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Estudo sobre treinamento musical na NF1 é premiado!

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O estudo sobre treinamento musical em adolescentes com NF1, sob a responsabilidade do médico Bruno Cezar Lage Cota, foi premiado como o melhor trabalho científico durante o  Terceiro Simpósio Franco-Brasileiro sobre Audição  realizado de 10 a 11 de setembro de 2021.

Este simpósio foi organizado pela professora Sirley Carvalho (UFMG) e pelo professor Paul Avan (L’Université Clermont Auvergne, França) e ocorreu de modo virtual devido à pandemia da COVID-19, e teve como temas centrais equilíbrio e ruído.

A pesquisa premiada do Dr. Bruno é sobre os efeitos cognitivos do treinamento musical e ainda está em andamento no Centro de Referência em Neurofibromatoses do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais, e faz parte do doutorado do Dr. Bruno no Programa de Pós Graduação em Ciências Aplicadas à Saúde do Adulto da Faculdade de Medicina da UFMG.

O trabalho está sendo orientado pelo professor Nilton Alves Rezende e pela professora Luciana Macedo de Resende, e tem o título “Treinamento musical em adolescentes com Neurofibromatose tipo 1: efeitos na percepção auditiva e seus correlatos eletrofisiológicos” [i].

No Simpósio, Dr. Bruno apresentou os passos que antecederam as suas pesquisas sobre música e neurofibromatose, desde a suspeita da ocorrência das dificuldades musicais na NF1 e sua confirmação durante seu mestrado (artigo publicado em inglês VER AQUI  e seu resumo em português AQUIAQUI ).

Em seguida, ele mostrou os resultados parciais do doutorado, que indicaram melhora nas habilidades auditivas de um pequeno grupo de adolescentes com NF1, após um período de 6 meses de treinamento musical. Esse estudo precisou ser interrompido em decorrência da pandemia da COVID-19, mas será retomado a partir das próximas semanas, com atividades musicais on-line.

O estudo apresentado consistiu em uma fase inicial da investigação dos efeitos do treinamento musical no processamento auditivo, no processamento musical e em alguns outros aspectos da cognição, como a atenção, as habilidades viso espaciais e a função executiva.

Os resultados desse estudo piloto mostraram que:

  1. Todos os participantes que concluíram o treinamento musical (duração de 6 meses) melhoraram o processamento auditivo, que consiste em uma habilidade de grande importância para o aprendizado e para o desenvolvimento da linguagem;
  2. Esses participantes que concluíram o treinamento também melhoraram sua percepção musical, o que pode refletir alguma relação entre o processamento cerebral da música e outros domínios cognitivos;
  3. Metade dos participantes, antes do treinamento musical, não apresentavam uma resposta neurológica (um potencial evocado auditivo, conhecido como Mismatch Negativity) que está relacionado com a habilidade do nosso cérebro perceber e interpretar algumas alterações nos sons que ouvimos, antes mesmos de percebermos conscientemente essas alterações sonoras. Após o treinamento, todos os participantes passaram a responder corretamente ao estímulo sonoro. 
  4. Os resultados dos testes cognitivos não foram apresentados nesse simpósio, porque o foco do evento era a audição.

O trabalho do Dr. Bruno foi selecionado, junto com outros quatro trabalhos, para ser apresentado na forma oral, e recebeu o prêmio de melhor trabalho do simpósio.

Dr. Bruno expressou seu agradecimento a todes que colaboraram para a construção desse projeto, a começar pelas jovens pessoas e seus pais e responsáveis que se voluntariaram para a participação na pesquisa.

Bruno agradeceu também as orientações do professor Nilton Alves Rezende e da professora Luciana Macedo de Resende, e à equipe de colaboradores do CRNF: Luiz Oswaldo Carneiro Rodrigues, Pollyanna Barros Batista, Juliana Ferreira Souza, alunas e alunos de iniciação científica Bruno Messias dos Santos (Bacharel em música), Sabrina Martins da Mata (fonoaudióloga),  Jamile Noele de Andrade (estudante de psicologia), Ana Luiza Nolli Merrighi (musicoterapeuta), Bruna Francielle Pereira (estudante de fonoaudiologia) e Matheus Coelho Rocha (médico).

Um agradecimento especial à inspiração permanente para todos nós que é o Dr. Vincent M. Riccardi, pioneiro mundial da neurofibromatose.

