas neurofibromatoses, como aqui. Por outro lado, as pessoas sem recursos financeiros não terão cobertura de um sistema público universal (ver o Programa de Saúde Pública que Barack Obama vem tentando implantar).

No entanto, existe uma diferença entre o Brasil e os Estados Unidos: lá, estão em andamento alguns estudos científicos experimentais buscando drogas eficazes no tratamento de neurofibromas plexiformes.

Amanhã falarei sobre isto.

[1] Dr. David Viskochil foi um dos descobridores do gene da NF1, já esteve no Brasil num Simpósio que promovemos em 2009 no CRNF, e tem sido um de nossos apoiadores internacionais.

O primeiro Curso de Capacitação em Neurofibromatoses é uma realização do Centro de Referência em Neurofibromatoses do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (CRNF) em conjunto com a Associação Mineira de Apoio às Pessoas com Neurofibromatoses (AMANF).

A coordenação será dos médicos e professores Nilton Alves de Rezende e Professor Luiz Oswaldo Carneiro Rodrigues.

As aulas serão oferecidas nos últimos sábados de cada mês, de 14 às 16 horas, numa sala a ser indicada na portaria da Faculdade de Medicina da UFMG, Avenida Alfredo Balena, Bairro Santa Efigênia, Belo Horizonte, MG, de acordo com o cronograma abaixo. Para os profissionais da área da saúde será oferecido a possibilidade de acompanhar os atendimentos médicos no Centro de Referência ás segundas e quintas feiras

Este programa tem como objetivo a capacitação de pessoas interessadas no manejo e ampliação do conhecimento sobre as neurofibromatoses.

Os slides das duas primeiras aulas já estão disponíveis neste blog numa página permanente ao lado.

Esta capacitação será realizada com a apresentação em dez aulas das principais informações sobre o diagnóstico e tratamentos das neurofibromatoses (NF), em linguagem simples e acessível a todos os profissionais da área da saúde, mas também aberto às pessoas com NF e suas famílias, para que as mesmas possam melhor se organizar, acolher, tratar e acompanhar os problemas de saúde relacionados com as NF, auxiliando os profissionais de saúde no manejo clínico das pessoas com NF.

Este curso tem origem no fato de que as NF são doenças raras, genéticas, que não têm CURA, mas têm TRATAMENTOS que evitam as complicações ou melhoram a qualidade de vida das pessoas; que existem mais de 5 mil doenças raras, por isso não devemos esperar que todos os profissionais da saúde saibam tratar corretamente cada uma delas; que a solução para as pessoas acometidas por doenças raras é a organização das famílias para obterem os conhecimentos científicos sobre sua doença; que o conhecimento das questões fundamentais sobre diagnóstico e tratamento das suas próprias doenças, permitirá as organizações familiares informar os profissionais da saúde, facilitando e aprimorando o seu trabalho.

Serão concedidos certificados para aqueles que completarem 8 das 10 aulas.

Mais informações pelos e-mails: rodrigues.loc@gmail.com narezende@terra.com.br

Ontem comentei sobre a possível relação entre os achados do doutorado da Cinthia Vila Nova Santana (telômeros mais longos na NF1) com a menor incidência de Diabetes tipo 2 (DM2) nas pessoas com NF1 na pesquisa realizada em outro doutorado, desta vez da nutricionista Aline Stangherlin Martins, no Programa de Pós Graduação em Ciências Aplicadas à Saúde do Adulto, da Faculdade de Medicina da UFMG, orientada pelo professor Nilton Alves de Rezende.

Desde o início do nosso ambulatório especializado em Neurofibromatoses sediado no Hospital das Clínicas da UFMG, já atendemos mais de 900 famílias e nossa impressão clínica é de que não há pessoas com NF1 e que apresentem ao mesmo tempo a DM2.

Como já vem se tornando bastante conhecido de todos, a DM2 também é chamada de diabetes do adulto, está relacionada com a ingestão excessiva de açúcar, com a obesidade, com o sedentarismo e com fatores genéticos.

