Critérios para realização de testes genéticos
A análise genética permite saber se existem variantes patogênicas que confirmem os diagnósticos de NF1, NF2, Schwannomatose, Síndrome de Legius e outras doenças genéticas.
Na maioria das vezes, o exame clínico cuidadoso realizado por equipe médica com experiência em Neurofibromatoses é suficiente para a realização do diagnóstico destas doenças.
No entanto, algumas situações clínicas podem ser beneficiadas pela realização da análise genética em busca de variantes patogênicas que justifiquem sinais e sintomas.
As indicações de análise genética mais comuns na NF1 são as seguintes:
- Dúvida no diagnóstico por insuficiência de critérios clínicos. Por exemplo:
- Grande expectativa dos pais quando encontramos apenas manchas café com leite e efélides em crianças sem parentes de primeiro grau com NF1;
- Possibilidade de ser NF1 ou Síndrome de Legius;
- Suspeita da NF1 na forma em mosaicismo;
- Lesões atípicas;
- Mosaicismo pigmentar com lesões parecidas com NF1;
- Busca de relação entre o fenótipo e o genótipo para orientar o prognóstico e o manejo clínico. Por exemplo:
- Suspeita de deleção completa do gene NF1 (casos mais graves)
- .Suspeita de fenótipos especiais: (somente manchas e efélides sem outras manifestações) – ver abaixo
- Para aconselhamento genético pesquisando variantes patogênicas em pais de uma criança com NF1 que desejam ter outros filhos.
As indicações de análise genética mais comuns na NF2 e Schwannomatose são as seguintes:
- Dúvida no diagnóstico por insuficiência de critérios clínicos para uma das doenças.
- Avaliação se são formas sistêmicas da doença ou em mosaicismo
- Para aconselhamento genético pesquisando variantes patogênicas em parentes de primeiro grau de uma pessoa com NF2.
Toda pessoa atendida pela equipe médica do Centro de Referência em Neurofibromatoses (CRNF – ver abaixos os nomes) do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (HC-UFMG) poderá realizar testes genéticos com descontos especiais (ver Anexo) a partir do convênio firmado entre o laboratório Mendelics Análise Genômica e a Associação Mineira de Apoio aos Portadores de Neurofibromatose (AMANF).
O procedimento é simples e a coleta do material é realizada por meio de esfregaço bucal (vídeo explicativo VER AQUI ) na residência da pessoa a ser testada.
Veja como fazer, passo a passo
- O primeiro passo é uma consulta da pessoa a ser testada por meio presencial ou por telemedicina (videoconferência por Google Meeting) com um dos profissionais do CRNF (em ordem alfabética):
Dr. Bruno Cezar Lage Cota
Dra. Juliana Ferreira de Souza
Dr. Luiz Oswaldo Carneiro Rodrigues
Dra. Luíza de Oliveira Rodrigues
Dr. Nilton Alves de Rezende
Dr. Renato de Souza Viana
2) Se indicado o teste genético (ver aqui: critérios do CRNF), a médica ou médico do CRNF consulta a Tabela de preços do acordo e informa a pessoa a ser examinada ou sua família.
3) Se estiverem de acordo, a médica ou o médico do CRNF emite um pedido assinado para a pessoa e envia ao mesmo tempo um e-mail para o Laboratório Mendelics (que possui acordo de desconto para associados da AMANF).
4) O laboratório Mendelics confirma com a pessoa a ser testada e decide a forma de pagamento do teste genético solicitado no valor do convênio.
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- Pessoas com grandes dificuldades financeiras podem solicitar auxílio à AMANF, que analisará caso a caso quando poderá ajudar, enviando a quantia para a pessoa solicitante.
5) A pessoa realiza o pagamento para o Laboratório Mendelics, que então envia o kit para a coleta do material (esfregaço bucal).
6) A pessoa colhe o material (de acordo com o vídeo) e envia para o laboratório Mendelics.