Estamos muito felizes com mais este passo dado, apesar de todas as dificuldades crônicas para realizarmos pesquisas científicas no Brasil, que se agravaram a partir do governo Temer e, principalmente, no governo Bolsonaro (ver reportagem da Rede Globo sobre a Fuga de Cérebros VER AQUI ).

 

[i] Título do trabalho em inglês: Musical training in teenagers with Type 1 Neurofibromatosis: effects on auditory perception and its electrophysiological correlates

Venha participar da pesquisa sobre efeitos da música sobre o aprendizado em adolescentes com NF1!

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Você vai gostar de participar e nos ajudar a conhecer melhor a neurofibromatose do tipo 1 para podermos tratar melhor os problemas de aprendizado e comportamentais.

A pesquisa “Treinamento musical como recurso terapêutico para problemas cognitivos e dificuldades de socialização na Neurofibromatose tipo 1” está com vagas disponíveis para adolescentes com NF1, de 12 a 18 anos, para a próxima turma que iniciará em março.

A técnica das aulas foi desenvolvida por um grupo de pesquisadores e educadores musicais, com enfoque na musicalização em grupo e também com aulas de canto ou instrumento (opções: violão, teclado, flauta doce e percussão).

O objetivo desse projeto é oferecer o aprendizado musical aos adolescentes com NF1, promovendo um ambiente agradável de socialização e avaliar os possíveis efeitos benéficos do treinamento musical sobre as dificuldades de aprendizado e problemas de comportamento.

Desejamos melhorar a sua qualidade de vida.

Quando? As aulas de musicalização ocorrem todas às terças-feiras

Horário: às 17 horas

Onde? No Centro de Referência da Juventude – CRJ, que se situa na rua Guaicurus, 50 – Centro, Belo Horizonte, na Praça da Estação.

 

Venha fazer uma aula experimental e obter maiores informações!

Basta entrar em contato com o Dr. Bruno Cota, nos números:

31- 99851-8284 (Vivo – zap)

31- 99194-2235 (Tim)

 

 

Publicada a primeira parte da pesquisa sobre música e NF1

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Já está disponível na página eletrônica da revista científica Arquivos de Neuropsiquiatria o artigo publicado pelo Dr. Bruno Cota e colaboradores sobre as dificuldades musicais nas pessoas com NF1 (VER AQUI).

O artigo apresenta os resultados do estudo realizado no Centro de Referência em Neurofibromatoses do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais como parte do mestrado do Dr. Bruno no Programa de Pós-Graduação em Fonoaudiologia da Faculdade de Medicina da UFMG sob a orientação da Professora Luciana Macedo de Resende.

A publicação mostra que a maioria das pessoas com NF1 apresenta algum grau de dificuldade musical e esta dificuldade está relacionada com certas alterações eletrofisiológicas cerebrais.

No momento, já começamos a segunda parte da pesquisa, que será o doutorado do Dr. Bruno Cota, com a colaboração dos educadores musicais Bruno Messias, Ana Nolli e Marquito, além de outros pesquisadores.

O objetivo é saber se as pessoas com NF1 poderiam ser beneficiadas em suas dificuldades cognitivas pelo treinamento musical, especialmente voltado para o ritmo e a dança.

Ainda temos vagas para voluntários.

Parabéns ao Dr. Bruno e demais autores que trabalharam com muito carinho nesta publicação.

 

Começou nossa pesquisa sobre a musicoterapia para adolescentes com NF1

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Neste sábado passado, 19 de maio, iniciamos nossa pesquisa sobre os efeitos da musicoterapia sobre as dificuldades de aprendizado em adolescentes com NF1.

É a pesquisa que servirá de base para a Tese de Doutorado do Dr. Bruno Cota, que já comentamos neste site.

O encantador músico e musicoterapeuta Bruno Messias trabalhou durante cerca de duas horas com o grupo inicial de 6 adolescentes, que saíram entusiasmados com o método e já estão esperando ansiosos pelo próximo final de semana.

Os encontros serão sempre aos sábados pela manhã, das nove às 12 horas, no estúdio do Centro de Referência da Juventude na Praça da Estação em Belo Horizonte.

Ainda temos vagas para novos voluntários e voluntárias. Quem quiser participar, mande um e-mail para brucezar@hotmail.com.br ou uma mensagem de WhatsApp para 31 999710622.

Quem tiver dificuldade com as passagens e transporte para participar a AMANF poderá ajudar financeiramente.