Por outro lado, acompanhamos há alguns anos dois casos de crianças com NF1 e diabetes do tipo 1, chamada diabetes juvenil, que ainda não tem uma causa bem conhecida.

Diante disso, temos estudado esta questão e recentemente a Aline concluiu seu doutorado sobre a incidência de DM2, resistência à insulina e alguns outros marcadores biológicos metabólicos. Seus dados finais serão apresentados no próximo Congresso em Neurofibromatoses em Austin, nos Estados Unidos.

Em seu estudo, a Aline convidou 40 pessoas com NF1 e 40 pessoas sem NF1 para serem controles. Para cada pessoa com NF1 havia outra, do grupo controle, da mesma idade, do mesmo sexo, com o mesmo peso corporal e mesmo índice de massa corporal. Amostras de sangue destas pessoas foram colhidas e analisadas quanto aos níveis de glicose em jejum e duas horas depois de ingerirem açúcar.

Além disso, Aline mediu em todos os voluntários os níveis de hemoglobina glicada (que indica como anda a glicemia nas últimas semanas), a insulina no plasma, o índice de resistência à insulina (HOMA-IR) e outros indicadores metabólicos (adiponectina, leptina e visfatina).

Em seus resultados Aline observou que a glicemia de jejum foi menor nas pessoas com NF1, apesar da resistência à insulina ser semelhante ao grupo controle. No entanto, a adiponectina estava aumentada e a leptina e a visfatina diminuídas. 


Em conjunto, os dados da Aline indicam que a chance de uma pessoa com NF1 desenvolver a DM2 é menor.

Ainda não sabemos a causa desta diferença metabólica entre as pessoas com NF1 e o restante da população, mas é possível que a menor chance de desenvolver DM2 explique a menor mortalidade encontrada em pessoas com NF1 causada por doenças cardíacas, como a obstrução das coronárias por aterosclerose.

Parabéns Aline, pelo seu trabalho original, cuidadoso e bem desenvolvido.

Você já mediu sua pressão arterial nos últimos doze meses?

Há cerca de um ano, quando a pesquisadora Cinthia Vila Nova Santana iniciou seu estudo, ela procurava indicadores celulares que nos ajudassem a diferenciar, entre as pessoas com NF1, aquelas com maior chance de desenvolver câncer, especialmente a transformação dos neurofibromas plexiformes em tumores malignos da bainha do nervo periférico (TMBNP).

Para seu estudo, Cinthia colheu amostras de sangue de 24 pessoas sadias (para controle) e de 24 pessoas com NF1 que possuíam neurofibromas plexiformes (benignos) sem sintomas (6 pessoas), com sintomas (8 pessoas) e também de outros que haviam sofrido a transformação do plexiforme para TMBNP (6 pessoas). No sangue de todos os voluntários ela mediu o comprimento de uma estrutura no DNA chamada telômero e comparou os resultados entre os grupos.

Os telômeros são um código genético especial do DNA na terminação de cada cromossomo (ver ilustração), como se fossem uma pequena tampa para evitar o desenrolamento do material genético. Eles protegem o material genético contra erros durante a multiplicação celular, mas, a cada vez que a célula se divide, os telômeros ficam um pouco mais curtos, se perdem aos poucos. Por isso eles são indicadores do envelhecimento celular: quanto mais curtos, mais idosa é a célula. Quando terminam os telômeros, a célula perde seu material genético, não mais se reproduz e morre.

Os telômeros estão envolvidos em diversas doenças, como alguns tipos de câncer, nos quais uma modificação na célula cancerosa faz com que os telômeros não diminuam durante a divisão celular, ou seja, a célula não atinge seu limite de reprodução e, portanto, se torna “imortal”.

Lembrando que as pessoas com NF1 têm maior predisposição para certos cânceres, Cinthia fez as perguntas: será que as pessoas com NF1 teriam telômeros diferentes das pessoas sadias sem NF1? Será que as pessoas com NF1 e TMBNP teriam telômeros maiores do que as pessoas com NF1 sem câncer? Será que o comprimento dos telômeros nas pessoas com NF1 poderia indicar o seu risco de desenvolver câncer?