7) O laboratório Mendelics analisa o material e envia o resultado para a pessoa testada e para a médica ou médico solicitante.
8) De posse do resultado, a pessoa examinada marca uma nova consulta com a médica ou médico solicitante para esclarecimentos e novas condutas.
Depois de receber o resultado
O exame genético pode prever as complicações da NF1?
Agradeço ao geneticista Dr. Salmo Raskin,
que me inspirou e orientou nesta revisão
Os testes genéticos podem ser úteis na orientação clínica das pessoas com neurofibromatose (ver aqui) e diante do resultado do painel genético indicando o diagnóstico de Neurofibromatose do tipo 1 (NF1) as pessoas querem saber o que ele significa em termos de gravidade e quais as consequências e complicações que podem ocorrer.
Para conhecer como classificamos os diferentes níveis de gravidade da NF1 clique aqui.
Para entender quais são as complicações possíveis nas pessoas com NF1 clique aqui.
Para responder estas perguntas, precisamos lembrar que a NF1 é causada por alterações no DNA de uma pessoa, ou seja, no seu código genético.
Rápida explicação sobre o código genético na NF1
O código genético são sequências de letras que formam os genes que estão incluídos no DNA de uma pessoa.
Os genes são instruções para a produção das proteínas necessárias para a vida, por exemplo, a proteína neurofibromina, que é fundamental para o desenvolvimento do cérebro, da pele, dos ossos e músculos.
Imagine que numa criança o código do gene para formar a neurofibromina seriam as duas sequências de letras abaixo. A primeira (em negrito), a criança recebeu de sua mãe (no óvulo) e a segunda recebeu de seu pai (no espermatozoide):
A NEUROFIBROMINA É UMA PROTEÍNA IMPORTANTE
A NEUROFIBROMINA É UMA PROTEÍNA IMPORTANTE
Para a formação adequada da criança, as duas cópias (frases) precisam estar escritas corretamente.
Agora, imagine que houve um erro de cópia do DNA na formação do espermatozoide e o código paterno veio faltando algumas letras, o que chamamos de variante (antes era chamado de mutação):
A NEUROFIBROMINA É UMA PROTEÍNA IMPORTANTE
UMA PROTEÍNA IMPORTANTE
Quando isso acontece, apenas o código materno é capaz de produzir neurofibromina corretamente para o desenvolvimento da criança. Mas essa quantidade de neurofibromina geralmente não é suficiente e então surgem as manifestações da NF1 (manchas, dificuldades de aprendizado, tumores etc.).
No exemplo acima, a variante foi a perda de um pedaço do gene (que chamamos de deleções) no material genético paterno (90% das vezes), mas pode ocorrer também no material genético materno (10% das vezes) e, nesse caso, geralmente a NF1 se manifesta de forma mais grave.
Além das deleções, as variantes podem ser de outros tipos, como a troca ou inclusão de uma ou mais letras, que também produzem proteínas defeituosas.
Quando a variante não atrapalha muito a neurofibromina e o funcionamento das células é normal, chamamos de variante benigna. Ou seja, a NF1 não se manifestará.
Quando a variante gera neurofibromina defeituosa, ela produz sinais e sintomas da NF1, então chamamos de variante patogênica (páthos quer dizer doença – gênica quer dizer que dá origem).
Entre as variantes benignas e patogênicas existem outras com menor certeza de que produzirão a NF1 e então são chamadas de “provavelmente benignas (90% de chance)”, ou “de significado incerto (50% de chance)” ou “provavelmente patogênicas (90% de chance de aparecerem manifestações da NF1)”.
Existe relação entre a alteração genética e as manifestações da NF1?
Sim, em cerca de 10 a 15% das pessoas com NF1 o exame genético pode oferecer informações sobre como a doença pode evoluir (ver aqui o artigo original em inglês sobre isso).
Dentre as 3.197 variantes já conhecidas no gene NF1 (até 2022), apenas 4 tipos de alterações genéticas são variantes que comprovadamente indicam manifestações clínicas mais graves ou menos graves.