Venha ver como funciona no próximo sábado.

 

 

Pergunta 187 – Pessoas com NF1 têm dificuldade para aprender outras línguas?

“Tenho NF1 e meus pais precisaram ir para a Inglaterra para trabalhar e eu não consegui aprender inglês, mesmo morando lá por um ano. Quem tem NF1 tem dificuldade para aprender outras línguas? ” IRJ, de Recife.

Cara I, obrigado pela sua participação. Repassei sua pergunta ao Dr. Bruno Cota, que está estudando problemas musicais nas pessoas com NF1 e veja o que ele respondeu:

“São comuns na neurofibromatose do tipo 1 as desordens de aprendizado e acredita-se que elas estejam relacionadas a déficits de linguagem, presente em aproximadamente metade das pessoas com NF1.

A aquisição e desenvolvimento da fala, bem como a compreensão de uma língua e dos seus aspectos gramaticais, podem ocorrer com algum prejuízo ou atraso nas pessoas com NF1.

Algumas dificuldades de compreensão de figuras de linguagem (como paradoxos, elementos não verbais e até mesmo a linguagem escrita) são descritos com maior frequência nas pessoas com NF1 do que na população em geral.

A aquisição da linguagem envolve habilidades cerebrais, comportamentais, psicológicas e motoras complexas, que necessitam primeiramente da percepção adequada dos sons, da sua organização (fonemas), construção de símbolos (palavras) e seus respectivos significados.

Para a consolidação da linguagem, esses elementos também dependem da capacidade de atenção dos indivíduos, possibilitando o armazenamento do que foi aprendido na nossa memória.

Hoje, já sabemos que tanto o processamento auditivo, bem como o déficit de atenção são comuns nas pessoas com NF1, o que certamente implica em dificuldades de aprendizado e linguagem.

Outras alterações também são comuns na NF1, especialmente secundárias a dificuldades motoras do aparelho fonológico, resultando em prejuízo na articulação da fala, ressonância e hipernasalidade da voz, e também podem aumentar as dificuldades de aquisição da linguagem.

Sabe-se que a música tem uma relação íntima com a linguagem, e suspeita-se que antes da aquisição da linguagem verbal, expressa por palavras, nossos ancestrais comunicavam-se através de sons musicais.

Mesmo com o aprimoramento evolutivo da linguagem verbal, as habilidades musicais mantêm grande importância na comunicação, permitindo inflexões, acentuações, exclamações, entonações, pausas e uma infinidade de outros elementos que constituem aquilo que chamamos de prosódia. Por exemplo: podemos saber se uma pessoa está cansada, triste, feliz, ansiosa, exaltada ou com medo pela maneira como o discurso dela é apresentado, através dos elementos descritos acima.

Estudos nos mostram que o aprendizado musical pode ser um recurso terapêutico que potencializa a aquisição da linguagem, em concordância com diversos outros estudos que constataram que a música e linguagem compartilham áreas cerebrais comuns. Crianças com autismo, por exemplo, têm áreas cerebrais relacionadas com a linguagem que são melhor estimuladas quando ouvem uma canção do que quando ouvem outra pessoa falando, o que torna a musicoterapia uma excelente ferramenta no aprimoramento linguístico.

Constatamos recentemente que pessoas com NF1 apresentam dificuldades na percepção musical, conhecidas como amusias. Ainda não sabemos se o treinamento musical poderá proporcionar uma melhora nas habilidades de aprendizado e linguagem, além das próprias habilidades musicais.

Pretendemos em breve iniciar um estudo para tentar responder a essa pergunta.”

Terapia musical para a NF1? Uma história interessante (Final).

Continuando nossa história de ontem, o Dr. Bruno Cota também concluiu mais uma parte de sua pesquisa sobre as dificuldades musicais nas pessoas com NF1. Ele está realizando um trabalho cuidadoso com a colaboração de muitas pessoas, entre elas a Ana Maria Arruda Lana, o João Gabriel Marques Fonseca, a Luciana Macedo de Resende, a Marília Nunes, o Nilton Alves de Rezende e a Pollyanna Barros Batista.

Seus resultados vem confirmando aquela impressão inicial de que as pessoas com NF1 apresentam dificuldades musicais (ver aqui os resultados iniciais (ver aqui ). Bruno já estudou 15 pessoas (com pelo menos 3 critérios diagnósticos positivos para NF1), as quais se submeteram voluntariamente a um teste especial para avaliação da amusia, que foi desenvolvido no Canadá. Além disso, todos realizaram a medida da atividade elétrica cerebral em resposta a estímulos sonoros (chamado de potencial evocado).