Verificando que não existia nenhuma resposta científica para suas questões, Cinthia desenvolveu seu projeto de doutorado em Genética pela UFMG, no qual está orientada pelo professor Dr. Renan Pedra de Souza e co-orientada pela Professora Débora Marques de Miranda com a colaboração do nosso Centro de Referência em Neurofibromatoses. 


Seus resultados mostraram que, de fato, os telômeros são maiores nas pessoas com NF1 do que nas pessoas sem NF1. No entanto, não houve diferença no comprimento dos telômeros entre as pessoas com NF1 com plexiformes ou com TMBNP. Ou seja, o comprimento do telômero é maior nas pessoas com NF1, mas, por enquanto, este dado não pode ser usado como um indicador do risco de malignidade nestas pessoas.

As hipóteses imaginadas para explicarmos os resultados da Cinthia ainda precisam ser mais investigadas, inclusive, aumentando-se o número de pessoas estudadas.

Primeiro, seria porque a enzima que renova os telômeros (chamada de telomerase) estaria mais ativa na NF1 por causa da falta da neurofibromina?

Segundo, seria por causa de uma menor atividade de multiplicação celular na medula óssea (onde são formados os leucócitos nos quais foram medidos os telômeros) das pessoas com NF1, ou seja, elas “gastariam pouco” seus telômeros?

Terceiro, seria um possível sinal de envelhecimento mais lento (pelo menos das células do sangue) na NF1?

Finalmente, seria por causa de um menor estresse celular metabólico nas pessoas com NF1, por exemplo, pelo fato delas apresentarem menores taxas de glicose no sangue e menor chance de diabetes tipo 2? 


Ou seria uma combinação de todas estas possibilidades?

Amanhã continuo a falar sobre a menor incidência de diabetes na NF1.

Parabéns Cinthia, pelo seu trabalho original em todo o mundo, que será apresentado no Congresso sobre Neurofibromatoses em Austin, Estados Unidos, neste ano.

 Você já mediu sua pressão arterial no último ano?


No início de 2016, a oftalmologista Vanessa Waisberg concluiu sua pesquisa e foi aprovada na defesa de sua Dissertação de Mestrado no Programa de Pós-Graduação em Medicina Molecular da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais.

Vanessa estudou nove pessoas com neurofibromatose do tipo 2 (e algumas com NF1) utilizando um equipamento relativamente novo chamado Tomografia de Coerência Óptica da Retina (em inglês OCT). A OCT utiliza luz no espectro do infravermelho para produzir imagens em três dimensões da retina, com definição menor do que 10 mícrones.

Este estudo da Vanessa foi o que examinou o maior número de pessoas com NF2, até o momento, utilizando esta nova técnica, e ela contou com a segura orientação da professora Débora Marques de Miranda e do professor Márcio Bittar Nehemy, além da colaboração da Dra. Maria Frasson, Dr. Yehuda Waisberg e minha.

Já se sabia que as pessoas com NF2, além dos tumores no nervo vestibular (schwannomas) e no cérebro (meningiomas), podem apresentar alterações oculares, como a chamada catarata juvenil (opacidades das camadas posterior subcapsular ou capsular do cristalino), pigmentação da retina, hamartomas da retina e membrana epirretiniana, além de estrabismo paralítico e meningiomas do nervo óptico.

No entanto, Vanessa demonstrou a presença de uma alteração muito típica da NF2, um espessamento da retina (membrana epirretiniana) em forma de chama de vela (ver indicação da seta na figura na tela da ilustração).

Comparando os casos de diagnóstico ou de aparecimento dos sintomas antes dos 20 anos de idade com aqueles de diagnóstico ou sintomas depois dos 20 anos de idade, Vanessa concluiu que o espessamento da retina pode ajudar os médicos e a família a conhecerem o prognóstico da NF2, permitindo distinguir os casos de evolução mais rápida e precoce dos outros de evolução mais lenta.