Manifestações clínicas mais graves
- Deleções completas do gene são as mais conhecidas e causam os casos mais graves (5 a 10% de todas as pessoas com NF1). Para saber mais sobre as manifestações clínicas mais graves das deleções clique aqui (artigo em inglês).
- Variantes que ocorrem em 1,6% das pessoas com NF1 e que mudam o sentido da proteína (misense) nos códons 844-848. Isto causa manifestações clínicas mais graves em 75% das pessoas que as possuem. Para saber mais clique aqui (artigo em inglês).
Manifestações clínicas menos graves
- Variante descrita nos laudos como 2970-72delATT – p.Met992del – encontrada em cerca de 0,78% das pessoas com NF1. As pessoas portadoras desta variante apresentam apenas manchas café com leite, efélides axilares e metade delas apresenta dificuldades cognitivas, mas não apresentam neurofibromas, nem gliomas e nem transformações malignas.
Assim, elas são muito semelhantes às pessoas com Síndrome de Legius (ver aqui mais informações sobre esta variante (artigo em inglês).
- Variante descrita no laudo como5425C>T – p.Arg1809Cys – encontrada em cerca de 1,2% das pessoas com NF1. Ver aqui mais informações sobre as manifestações clínicas desta variante que produz apenas manchas café com leite e efélides (artigo em inglês).
Se não for uma destas 4 variantes acima, por enquanto, todas as demais podem apresentar as outras manifestações clínicas da NF1, além das manchas café com leite e efélides, como neurofibromas e outras complicações.
É importante lembrar que, independentemente do tipo de variante, a maioria das pessoas apresenta algumas das várias manifestações da NF1 e raríssimas pessoas apresentam todas as manifestações da doença (ver aqui).
Outras variantes com possível relação com as manifestações clínicas, mas ainda não confirmadas:
- Variante3112A>G – p.Arg1038Gly – apenas manchas café com leite (ver aqui).
- Neurofibromatose espinhal familial (ver aqui).
- Pessoas com NF1 e com gliomas ópticos e determinado tipo de variante (ver aqui).
- Pessoas com NF1 e estenose pulmonar (ver aqui).
- Outras em estudo (ver aqui).
Para conhecer uma série de variantes já descritas nas pessoas com NF1, clique aqui.
Outras correlações genéticas com a NF1
Sugiro o estudo realizado na China recentemente que tentou encontrar relações entre as manifestações clínicas com as variantes conhecidas no gene NF1 (ver aqui – em inglês).
No geral, a equipe de cientistas chegou às conclusões acima, mas apresentou algumas correlações da clínica com a genética que me chamaram a atenção e que resumo abaixo na forma de notas para discussão:
- Sugerem realizar sempre o painel genético em toda criança menor de 2,5 anos e com manchas café com leite.
- Suspeitam que a presença de Nódulos de Lisch seja sugestiva de variantes mais patogênicas.
- Os neurofibromas plexiformes volumosos (mais de 3 litros) são 16 vezes mais comuns nas deleções e a presença de variante patogênica no gene SUZ12 aumenta a chance de transformação maligna.
- As dificuldades cognitivas parecem relacionadas com a isoforma 1 da neurofibromina expressa em alguns exons específicos.
- A displasia periapical do cemento dentário ocorre em 35% das mulheres com NF1, mas não em homens.
- Gliomas ópticos são mais comuns em mulheres.
- Alterações ósseas graves estão associadas com deleções e com variantes que mudam o sentido da proteína (frameshift).
- Retomaram a relação entre Vitamina D baixa e neurofibromas cutâneos.
- Sugerem relação entre transformação maligna e variantes nos códons 844-848 (ver acima).
- A relação entre câncer e NF1 parece clara no câncer de mama, mas ainda é controversa na leucemia mieloide crônica e precisa ser mais estudada.
Por hoje é isso e espero ser útil.
Dr Lor