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Quais são os aspectos que devem ser observados no atendimento psicoterápico ou psicanalítico a pacientes e familiares com NF (pensando aqui na relação familiar, na superproteção ou no diagnóstico de dificuldades de aprendizagem, por exemplo)? AB, de Belo Horizonte, MG.
Cara A, obrigado por tocar neste assunto, o qual frequentemente vem à tona nos meus contatos com as pessoas com NF1 e seus familiares.
Primeiramente, preciso lembrar que não tenho conhecimentos técnicos de psicologia e nem de psicanálise, das quais fui apenas beneficiário ao me submeter à psicanálise para enfrentar minha ansiedade e angústia existencial durante alguns anos.
Por outro lado, tenho acompanhado os trabalhos cuidadosos das psicólogas Ingrid Faria Gianordoli-Nascimento, Alessandra Cerello, Danielle de Souza Costa e Aline Hellen Moreira, assim como dos (das) estudantes de psicologia que participaram de projetos de atendimento a pessoas com NF1 no nosso Centro de Referência.
Além disso, como pai da Maria Helena, tenho vivido a experiência familiar de mais de 35 anos envolvido nas dimensões psicológicas da minha família com a NF1.
Assim, é dentro destas condições pessoais que tentarei responder à sua pergunta sobre tratamento psicológico e psicanalítico para pessoas com NF1.
Começo comentando o desenho acima, que me foi enviado como ilustração de um bilhete carinhoso escrito nesta semana por duas irmãs gêmeas univitelinas com NF1, as quais eu acompanho clinicamente há vários anos no Centro de Referência. Sabendo que elas estão com cerca de 18 anos, o desenho parece revelar um olhar bem mais jovem sobre o mundo, uma simplificação que precede a adolescência, numa distribuição esquemática e sem conflitos da ordem das coisas, o que traduz bem o estado de humor que percebo nas duas irmãs.
Tenho a impressão de que esta maneira de ver o mundo é comum entre muitas pessoas com NF1, antes ou mesmo depois da adolescência, associada ao menor desenvolvimento da expressão verbal, à timidez, ao retraimento e algumas vezes aos problemas de comportamento que já comentamos aqui.
Também percebo nas pessoas com NF1 mais sentimento de insegurança e medo do ambiente, do outro, da vida e do futuro, do que ansiedade ou angústia. Encontro nelas mais os conflitos com seus familiares geralmente decorrentes de incompreensão e impaciência, levando à irritação e raiva, do que sentimentos complexos envolvendo sexualidade, relações amorosas, solidão ou culpa.
Considero que há dificuldade de expressão verbal nas pessoas com NF1, a qual parece-me decorrente da imaturidade do sistema nervoso central, que leva à desordem do processamento auditivo, por exemplo, que praticamente todas elas apresentam (ver neste blog sobre isto).
Estas limitações da articulação da fala, da palavra e da linguagem nas pessoas com NF1 podem trazer dificuldades para as abordagens por meio da psicoterapia e da psicanálise, as quais requerem muito o uso da palavra, se não estou enganado.
Por outro lado, creio que nós, os pais das pessoas com NF1, precisamos muito mais de apoio e suporte psicoterápico do que nossos filhos e filhas, para lidarmos com os sentimentos frequentemente ocultos de raiva e decepção diante da doença, os quais podem corroer nosso amor pela culpa e aflorar na forma de superproteção.
Precisamos de ajuda para amadurecermos juntos com nossas crianças, transformando nossas angústias improdutivas em responsabilidade construtiva para com nossos filhos e filhas com NF1.

Bom final de semana.
Como posso saber mais sobre a NF2, já que seus posts só falam sobre NF1. Tenho muitas dúvidas sobre o futuro. AH de Canoas, RGS.





Cara AH, de fato você tem razão em perceber que a maioria das respostas do meu blog são sobre NF1, porque a NF1 é 8 vezes mais comum que a NF2, o que faz com que, naturalmente, tenhamos mais perguntas sobre NF1.

