Continuo os comentários sobre o último congresso realizado em Bruxelas.

O desejo da nossa equipe do CRNF seria de apresentarmos muitos outros conteúdos sobre o congresso, mas estamos sobrecarregados de trabalho no atendimento aos pacientes e tivemos diversos problemas de saúde em alguns de nossos familiares.

Além disso, estamos trabalhando bastante para realizar a edição comemorativa dos 20 anos do CRNF a ser lançada em novembro de 2024, na nossa festa anual.

Assim, vamos apresentando o que estamos conseguindo realizar.

 

Hoje , faço uma análise de um tema apresentado no congresso e que também saiu publicado na revista científica The New England Journal of Medicine de junho de 2024 (ver aqui artigo completo em inglês) com o título “Brigatinibe na Schwannomatose Relacionada à NF2 com Tumores Progressivos” pelo grupo de cientistas liderados por Jaishri O. Blakeley, do Massachusetts General Hospital.

A Schwannomatose relacionada à NF2 (NF2-SWN, anteriormente chamada de neurofibromatose tipo 2) provoca o crescimento de múltiplos tumores como schwannomas vestibulares, schwannomas não vestibulares, meningiomas e ependimomas. A doença geralmente é progressiva, necessitando de cirurgias repetidas e ainda sem medicamentos aprovados.

Alguns estudos de laboratório mostraram que uma droga chamada brigatinibe agiu como inibidora das tirosina quinases (estimulantes do crescimento celular) num tipo de schwannoma (não vestibular) e no meningioma induzidos por variante genética no gene NF2. Diante disso, a equipe da Dra. Blakeley realizou um estudo com brigatinibe em pacientes com múltiplos tipos de tumores progressivos em pessoas com NF2-SWN.

Neste ensaio, os pacientes com 12 anos de idade ou mais com NF2-SWN e tumores progressivos foram tratados com brigatinibe oral na dose de 180 mg por dia. O resultado principal foi a resposta radiográfica, ou seja, a variação de tamanho na ressonância magnética dos tumores chamados de “alvo”. Outros resultados secundários foram: segurança do medicamento, taxa de resposta em todos os tumores, melhora auditiva e resultados relatados pelo paciente.

Um total de 40 pessoas foram voluntárias (idade mediana de 26 anos) com tumores-alvo progressivos (sendo 10 schwannomas vestibulares, 8 schwannomas não vestibulares, 20 meningiomas e 2 ependimomas) e receberam o tratamento com brigatinibe.

Após 10,4 meses de uso do medicamento, segundo a equipe, a resposta radiográfica foi:

Redução de 10% para os tumores-alvo

Redução de 23% para todos os tumores

Outros resultados encontrados foram:

Meningiomas e schwannomas não vestibulares mostraram mais redução do que os schwannomas vestibulares.

As taxas de crescimento por ano diminuíram para todos os tipos de tumor durante o tratamento.

A melhora auditiva ocorreu em 35% das orelhas escolhidas.

Sugestão de redução da dor durante o tratamento.

Nenhum evento adverso grave (graus 4 e 5) foram relacionado ao tratamento.

 

Em conclusão, segundo os autores, o tratamento com brigatinibe resultou em respostas radiográficas em vários tipos de tumor e benefício clínico em um grupo de pacientes com NF2-SWN.

 

Comentários

Inicialmente, minha impressão é de que 10% de redução dos tumores-alvo e 23% de redução dos tumores em geral é um resultado insatisfatório.

Além disso, é preciso considerar que a perda de audição nem sempre está relacionada com o tamanho do tumor. Portanto, reduzir o tamanho do tumor não significa a melhora dos problemas dos pacientes.

Aliás, na Figura 2 publicada, há pessoas que apresentaram piora da audição numa orelha e estabilidade ou melhora discreta na outra. Ou seja, o medicamento não parece ter interferido nos tumores efetivamente.

Reduzir o tumor parece ser apenas um indicativo de que o medicamento está agindo nos processos celulares que promovem o seu crescimento e isto é um sinal promissor de que o caminho para tratamentos mais efetivos possa ser este.

