Alguns comentários sobre a CONFERÊNCIA EM NEUROFIBROMATOSES realizada em MONTEREY, CALIFORNIA, Estados Unidos, de 6-9 DE JUNHO DE 2015, realizados pelos Dr. Nilton Alves de Rezende, Dra. Juliana Ferreira de Souza, fonoaudióloga Pollyanna Barros Batista e o nutricionista Marcio Leandro Ribeiro de Souza.
A conferência anual sobre as neurofibromatoses (NF) acontece sempre no mês de junho desde a sua criação em 1987. É o principal evento científico sobre estas doenças.
Em 2015 estiveram presentes mais de 300 pesquisadores de todo o mundo para mostrar os mais recentes avanços na investigação sobre as NF e os cuidados com os pacientes portadores desta enfermidade.
A conferência incluiu seminários ministrados por renomados especialistas em NF, assim como palestrantes de alto nível que trabalham e realizam pesquisas em problemas afins às neurofibromatoses (como alguns tipos de câncer) e da neurociência, principalmente nos aspectos relacionados aos distúrbios cognitivos, da aprendizagem, e da possibilidade de pacientes com NF1 apresentarem algum comportamento semelhante ao autismo.
A participação destes especialistas tem como objetivo principal estimular o pensamento e construir reflexões e conexões entre as NF e outras doenças semelhantes a elas.
Patrocínio
A conferência anual de NF é patrocinada pela Childrens Tumor Foudation, uma organização sem fins lucrativos dedicados a melhorar a saúde e o bem-estar dos indivíduos e famílias afetadas pelas neurofibromatoses. A missão da fundação é:
• incentivar e apoiar a investigação e o desenvolvimento de tratamentos e a cura para os vários tipos de neurofibromatoses: 1, 2, schwannomatose e Legius;
• apoiar pessoas com NF, suas famílias e cuidadores, fornecendo informações completas e atuais sobre sua doença;
• auxiliar no desenvolvimento e criação de centros clínicos, sempre baseada nas melhores práticas e outros mecanismos de apoio ao paciente (mas não inclui assistência médica direta) para criar um melhor acesso aos cuidados de saúde de qualidade para os indivíduos afetados;
• expandir a consciência pública sobre as NF nos EUA e obter recursos financeiros para patrocinar as pesquisas tanto de fontes públicas como privadas.
(Observação do Dr Nilton Alves de Rezende: Creio que estes deveriam ser os objetivos da AMANF).
Prêmio Friedrich von Recklinghausen 2015
Todo ano é escolhido previamente um pesquisador que tenha contribuído de forma significativa para os conhecimentos sobre as NF. Este ano o prêmio foi dedicado ao pesquisador Eric Legius, Diretor do Departamento de Genética Humana da Universidade de Leuven, na Bélgica. Ele tem se dedicado às pesquisas sobre as NF1 nos últimos 25 anos. Sua principal contribuição foi à descrição de uma síndrome até então diagnosticada como NF1, mas que na verdade trata-se de outra doença originada em outro cromossoma, chamada de Síndrome de Legius.
Alguns destaques das conferências
1) Renovação do alerta sobre os sinais clínicos de malignização dos plexiformes por meio de um acróstico: HELP: H- hard (aumento da consistência) E- enlarging (aumento de volume) L- limb weakness (fraqueza nas pernas) P- Pain resistence or noturnal ( dor refratária ou noturna).
2) Nota-se uma tendência a aumentar as indicações de testes moleculares para diagnóstico de NF1 e diferenciá-la das varias doenças que a mimetizam.
3) Ao que parece, a abordagem dos plexiformes com o PET-CT tem sido questionada em decorrência da heterogeneidade dos resultados; observa-se uma tendência para a indicação cirúrgica precoce em TODOS os plexiformes, quando isto for possível.
4) O PET, quando realizado com a metionina marcada parece ter maior sensibilidade e especificidade.
