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Dando continuidade à divulgação online dos capítulos escritos para a Edição Comemorativa dos 20 anos do CRNF, a ser lançada em novembro de 2024, apresentamos o excelente texto de um grupo de neurocientistas da Universidade Federal de Minas Gerais, que tem participado há muitos anos do desenvolvimento dos nossos conhecimentos sobre as pessoas com NF1.

Muito obrigado por mais esta colaboração, que já nasce como uma referência fundamental para a população brasileira.

Dr. Lor

 

Danielle de Souza Costa (Ph.D.)

Jonas Jardim de Paula (Ph.D.)

Débora Marques de Miranda (M.D., Ph.D)

Neuropsicologia da NF1

A Neurofibromatose Tipo 1 (NF1) é uma condição genética que afeta o sistema nervoso central e periférico frequentemente associada a déficits cognitivos (até 80% dos casos), sendo as dificuldades de aprendizagem uma das adversidades mais comuns no quadro (Hyman et al. 2005). Apesar de déficits cognitivos serem uma característica chave da NF1, o perfil de comprometimentos tem se mostrado bastante heterogêneo (Crow et al., 2022). Variáveis sociodemográficas (p.ex., idade, sexo, escolaridade e nível de educação dos pais) não impactam significativamente o perfil de déficits cognitivos na NF1 e os comprometimentos são difusos e salientes ao longo da vida (Crow et al., 2022).

Pessoas com NF1 enfrentam um risco aumentado de desenvolver comprometimentos cognitivos e disfunções motoras (Gutmann et al., 2012). A inteligência é encontrada na faixa média-inferior (ou seja, QI ≈ 85–90) e a taxa de Deficiência Intelectual (i.e., QI ≤70 e baixa funcionalidade) é maior que na população em geral (6%–7%) (Lehtonen et al., 2013). Outra característica marcante é o comprometimento de funções executivas (Beaussart et al., 2018), além de déficits de desempenho acadêmico, habilidade visuoespacial, atenção e funcionamento psicossocial (Lehtonen et al., 2013). É comum que as dificuldades cognitivas sejam evidentes já na infância, entre os 3 e 5 anos de idade (Williams et al., 2009). Apesar de o comprometimento cognitivo ser perceptível em vários domínios na NF1, não existe um perfil cognitivo claro associado à condição (Crow et al., 2022).

Em metanálise, Crow e colegas (2022) encontraram que as maiores diferenças em magnitude de efeito entre pessoas com NF1 e controles foram nos escores de inteligência (geral, de execução e verbal) e em habilidades visuoespaciais. Diferenças menores e moderadas, foram encontradas tanto para habilidades não verbais (memória de longo prazo não verbal, memória de curto prazo não verbal, velocidade de processamento, fluência não verbal, planejamento e função motora) quanto verbais (memória de trabalho verbal e linguagem receptiva). Diferenças progressivamente menores e pequenas foram observadas em linguagem expressiva, controle de interferência, atenção, mudança de conjunto (flexibilidade), fluência fonêmica, memória de trabalho não verbal, inibição de resposta, memória de longo prazo verbal, emoção, memória de curto prazo verbal, fluência semântica e tomada de decisão. Essa relativa falta de especificidade de comprometimento em dimensões cognitivas (p.ex., não verbais vs. verbais) tem sido atribuída à inteligência moderadamente mais baixa na NF1 (geralmente 1DP abaixo da média), aos déficits visuoespaciais e nas funções executivas, bem como às dificuldades de aprendizagem (Cutting et al., 2004).

Apesar das habilidades visuoespaciais serem as mais frequentemente e fortemente afetadas na NF1, além da inteligência, atenção especial tem sido dada aos déficits nas funções executivas talvez pelo seu impacto funcional mais amplo. As funções executivas (FEs; também chamadas de controle executivo ou controle cognitivo) referem-se a uma família de processos mentais top-down necessários quando você precisa se concentrar e prestar atenção, quando agir automaticamente ou confiar no instinto ou intuição seria imprudente, insuficiente ou impossível (Diamond, 2013). Há um consenso de que existem três funções executivas principais: inibição [controle inibitório, incluindo autocontrole (inibição comportamental) e controle de interferência (atenção seletiva e inibição cognitiva)], memória de trabalho e flexibilidade cognitiva (também chamada de mudança de conjunto, flexibilidade mental ou mudança de conjunto mental e intimamente ligada à criatividade). A partir dessas, são construídas as FEs de ordem superior, como raciocínio, resolução de problemas e planejamento. As FEs são habilidades essenciais para a saúde mental e física; sucesso na escola e na vida; e desenvolvimento cognitivo, social e psicológico (Diamond, 2013).

Em metanálise, Beaussart e colegas (2018) apontam que dificuldades executivas são uma característica central na NF1, pelo menos em crianças e adolescentes. As dificuldades são maiores e moderadas nos domínios memória de trabalho e planejamento/resolução de problemas e menores e pequenas para controle inibitório e a flexibilidade cognitiva. A disfunção executiva parece ser maior com o aumento da idade (diferente da metanálise de Crow et al, 2022), enquanto o tipo de ferramenta de avaliação, desempenho intelectual, transtorno de déficit de atenção/hiperatividade e a composição do grupo controle não parecem afetar os resultados das funções executivas.

As principais características neuropsicológicas da NF1 foram sintetizadas na Tabela 1. Os resultados são baseados principalmente na metanálise de Crow e colaboradores (2022) – a mais recente e abrangente até o momento – junto a informações específicas de outros estudos citados neste capítulo. Organizamos a tabela com base na classificação mais recente das funções cognitivas propostas pelo Manual Estatístico-Diagnóstico dos Transtornos Mentais (DSM-5-TR – APA, 2020) que adota a nomenclatura “domínios neurocognitivos”. Complementamos esta organização os tópicos inteligência geral e desempenho escolar.