Os dados da pesquisa do Bruno estão mostrando uma correlação estatística muito forte entre a presença da NF1 e os resultados para a amusia. Hoje, estamos preparando um resumo dos seus resultados para apresentarmos no próximo congresso do CTF em Austin, em junho de 2016. Assim, será a primeira vez que esta informação científica sobre amusia na NF1 será conhecida internacionalmente.

É interessante notar como cada conhecimento científico depende de uma história que envolve tantas pessoas e seus vários e diferentes olhares. Não existe o “herói solitário” que descobre a solução para determinado problema, mas sim uma rede de pessoas que são fundamentais para a construção de qualquer conhecimento, desde o trabalhador que cuida do ambiente ao cientista que realiza as medidas, desde a mãe que desconfia de um detalhe na doença de seu filho até o filósofo que nos ajuda a pensar a ciência, desde o cidadão que paga seus impostos até a universidade pública que financia os projetos.

Portanto, a ciência é uma construção coletiva e por isso seus resultados devem ser públicos e abertos a todos. Ela deve ser construída em benefício de todos, no nosso caso, as pessoas com NF1, às quais agradecemos a colaboração para todos estes projetos que temos desenvolvido e esperamos que cada vez mais as pessoas com NF1 se beneficiem dos resultados das nossas pesquisas.

Apesar do convite do Jô Soares continuar aberto, Maria Helena interrompeu suas aulas e não chegou a tocar bem seu violino de três cordas. Mas, de alguma forma, seu desejo, além de legítimo, desencadeou uma série de acontecimentos que nos permitiram conhecer melhor a NF1. Quem sabe, num futuro próximo, a terapia musical (tão amada pelo Oliver Sacks) venha a ser uma das ferramentas para melhorarmos o desenvolvimento cognitivo das crianças com NF1?

Quem desejar mais informações sobre música e NF1 pode entrar em contato com o Dr. Bruno Cota pelo e-mail: brucezar@hotmail.com.br 

Até segunda feira e bom final de semana.

Terapia musical para a NF1? Uma história interessante (Parte 2).

Ontem relatei a primeira parte da história da nossa suspeita de que as habilidades musicais estariam diminuídas nas pessoas com NF1, suspeita esta que fora despertada pelas observações sobre minha filha Maria Helena e reforçada no contato com outras pessoas atendidas em nosso Centro de Referência, inclusive a menina com NF1 que tentou fazer aulas de música e o professor praticamente a expulsou da sala, o que muito a magoou, por causa de sua extrema dificuldade de afinação vocal.

Um passo importante para compreendermos as dificuldades musicais na NF1 foi dado em 2010, quando publicamos o relato de um jovem adulto com NF1, que foi estudado em nosso Centro de Referência em NF pela estudante de fonoaudiologia Pollyanna Barros Batista, que encontrou nele a desordem do processamento auditivo (DPA), ou seja, uma situação na qual a pessoa escuta normalmente, mas processa as informações sonoras de forma inadequada em seu cérebro (ver aqui o artigo).

Continuando seu estudo no mestrado em Ciências Aplicadas à Saúde do Adulto, Pollyanna constatou que praticamente todas as pessoas com NF1 apresentam a DPA em maior ou menor grau e que havia uma relação entre a DPA e as dificuldades de aprendizado e linguagem (ver aqui a dissertação completa ou o artigo publicado). Lembrando da possível associação entre amusia e DPA mencionada pelo Oliver Sacks, busquei nas publicações científicas alguma relação entre NF1, DPA e dificuldades musicais, mas nada encontrei.

Durante outro congresso do CTF, desta vez em Jackson Hole, nos Estados Unidos, numa conversa que tivemos com Riccardi, eu e Luíza (minha filha caçula, que também é médica e estudou a disfunção endotelial na NF1 no seu mestrado), comentamos com ele nossa impressão de que as pessoas com NF1 apresentam dificuldades musicais. Ele não apenas concordou, como contou-nos que numa viagem à Espanha ele mencionara esta mesma opinião para um médico espanhol que trabalhava com NF. O tal colega discordou do Riccardi, dizendo que conhecia uma pessoa com NF1 a qual era excelente pianista. Noutro momento, Riccardi teve a oportunidade de ver o pianista com NF1 executar uma partitura clássica e percebeu que embora ele fosse capaz de tocar as notas previstas, não havia no seu desempenho harmonia ou melodia satisfatórias. Riccardi concluiu que o médico espanhol não devia ter grande percepção musical e que o pianista, talvez, se não fosse a NF1 poderia ter sido um gênio musical.