Outro fator preocupante é que 45% das pessoas voluntárias abandonaram o tratamento por efeitos colaterais.

Uma limitação importante do estudo, admitida pelos próprios autores, é a falta de um grupo de pessoas usando placebo como grupo controle, uma vez que um dos resultados procurados pelas pessoas com NF2-SWN é a melhor compreensão das palavras numa conversa, ou seja, um dado fortemente influenciado por fatores subjetivos.

Finalmente, precisamos lembrar que este é mais um estudo realizado com apoio e financiamento da indústria que produz o próprio medicamento que está sendo testado, com diversos dos autores e autoras com conflito de interesse financeiro, pois recebem pagamentos das indústrias envolvidas. Além disso, foi também financiado pela Children’s Tumor Foundation (número no ClinicalTrials.gov INTUITT-NF2, NCT04374305.)

 

Conclusão

Infelizmente, o brigatinibe não mostrou ser uma droga capaz de melhorar a qualidade de vida da maioria das pessoas com NF2-SWN.

Dr. Lor

 

 

 

Terminou na semana passada, em Bruxelas, na Bélgica, a Global NF Conference, que reuniu uma parte da comunidade científica internacional que se dedica ao estudo da NF1 e das Schwannomatoses. Foram 305 assuntos abordados no congresso e destacamos a seguir algumas informações.

A primeira, é que foi um evento patrocinado por alguns laboratórios da indústria farmacêutica, principalmente a Astrazeneca (representada pela Alexion – seu braço comercial para as doenças raras) e a SpringWorks. Assim, já podíamos esperar, como aconteceu, as diversas sessões de propaganda explícita de medicamentos disfarçadas de comunicações científicas. 

A segunda, é que, no meio de muita propaganda, encontramos mais alguns tijolos úteis nessa lenta construção do conhecimento científico sobre NF1 e Schwannomatoses, como alguns avanços no uso da inteligência artificial (14 temas) e no chamado tratamento genético (outros 14 temas). 

A terceira, é que os medicamentos produzidos pelas indústrias patrocinadoras, chamados de inibidores da via MEK dominaram a pauta da reunião (1 em cada 5 temas discutidos). Assim, é preciso compreender o que são estes medicamentos antes de prosseguirmos nossa análise. 

Inibidores MEK 

Já se sabe que diversas manifestações clínicas da NF1 ocorrem porque há insuficiência de uma proteína chamada neurofibromina, a qual controla o crescimento celular assim:

Quando a célula deve crescer, ocorre um estímulo para o crescimento celular, que leva ao início de uma cadeia de eventos dentro da célula, que leva à ativação da etapa MEK, que leva à multiplicação celular. 

Quando a célula não deve crescer: ocorre um estímulo para o crescimento celular, que leva ao início da cadeia de eventos dentro da célula, mas ela sofre BLOQUEIO PELA NEUROFIBROMINA, evitando a ativação da etapa MEK , e então não ocorre multiplicação celular. 

Portanto, a insuficiência da neurofibromina nas pessoas com NF1 permite que a célula cresça quando não deveria, dando origem aos tumores (múltiplas células). 

Os medicamentos inibidores MEK foram desenvolvidos para “substituir” a neurofibromina, ou seja, inibir a etapa MEK, evitando o crescimento inadequado das células e a formação dos tumores.

O mecanismo suposto faz sentido e assim foi desenvolvido o medicamento selumetinibe (um dos inibidores MEK em estudo e discutidos no congresso), o primeiro a ser aprovado para uso terapêutico em diversos países nos neurofibromas plexiformes SINTOMÁTICOS E INOPERÁVEIS (ver aqui mais informações sobre isso). 

Os resultados de estudos com vários inibidores MEK foram apresentados no evento, a maioria deles com efeitos semelhantes ao selumetinibe: cerca de 30% de redução do volume dos plexiformes em metade das crianças que usaram a droga por pelo menos 8 meses, mas sem o uso de placebo para comprovação e com efeitos colaterais moderados (inclusive 10% de fraturas ósseas, ainda não relatadas, segundo resumo apresentado no evento pela pesquisadora Andrea Baldwin e colaboradores, vários deles também autores da pesquisa que justificou a aprovação do medicamento pelas autoridades de saúde).