A OCT é um exame relativamente simples, rápido e feito de forma não invasiva, e que pode ser aplicado em crianças pequenas sem necessidade de sedação, portanto, pode ser muito útil em casos de suspeita de NF2 em algum parente de primeiro grau, como filhos, filhas e irmãos, os quais podem ser esclarecidos com a realização deste exame complementar.

Durante seu estudo, Vanessa examinou diversas pessoas também com NF1 e realizou nelas a tomografia de coerência óptica. Suas observações oftalmológicas ajudaram-me na condução de diversos casos com gliomas ópticos e outros problemas oftalmológicos relacionados tanto com a NF1 quanto com a NF2.

Minha impressão é que a tomografia de coerência óptica deve ser realizada em todas as pessoas com NF2 e seus familiares de primeiro grau que desejarem obter mais informações sobre sua doença, para assim poderem acompanhar de forma mais segura a sua evolução, orientar o momento de cirurgias e realizar o aconselhamento genético.

Além disso, é possível que num futuro breve as informações sobre a retina das pessoas com NF1 também venham a ser úteis no seu acompanhamento clínico.

Parabéns, Dra. Vanessa Waisberg, pelo seu trabalho inovador, conduzido de forma ética, cuidadosa, dedicada e com grande envolvimento afetivo com as pessoas com NF1 e NF2.

Depois de ler este post, Dra. Vanessa comentou:


“Acho interessante acrescentar que a OCT tem se mostrado uma ferramenta útil para acompanhar a evolução de gliomas ópticos através da medida da espessura da camada de fibras nervosas da retina; e que a OCT pode ajudar no diagnóstico de pacientes com NF1 através da identificação de nódulos de coróide. Parece que estes nódulos estão presentes em uma grande porcentagens de pacientes com NF1 (em um estudo que avaliou 95 pacientes com NF1, os nódulos estavam presentes em 82% dos pacientes com NF1 e apenas em 7 % dos controles). Os autores sugerem que os nódulos de coróide sejam considerados um novo critério diagnóstico (para NF1). A importância da OCT atualmente está mais estabelecida para pacientes com NF1 do que pacientes com NF2 já que os estudos com NF2 envolvem um número muito pequeno de pacientes. Será muito interessante fazer a correlação fenótipo-genótipo dos achado na OCT em pacientes com NF1.”
Diante disso, refiz o título do post. Obrigado Vanessa.






Se você tem NF1, já mediu sua pressão arterial este ano?







Utilizo o blog de hoje para lembrar a todas as pessoas com neurofibromatose do tipo 1 (NF1) que é importante realizar a medida da pressão arterial pelo menos uma vez por ano.

Veja aqui as explicações para isto.

Mesmo as crianças pequenas devem ter sua pressão medida com aparelhos apropriados para o seu tamanho.

Podemos salvar vidas com esta medida simples.

Você já mediu a sua pressão este ano?

Continuando nossa história de ontem, o Dr. Bruno Cota também concluiu mais uma parte de sua pesquisa sobre as dificuldades musicais nas pessoas com NF1. Ele está realizando um trabalho cuidadoso com a colaboração de muitas pessoas, entre elas a Ana Maria Arruda Lana, o João Gabriel Marques Fonseca, a Luciana Macedo de Resende, a Marília Nunes, o Nilton Alves de Rezende e a Pollyanna Barros Batista.

Seus resultados vem confirmando aquela impressão inicial de que as pessoas com NF1 apresentam dificuldades musicais (ver aqui os resultados iniciais (ver aqui ). Bruno já estudou 15 pessoas (com pelo menos 3 critérios diagnósticos positivos para NF1), as quais se submeteram voluntariamente a um teste especial para avaliação da amusia, que foi desenvolvido no Canadá. Além disso, todos realizaram a medida da atividade elétrica cerebral em resposta a estímulos sonoros (chamado de potencial evocado).

Os dados da pesquisa do Bruno estão mostrando uma correlação estatística muito forte entre a presença da NF1 e os resultados para a amusia. Hoje, estamos preparando um resumo dos seus resultados para apresentarmos no próximo congresso do CTF em Austin, em junho de 2016. Assim, será a primeira vez que esta informação científica sobre amusia na NF1 será conhecida internacionalmente.