Mais algum tempo se passou e tive a oportunidade de assistir a uma palestra do brilhante médico e músico, o professor João Gabriel Marques Fonseca, durante a qual ele mencionou as amusias e desarmonias. Ao final, perguntei se ele sabia de alguma coisa sobre amusia e neurofibromatose, o que ele achou uma boa pergunta, para a qual não tinha resposta naquele momento, mas que prometia estudar. De fato, um tempo depois fui procurado no Centro de Referência em NF pelo também médico e músico, Bruno Cota, que fora indicado pelo João Gabriel para, quem sabe, desenvolver a pesquisa de seu mestrado estudando a hipótese de que haveria amusia na NF1. Concordamos que seria uma boa ideia, montamos o projeto e o Dr. Bruno iniciou um estudo cuidadoso que comentarei adiante.

Ontem (16 de fevereiro de 2016), a fonoaudióloga Pollyanna Barros Batista foi aprovada no seu doutorado na Faculdade de Medicina da UFMG (ao lado a foto da banca examinadora: Nilton, Pollyanna, Carla, Daniela, Denise e Rogério) e na sua pesquisa ela estudou se o treinamento auditivo poderia melhorar a desordem do processamento auditivo em pessoas com NF1. 

Ela realizou um treinamento auditivo durante 8 semanas em dois grupos de pessoas com DPA com idade entre 10 a 35 anos. Um grupo apresentava NF1 e DPA e o outro também apresentava DPA, mas sem NF1. Depois do tratamento fonoaudiológico, ambos os grupos melhoraram de forma semelhante diversas medidas fonoaudiológica realizadas pela Pollyanna, indicando que as pessoas com NF1 responderam ao tratamento de forma semelhante às pessoas sem NF1. Esta é uma informação inédita em todo o mundo.

Depois de um ano, Pollyanna repetiu os testes com as pessoas com NF1 e DPA que haviam sido tratadas e verificou que os benefícios do tratamento persistiam depois de um ano. Estes resultados originais da Pollyanna precisam ser confirmados por outros pesquisadores para termos certeza de que são verdadeiros, mas eles nos animam muito a estudar o tratamento mais precoce, ou seja, estudarmos crianças com NF1 antes dos 10 anos de idade, para tentarmos melhorar o aprendizado da voz, fala e linguagem antes que elas tenham os prejuízos no seu desenvolvimento escolar e social.

E como é que a música entra nesta questão? Amanhã concluirei este assunto.

Terapia musical para a NF1? Uma história interessante (parte 1)



Entre as diversas habilidades da minha filha Maria Helena, a musicalidade não me parecia ser um de seus talentos naturais. Em torno dos seus dez anos de idade, ela manifestou o desejo de fazer aulas particulares de violino, o que me surpreendeu, embora os poucos acordes que sou capaz de arranhar no violão não me forneçam qualquer atestado de competência musical.

Durante várias semanas, às vezes Thalma, às vezes eu, levamos Maria Helena às tais aulas, nas quais seu progresso no aprendizado do violino não parecia animar muito o jovem professor, compelido a defender seus trocados tentando viabilizar o sonho da menina. Na saída de uma das aulas, Maria Helena confessou-me que não lhe agradava muito o som da quarta corda e quando a tangia com o arco percorria pelo seu corpo um arrepio desagradável.

Na mesma época, participei da organização de um salão de humor em Belo Horizonte, para o qual foram convidados diversos cartunistas brasileiros e o Jô Soares, cujo programa de entrevistas na TV já era famoso. Depois do show do Jô, fomos a um restaurante de comida mineira, ao qual Maria Helena nos acompanhou, pois queria fazer um “pedido” ao Jô Soares. Depois do jantar, demos carona ao Jô até seu hotel e no trajeto Maria Helena disse a ele que gostaria muito de se apresentar no seu programa na TV. Jô, gentil, disse que a receberia com muito prazer, e perguntou o que ela apresentaria diante das câmeras. Maria Helena respondeu que tocaria violino. Ah, exclamou o Jô, – e você toca bem? Ela respondeu: Ainda não, porque a quarta corda tem um som horrível, que me deixa toda arrepiada! Jô deu uma grande risada e disse: Então, estamos combinados: quando você estiver tocando bem um violino com apenas três cordas, você me avisa que apresento você no meu programa!