Nos estudos apresentados em Bruxelas, a maioria patrocinada pelos fabricantes das drogas, além dos neurofibromas plexiformes sintomáticos e inoperáveis, os inibidores MEK também estão sendo testados em experimentos clínicos, modelos animais, culturas de células e relatos de casos clínicos, mas os resultados são ainda inconclusivos nas seguintes situações: 

  1. neurofibromas cutâneos, 
  2. gliomas das vias ópticas
  3. glioblastomas  
  4. dor neuropática (em camundongos e mini porcos)
  5. dificuldades cognitivas (em moscas drosófilas)
  6. fadiga  (1 caso)
  7. tratamento adjuvante na transformação maligna 
  8. “preventivos” para crescimento dos tumores 
  9. “preventivos” para displasia do esfenoide
  10. tratamento de problemas psiquiátricos em pessoas com NF1

A expectativa de usar um mesmo tipo de medicamento para essa lista de problemas clínicos tão diferentes entre si parece pouco realista, mas, quem sabe? 

Em conclusão, é possível que a busca por tratamentos das complicações da NF1 com inibidores MEK continue por alguns anos e, nesta busca, esperamos que medicamentos mais eficientes, mais seguros e com preço mais acessível sejam encontrados. 

Esperamos também que, para isso, o financiamento dos estudos se torne cada vez mais público e menos privado (ver aqui as ideias de Isabelle Stengers como é possível), para garantir que as pessoas sejam as mais beneficiadas e não as ações da indústria de medicamentos.

Nos próximos dias comentaremos outras novidades do congresso. 

Dr. Lor

 

 

Nos posts anteriores falamos sobre o possível excesso de diagnósticos de transtornos do comportamento, sobre o papel da família e da sociedade nestes transtornos e sobre a incerteza que existe nos manuais de diagnóstico de transtornos mentais.

Hoje concluímos nossa apresentação sugerindo algumas abordagens para as crianças com o TDDH.  Ainda não há um tratamento específico para esse transtorno, mas as sugestões dos Manuais  são:

  • A avaliação psicológica e psicoterapia deve ser a primeira abordagem da criança com suspeita de TDDH;
  • Os pais e mães (e quem mais for responsável por criar a criança) também devem participar de psicoterapia (para aprender a manejar seus próprios impulsos e raiva) e receber treinamento adequado para serem instrutores de suas crianças, e ajudarem no desenvolvimento do autocontrole e de manejos dos gatilhos que desencadeiam as crises;
  • A abordagem da hiperatividade com medicamentos pode ser útil, mas não é sempre eficaz (e nas crianças com NF1 a eficácia desses tratamentos é ainda menos estabelecida cientificamente: ver um estudo aqui e outro aqui).
  • Não há ainda estudos científicos que justifiquem o uso de estimulantes do sistema nervoso (por exemplo, metilfenidato) associados a antipsicóticos (risperidona, por exemplo).

Por fim, mas não por último, todas estas medidas serão pouco eficientes se não transformarmos a estrutura familiar, a escola e a sociedade num mundo com menos competição, menos foco em obediência e mais guiado pela felicidade humana e não pelo lucro e produtividade.

Crianças e adolescentes precisam de liberdade sem medo, de corpos e mentes livres, pelo menos um pouco longe das telas e das redes sociais, com atividades físicas lúdicas e prazerosas. Precisam também de alegria de viver e de esperança num futuro melhor, em um mundo menos desigual, mais justo e inclusivo.

Há muitos movimentos, de grupos da sociedade que estão preocupados com o futuro, que podem nos ajudar a mudar nossas ações hoje, apontando novos caminhos, como o Movimento Desconecta (https://www.movimentodesconecta.com.br/), o Movimento Infância Livre de Consumismo (https://milc.net.br/) e a Aliança pela Alimentação Adequada e Saudável (https://alimentacaosaudavel.org.br/).