Sabendo que a prevalência de NF2 na população é de 1 pessoa com NF2 para cada 25 mil pessoas sem a doença, deveríamos ter no nosso Centro de Referência entre as cerca de 800 famílias atendidas pelo menos 100 pessoas com NF2. No entanto, temos apenas 16, ou seja, somos menos procurados pelas pessoas com NF2 ou menos indicados pelos colegas médicos.

Tenho a impressão de que isto acontece porque a maioria dos diagnósticos iniciais da NF2 são feitos diretamente por neurologistas (ou otorrinolaringologistas que encaminham as pessoas aos neurocirurgiões), os quais costumam adotar condutas mais cirúrgicas do que clínicas, o que torna o acompanhamento da NF2 mais restrito aos neurologistas.

No entanto, lamentamos que isto esteja acontecendo, porque que a complexidade da evolução da NF2 precisa muito mais de acompanhamento clínico do que cirúrgico (clique aqui para ver guia de manejo clínico de 2015 publicado na revista Arquivos de Neuropsiquiatria).

Você tem razão também em ficar apreensiva quanto ao futuro, porque embora a NF2 geralmente seja de lenta evolução, esta evolução é imprevisível. Por exemplo, o tempo para um tumor (um schwannoma vestibular, por exemplo) dobrar de tamanho tem sido calculado entre 0,3 e 70 anos, segundo o excelente livro editado pelos médicos Mauro Geller e Aguinaldo Bonalumi Filho, “Neurofibromatose – Clínica, genética e terapêutica” publicado pela Guanabara Koogan no Rio de Janeiro, em 2004.

No entanto, apesar da imprevisibilidade e da ausência de cura definitiva para a NF2, há tratamentos e condutas que podem melhorar qualidade de vida. A expectativa de vida das pessoas com NF2 foi calculada em cerca de 62 anos, mas esta idade foi calculada há mais de uma década com dados antigos e os recursos terapêuticos atuais devem ter melhorado esta expectativa.
Assim, tentarei apresentar abaixo algumas orientações básicas para alguém com o diagnóstico de NF2.
É importante ser avaliado regularmente por médicos (as) com experiência em NF2, porque eles sabem que na NF2 não se deve retirar um tumor apenas porque ele está lá, mas quando existem determinadas razões clínicas para isto (ver guia de condutas da Sociedade Brasileira de Pesquisa em Neurofibromatoses aqui).

É essencial saber se outras pessoas na família também têm NF2. Identificar quem é portador na família pode ser uma tarefa difícil porque algumas pessoas têm sentimentos de raiva ou vergonha por terem uma desordem genética e outras podem ter sinais pouco evidentes da doença.
Apesar desta dificuldade familiar, existem boas razões para saber se alguém mais na família tem NF2, porque todos podem usar estas informações para fazer um planejamento da saúde familiar.
A aceitação de que alguém na família tem NF2 pode levar algum tempo e é importante entender isto. Muitas outras famílias passam por problemas similares e assim os grupos de apoio podem ser uma boa fonte de ajuda. Já existem grupos de suporte em alguns estados brasileiros, como a AMANF em Minas Gerais. Eles são formados por pais ou portadores com o objetivo de oferecer apoio, conselhos e informações para enfrentar as neurofibromatoses.
No entanto, nestas associações de apoio, percebemos que as pessoas com NF1 e NF2 possuem problemas muito diferentes e por isso tenho sugerido que as reuniões sejam separadas para que as demandas de cada grupo sejam melhor discutidas.
As pessoas com NF2 precisam de exames médicos regulares para verificar o estado geral de saúde e acompanhar o crescimento dos tumores, a audição, o equilíbrio e avaliar se surgiram novos problemas. Quaisquer mudanças devem ser notificadas imediatamente ao médico, mesmo antes do prazo para o retorno anual.
Exames de ressonância magnética do cérebro devem ser pedidos por médicos experientes com a NF2 e podem ser necessários no acompanhamento.
A NF2 pode afetar sua audição nos dois lados, por isso você deve estar aberto para todos os meios de comunicação. A leitura dos lábios é uma alternativa interessante para as pessoas com NF2. A linguagem de sinais também abre muitas oportunidades para os deficientes auditivos. Estas condutas são mais úteis quando toda a família aprende os sinais.
As pessoas com NF2 podem precisar de cirurgias complicadas em mais de uma ocasião. Pelo fato de algumas cirurgias poderem levar a deficiências permanentes, como perda de audição, a programação de cirurgias deve ser considerada cuidadosamente. As cirurgias devem ser realizadas por profissionais com experiência em NF2, pois podem levar a complicações.
Em alguns casos, a cirurgia deve ser adiada, pois alguns tumores podem mostrar um crescimento muito pequeno através dos anos e podem ser observados cuidadosamente.
Terapeutas treinados, fonoaudiólogos e oftalmologistas são essenciais no processo de acompanhamento e reabilitação.