Este caso das aulas de violino aconteceu quando eu ainda não me dedicava ao atendimento clínico de pessoas com neurofibromatoses, mas de forma pitoresca chamou a atenção para a questão da habilidade musical (ou falta dela) da Maria Helena e me perguntei se isto teria algo a ver com a sua doença, a Neurofibromatose do tipo 1 (NF1).

Anos mais tarde, depois de criarmos o ambulatório em 2005, à medida que ia conhecendo mais e mais pessoas com NF1, comecei a desconfiar que era comum certa dificuldade entre elas para tocar instrumentos musicais. Na mesma época, começamos alguns estudos conduzidos pela fonoaudióloga Carla Menezes da Silva sob a orientação do Dr. Nilton Alves de Rezende, que encontrou alterações da motricidade orofacial em pessoas com NF1 e estes resultados foram apresentados no congresso sobre neurofibromatoses do Children’s Tumor Foundation (CTF) de 2007 nos Estados Unidos. A fonoaudiologia já fizera parte da vida da Maria Helena, como terapia para sua voz anasalada e outras alterações de fala e linguagem.

Em 2008, recebi de presente da minha filha Ana e seu marido Juliano o livro do Oliver Sacks “Alucinações Musicais”, no qual o famoso médico norte-americano descreve diversas pessoas com doenças variadas, inclusive algumas delas que apresentavam dificuldade de percepção e ou de execução musical. Sacks detalhava as diferentes formas de amusia e desarmonia e, num dos seus casos clínicos, estabeleceu uma relação entre a desordem do processamento auditivo e a dificuldade do paciente em manter na memória uma sequência auditiva de notas.

Anotei na página do livro se aquilo poderia ter algo a ver com as dificuldades musicais da Maria Helena e das pessoas com NF1. Esta dúvida começou a ser respondida no ano seguinte pela Pollyanna Barros Batista, bolsista de iniciação científica em fonoaudiologia orientada pelo Nilton Alves de Rezende.

Amanhã continuo esta história.

A música faz parte do desenvolvimento humano?

Continuo a conversa de ontem sobre os resultados da pesquisa do Bruno Cota, que encontrou dez vezes mais dificuldades musicais nas pessoas com NF1 do que nos voluntários sem a NF1.

Minha impressão é de que a musicalidade na voz humana é fundamental para o desenvolvimento dos bebês, porque mesmo sem entender o sentido das palavras pronunciadas eles são capazes de compreender o significado emocional dos sons emitidos naquelas conversas que elaboramos com eles.

Pela maneira como expressamos a voz, os bebês percebem se é uma voz conhecida ou estranha, se quem emite a voz é uma pessoa que está ansiosa ou calma, se está agressiva ou cordial, se tem pressa ou se está relaxada e assim por diante. Muito antes de saber o sentido das palavras, como diz o João Gabriel, a criança já entende a voz em sua entonação, em seu volume, em suas variações de ritmo, ou seja, em sua musicalidade.

Por isso, creio que a linguagem por meio da musicalidade vem antes do sentido da linguagem das palavras, o que tem uma finalidade biológica de sobrevivência e pode ter sido a origem da presença da música em todas as culturas e civilizações humanas.

Neste sentido, nós seres humanos somos animais sociais, ou seja, somente sobrevivemos na natureza quando estamos organizados em grupos. Só existimos no plural: nós.

A comunicação pela voz, e em seguida pela palavra, entre os diferentes membros do grupo social é fundamental para a formação da identidade de uma pessoa. 


Por isso a música faz parte desta comunicação, desde o bebê até a vida adulta, quando os grupos humanos se reúnem e se sentem participando do mesmo instante, vivendo um mesmo momento, ao escutarem uma determinada música que fortalece no grupo a sua identidade (“a música” de um casal enamorado, aquele sucesso de uma geração, o hino de uma nação ou de uma torcida, uma canção religiosa, uma marcha militar, e assim por diante).

A nossa consciência é plural, ou seja, não existo sozinho, mas somente tenho consciência de mim pelos sinais que os outros me enviam, então a música compartilhada é um momento de identidade coletiva, em que me sinto “realmente” participando de um grupo que dá sentido à minha existência. Ou seja, a música “é nós”.