É interessante notar como cada conhecimento científico depende de uma história que envolve tantas pessoas e seus vários e diferentes olhares. Não existe o “herói solitário” que descobre a solução para determinado problema, mas sim uma rede de pessoas que são fundamentais para a construção de qualquer conhecimento, desde o trabalhador que cuida do ambiente ao cientista que realiza as medidas, desde a mãe que desconfia de um detalhe na doença de seu filho até o filósofo que nos ajuda a pensar a ciência, desde o cidadão que paga seus impostos até a universidade pública que financia os projetos.

Portanto, a ciência é uma construção coletiva e por isso seus resultados devem ser públicos e abertos a todos. Ela deve ser construída em benefício de todos, no nosso caso, as pessoas com NF1, às quais agradecemos a colaboração para todos estes projetos que temos desenvolvido e esperamos que cada vez mais as pessoas com NF1 se beneficiem dos resultados das nossas pesquisas.

Apesar do convite do Jô Soares continuar aberto, Maria Helena interrompeu suas aulas e não chegou a tocar bem seu violino de três cordas. Mas, de alguma forma, seu desejo, além de legítimo, desencadeou uma série de acontecimentos que nos permitiram conhecer melhor a NF1. Quem sabe, num futuro próximo, a terapia musical (tão amada pelo Oliver Sacks) venha a ser uma das ferramentas para melhorarmos o desenvolvimento cognitivo das crianças com NF1?

Quem desejar mais informações sobre música e NF1 pode entrar em contato com o Dr. Bruno Cota pelo e-mail: brucezar@hotmail.com.br 

Até segunda feira e bom final de semana.

Ontem relatei a primeira parte da história da nossa suspeita de que as habilidades musicais estariam diminuídas nas pessoas com NF1, suspeita esta que fora despertada pelas observações sobre minha filha Maria Helena e reforçada no contato com outras pessoas atendidas em nosso Centro de Referência, inclusive a menina com NF1 que tentou fazer aulas de música e o professor praticamente a expulsou da sala, o que muito a magoou, por causa de sua extrema dificuldade de afinação vocal.

Um passo importante para compreendermos as dificuldades musicais na NF1 foi dado em 2010, quando publicamos o relato de um jovem adulto com NF1, que foi estudado em nosso Centro de Referência em NF pela estudante de fonoaudiologia Pollyanna Barros Batista, que encontrou nele a desordem do processamento auditivo (DPA), ou seja, uma situação na qual a pessoa escuta normalmente, mas processa as informações sonoras de forma inadequada em seu cérebro (ver aqui o artigo).

Continuando seu estudo no mestrado em Ciências Aplicadas à Saúde do Adulto, Pollyanna constatou que praticamente todas as pessoas com NF1 apresentam a DPA em maior ou menor grau e que havia uma relação entre a DPA e as dificuldades de aprendizado e linguagem (ver aqui a dissertação completa ou o artigo publicado). Lembrando da possível associação entre amusia e DPA mencionada pelo Oliver Sacks, busquei nas publicações científicas alguma relação entre NF1, DPA e dificuldades musicais, mas nada encontrei.

Durante outro congresso do CTF, desta vez em Jackson Hole, nos Estados Unidos, numa conversa que tivemos com Riccardi, eu e Luíza (minha filha caçula, que também é médica e estudou a disfunção endotelial na NF1 no seu mestrado), comentamos com ele nossa impressão de que as pessoas com NF1 apresentam dificuldades musicais. Ele não apenas concordou, como contou-nos que numa viagem à Espanha ele mencionara esta mesma opinião para um médico espanhol que trabalhava com NF. O tal colega discordou do Riccardi, dizendo que conhecia uma pessoa com NF1 a qual era excelente pianista. Noutro momento, Riccardi teve a oportunidade de ver o pianista com NF1 executar uma partitura clássica e percebeu que embora ele fosse capaz de tocar as notas previstas, não havia no seu desempenho harmonia ou melodia satisfatórias. Riccardi concluiu que o médico espanhol não devia ter grande percepção musical e que o pianista, talvez, se não fosse a NF1 poderia ter sido um gênio musical.