Transtornos do Neurodesenvolvimento na NF1

Transtornos do neurodesenvolvimento ocorrem com frequência na NF1, como o Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade (TDAH) (30–50%), dificuldades de aprendizagem (30%–60%) e Transtorno do Espectro Autista (TEA) (25%–30%) (Ferner, 2007; Garg et al., 2012; Garg et al., 2013; Pride, Payne, & North, 2012).

Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade (TDAH)

O TDAH é um transtorno da autorregulação caracterizado por um padrão extremo e persistente de desatenção (p.ex., descuido, desatenção, desinteresse, não terminar tarefas, desorganização, procrastinação, perder coisas, esquecimento, distração) e/ou hiperatividade-impulsividade (agitação, não ficar sentado, inquietação, barulhento, estar “a mil”, falar demais, precipitação, dificuldade para esperar, interrompe/intromete) (APA, 2022). Levantamentos populacionais sugerem que o TDAH ocorre na maioria das culturas em cerca de 5% das crianças e 2,5% dos adultos (APA, 2022).

O TDAH é um fenótipo comportamental frequentemente encontrado na NF1. Estudos encontram que 23% a 50% das crianças com NF1 atendem aos critérios para o TDAH (Barton & North, 2004; Huijbregts et al., 2010; Hyman et al., 2006; Isenberg et al., 2013; Mautner, Kluwe, Thakker, & Leark, 2002; Templer et al., 2013). Pacientes com NF1 e TDAH parecem ter um desempenho acadêmico mais baixo e mais transtornos específicos de aprendizagem do que pacientes apenas com NF1 (Hachon, Iannuzzi, & Chaix, 2011; Payne et al., 2012). Crianças com NF1 e TDAH apresentam um perfil de déficit de atenção e funções executivas semelhante ao de crianças com TDAH primário, mas com um tempo de resposta mais lento, aumentando as dificuldades de aprendizagem (Routier et al., 2024).

O metilfenidato, uma medicação estimulante comum para o TDAH, tem demonstrado consistentemente eficácia positiva no tratamento de déficits cognitivos e sintomatologia relacionada ao TDAH na NF1 (Lidzba et al., 2014; Loin-François et al., 2014; Mautner et al., 2002), embora déficits atencionais e nas funções executivas existam na NF1 independentemente da comorbidade com o TDAH (Loin-François et al., 2020).

Transtorno do Espectro Autista (TEA)

Outra alteração de neurodesenvolvimento que vem sendo corroborada como mais prevalente e grave em comparação com a população não afetada pela NF1 é o Transtorno do Espectro Autista (TEA) (Chisholm et al., 2018). O TEA é caracterizado por déficits persistentes na comunicação social e na interação social em múltiplos contextos (reciprocidade social, comunicação não verbal e relacionamentos) e por padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades, incluindo fala ou outro comportamento repetitivo, insistência na mesmice, interesses restritos e alterações sensoriais (APA, 2022).

Em metanálise, Chisholm e colaboradores (2018) encontraram que as dificuldades no funcionamento social na NF1 variam de moderadas a altas, incluindo habilidades sociais reduzidas e comportamentos pró-sociais diminuídos, bem como dificuldades sociais aumentadas, como isolamento e menor aceitação pelos pares. Déficits na percepção de emoções em crianças e adultos com NF1, especialmente ao identificar emoções negativas como raiva e medo, já foram descritas, além de menor capacidade na atribuição de estados mentais. Os autores também descrevem que a sintomatologia do TEA na NF1 em comparação com amostras controle é significativamente maior (tamanho de efeito grande). Sobre a prevalência do TEA em si na NF1, apenas dois estudos foram identificados, apontando prevalência de 25% (Garg et al. 2013; Plasschaert et al. 2015). Nesses estudos, em comparação com pessoas com TEA idiopático, pessoas com NF1 apresentam menos comportamentos estereotipados e melhor contato visual (Garg et al. 2013; Morris et al. 2016; Plasschaert et al. 2015). Se a natureza dos sintomas de TEA na NF1 é diferente daquela na condição idiopática, é uma questão a ser esclarecida.

Dificuldades de aprendizagem e transtornos específicos de aprendizagem

Aproximadamente 70% dos pacientes com NF1 experimentam baixo desempenho acadêmico devido a dificuldades de aprendizagem ou problemas comportamentais (Hyman et al., 2005).

Os déficits de leitura são prevalentes na NF1 (50% a 67%) (Orraca-Castillo et al., 2014; Watt, Shores, & North, 2008) e as dificuldades em testes de linguagem associadas à leitura são maiores em crianças com NF1 do que em crianças com um transtorno específico de aprendizagem (Cutting, Koth, & Denckla, 2000). Medidas de inteligência, decodificação e precisão de leitura, além de medidas laboratoriais e comportamentais de atenção influenciam o desempenho de crianças com e sem NF1 em compreensão de leitura (Biotteau et al., 2021).

Num estudo envolvendo 32 estudantes com NF1(Orraca-Castillo et al., 2014), encontrou-se que a frequência da dislexia foi de 50%, enquanto a de discalculia de 18,8%. Os mecanismos relacionados à dislexia e à discalculia na NF1 foram déficits em estratégias lexicais e fonológicas e baixa recuperação de fatos numéricos. Além disso, a eficiência em estratégias lexicais/fonológicas e aritmética mental foram preditores significativos das diferenças individuais na conquista da leitura e da matemática, respectivamente. No estudo, não foram encontrados déficits em capacidades numéricas básicas na amostra.