Daí o verdadeiro prazer e a ausência de solidão que sentimos quando ouvimos música em grupo (o que talvez não funcione com os fones de ouvido dos celulares…).

Se estas ideias acima forem verdadeiras, a exposição à música deve ser parte fundamental do desenvolvimento cognitivo dos seres humanos. Então, se as pessoas com NF1 têm dificuldades musicais, será que esta “amusia” faz parte de suas dificuldades de aprendizagem? Será que a amusia das pessoas com NF1 prejudica a sua interação social, o que explicaria a timidez e o retraimento afetivo que muitas pessoas com NF1 apresentam, a ponto de serem confundidas com autistas?

São perguntas que precisam ser respondidas no futuro e que podem nos apontar se a maior exposição à música ou a tratamentos baseados no treinamento musical poderiam ajudar as crianças com NF1 a se desenvolverem melhor.


Lembro que quando minha filha Maria Helena nasceu com NF1 nós ainda não sabíamos o seu diagnóstico e nem que ela tinha pouca força muscular. Sem força para sugar o leite do peito de sua mãe, a pobrezinha chorava de fome e não conseguia dormir, chegando a ficar um pouco desnutrida com o passar das semanas. Quando, finalmente, o cansaço a dominava e ela dormia por alguns instantes nós fazíamos de tudo para que nenhum barulho a acordasse, inclusive nenhuma música podia ser tocada (o que antes acontecia com muita frequência, é claro, inclusive pela Ana sua irmã mais velha).

Será que Maria Helena foi exposta a menos música do que precisava?

Vamos continuar estudando.

Resultados iniciais do estudo sobre dificuldades musicais na NF1

Na semana passada, o médico e estudante de pós-graduação em fonoaudiologia da UFMG, Bruno Cezar Lage Cota apresentou os resultados iniciais do seu estudo sobre dificuldades musicais nas pessoas com NF1.

Suas conclusões foram expostas aos examinadores do seu mestrado, um grupo formado por pessoas envolvidas com a questão: os médicos (e também músicos) Ana Maria Arruda Lana e João Gabriel Marques Fonseca, a fonoaudióloga (e orientadora) Luciana Macedo de Resende e por mim, responsável pelo acompanhamento das pessoas com NF1.

No auditório também estavam o médico diretor do Centro de Referência em Neurofibromatoses do HC da UFMG, Nilton Alves de Rezende e a fonoaudióloga Pollyanna Barros Batista, que realizaram a primeira pesquisa que mostrou a desordem do processamento auditivo que pode estar relacionada às dificuldades de aprendizagem nas pessoas com NF1 (ver aqui o artigo aqui).

A partir do trabalho da Pollyanna, e do relato de diversas pessoas com NF1 de que possuíam poucas habilidades com instrumentos musicais, foi idelizado o estudo do Bruno para saber se, de fato, a neurofibromatose do tipo 1 estaria relacionada com a “amusia”, ou seja, uma dificuldade de perceber a música.

E por que a capacidade de compreender música precisa ser estudada? Porque a música, muito mais do que apenas distração, passatempo ou divertimento, é fundamental para o desenvolvimento humano.

Sabendo que o aprendizado musical faz parte do processo de aprendizagem em geral, a nossa pergunta é: qual é a relação entre uma possível amusia com a desordem do processamento auditivo e com o desenvolvimento psicológico e intelectual das crianças com NF1? Ou seja, queremos saber se as pessoas com NF1 possuem alguma dificuldade musical que possa estar relacionada com suas dificuldades na escola, por exemplo.

Nos testes especiais para se medir a amusia, por enquanto com 10 pessoas com NF1 e 10 pessoas sem NF1, Bruno observou que as pessoas com NF1 pontuaram abaixo do grupo controle, formado por pessoas da mesma idade, sexo e nível educacional mas sem NF1.
Assim, a conclusão do Bruno, com a qual todos nós que examinamos o seu trabalho concordamos, é que há cerca de 10 vezes mais chance de uma pessoa com NF1 apresentar amusia do que uma pessoa sem a NF1. Ou seja, há um tipo de amusia relacionada com a NF1.

Amanhã continuo falando dos passos seguintes deste estudo, o porquê de a música ser fundamental no desenvolvimento humano e nossa esperança de podermos usar a música no tratamento das crianças com NF1 e dificuldades de aprendizagem.