Finalmente, é preciso evitar qualquer tratamento não reconhecido pela medicina científica. 
Nos últimos dias falei sobre as formas mais comuns de dor nas neurofibromatoses. Hoje, quero comentar aquela que talvez seja a mais comum: a angústia das famílias diante da incerteza quanto ao presente e ao futuro de seus entes queridos acometidos pela doença.
O sofrimento geralmente começa na demora para se chegar a um diagnóstico. As neurofibromatoses são doenças raras e por isso a maioria dos profissionais da saúde desconhece os critérios diagnósticos para as NF e os problemas de nossos filhos e filhas são tratados como se tivessem outras causas. Assim, o diagnóstico correto costuma demorar para acontecer e o diagnóstico errado sempre leva a condutas equivocadas.
Quando o diagnóstico correto é feito e descobrimos que se trata de doenças genéticas e nós, pais e mães, ficamos confusos porque não temos conhecimento científico suficiente para compreendermos as questões biológicas mais complexas que nos são apresentadas pelos médicos. Nós não sabemos exatamente o que são doenças genéticas, doenças hereditárias, doenças adquiridas ou doenças congênitas.
Infelizmente, muitos médicos, com a intenção de esclarecer os pais, completam de forma equivocada o seu diagnóstico mostrando-nos imagens de pessoas com neurofibromatoses, fotos e ilustrações escolhidas em livros de medicina ou na internet, geralmente os casos mais graves, que nos deixam arrasados. Então, o meu bebê vai ficar assim?
Em seguida, além do diagnóstico de que se trata de uma doença genética, ficamos sabendo que não há cura. Isto geralmente provoca um grande sentimento de culpa por parte dos pais, e ficamos nos perguntando o que teríamos feito de errado: será que foi o cigarro, a bebida, a exposição a substâncias perigosas, a alimentação, etc.?
Geralmente não somos informados pelos médicos de que nada do que tenhamos feito foi a causa da mutação nova no gene da nossa criança, mutação esta que acontece totalmente por acaso em 1 em cada 3 mil crianças na NF1, em 1 em cada 20 mil crianças na NF2 e em 1 em cada 40 a 50 mil crianças com schwannomatose.
A partir daí a dor familiar vai aumentando a cada dia naqueles casos realmente mais graves, que requerem internações e cirurgias, provocam perda de capacidades funcionais, dificuldades de aprendizado graves e até mesmo a morte.
Nos outros casos menos graves, mesmo naqueles casos em que nosso filho ou filha está bem e feliz, a incerteza do seu futuro, de como a doença vai evoluir, nos deixa noites sem dormir na angústia. Não somos informados de que os casos mais graves geralmente já nascem mais graves e que é possível para a maioria das pessoas com NF levar uma vida feliz.
Assim, sofremos cronicamente como família e, muitas vezes, por falta de informação. Por isso, num questionário realizado pela Associação Maria Vitória de Doenças Raras, a maioria das pessoas com NF e suas famílias responderam que sua maior necessidade neste momento, acima mesmo de tratamentos medicamentosos ou cirúrgicos, é mais informação sobre as neurofibromatoses.
Então, é preciso lembrar que cura não é o mesmo que tratamento. As neurofibromatoses não têm cura, é verdade, mas têm tratamentos.
Uma parte do tratamento para alívio da dor no coração das famílias com neurofibromatoses vem sendo construída em todo o mundo por associações de famílias que enfrentam de frente o problema.