Mais algum tempo se passou e tive a oportunidade de assistir a uma palestra do brilhante médico e músico, o professor João Gabriel Marques Fonseca, durante a qual ele mencionou as amusias e desarmonias. Ao final, perguntei se ele sabia de alguma coisa sobre amusia e neurofibromatose, o que ele achou uma boa pergunta, para a qual não tinha resposta naquele momento, mas que prometia estudar. De fato, um tempo depois fui procurado no Centro de Referência em NF pelo também médico e músico, Bruno Cota, que fora indicado pelo João Gabriel para, quem sabe, desenvolver a pesquisa de seu mestrado estudando a hipótese de que haveria amusia na NF1. Concordamos que seria uma boa ideia, montamos o projeto e o Dr. Bruno iniciou um estudo cuidadoso que comentarei adiante.

Ontem (16 de fevereiro de 2016), a fonoaudióloga Pollyanna Barros Batista foi aprovada no seu doutorado na Faculdade de Medicina da UFMG (ao lado a foto da banca examinadora: Nilton, Pollyanna, Carla, Daniela, Denise e Rogério) e na sua pesquisa ela estudou se o treinamento auditivo poderia melhorar a desordem do processamento auditivo em pessoas com NF1. 

Ela realizou um treinamento auditivo durante 8 semanas em dois grupos de pessoas com DPA com idade entre 10 a 35 anos. Um grupo apresentava NF1 e DPA e o outro também apresentava DPA, mas sem NF1. Depois do tratamento fonoaudiológico, ambos os grupos melhoraram de forma semelhante diversas medidas fonoaudiológica realizadas pela Pollyanna, indicando que as pessoas com NF1 responderam ao tratamento de forma semelhante às pessoas sem NF1. Esta é uma informação inédita em todo o mundo.

Depois de um ano, Pollyanna repetiu os testes com as pessoas com NF1 e DPA que haviam sido tratadas e verificou que os benefícios do tratamento persistiam depois de um ano. Estes resultados originais da Pollyanna precisam ser confirmados por outros pesquisadores para termos certeza de que são verdadeiros, mas eles nos animam muito a estudar o tratamento mais precoce, ou seja, estudarmos crianças com NF1 antes dos 10 anos de idade, para tentarmos melhorar o aprendizado da voz, fala e linguagem antes que elas tenham os prejuízos no seu desenvolvimento escolar e social.

E como é que a música entra nesta questão? Amanhã concluirei este assunto.



Entre as diversas habilidades da minha filha Maria Helena, a musicalidade não me parecia ser um de seus talentos naturais. Em torno dos seus dez anos de idade, ela manifestou o desejo de fazer aulas particulares de violino, o que me surpreendeu, embora os poucos acordes que sou capaz de arranhar no violão não me forneçam qualquer atestado de competência musical.

Durante várias semanas, às vezes Thalma, às vezes eu, levamos Maria Helena às tais aulas, nas quais seu progresso no aprendizado do violino não parecia animar muito o jovem professor, compelido a defender seus trocados tentando viabilizar o sonho da menina. Na saída de uma das aulas, Maria Helena confessou-me que não lhe agradava muito o som da quarta corda e quando a tangia com o arco percorria pelo seu corpo um arrepio desagradável.

Na mesma época, participei da organização de um salão de humor em Belo Horizonte, para o qual foram convidados diversos cartunistas brasileiros e o Jô Soares, cujo programa de entrevistas na TV já era famoso. Depois do show do Jô, fomos a um restaurante de comida mineira, ao qual Maria Helena nos acompanhou, pois queria fazer um “pedido” ao Jô Soares. Depois do jantar, demos carona ao Jô até seu hotel e no trajeto Maria Helena disse a ele que gostaria muito de se apresentar no seu programa na TV. Jô, gentil, disse que a receberia com muito prazer, e perguntou o que ela apresentaria diante das câmeras. Maria Helena respondeu que tocaria violino. Ah, exclamou o Jô, – e você toca bem? Ela respondeu: Ainda não, porque a quarta corda tem um som horrível, que me deixa toda arrepiada! Jô deu uma grande risada e disse: Então, estamos combinados: quando você estiver tocando bem um violino com apenas três cordas, você me avisa que apresento você no meu programa!