E nós, pais e mães dos tempos atuais, precisamos encontrar mais leveza e mais alegria na nossa convivência em família e na educação de nossos filhos e filhas, pois eles crescem rápido demais, especialmente se estivermos muito ocupados trabalhando, alheios ao presente, muito distraídos pelos nossos celulares e muito preocupados com o futuro adulto que um dia eles serão (veja um livro interessante sobre gestão do tempo aqui https://a.co/d/8DvIxR6).

Talvez, nesse novo mundo, que podemos construir com as ações de hoje e de cada dia, serão mais raras as crianças e adolescentes (e talvez os adultos) com TDDH, depressão, TDAH, TOD etc… ?

Dra. Luiza De Oliveira Rodrigues

Dr. Luiz Oswaldo C. Rodrigues

Agradecemos as leituras atentas e sugestões de Fabiana Amélia Reis Pantuzza, Felipe Pantuzza Santana , Maria Helena Rodrigues Vieira, Marcos Vinícius Soares Vieira e Rafael Cosenza.

 

Nos posts anteriores falamos sobre o possível excesso de diagnósticos de transtornos do comportamento, sobre o papel da família e da sociedade nestes transtornos e sobre a incerteza que existe nos manuais de diagnóstico de transtornos mentais.

Com estas perguntas em mente, vamos tentar compreender melhor o Transtorno Disruptivo de Desregulação do Humor (TDDH) (ver artigo aqui em inglês), a partir da leitura de uma revisão sobre esse transtorno.

Lembramos que esta é uma revisão do tipo”narrativa” e não “sistemática” (quem desejar saber a diferença, veja aqui  o que isso quer dizer).

É importante ressaltar que, o Manual Americano de Desordens Mentais (DSM) agrupou o (TDDH) junto com os transtornos do humor (dentro do grupo de Transtornos Depressivos) e não com os transtornos do Neurodesenvolvimento (como o TDAH ou TEA) ou os Transtornos de conduta, disruptivos e de controle de impulsos (como o TOD).

O diagnóstico do TDDH pode ser feito a partir dos critérios apresentados na tabela abaixo.

 

Tabela  – Sinais e sintomas para o diagnóstico de Transtorno Disruptivo de Desregulação do Humor (American Psychiatric Association. Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders, 5 edição, Washington, DC, 2013).

  • Surtos frequentes e graves de raiva (verbais ou comportamentais) desproporcionais à provocação.
  • Os surtos são inadequados para a idade da criança.
  • Ocorrem 3 ou mais vezes por semana.
  • O comportamento habitual entre os surtos é continuamente irritado ou raivoso a maior parte do dia, quase todos os dias e são percebidos por outras pessoas.
  • Este problema tem duração maior que 12 meses, sem intervalo..
  • Estes comportamentos estão presentes em dois ou mais destes ambientes: em casa, na escola e com crianças da mesma idade) e são graves, pelo menos em um destes ambientes.
  • O início dos problemas está presente desde antes dos dez anos de idade.
  • O diagnóstico não é feito antes dos 6 e nem depois dos 18 anos.
  • Sintomas de comportamento bipolar típico (mania ou depressão) não duram mais do que um dia.

Observação: para se fazer o diagnóstico de TDDH, a criança não pode apresentar outros diagnósticos já definidos, como depressão grave, distimia, transtorno no espectro do autismo, desordem de estresse pós-traumático, desordem de ansiedade de separação, transtorno bipolar, desordem explosiva intermitente ou transtorno desafiador opositor e os sintomas não são decorrentes de efeitos de uso de drogas ou problemas neurológicos.

 

Lembrar que os sintomas de TDDH podem estar presente em outros problemas, por exemplo: com o diagnóstico de transtorno depressivo maior (TDM), transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), transtorno de conduta (TC) e transtorno por uso de substância (TUS). Aliás, o manual informa que é raro o diagnóstico isolado dessa condição.

Quantas crianças têm TDDH?

Como o transtorno só foi descrito recentemente, as informações não são muito precisas. Por exemplo, há relatos de que poderia estar presente em 1 a cada 100 crianças na população em geral, mas poderia acontecer em até 1 em cada 4 crianças atendidas por problemas de comportamento.