5) O manejo na dor NEUROPÁTICA na Schwannomatose segue o padrão geral para o tratamento da dor. Enfatizaram a importância de sempre associar antidepressivo tricíclico ou carbamazepina com outros analgésicos ou bloqueios neuromusculares.
6) Foram discutidos aspectos predominantemente radiológicos dos sarcomas na Schwannomatose e massas abdominais, com ênfase para orientação de tratamentos cirúrgico.
7) Foi falado sobre a neuropatia na NF1, ficando a dúvida se ela é de origem central (cérebro) ou periférica (nervos).
8) Foram comentados os distúrbios do sono na NF1, e associaram este distúrbio de sono a esta neuropatia progressiva.
9) Comentaram sobre os problemas nas cordas vocais para melhorar a função vocal nas pessoas com NF2, o que vai ao encontro dos trabalhos realizados no CRNF da fonoaudióloga Carla Silva.
10) Recomendou-se a análise da função respiratória na NF1, o que já foi realizado aqui no Brasil no doutorado da Dra. Juliana Ferreira de Souza.
11) A Maria Acosta foi enfática em relacionar os déficits motores com o baixo desempenho escolar e propôs que a atividade física seja encorajada precocemente em todos os pacientes com NF1. No entanto, ainda não existem estudos suficientes prolongados de que esta atividade mude ou não o curso dos distúrbios cognitivos ou da aprendizagem. A maneira como aptidão física e cognição (mais especificamente controle cognitivo) se relacionam e o efeito do treinamento de ambas na NF1 é o objetivo geral do estudo.
12) Numa excelente palestra magna foram apresentados vários biomarcadores para diversas patologias e enfatizada a importância de se encontrar biomarcadores (radiológicos, bioquímicos ou teciduais) nas neurofibromatoses, que possam ser úteis no acompanhamento dos tratamentos instituídos. Interessante como este termo “BIOMARCADORES” foi muito repetido nesta Conferência. Como a abordagem dos neurofibromas atípicos é uma prioridade, acreditamos que a definição de biomarcadores para os neurofibromas com maior risco de malignização seja o alvo principal no momento.
13) Noutra conferência, o Dr. Bruce Korf propôs que sejam revistos os critérios atuais para o diagnóstico das NF (pedido e sugestão feitos também pelo Dr. Legius durante o discurso de recebimento do prêmio Von Recklinghausen), considerando a evolução do conhecimento da NF1.
14) Dr Korf também defendeu mais indicação de testes moleculares em crianças, uma vez que os sinais da doença são dependentes da idade, assim como para diagnóstico pré-natal, para fertilização in vitro e nos casos de mosaicismo para aconselhamento genético.
15) Foi apresentado pelo Dr. Garett Evans um estudo de 1192 casos de NF2 na Inglaterra, mostrando um pior prognóstico em algumas mutações específicas do gene, na idade abaixo de 20 anos e na presença de meningiomas, sem diferenças entre os sexos.
16) Foi proposta a utilização de PET-CT utilizando metionina no lugar da glicose marcada, por ser mais específico de malignização dos plexiformes, assim como a RNM volumétrica como biomarcador para verificar a eficácia terapêutica de medicamentos ou de radioterapia. A RNM volumétrica vem sendo utilizada como parâmetro de regressão (ou não) dos plexiformes nos estudos em andamento.
17) Foi apresentado o estudo randomizado multicêntrico de 24 semanas de utilização da Lovastatina (40 mg/dia), mostrando que esta droga não modifica os aspectos cognitivos e os déficits de aprendizagem na NF1. Este foi um momento de destaque do dia. A Dra. Kathryn North apresentou os resultados do estudo multicêntrico que estava em andamento há alguns anos. O que eles fizeram foi selecionar crianças com NF1, em uma faixa etária determinada, especificamente com déficit de atenção e memória (usaram um teste computadorizado). Os resultados não foram estatisticamente significativos para qualquer das avaliações utilizadas (atenção e memória). Os resultados foram apresentados melancolicamente como um estudo negativo e, quando perguntada, a Dra North disse não acreditar ser válido o investimento em estudos subsequentes com a Lovastatina.