Embora os déficits de leitura e processos subjacentes sejam mais frequentes, em metanálise, o déficit em aritmética e escrita (grande) foi maior do que em leitura (moderado) (Crow et al., 2022).

Conclusão

Em conjunto, esses achados sugerem uma interrupção dos processos de neurodesenvolvimento típicos na NF1, ressaltam a importância da neurofibromina no desenvolvimento normal do cérebro e demonstram que esforços devem ser feitos para avaliar e abordar a morbidade cognitiva em pacientes com NF1 em conjunto com as melhores práticas existentes.

 

Dificuldades cognitivas em pacientes com NF1, repercussões clínicas e transtornos do neurodesenvolvimento associados

 

Domínio cognitivo Habilidades específicas Magnitude do déficit* Características clínicas Transtornos de Neurodesenvolvimento Correlacionados
Inteligência QI Geral Alta Deficiência intelectual, problemas de aprendizagem, dificuldades laborais, dificuldades na resolução de problemas Deficiência intelectual, Atraso Global do Desenvolvimento
QI Verbal Alta
QI Executivo Alta
Perceptomotor Habilidades visuoespaciais Alta Dificuldades de orientação espacial, discriminação esquerda-direita, busca visual de informações, esquema corporal, coordenação motora reduzida. Dificuldades com conteúdo escolar visual (ex.: mapas, geometria, artes e gráficos). Transtorno do Desenvolvimento da Coordenação, Transtorno Não-Verbal de Aprendizagem
Fluência não-verbal Moderada
Controle motor Moderada
Atenção Complexa Velocidade de processamento Moderada Dificuldades em estabelecer, manter e controlar o foco atencional. Nível de alerta/responsividade reduzido. Redução da velocidade de processamento (mental) e lentificação psicomotora (comportamento. Transtorno do Déficit de Atenção-Hiperatividade, Síndrome do Desengajamento Cognitivo (Sluggish Cognitive-Tempo)
Controle de interferência Moderada
Atenção sustentada Moderada
Linguagem e Comunicação Linguagem receptiva Moderada Dificuldades articular e expressar corretamente a linguagem. Problemas de compreensão na linguagem oral ou escrito. Dificuldades na comunicação social e interação com os pares. Transtorno da Linguagem, Transtorno da Fala, Gagueira, Transtorno da Pragmática (comunicação social).
Linguagem expressiva Moderada
Fluência verbal semântica Sem déficit
Fluência verbal fonêmica Sem déficit
Linguagem e Aprendizagem Memória de longo prazo (verbal) Sem déficit Dificuldades em recordar eventos recentes (episódios), problemas na junção de múltiplas informações na memória (conteúdo, local e tempo), dificuldades em manter informações mentalmente. Transtorno do Déficit de Atenção/Hiperatividade, Transtorno Específico de Aprendizagem (Dislexia e Discalculia)
Memória de longo prazo (não-verbal) Moderada
Memória de curto prazo (verbal) Sem déficit
Memória de curto prazo (não-verbal) Moderada
Funções Executivas Memória de trabalho (verbal) Moderada Dificuldades na resolução de problemas práticos no dia a dia. Desorganização, falta de planejamento, rigidez cognitiva, distratibilidade e procrastinação. Dificuldades no aprendizado de conteúdos complexos. Transtorno do Déficit de Atenção/Hiperatividade, Transtorno do Espectro Autista, Deficiência Intelectual e Atraso Global do Desenvolvimento.
Memória de trabalho (visuoespacial) Leve
Planejamento Moderada
Flexibilidade cognitiva Leve
Controle inibitório Leve
Tomada de decisão Sem déficit
Cognição Social Processamento emocional Leve Dificuldades no reconhecimento e interpretação de informações sociais e emocionais, dificuldades nos relacionamentos sociais. Transtorno do Espectro Autista, Transtorno da Pragmática
Percepção social Leve
Cognição social Moderada
Habilidades Escolares Matemática Alta Dificuldades no aprendizado e das habilidades escolares básicas (leitura, escrita e matemática). Redução da fluência de leitura e escrita. Dificuldades de compreensão de texto. Problemas na resolução de cálculos aritméticos e algébricos Transtorno Específico de Aprendizagem (Dislexia, Discalculia e Disgrafia)
Leitura Moderada
Escrita Alta

            Magnitude estimada com base nos resultados da metanálise de Crow e colaboradores (2022) e demais estudos referenciados neste capítulo.

           

Referências

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Nos posts anteriores falamos sobre o possível excesso de diagnósticos de transtornos do comportamento, sobre o papel da família e da sociedade nestes transtornos e sobre a incerteza que existe nos manuais de diagnóstico de transtornos mentais.

Com estas perguntas em mente, vamos tentar compreender melhor o Transtorno Disruptivo de Desregulação do Humor (TDDH) (ver artigo aqui em inglês), a partir da leitura de uma revisão sobre esse transtorno.

Lembramos que esta é uma revisão do tipo”narrativa” e não “sistemática” (quem desejar saber a diferença, veja aqui  o que isso quer dizer).

É importante ressaltar que, o Manual Americano de Desordens Mentais (DSM) agrupou o (TDDH) junto com os transtornos do humor (dentro do grupo de Transtornos Depressivos) e não com os transtornos do Neurodesenvolvimento (como o TDAH ou TEA) ou os Transtornos de conduta, disruptivos e de controle de impulsos (como o TOD).

O diagnóstico do TDDH pode ser feito a partir dos critérios apresentados na tabela abaixo.