Estas associações nos oferecem informação científica, cuidadosa, carinhosa e acolhedora sobre a doença das nossas crianças.
Ontem, a escola da minha filha de 9 anos nos informou que ela não conseguiu atingir as mesmas competências dos colegas. 

Assim, apesar de transitá-la para o segundo ano, ela continuará com os livros do primeiro. Isso quer dizer que, no segundo ano:
– Ela verá o conteúdo da turma para o segundo ano enquanto ela vê o mais atrasado;
– Sairá de sala de aula para o acompanhamento especial, para a fonoterapia e, talvez, terapia ocupacional. Enquanto está neste atendimento, o restante da turma recebe novos conteúdos.
Não sou pedagogo, mas penso que mesmo com a professora particular acompanhando-a, dificilmente ela conseguirá chegar ao nível da turma.
Você passou por situação semelhante? O que podemos fazer para minimizar o impacto da diferença e ajudá-la no aprendizado?
Uma coisa que eu não consigo entender. Minha filha é muito antenada, entende tudo a sua volta, tem o pensamento rápido, mais até do que os irmãos, mas não consegue assimilar os conteúdos da escola. Será que o conteúdo deve ser dado de uma forma diferente?
Ela possui as manchas no cérebro. Segundo minha esposa, estas manchas são na área do aprendizado, pode ser isso mesmo? BPC, do Rio de Janeiro.
Resposta.
Sim, passei por situação semelhante à sua e creio que as dificuldades de aprendizado na NF1 afetam profundamente inúmeras famílias neste momento. Minha filha com NF1 já está com 36 anos, conseguiu se formar em Fisioterapia e leva uma vida praticamente normal. No entanto, como em grande parte das crianças com NF1, seu processo de aprendizado se deu de forma mais lenta do que para os demais colegas e algumas habilidades específicas ainda não foram alcançadas por ela, como a habilitação para dirigir automóveis.
Por causa das suas dificuldades, especialmente de memória, – e a capacidade de guardar informações é muito cobrada nos sistemas atuais de ensino, – ela repetiu algumas séries, o que acabou por forçá-la a completar o ensino de forma supletiva. Na faculdade (particular) ela continuou com as dificuldades de memória, necessitando de mais tempo do que os (as) colegas para adquirir o conhecimento médio de sua turma.
Então, a segunda questão que você levanta é se o conteúdo poderia ser ensinado de forma diferente. Também não sou pedagogo, mas tenho a impressão que a socialização deveria ser a maior tarefa da escola, ou seja, preparar as novas pessoas para viverem em sociedade, cuidando dos lações afetivos e das relações sociais.
No entanto, a ideologia da escolarização é formar indivíduos produtivos para o mercado de trabalho. Assim, não só para as crianças com NF1, a maneira de ensinar na maioria das escolas é produtivista, pouco interessante, desconectada da vida social real, excessivamente formal e muito baseada na memória, além de estimular de forma doentia a competição, a qual leva a comportamentos individualistas. Veja as crianças japonesas, tão tristes em seu produtivismo, educadas para se matarem de trabalhar e que são modelo para muitos países, inclusive o Brasil.
Minha opinião é de que sim, precisamos lutar por conteúdos escolares diferentes dos atuais, que deveriam ser voltados para o desenvolvimento dos afetos, da socialização, da inclusão de todos e do espírito comunitário e solidário. Menos campeões e mais corações. É difícil? Sim, mas saber que as falhas não estão na sua filha, mas no sistema educacional que a exclui como pessoa, impedindo-a de realizar seu potencial humano.
Concordo com você que os cuidados complementares que sua filha recebe retiram dela uma parte do tempo que poderia ser destinado aos chamados conteúdos escolares. Mas o efeito principal, a meu ver, é que estas atividades terapêuticas a afastam ainda mais da socialização com os colegas e criam uma situação especial, a qual pode, inclusive, ser fonte de discriminação e maus tratos. Portanto, devemos indicar atividades terapêuticas, que sejam cientificamente comprovadas como eficazes na NF1, apenas para os horários fora do período escolar.
Finalmente, sobre as manchas no cérebro, que, provavelmente devem ser hiperintensidades encontradas na ressonância magnética do encéfalo, geralmente decorrentes de pequenos hamartomas inofensivos. Houve uma época em que se suspeitou que estas manchas estariam relacionadas com as dificuldades de aprendizado, mas depois isto não foi comprovado.
Em conclusão, creio que nosso papel, como pais, deva ser a criação de entidades civis de defesa das pessoas com NF e a partir destas associações promovermos mudanças nas estruturas de ensino, tornando-as mais inclusivas, ou seja, menos competitivas e mais amorosas.