O que causa o TDDH nas crianças?

Ainda não sabemos exatamente. Os estudos genéticos ainda não encontraram hereditariedade definida, embora a presença de outras doenças mentais na família poderiam contribuir para o aparecimento do TDDH.

Ainda não foram realizados muitos estudos específicos (incluindo ressonância magnética funcional) em crianças classificadas com o TDDH. Dados preliminares sugerem que há uma resposta excessiva aos estímulos emocionais numa parte do cérebro chamada “amígdala”. Por exemplo, uma expressão facial neutra pode ser interpretada como sendo agressiva pela criança com transtorno de humor importante (ver estudo sobre isso aqui).

 

Amanhã, concluiremos nossa apresentação apresentando sugestões para o tratamento das crianças com o possível TDDH.

 

Dra. Luiza De Oliveira Rodrigues

Dr. Luiz Oswaldo C. Rodrigues

Agradecemos as leituras atentas e sugestões de Fabiana Amélia Reis Pantuzza, Felipe Pantuzza Santana , Maria Helena Rodrigues Vieira, Marcos Vinícius Soares Vieira e Rafael Cosenza.

 

 

 

Nos posts anteriores falamos sobre a possibilidade de excesso de diagnósticos e sobre o papel das famílias e da sociedade nos transtornos mentais das crianças.

Hoje, vamos falar sobre os manuais internacionais de doenças mentais (DSM), que apresentam muitos rótulos para doenças que se confundem nos limites, porque os sintomas são parecidos.

Por exemplo, o Transtorno Disruptivo de Desregulação do Humor (TDDH) apresenta sintomas semelhantes ao Transtorno no Espectro do Autismo (TEA), ao Transtorno Bipolar (TBP) e ao Transtorno Opositor Desafiador (TOD).

Assim, são muitos rótulos e muitas “patologias” com sintomas em comum, com critérios diagnósticos que se confundem e com tratamentos medicamentosos semelhantes: estimulantes do sistema nervoso, antipsicóticos e estabilizadores do humor.

Qual é a verdadeira utilidade de separar os comportamentos das crianças em tantas caixas diferentes porém tão parecidas?

Se elas tivessem causas diferentes e bem conhecidas, as quais pudessem ser tratadas diretamente, poderia fazer sentido separá-las. Mas, a medicina ainda não sabe completamente a causa da maior parte dessas “doenças” e estamos, em geral, tratando somente os sintomas, com os mesmos “remédios”.

Algumas “novas” doenças mentais são mais divulgadas que outras, e parecem ser justamente aquelas tratadas com um medicamento caro (ver aqui nossas dúvidas sobre a indústria farmacêutica).

Inclusive, um dos principais autores do artigo de revisão do TDDH, que comentaremos a seguir, é justamente um psiquiatra que tem ligações profissionais com indústrias que produzem o medicamento metilfenidato, utilizado para ajudar a tratar os sintomas de hiperatividade e desatenção. Portanto, poderia haver interesse pessoal dele em promover o tratamento medicamentoso das crianças com este medicamento?

Amanhã continuaremos nossa discussão sobre problemas de comportamento em nossas crianças, abordando o novo diagnóstico denominado TDDH.

 

Dra. Luiza De Oliveira Rodrigues

Dr. Luiz Oswaldo C. Rodrigues

Agradecemos as leituras atentas e sugestões de Fabiana Amélia Reis Pantuzza, Felipe Pantuzza Santana , Maria Helena Rodrigues Vieira, Marcos Vinícius Soares Vieira e Rafael Cosenza.

 

Ontem iniciamos nosso debate sobre transtornos de comportamentos nas crianças e discutimos se estamos vivendo um excesso de diagnósticos de problemas de comportamento.

Hoje, continuamos este assunto perguntando: é possível avaliar a saúde mental das crianças sem envolver sua família e sem levar em conta sua história de vida e a sociedade na qual elas vivem?

Como se diz, é preciso uma vila inteira para criar uma criança.