 

Tabela  – Sinais e sintomas para o diagnóstico de Transtorno Disruptivo de Desregulação do Humor (American Psychiatric Association. Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders, 5 edição, Washington, DC, 2013).

  • Surtos frequentes e graves de raiva (verbais ou comportamentais) desproporcionais à provocação.
  • Os surtos são inadequados para a idade da criança.
  • Ocorrem 3 ou mais vezes por semana.
  • O comportamento habitual entre os surtos é continuamente irritado ou raivoso a maior parte do dia, quase todos os dias e são percebidos por outras pessoas.
  • Este problema tem duração maior que 12 meses, sem intervalo..
  • Estes comportamentos estão presentes em dois ou mais destes ambientes: em casa, na escola e com crianças da mesma idade) e são graves, pelo menos em um destes ambientes.
  • O início dos problemas está presente desde antes dos dez anos de idade.
  • O diagnóstico não é feito antes dos 6 e nem depois dos 18 anos.
  • Sintomas de comportamento bipolar típico (mania ou depressão) não duram mais do que um dia.

Observação: para se fazer o diagnóstico de TDDH, a criança não pode apresentar outros diagnósticos já definidos, como depressão grave, distimia, transtorno no espectro do autismo, desordem de estresse pós-traumático, desordem de ansiedade de separação, transtorno bipolar, desordem explosiva intermitente ou transtorno desafiador opositor e os sintomas não são decorrentes de efeitos de uso de drogas ou problemas neurológicos.

 

Lembrar que os sintomas de TDDH podem estar presente em outros problemas, por exemplo: com o diagnóstico de transtorno depressivo maior (TDM), transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), transtorno de conduta (TC) e transtorno por uso de substância (TUS). Aliás, o manual informa que é raro o diagnóstico isolado dessa condição.

Quantas crianças têm TDDH?

Como o transtorno só foi descrito recentemente, as informações não são muito precisas. Por exemplo, há relatos de que poderia estar presente em 1 a cada 100 crianças na população em geral, mas poderia acontecer em até 1 em cada 4 crianças atendidas por problemas de comportamento.

O que causa o TDDH nas crianças?

Ainda não sabemos exatamente. Os estudos genéticos ainda não encontraram hereditariedade definida, embora a presença de outras doenças mentais na família poderiam contribuir para o aparecimento do TDDH.

Ainda não foram realizados muitos estudos específicos (incluindo ressonância magnética funcional) em crianças classificadas com o TDDH. Dados preliminares sugerem que há uma resposta excessiva aos estímulos emocionais numa parte do cérebro chamada “amígdala”. Por exemplo, uma expressão facial neutra pode ser interpretada como sendo agressiva pela criança com transtorno de humor importante (ver estudo sobre isso aqui).

 

Amanhã, concluiremos nossa apresentação apresentando sugestões para o tratamento das crianças com o possível TDDH.

 

Dra. Luiza De Oliveira Rodrigues

Dr. Luiz Oswaldo C. Rodrigues

Agradecemos as leituras atentas e sugestões de Fabiana Amélia Reis Pantuzza, Felipe Pantuzza Santana , Maria Helena Rodrigues Vieira, Marcos Vinícius Soares Vieira e Rafael Cosenza.

 

 

Ontem iniciamos nosso debate sobre transtornos de comportamentos nas crianças e discutimos se estamos vivendo um excesso de diagnósticos de problemas de comportamento.

Hoje, continuamos este assunto perguntando: é possível avaliar a saúde mental das crianças sem envolver sua família e sem levar em conta sua história de vida e a sociedade na qual elas vivem?

Como se diz, é preciso uma vila inteira para criar uma criança.

Sabemos que as doenças mentais são resultado de situações genéticas, sociais, econômicas e históricas. Assim, talvez essas “novas doenças” das crianças sejam um dos resultados das formas de viver que temos adotado, com mais competição, individualismo e todas as pessoas sequestradas pelas telas e redes sociais.

Talvez as crianças estejam percebendo e reagindo subconscientemente à insegurança de um mundo a caminho da crise climática (elas vêem as enchentes trágicas!), com aumento das desigualdades sociais, com menor oportunidade de emprego e ameaçado por guerras nucleares. Será que o caminho para entendermos os problemas de comportamento das crianças pode ser outro, que as ajude a compreender melhor a realidade difícil que estamos vivendo?

É possível esperarmos dos consultórios de neuropediatria e neuropsicologia uma abordagem mais fenomenológica, considerando o comportamento da criança dentro do seu contexto afetivo, familiar e social?

Quem sabe esta abordagem será mais útil, tanto para compreender quanto para tratar os sintomas da desorganização emocional e os transtornos do desenvolvimento das crianças?

Abordagens que incluam olhares mais amplos, para outras formas de lidar com as dificuldades das crianças, assumindo para nós mesmos, enquanto sociedade (família, amigos e amigas, médicos e médicas, escola), a responsabilidade de transformar o entorno da criança em um lugar mais generoso, aberto e divertido, ao invés de somente tentarmos encaixá-la no comportamento que se espera dela.

Amanhã continuaremos a falar de transtornos do comportamento infantil e abordaremos os “rótulos” que têm sido dados às nossas crianças pela medicina e pela psicologia.

 

Dra. Luiza De Oliveira Rodrigues

Dr. Luiz Oswaldo C. Rodrigues

Agradecemos as leituras atentas e sugestões de Fabiana Amélia Reis Pantuzza, Felipe Pantuzza Santana , Maria Helena Rodrigues Vieira, Marcos Vinícius Soares Vieira e Rafael Cosenza.