Tenho uma filha com 14 anos está cursando o 8º ano em escola particular. Ela faz acompanhamento com neurologista desde pequena, ela tem neurofibromatose. Na escola, minha filha apresenta muita dificuldade de concentração e aprendizado. Faz acompanhamento com professores particulares, mas mesmo assim apresenta muita dificuldade e não melhora as notas. Quero dizer, não consegue alcançar o desejado do que estuda. O neurologista já solicitou através de relatório, tempo alargado para as atividades, aceitar pequenos erros e acento preferencial. Mas, contudo, está sendo muito desgastante, pois ela está sendo cobrada da mesma forma. Existe alguma legislação onde posso assegurar o direito de minha filha já que existe tais necessidades. Agradeço desde já a atenção. JM, Belo Horizonte, MG.

Cara JM, obrigado pela sua pergunta, pois ela deve ser uma dúvida comum a muitos outros pais e mães de crianças com NF1.
Creio que a família deve insistir ao máximo na inclusão da criança na escola por meios amigáveis e cooperativos. Devemos buscar o diálogo com a escola, levando informações sobre a NF1 à escola, como a cartilha distribuída por nós (As manchinhas da Mariana). Se preciso, podem ser organizadas palestras ministradas na escola por participantes da Associação Mineira de Apoio às Pessoas com Neurofibromatoses (AMANF).

No entanto, se nada disso funcionar, existe uma legislação que já está em vigor no Estado de Minas Gerais (onde você mora) que garante às pessoas com neurofibromatoses os direitos das pessoas com necessidades especiais, entre elas o direito a sistema de provas e avaliações específicas para as limitações causadas pela doença. Veja numa coluna à direita neste blog: Leis que podem ser úteis.

Entre também em contato com a Associação Mineira de Apoio às Pessoas com Neurofibromatoses (AMANF) (email da presidente atual Maria Danuzia Ribas: danuzia@sarah.br ), pois nossa associação vem acumulando experiências interessantes neste sentido.

Como temos comentado, o simples fato de ser uma pessoa com uma das neurofibromatoses (tipo 1, tipo 2 ou schwannomatose) não garante à pessoa doente os direitos especiais, pois é preciso que o exame técnico demonstre a existência de uma limitação ao desenvolvimento do potencial humano daquela pessoa. Para orientar o trabalho do exame dos peritos, um bom relatório de um profissional da saúde (medicina, psicologia, fonoaudiologia) com experiência em neurofibromatoses pode ser bastante útil na identificação das limitações causadas pela doença.
Por exemplo, as dificuldades de aprendizado são a queixa mais comum entre as pessoas com NF1, chamadas de déficits cognitivos, que se apresentam geralmente como: 1) redução das habilidades de visão e orientação espacial, 2) menor velocidade de compreensão de ideias, conceitos e problemas, 3) pouca coordenação motora para esportes e dança, 4) linguagem reduzida e 5) diminuição da função executiva (que é a capacidade de imaginar, planejar e coordenar diversas tarefas para executar funções). Estes problemas aparecem na infância e provavelmente continuam por toda a vida.
É claro que estes problemas podem ser mais ou menos graves. Em algumas pessoas com NF1 eles causam atraso escolar, dificuldade para passar de ano, mas a pessoa consegue completar sua formação básica. Noutras pessoas, a gravidade pode ser grande o suficiente para torna-las incapazes de aprenderem a ler e escrever ou interpretar uma informação escrita ou uma história narrada a elas.
Assim, no meu ponto de vista, o recurso jurídico é uma opção existente, mas deve ser tentado apenas depois que todos os caminhos mais amistosos e construtivos foram esgotados.