Sabemos que as doenças mentais são resultado de situações genéticas, sociais, econômicas e históricas. Assim, talvez essas “novas doenças” das crianças sejam um dos resultados das formas de viver que temos adotado, com mais competição, individualismo e todas as pessoas sequestradas pelas telas e redes sociais.

Talvez as crianças estejam percebendo e reagindo subconscientemente à insegurança de um mundo a caminho da crise climática (elas vêem as enchentes trágicas!), com aumento das desigualdades sociais, com menor oportunidade de emprego e ameaçado por guerras nucleares. Será que o caminho para entendermos os problemas de comportamento das crianças pode ser outro, que as ajude a compreender melhor a realidade difícil que estamos vivendo?

É possível esperarmos dos consultórios de neuropediatria e neuropsicologia uma abordagem mais fenomenológica, considerando o comportamento da criança dentro do seu contexto afetivo, familiar e social?

Quem sabe esta abordagem será mais útil, tanto para compreender quanto para tratar os sintomas da desorganização emocional e os transtornos do desenvolvimento das crianças?

Abordagens que incluam olhares mais amplos, para outras formas de lidar com as dificuldades das crianças, assumindo para nós mesmos, enquanto sociedade (família, amigos e amigas, médicos e médicas, escola), a responsabilidade de transformar o entorno da criança em um lugar mais generoso, aberto e divertido, ao invés de somente tentarmos encaixá-la no comportamento que se espera dela.

Amanhã continuaremos a falar de transtornos do comportamento infantil e abordaremos os “rótulos” que têm sido dados às nossas crianças pela medicina e pela psicologia.

 

Dra. Luiza De Oliveira Rodrigues

Dr. Luiz Oswaldo C. Rodrigues

Agradecemos as leituras atentas e sugestões de Fabiana Amélia Reis Pantuzza, Felipe Pantuzza Santana , Maria Helena Rodrigues Vieira, Marcos Vinícius Soares Vieira e Rafael Cosenza.

 

 

 

 

 

Muitas crianças com NF1 apresentam dificuldades de aprendizado e de comportamento, o que tem merecido nossa atenção, e por isso disponibilizamos uma cartilha sobre este assunto (ver aqui).

Entre os problemas de comportamento, algumas crianças apresentam uma mistura de “mal humor (irritabilidade crônica), desatenção, hiperatividade, surtos de agressividade (verbal ou física) e comportamento desafiador e opositivo, com desobediência e teimosia frequentes”.

Uma destas famílias perguntou-nos se este conjunto de comportamentos seria o Transtorno Disruptivo de Desregulação do Humor (TDDH), um diagnóstico incluído nos manuais psiquiátricos internacionais desde 2013.

Se uma criança está apresentando esses sintomas de forma frequente e intensa, prejudicando o seu bem estar e a integração social, é importante uma avaliação clínica e psicológica para orientar a criança, sua família, a escola e demais pessoas envolvidas.

No entanto, antes de avançarmos na descrição deste novo diagnóstico, queremos levantar 3 perguntas importantes, que discutiremos hoje e nos próximos dias.

 

 

A primeira delas é: será que há um excesso de “diagnósticos” de problemas de comportamento em crianças?

Será que estamos diagnosticando em excesso o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), o Transtorno no Espectro do Autismo (TEA), o Transtorno Desafiador Opositor (TOD), entre outros? (ver aqui um texto sobre isso: está em inglês, mas o tradutor automático do seu navegador de internet pode ser usado).

Há crianças, adolescentes e adultos que, de fato, têm comportamentos que prejudicam sua vida em sociedade (na família, com amigos e amigas, na escola, no trabalho etc.), algumas delas com graves problemas psiquiátricos e neurológicos. Estas pessoas precisam ser compreendidas e tratadas adequadamente, inclusive aquelas com NF1.

Mas, pode estar havendo também um excesso desses diagnósticos, que “explicam” as coisas, que acham uma “causa” (ou um responsável) e oferecem a possibilidade de um “tratamento” (especialmente medicamentoso).

É sobre esses excessos que nós nos interrogamos.