 

 

 

 

 

Muitas crianças com NF1 apresentam dificuldades de aprendizado e de comportamento, o que tem merecido nossa atenção, e por isso disponibilizamos uma cartilha sobre este assunto (ver aqui).

Entre os problemas de comportamento, algumas crianças apresentam uma mistura de “mal humor (irritabilidade crônica), desatenção, hiperatividade, surtos de agressividade (verbal ou física) e comportamento desafiador e opositivo, com desobediência e teimosia frequentes”.

Uma destas famílias perguntou-nos se este conjunto de comportamentos seria o Transtorno Disruptivo de Desregulação do Humor (TDDH), um diagnóstico incluído nos manuais psiquiátricos internacionais desde 2013.

Se uma criança está apresentando esses sintomas de forma frequente e intensa, prejudicando o seu bem estar e a integração social, é importante uma avaliação clínica e psicológica para orientar a criança, sua família, a escola e demais pessoas envolvidas.

No entanto, antes de avançarmos na descrição deste novo diagnóstico, queremos levantar 3 perguntas importantes, que discutiremos hoje e nos próximos dias.

 

 

A primeira delas é: será que há um excesso de “diagnósticos” de problemas de comportamento em crianças?

Será que estamos diagnosticando em excesso o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), o Transtorno no Espectro do Autismo (TEA), o Transtorno Desafiador Opositor (TOD), entre outros? (ver aqui um texto sobre isso: está em inglês, mas o tradutor automático do seu navegador de internet pode ser usado).

Há crianças, adolescentes e adultos que, de fato, têm comportamentos que prejudicam sua vida em sociedade (na família, com amigos e amigas, na escola, no trabalho etc.), algumas delas com graves problemas psiquiátricos e neurológicos. Estas pessoas precisam ser compreendidas e tratadas adequadamente, inclusive aquelas com NF1.

Mas, pode estar havendo também um excesso desses diagnósticos, que “explicam” as coisas, que acham uma “causa” (ou um responsável) e oferecem a possibilidade de um “tratamento” (especialmente medicamentoso).

É sobre esses excessos que nós nos interrogamos.

Há profissionais da educação que consideram que o sistema educacional onde estão nossas crianças é organizado para preparar pessoas dóceis e obedientes, para serem os futuros trabalhadores, a serviço da manutenção do funcionamento da nossa sociedade como nós a conhecemos, ou seja, para dar continuidade ao modo de produção no sistema capitalista (ver aqui).

Nesse tipo de escola, prefere-se a obediência, a instrução tecnológica e a restrição dos corpos do que a liberdade e a criatividade cultural. Assim, neste sistema de educação, as crianças mais ativas, independentes, autônomas, que precisam aprender também com a inteligência do corpo (como os atletas), podem ser percebidas como desobedientes, desafiadoras e hiperativas (ver aqui).

Se a obediência for o objetivo da educação (e achamos que ela não deveria ser), a desobediência então se torna um problema. Pense bem: quando você diz a uma criança, por exemplo, para ela calçar seus sapatos (para vocês saírem de casa), e ela se recusa, o objetivo real não é que ela te obedeça, e sim que ela calce os sapatos. Mas nós brigamos com a criança porque ela não nos obedece e deixamos de tentar outras maneiras diferentes de se conseguir esse mesmo objetivo.

Será que um pouco do excesso de diagnósticos médicos e psicológicos vem daí? Pois “tratar” algum “transtorno” nestas crianças seria mais “fácil” do que mudarmos o sistema de ensino das nossas sociedades ou a maneira como criamos nossos filhos e filhas?

Amanhã continuaremos este assunto, lembrando o papel da família nos transtornos de comportamento das crianças.

 Dra. Luiza De Oliveira Rodrigues

Dr. Luiz Oswaldo C. Rodrigues

Agradecemos as leituras atentas e sugestões de Fabiana Amélia Reis Pantuzza, Felipe Pantuzza Santana , Maria Helena Rodrigues Vieira, Marcos Vinícius Soares Vieira e Rafael Cosenza.

 

 

Minha filha AC, de 9 anos, já atendida no CRNF, tem neurofibromatose do tipo 1 (NF1) e transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH). Por causa da irritabilidade acentuada e agressividade um neurologista sugeriu risperidona. Ela não apresenta dificuldade em aprender, já sabe ler desde os 6 anos, mas não quer estudar, porque acha tedioso e só quer brincar. Quando tem foco em algo que gosta é impressionante a rapidez com que aprende. Pode me orientar? M.I, de João Pessoa.

Cara M.I., obrigado pelo seu relato, que abriu uma oportunidade para falarmos sobre algo muito importante: a autonomia das crianças.

Antes, quero lembrar que muitas crianças com NF1 apresentam TDAH e alguma agressividade. A AMANF acaba de publicar uma cartilha com orientações para mães, pais, educadoras e educadores de crianças com NF1 e problemas de comportamento. Clique aqui para obter a cartilha.

Antes de qualquer medicação, acho que todas as pessoas cuidadoras de sua filha devem tentar seguir a nossa cartilha por algumas semanas ou meses.

Se, ao final, a cartilha não for suficiente para melhorar a qualidade de vida de vocês, então os medicamentos podem ser pensados.

Quando há hiperatividade, o medicamento metilfenidato pode ser uma opção ( prescrita pela neurologia) a ser experimentada com a finalidade de diminuir a impulsividade – ações realizadas de forma impensada e às vezes contra a vontade consciente da pessoa. A impulsividade gera ansiedade que contribui para a irritabilidade e, como consequência, para aumentar a agressividade.