Além dos problemas cognitivos, sobre os quais falamos ontem, algumas dificuldades psicológicas são comuns entre as pessoas com NF1. Elas são obrigadas a enfrentar o fato de que possuem uma doença que é: 

1) Genética – o que traz muitas vezes conflitos de culpa, medo de transmissão para os filhos e netos, preconceitos sociais; 

2) Crônica – os achados e complicações da NF1 estão presentes desde o nascimento e podem ocorrer ao longo da vida; 

3) Incurável – apesar de diversos tratamentos poderem melhorar a qualidade de vida das pessoas com NF1, não existe qualquer tratamento cirúrgico ou medicamentoso que possa acabar com a doença de uma vez; 

4) Variável de uma pessoa para outra – como a NF1 se manifesta de forma completamente diferente de uma pessoa para outra, torna-se difícil conhecermos a evolução natural da doença; 

5) Imprevisível – é muito difícil saber o que vai acontecer com determinada pessoa num dado momento; 

6) Sem representação social – ou seja, a sociedade desconhece a doença, as suas causas, o significado do seu nome, as suas consequências e assim não sabemos o que sentir diante de uma pessoa com NF1; 

7) Que pode causar discriminação social – seja pela aparência dos neurofibromas e outras lesões, seja pelas dificuldades de aprendizado, ou pelos problemas cognitivos e comportamentais, as pessoas com NF1 têm muitas chances de serem incompreendidas e sofrerem discriminação na comunidade em que vivem.


Por tudo isso, as pessoas com NF1 apresentam maior número de casos de ansiedade, medo, baixa autoestima e falta de sucesso profissional, o que afeta também a sua família. Uma ampla faixa de sintomas psicossociais pode estar presente nas crianças e adolescentes com NF1, como imaturidade emocional, incompetência social, timidez excessiva, limitações para entrar no mercado de trabalho e dificuldades para desenvolver relações amorosas. 

Apesar de tudo isto, surpreendentemente, as próprias pessoas com NF1 se avaliam de forma mais positiva do que seus pais e professores, o que aumenta a nossa preocupação em não superprotegê-las, mas, ao contrário, tentarmos garantir a realização do potencial humano de cada uma delas.

As intervenções profissionais direcionadas aos aspectos psicossociais das pessoas com NF1 devem ser baseadas em quatro aspectos:

1) Facilitar o acesso e a transferência de informação sobre a NF1 entre os profissionais que cuidam da pessoa com NF1 (professores, profissionais da saúde) e a família, acompanhando de que maneira ela compreende e adota as informações disponíveis;

2) Ajudar o desenvolvimento de estratégias para a pessoa com NF1 lidar com problemas, relacionados ou não à NF1, estimulando os sentimentos positivos e a aceitação da doença;

3) Auxiliar o desenvolvimento de um plano de vida profissional e afetivo para a pessoa com NF1 e fornecer aconselhamento genético;

4) Mediar as relações entre a pessoa com NF1 e sua família com as instituições de saúde (públicos ou planos de saúde, seguridade social).

É importante lembrar que o suporte a ser oferecido às pessoas com NF1 envolve tanto os aspectos de saúde quanto problemas sociais e econômicos.

Amanhã continuamos falando de tratamento para os problemas de aprendizado e comportamentais.