Há profissionais da educação que consideram que o sistema educacional onde estão nossas crianças é organizado para preparar pessoas dóceis e obedientes, para serem os futuros trabalhadores, a serviço da manutenção do funcionamento da nossa sociedade como nós a conhecemos, ou seja, para dar continuidade ao modo de produção no sistema capitalista (ver aqui).

Nesse tipo de escola, prefere-se a obediência, a instrução tecnológica e a restrição dos corpos do que a liberdade e a criatividade cultural. Assim, neste sistema de educação, as crianças mais ativas, independentes, autônomas, que precisam aprender também com a inteligência do corpo (como os atletas), podem ser percebidas como desobedientes, desafiadoras e hiperativas (ver aqui).

Se a obediência for o objetivo da educação (e achamos que ela não deveria ser), a desobediência então se torna um problema. Pense bem: quando você diz a uma criança, por exemplo, para ela calçar seus sapatos (para vocês saírem de casa), e ela se recusa, o objetivo real não é que ela te obedeça, e sim que ela calce os sapatos. Mas nós brigamos com a criança porque ela não nos obedece e deixamos de tentar outras maneiras diferentes de se conseguir esse mesmo objetivo.

Será que um pouco do excesso de diagnósticos médicos e psicológicos vem daí? Pois “tratar” algum “transtorno” nestas crianças seria mais “fácil” do que mudarmos o sistema de ensino das nossas sociedades ou a maneira como criamos nossos filhos e filhas?

Amanhã continuaremos este assunto, lembrando o papel da família nos transtornos de comportamento das crianças.

 Dra. Luiza De Oliveira Rodrigues

Dr. Luiz Oswaldo C. Rodrigues

Agradecemos as leituras atentas e sugestões de Fabiana Amélia Reis Pantuzza, Felipe Pantuzza Santana , Maria Helena Rodrigues Vieira, Marcos Vinícius Soares Vieira e Rafael Cosenza.

 

 

Opinião pessoal

 

O colega oncologista Dr. Geraldo Felício enviou-nos gentilmente o mais novo artigo internacional sobre possíveis tratamentos para o chamado Tumor Maligno da Bainha do Nervo Periférico (TMBNP) – (ver aqui o artigo completo em inglês). 

Nas pessoas com neurofibromatose do tipo 1 (NF1), sabemos que 8 a 13% dos neurofibromas plexiformes (NP) difusos e nodulares se transformam num TMBNP e isto se torna um motivo de grande preocupação por causa da agressividade desse tumor. 

Esta revisão está de acordo com outras informações já fornecidas neste site (ver aqui ) e ela mais uma vez indica que o TMBNP é muito agressivo (se expande rapidamente, invadindo outros tecidos e dando metástases) e, mesmo tratado, é recidivante em cerca de metade dos casos. 

A volta do tumor geralmente provoca a morte da maioria dessas pessoas em 5 anos depois de diagnosticado o TMBNP, apesar da cirurgia, radioterapia e quimioterapia

Portanto, é mais do que urgente a procura de tratamentos mais eficazes para o TMBNP.

É o que diz também o artigo acima, escrito a partir de revisão da literatura por um grupo de médicas e médicos, quase todas e todos comprometidos financeiramente com diferentes laboratórios farmacêuticos (verifique na declaração de conflitos no próprio artigo), o que nos preocupa (ver aqui nossas restrições aos estudos financiados pelos fabricantes dos medicamentos que estão sendo testados). 

O artigo compara diversos medicamentos que estão sendo testados nas pessoas com NF1 e TMBNP, que foram submetidas à cirurgia e os tumores voltaram. Autoras e autores sugerem que o resultado mais favorável (9 pessoas estáveis em 21 tratadas) foi uma combinação de selumetinibe com sirolimus (com o propósito de inibir duas vias metabólicas celulares: mTOR e MEK), mas o estudo final ainda não foi publicado. 

Seria apenas uma coincidência que o medicamento selumetinibe seja justamente aquele fabricado pelo laboratório que tem relações comerciais com a principal autora e outros colaboradores?