Quando não há hiperatividade, mas apenas desatenção, ainda não estou convencido de que o metilfenidato seja eficiente nas crianças com NF1.

Se houver hiperatividade e mesmo com o uso do metilfenidato ainda persistir a agressividade, pode ser experimentada a risperidona sob a orientação da psiquiatria psiquiatra infantil ou neurologia infantil.

 

Mas vamos pensar numa coisa importante, que você falou: sua filha aprende rapidamente quando quer.

 Acho que ela tem razão.

 Acho que todos nós aprendemos de fato somente aquilo que nos interessa.

E talvez qualquer pessoa fique irritada e agressiva se for obrigada a fazer coisas que não deseja, não é?

Há cerca de 50 anos, fiquei impressionado por um experimento educacional famoso na Inglaterra, chamado Summerhill, que deu origem às escolas democráticas, no qual as crianças podiam escolher quando brincar ou estudar. Mesmo as crianças com problemas comportamentais (a maioria naquele colégio especial) acabavam aprendendo aquilo que precisavam para seguirem suas vidas com autonomia quando adultas.

Clique aqui para conhecer mais sobre as escolas democráticas inspiradas em Summerhill.

Talvez a escola convencional atual seja mesmo muito entediante para crianças com hiperatividade.

Talvez possamos ajudar as crianças a se encontrarem e a realizarem seus desejos e sua formação humana por meio de brincadeiras criativas.

Brincar é o jeito mais alegre e eficiente de aprender sobre tudo: sobre o mundo, sobre as pessoas e sobre os afetos. Sobre como viver.

 

Eu, no lugar da sua filha, gostaria de estar numa escola onde brincar fosse levado muito a sério.

Vamos ouvir o que sua filha quer fazer?

Dr. Lor

 

 

 

 

Opinião do Dr. Lor

Muitas vezes nós, mães, pais, professoras e adultos perdemos a paciência com o comportamento da criança com Neurofibromatose do tipo 1 que não obedece.

Geralmente ela não cumpre as regras, reage mal quando negamos alguma coisa, fica desatenta e mexe em tudo, podendo até ser agressiva quando contrariada.

Brigar, dar castigos e mesmo bater na criança NUNCA FUNCIONA!

 

Esse comportamento se torna um grande sofrimento para todos, ESPECIALMENTE PARA A CRIANÇA, que não entende o que está acontecendo e pensa que nossas punições acontecem porque não gostamos dela.

 O que ela entende é que nós NÃO A AMAMOS.

 

Por isso, se queremos melhorar esse problema, o primeiro passo tem que ser nosso, dos adultos: temos que entender que a CRIANÇA NÃO ESCOLHE SER ASSIM.

ELA NÃO DESOBEDECE PORQUE É UMA PESSOA MÁ.

Seu comportamento indica que ela está doente e precisa de nossa ajuda.

 

Alterações de comportamento nas crianças com NF1 acontecem por problemas no desenvolvimento neurológico desde sua vida dentro do útero.

Seu cérebro demora mais para amadurecer e para aprender.

Por isso ela tem dificuldade para:

Controlar seus impulsos

Entender as regras sociais

Respeitar os limites

Manter a atenção numa tarefa

 

Ela escuta bem, mas não entende o que falamos com ela.

Se ela não entende nossas palavras, então não entende as regras.

 

Por isso, vou dar algumas dicas que têm funcionado comigo:

 

  • Tento falar com a criança usando voz baixa e de forma clara – porque ela tem transtorno do processamento auditivo – É PRECISO FALAR NA ORDEM DIRETA – ELA NÃO ENTENDE DICAS, nem IRONIAS, nem PIADAS nem INDIRETAS.

 

  • Tento não dar ordens – porque ela TEM transtorno desafiador opositor, então qualquer voz de COMANDO desperta no seu cérebro uma reação que não consegue controlar e que dispara o seu NÃO!

 

  • Tento transformar minha ordem em pedido ou escolha – por exemplo, ao invés de falar VISTA SUA ROUPA LOGO! – posso dizer: QUE TAL COLOCAR SUA ROUPA PARA CHEGARMOS MAIS CEDO HOJE? – ou então: VOCÊ PREFERE VESTIR AS MEIAS OU A CALÇA PRIMEIRO? – enfim, evitar o tom de voz do tipo OBEDEÇA!

 

  • Tento falar olhando nos olhos da criança e me agacho para ficar na altura dela – porque ela tem déficit de atenção e hiperatividade, QUALQUER COISA DESVIA SUA ATENÇÃO e meu tamanho de adulto pode ser ameaçador.

 

  • Tento usar palavras simples – porque ela tem atraso no aprendizado, seu vocabulário é pequeno e ela confunde palavras com sons parecidos, mas com sentidos diferentes (vaca com faca, por exemplo).

 

  • Tento combinar e construir as regras com a criança e peço para ela repetir o que entendeu do combinado – para que se sinta respeitada e porque ela tem dificuldade de memória de curto e médio prazo.

 

  • Tento sempre elogiar suas conquistas, mas pergunto se ELA entendeu o resultado de uma ação errada que ela cometeu – aí tentamos extrair uma lição do que aconteceu.

 

O resultado disso tudo costuma ser a alegria de estar ao lado delas.

 

SEMPRE AO LADO DELAS!

 

 

 

 

 

 

Conversando com algumas mães com filhos com NF1 e TDAH e falando sobre a Ritalina, me perguntaram por eu não dou para o meu filho e respondi que não daria porque soube que a Ritalina pode causar dependência de drogas no futuro. Então elas disseram que isso não era verdade. O senhor poderia esclarecer sobre isso? ” MHRV, de Belo Horizonte, MG.