18) Por outro lado, o grupo do Alcino Silva mostrou melhora da atenção, da memória e aprendizagem verbal com uso da Lovastatina. Para nós, continua o impasse e talvez o tempo de acompanhamento (24 semanas e 14 semanas) seja pequeno para avaliar respostas de longo prazo. Cabe aqui um comentário que ouvimos do Riccardi sobre os testes utilizados para avaliação cognitiva na NF1 e, ao mesmo tempo, sobre os resultados do estudo com a Lovastatina. Ele ressaltou que a transposição da observação no modelo animal (feita pelo Alcino Silva e equipe) para os seres humanos deve, provavelmente, exigir uma avaliação mais próxima das atividades habituais desempenhadas por estas crianças no seu cotidiano e menos baseada em testes de múltipla escolha respondidos dentro de um consultório.
19) Outra questão interessante, foi o destaque dado para a necessidade de se uniformizar a descrição anatomopatológica dos neurofibromas, utilizando-se a classificação da ASPECTOS RELEVANTES:
20) Foram mostrados alguns resultados da utilização de uma nova droga (inibidor do MEK, uma das enzimas envolvidas na reprodução das células) para os tumores plexiformes (não necessariamente atípicos, mas que desfiguram, alteram a função ou aumentam o risco de morte ou pioram a qualidade de vida pela localização e/ou volume) e que são inoperáveis. Observou-se redução média de 25-30% do volume, o que não foi considerado algo tão exuberante, mas que resultou em melhora da qualidade de vida destes pacientes. Um conceito importante foi de que não devemos buscar apenas a redução do tamanho dos tumores, mas também a qualidade de vida e outros resultados.
21) Mostrou-se a utilização da tomografia de coerência óptica (TCO) para verificar a perda de fibras neurais em pacientes com glioma óptico. Segundo os autores, as alterações no exame precedem a perda do campo visual e poderia ser útil na decisão terapêutica dos gliomas ópticos na NF1. Além disso, a TCO permitiria a avaliação daquelas crianças em idade inferior a 6-7 anos que não se prestam ao exame de campo visual tradicional. Achamos muito interessante pois é exatamente o que a oftalmologista Dra. Vanessa Waisberg está estudando conosco em pessoas com NF2 e NF1.
22) Foram apresentadas as áreas prioritárias para pesquisas nas neurofibromatoses para 2015-2020 segundo o Departamento de Defesa dos EUA. Pareceu-nos que os neurofibromas (cutâneos – pela estética, plexiformes – quando são inoperáveis, atípicos – diante da incerteza do risco de malignização) e os tumores malignos da bainha do nervo periférico – pela extrema agressividade e pequena resposta ao tratamento, são uma prioridade para todos os pesquisadores que participaram desta ótima discussão. Quer seja na área básica ou na pesquisa clínica, que gradativamente, se afunila e se restringe aos estudos com medicamentos, eles são o foco. Talvez por isso as prioridades para as pesquisas futuras seja esta lista abaixo.
a. Melhorar os serviços de assistência (uniformizar coleta de dados), para pesquisas clinicas em NF1 (nas 44 clínicas americanas especializadas em NF);
b. Estudo da heterogeneidade dos neurofibromas e de outros tumores relacionados às neurofibromatoses;
c. Manifestações clínicas da NF1 após a adolescência;
d. Mecanismo da dor na NF (Schwannomatose);
e. Marcadores de resposta terapêutica utilizando-se da genômica, epigenômica, outros marcadores biomoleculares entre outros;
f. Identificação de novas drogas alvo-específico para o tratamento da NF1;
g. Fatores ambientais e nutricionais que modificam a evolução da NF1.
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