 

Sim, caro Dr. Geraldo Felício, é mais do que urgente o estudo de tratamentos mais eficazes para o TMBNP que sejam realizados por entidades públicas sem financiamento da indústria de medicamentos. 

Obrigado pelo artigo.

Dr Lor

 

 

Uma leitora deste blog (A.M.S. de São Paulo) pergunta porque a AMANF e o CRNF decidiram não aceitar financiamento ou patrocínio de laboratórios fabricantes de medicamentos para nossas pesquisas, eventos ou divulgação.

Temos duas fortes razões para isso.

A primeira, é chamada de regra de ouro: cientistas devem ter o compromisso de buscar os fatos, mesmo que a verdade sobre determinado assunto seja contra a opinião ou o desejo de quem estuda aquela questão. Por exemplo, apesar de todo nosso desejo de encontrarmos um tratamento que diminua ou cure os neurofibromas, temos que analisar com cuidado ético e estatístico os resultados do uso de qualquer tratamento ou droga, para saber se realmente beneficiam as pessoas.

A segunda regra é a do ouro: quem financia um estudo pode modificar nosso comportamento para beneficiar seus interesses. Em outras palavras, é muito difícil para qualquer pessoa se convencer de uma ideia que pode diminuir seu lucro ou salário.

Por isso, quase sempre as indústrias de medicamentos e outras grandes empresas influenciam a maneira como são planejados e analisados os estudos científicos financiados por elas, de forma que seus resultados e conclusões beneficiem os lucros de quem está pagando os cientistas ou seus laboratórios e universidades.

Quem quiser conhecer mais sobre esta grave situação deve ler o livro “O triunfo da dúvida”, do epidemiologista David Michaels, que mostra como as BIG indústrias (tabaco, petróleo, alimentos, medicamentos, mineradoras, agronegócio, comunicação etc.) promovem o negacionismo corrompendo a ciência e a democracia e com isso garantem seus lucros sem se importar com o fato de que suas ações (no duplo sentido) nos levam para a catástrofe climática.

E observem que David Michaels ele não é nenhum anticapitalista, pois foi secretário da Agência de Segurança e Saúde Ocupacional nos governos de Barack Obama.

Por isso, cara leitora, a AMANF e o CRNF não aceitam relações comerciais com fabricantes de medicamentos, pois está bem demonstrado que a verdade sobre a eficiência de tratamentos médicos somente pode ser verificada em estudos financiados de forma independente da indústria, ou seja, com recursos públicos e transparentes.

 Dr. Lor

 

 

Nesta semana recebi duas informações sobre resultados promissores de terapia gênica em seres humanos para três doenças genéticas até agora incuráveis.

A primeira informação veio no New England Journal of Medicine, mostrando o processo de cura de pessoas com anemia falciforme e talassemia (ver aqui artigo em inglês: “Benvindo à era da terapia gênica em medicina” ).

A outra informação foi enviada pela amiga Dra. Luciana Imaculada de Paula, uma reportagem do jornal Estado de Minas, mostrando a cura de um tipo de surdez hereditária com a terapia gênica (ver aqui o artigo em português ).

Além disso, a amiga Ieda Bussman informou que a ANVISA liberou recentemente o primeiro tratamento gênico para uma forma de hemofilia (ver aqui) e a Dra. Vanessa Waisberg informa que em oftalmologia a terapia genica também parece promissora para algumas doenças genéticas em especial a neuropatia óptica de Leber (ver aqui).

A reação natural de muitas pessoas é perguntar: e quando esta terapia estará disponível para pessoas com NF1 e Schwannomatoses?

Sou apenas aprendiz desse tipo de terapia, então quando surgiu o assunto pela primeira vez em nosso meio, pedi a uma especialista, Dra. Cinthia Vila Nova Santana, que nos explicasse o processo todo e respondesse à pergunta acima. Publicamos suas opiniões, que foram revisadas em 2021 (ver aqui).

Por enquanto, as respostas da Dra. Cinthia ainda me parecem satisfatórias para este novo momento de entusiasmo.

Dr Lor