Este caso das aulas de violino aconteceu quando eu ainda não me dedicava ao atendimento clínico de pessoas com neurofibromatoses, mas de forma pitoresca chamou a atenção para a questão da habilidade musical (ou falta dela) da Maria Helena e me perguntei se isto teria algo a ver com a sua doença, a Neurofibromatose do tipo 1 (NF1).

Anos mais tarde, depois de criarmos o ambulatório em 2005, à medida que ia conhecendo mais e mais pessoas com NF1, comecei a desconfiar que era comum certa dificuldade entre elas para tocar instrumentos musicais. Na mesma época, começamos alguns estudos conduzidos pela fonoaudióloga Carla Menezes da Silva sob a orientação do Dr. Nilton Alves de Rezende, que encontrou alterações da motricidade orofacial em pessoas com NF1 e estes resultados foram apresentados no congresso sobre neurofibromatoses do Children’s Tumor Foundation (CTF) de 2007 nos Estados Unidos. A fonoaudiologia já fizera parte da vida da Maria Helena, como terapia para sua voz anasalada e outras alterações de fala e linguagem.

Em 2008, recebi de presente da minha filha Ana e seu marido Juliano o livro do Oliver Sacks “Alucinações Musicais”, no qual o famoso médico norte-americano descreve diversas pessoas com doenças variadas, inclusive algumas delas que apresentavam dificuldade de percepção e ou de execução musical. Sacks detalhava as diferentes formas de amusia e desarmonia e, num dos seus casos clínicos, estabeleceu uma relação entre a desordem do processamento auditivo e a dificuldade do paciente em manter na memória uma sequência auditiva de notas.

Anotei na página do livro se aquilo poderia ter algo a ver com as dificuldades musicais da Maria Helena e das pessoas com NF1. Esta dúvida começou a ser respondida no ano seguinte pela Pollyanna Barros Batista, bolsista de iniciação científica em fonoaudiologia orientada pelo Nilton Alves de Rezende.

Amanhã continuo esta história.


“Meu filho de 5 anos tem 2 manchas café com leite, sendo 1 no pescoço (ver foto abaixo) e a outra no bumbum, maiores que meio centímetro, mas pequenas e uma bem clarinha na barriga que não se vê no sol, também maior que meio centímetro, uma pintinha nas costas e duas no pescoço bem pequenas.

A pediatra suspeitou de NF 1 e o encaminhou para avaliação da oftalmologista que visualizou 3 pequenos nódulos, sendo sugestivo para Lisch (apenas no olho esquerdo). Fez exame de biomicroscopia, na lâmpada de fenda.
Pelo o que temos estudado sobre a NF, 95% das pessoas apresentam múltiplas manchas café com leite e meu filho não tem muitas. O que acontece?

A pediatra disse que como meu filho tem poucas manchas café com leite, mas tem um sintoma característico de NF1, eu não precisava preocupar, pois ele tem a doença na forma mínima, pois ele não tem as típicas sardas axilar e inguinal e nenhum tipo de indicação de plexiforme e neurofibromas. Ela disse que ele tem a NF mínima quando não se percebe a doença e com poucos sintomas. E terá uma vida normal.

Pois segundo ela, além disso ele tem estatura de uma criança de 6 anos, pois o pai é alto, está com peso adequado, não tem problemas sérios de saúde, tem desenvolvimento normal na fala, ao caminhar e é uma criança muito inteligente, considerado, conforme relatado pela professora, um dos melhores da turma, pois aprende com muita facilidade.

Na minha família ninguém tem, trata-se de uma nova mutação.

Então é possível ele ter os nódulos de Lisch e não ser portador de NF? A oftalmologista havia explicado que os nódulos de Lisch era um sintoma restrito da NF1.