Cara M, obrigado pela sua pergunta, que pode ser útil a outras famílias.

A possibilidade do uso crônico da Ritalina causar dependência de drogas no futuro tem sido uma pergunta realizada em vários estudos científicos. Ritalina é nome comercial do medicamento metilfenidato.

Vejamos, por exemplo, um estudo realizado por cientistas da Universidade Federal do Rio de Janeiro Giuseppe Pastura e Paulo Mattos (VER AQUI). Eles revisaram os principais efeitos colaterais do metilfenidato, em curto e longo prazos, no tratamento de crianças com Transtorno do Déficit de Atenção (TDAH) e usaram como fontes de dados os artigos científicos publicados nos últimos doze anos.

Eles encontraram efeitos colaterais que surgem em curto prazo, entre os quais prevalecem a redução de apetite, insônia, cefaleia e dor abdominal. Estes efeitos são de média intensidade, desaparecem espontaneamente e dependem da dose utilizada. Entre os efeitos colaterais em longo prazo, são descritas alterações discretas de pressão arterial e frequência cardíaca e uma possível discreta diminuição da estatura.

O abuso e a dependência ao medicamento foram observados muito raramente. Os cientistas concluíram que o perfil de efeitos colaterais do metilfenidato é seguro, não parecendo justificar a restrição ao seu uso no Brasil, ante os benefícios demonstrados na literatura.

Por outro lado, alguns estudos em animais de laboratório mostram alterações neurológicas e comportamentais em longo prazo com o uso de Ritalina (VER AQUI  ).

Portanto, minha impressão é que ainda não temos absoluta certeza do que pode acontecer no futuro com crianças que usam Ritalina cronicamente, especialmente crianças com NF1.

Poucos estudos científicos experimentaram a Ritalina em crianças com NF1. Ver o principal deles em texto anterior publicado neste blog: VER AQUI

Por isso, o principal cuidado é SABER SE A CRIANÇA TEM MESMO TDHA E SE ESTÁ INDICADO O MEDICAMENTO.

Sabemos que o diagnóstico de hiperatividade e desatenção não é simples e deve ser feito por especialistas e não pelos pais e professores.

Quanto mais insegurança tivermos sobre o diagnóstico, mais cuidado temos que ter em prescrever o medicamento.

No momento, minha conclusão para as crianças sem NF1 é que o metilfenidato é eficiente nas crianças com TDHA bem diagnosticado e não parece haver um risco confirmado de que quem usar metilfenidato se tornará dependente de drogas na vida adulta.

No entanto, no momento, minha conduta é de mais PRUDÊNCIA ainda nas crianças com NF1. Raramente uso metilfenidato nas crianças com NF1, porque acho que a maioria delas não têm TDHA. Minha impressão clínica é que elas têm outro tipo de transtorno que é caracterizado por mais desatenção do que hiperatividade, por mais desmotivação do que desatenção, por mais desordem do humor e do processamento auditivo e estas alterações combinadas retiram o foco de sua atenção e atrapalham estas crianças no aprendizado e no convívio social.

Precisamos estudar melhor esta questão.

 

 

 

 

“Meu nome é J, sou portadora de neurofibromatose do tipo 1 (NF1) e também de transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) do subtipo desatento, como descreve o seu artigo. Gostaria de dar o meu depoimento com o uso da Ritalina. Sou psicóloga, e sempre tive problemas na escola, porém, era taxada de preguiçosa, e o problema foi varrido para debaixo do tapete. Depois de adulta, formada e clinicando, notei que os sintomas de meus pacientes portadores de TDAH eram exatamente os mesmos que os meus. Fiz uma bateria de testes, fui ao neurologista, que comprovou o diagnóstico e receitou a ritalina. A medicação “me abriu os olhos”, foi como dar óculos a um portador de miopia! Hoje tomo quando necessário, e meu desempenho profissional é 1000 vezes melhor! ” JBB, de local não identificado.

Cara J, obrigado pelo seu depoimento, o qual me permite abordar este tema com novas informações que podem ser úteis às pessoas com NF1.

Primeiro, quero lembrar que metade das pessoas com NF1 apresenta transtornos de déficit de atenção, hiperatividade e impulsividade, que são mais visíveis nas crianças, mas também acometem os adultos. Além disso, as meninas parecem sofrer mais o tipo “desatenção” e os meninos mais o tipo “hiperatividade e impulsividade”.

Apesar do grande número de pessoas com NF1 apresentarem TDAH, precisamos tomar cuidado para não utilizarmos de forma errada os medicamentos psiquiátricos, especialmente em crianças, como nos mostra o pediatra Daniel Becker (para ver uma de suas excelentes palestras clicar AQUI ).

Por isso, o primeiro passo deve ser a segurança do diagnóstico de TDAH, que deve ser feito por profissionais experientes. Para nos orientar sobre como fazer o diagnóstico de TDAH, pedi a colaboração da psicóloga e neurocientista Danielle de Costa Souza, que estudou aspectos neuropsicológicos em pessoas com NF1 em nosso Centro de Referência em Neurofibromatoses do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (ver aqui os seus artigos publicados AQUI e AQUI ).

Danielle enviou-me alguns artigos científicos sobre o assunto (ver um deles AQUI) e respondeu-me que em seus estudos com NF1 os voluntários responderam a questionários especializados (chamado SNAP-IV) para quantificar a presença e intensidade de sintomas do TDAH.

No entanto, se você suspeita que você, ou seu filho ou filha com NF1 também tem TDAH, vale a pena fazer uma visita à página da internet da Associação Brasileira de Déficit de Atenção (clicar aqui: ABDA ). 

Esta associação é a melhor referência que pude encontrar para orientação sobre TDAH e certamente ela poderá ajudar você a saber se deve procurar um especialista e onde encontrar apoio.


E depois do diagnóstico de NF1 + TDAH?

As crianças com NF1 + TDAH têm resultados escolares e cognitivos piores do que aquelas com NF1 sem TDAH e apresentam mais chance de problemas comportamentais. Assim, seria importante obtermos um medicamento que pudesse melhorar os sintomas de TDAH na NF1.

Alguns resultados de pesquisas na Alemanha (ver AQUI ) e na França (ver AQUI) têm mostrado que o metilfenidato (cujo nome comercial é Ritalina®) usado cuidadosamente melhorou os testes cognitivos, assim como o nível de atenção e os problemas de comportamento das crianças com TDAH e NF1.

Em conclusão, creio que a ritalina, isoladamente ou associada a antidepressivos, deve ser experimentada de forma criteriosa e em doses baixas em crianças com NF1 que apresentem dificuldades de atenção, hiperatividade e problemas comportamentais.

No entanto, os medicamentos sozinhos podem não ser capazes de diminuir os efeitos prejudiciais da TDAH sobre as crianças com NF1, pois o problema é complexo e envolve a história de vida da pessoa, sua família e o ambiente em torno dela.

Outra fonte de informação

Para adultos e parentes de crianças com TDAH e NF1 também sugiro um livro interessante que pode ajudar as pessoas a enfrentarem o grande desafio da TDAH que se chama “Mentes Inquietas”, de Ana Beatriz Barbosa Silva, publicado em 2014.


A autora, que é médica psiquiatra e não tem NF1, mas tem TDAH, apresenta outras orientações úteis no resgate do autocontrole, da autoestima e de uma vida mais feliz para as pessoas acometidas pelo TDAH. 

Apesar do livro não tratar diretamente de pessoas com NF1, a sua leitura é fácil, não usa termos complicados e também nos ajuda a compreender a TDAH.


PS: Minha filha Dra. Luíza de Oliveira Rodrigues enviou-me um link muito interessante (CLIQUE AQUI) com diversos estudos (em inglês) sobre o excesso de diagnóstico de TDAH e tratamento medicamentoso em crianças no mundo inteiro (sem NF1).
Continuação da resposta à GC, de Fortaleza, sobre problemas de aprendizado e comportamentais de seu filho com NF1. Primeiro, é preciso separar estas duas complicações: uma pessoa com NF1 pode ter dificuldades de aprendizado sem problemas comportamentais, ou pode ter problemas comportamentais sem dificuldades de aprendizado, pode ter as duas complicações ou não ter nenhuma delas.
Para começar, vamos falar sobre os problemas de aprendizado.
A maioria das pessoas com NF1 leva uma vida normal, mas os chamados problemas cognitivos, entre eles as dificuldades de aprendizado, são a queixa mais comum na NF1. Cerca de 80% das crianças com NF1 apresentam problemas cognitivos em mais de um domínio, como 1) redução das habilidades de visão e orientação espacial, 2) menor velocidade de compreensão de ideias, conceitos e problemas, 3) pouca coordenação motora para esportes e dança, 4) linguagem reduzida e 5) diminuição da função executiva (que é a capacidade de imaginar, planejar e coordenar diversas tarefas para executar funções). Estes problemas aparecem na infância e provavelmente continuam por toda a vida.

É importante lembrar que a fonoaudióloga Pollyanna Barros Batista realizou uma pesquisa em nosso Centro de Referência e descobriu que todas as pessoas com NF1 que ela examinou têm diferentes graus de um problema chamado desordem do processamento auditivo. Isto quer dizer que a pessoa escuta normalmente, mas compreende mal o que escutou. Por exemplo, a professora diz: “a vaca foi para o brejo”, a criança com NF1 pode entender “a faca foi com o queijo”, o que pode se constituir numa grande dificuldade de acompanhamento do que é ensinado de forma verbal.
Apesar de todas estas dificuldades cognitivas, as pessoas com NF1 em geral apresentam inteligência no limite mínimo da faixa normal, embora uma pequena percentagem (6-7%) seja incapaz de uma vida autônoma por causa de sua deficiência intelectual.
Os problemas de comportamento.
Embora os problemas de comportamento sejam independentes das dificuldades cognitivas, estas duas complicações da NF1 estão relacionadas entre si: quanto maior a dificuldade cognitiva, maior o problema comportamental e vice-versa.
Os problemas de comportamento na NF1 podem ser: 1) dificuldades de sono (para começar a dormir, acordar frequente, dormir pouco e sonolência fora de hora), 2) diminuição da capacidade de socialização (vida retraída com poucos amigos, amizade apenas com crianças menores), 3) pouca capacidade de perceber as circunstâncias sociais (dificuldade para entender quando alguém está sendo irônico, as dicas das pessoas, entender piadas e metáforas), 4) baixa autoestima em decorrência do isolamento social e discriminação pelos colegas. Este conjunto de dificuldades pode contribuir e ser agravado para que algumas crianças com NF1 apresentem comportamentos semelhantes aos autistas.
Cerca de metade das crianças com NF1 apresentam em algum grau um tipo de de comportamento semelhante ao descrito como “Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade” (conhecido como TDAH).
Considero que os problemas cognitivos e comportamentais são a maior causa de redução da qualidade de vida das pessoas com NF1.
Amanhã continuarei trazendo informações sobre os tratamentos disponíveis para as dificuldades de aprendizado e comportamentais na NF1.