Se puder falar no blog sobre os nódulos de Lisch e sintomas isolados da NF1, seria esclarecedor para muitos, pois não localizei muita literatura a respeito disso, apesar de você sempre falar que o paciente precisa apresentar, em caso de mutação nova, dois sintomas e para ter confirmação 3 sinais característicos da NF1”. RM, de Minas Gerais.

Caro R. Obrigado pela sua pergunta e pela sugestão deste tema que pode ser útil a outras pessoas. Agradeço as colaborações da Dra. Luciana Baptista Pereira (dermatologista) e da Dra. Vanessa Waisberg (oftalmologista) na construção da resposta abaixo.

Você fez uma descrição do seu filho como sendo uma criança sadia em todos os aspectos e apenas com 2 manchas café com leite (maiores que meio centímetro) e outras 3 pintinhas, além de 3 nódulos “sugestivos” de serem Nódulos de Lisch no olho esquerdo.

De fato, a primeira impressão que me ocorre é a de que seu menino pode não ser uma pessoa com neurofibromatose do tipo 1 (NF1), vamos ver o porquê.

Para começar, é preciso encontrarmos cinco ou mais manchas café com leite, com mais de meio centímetro nesta idade, para reconhecermos como um dos sete critérios para o diagnóstico de NF1. A descrição que nos fez do seu filho não parece confirmar este critério.

Cerca de 1 em cada 10 pessoas da população em geral apresenta uma ou duas manchas café com leite, sem qualquer significado clínico. Mesmo considerando que a possibilidade de que menos de 5 manchas café com leite podem estar presentes na Neurofibromatose do tipo 2 (1 em cada 30 mil pessoas) ou na Schwannomatose (1 em 40 mil pessoas), fica evidente que a maior probabilidade é de que uma ou duas manchas café com leite do seu menino não sejam sinal de qualquer doença (ver neste blog a questão da diferença entre possibilidade e probabilidade nas neurofibromatoses).

Vale a pena lembrar que o diagnóstico da mancha café com leite não é tão fácil, pois ela pode ser confundida com outras manchas de pele semelhantes, como por exemplo o chamado nevo hipercrômico. Além disso, se encontrarmos, de fato, mais de 3 manchas, sem outros sinais de NF1, devemos pensar em outras doenças.

Por outro lado, a oftalmologista encontrou 3 nódulos “sugestivos” de serem Nódulos de Lisch e ela tem razão em dizer que, se forem mesmo Nódulos de Lisch, seu menino teria um sinal que geralmente só é encontrado em pessoas com NF1, pois sabemos que somente em casos muito raros os verdadeiros Nódulos de Lisch são observados em pessoas sem NF1.

No entanto, os Nódulos de Lisch na NF1 geralmente ocorrem em ambos os olhos (e em número igual) e os oftalmologistas experientes alertam para a necessidade do diagnóstico diferencial entre Nódulos de Lisch e outras alterações oculares, especialmente os chamados “nevos de íris” que acontecem em pessoas sadias.

Outra informação a ser levada em conta é que a maioria dos Nódulos de Lisch aparece durante a infância e a adolescência, sendo incomuns antes dos 3 anos de idade. Geralmente os nódulos aparecem entre os 5 e 10 anos de idade e seu número aumenta com o tempo. A probabilidade de encontrá-los no exame oftalmológico corresponde a cerca de 10 vezes a idade da criança: por exemplo, uma criança de 8 anos com NF1 tem 80% de chance de apresentar Nódulos de Lisch.

Desta forma, praticamente 100% dos adultos com NF1 apresentam Nódulos de Lisch, mas sua presença e quantidade não afetam a visão ou a saúde ocular e não servem como indicadores da gravidade da NF1.

Assim, creio que seu filho precisa repetir o exame oftalmológico, de preferência ouvindo a opinião de outro profissional, assim como seria interessante a avaliação das alterações cutâneas por um especialista em neurofibromatose.

Estamos à sua disposição no Centro de Referência (31 3409 9560), basta ligar numa quarta de manhã e no dia do exame trazer seu cartão do SUS.