Posts

Ontem comentei sobre o estudo realizado na Universidade de Indiana nos Estados Unidos, usando o imatinibe em diversas pessoas com NF1 e neurofibromas plexiformes (quem desejar ver o artigo completo em inglês basta clicar AQUI – em inglês).

Outros estudos mais recentes sobre o uso de imatinibe em neurofibromas plexiformes inoperáveis em pessoas com NF1 apontam na mesma direção, ou seja, de que devemos continuar a estudar mais ampla e profundamente esta possibilidade terapêutica.

Algumas reflexões podem ser feitas sobre os resultados do Dr. Robertson e colaboradores, que deram origem ao nosso atual projeto de pesquisa.

A primeira delas é que não sabemos a taxa de crescimento dos plexiformes antes do tratamento com o imatinibe no estudo do grupo do Dr. Robertson. É possível que aqueles tumores com maior taxa de crescimento apresentem resposta melhor ao imatinibe do que os outros menos ativos? Será que a utilização inicial da tomografia computadorizada com emissão de pósitrons (PET CT) poderia definir o nível metabólico dos plexiformes e indicar os mais adequados para o uso do imatinibe?

Segundo, os autores relatam que o tamanho mínimo dos neurofibromas plexiformes deveria ser de 10 mm, ou seja, tumores muito pequenos para causar grandes riscos, de um modo geral. Não seria mais indicado o imatinibe para pessoas com plexiformes maiores (e, de preferência mais ativos, como vimos acima) e inoperáveis?

Terceiro, não sabemos se houve uma distinção segura entre os neurofibromas difusos (epineurais) e os neurofibromas nodulares (perineurais), os quais possuem origens embriológicas distintas, diferentes momentos de crescimento, diferentes padrões vasculares e possíveis diferenças nas barreiras teciduais à perfusão do medicamento. Não teria sido prudente a separação prévia ou retrospectiva dos efeitos do imatinibe sobre os neurofibromas difusos e os nodulares?

Quarto, sentimos falta de informação sobre os efeitos do imatinibe sobre os sintomas (como dor e disfunção neurológica) e a qualidade de vida das pessoas com o tratamento experimental. Não teria sido mais útil, para todos nós que trabalhamos na clínica e para as pessoas com NF1, se soubéssemos como o tratamento com o imatinibe foi percebido pelas pessoas que o usaram?

Finalmente, quando se busca corretamente a objetividade (medindo-se apenas o tamanho do tumor) não se corre o risco de perdermos informações que talvez sejam mais importantes para as pessoas com NF1, como dor, outros sintomas e qualidade de vida?

Por exemplo, outra pesquisa, realizada com 3 pessoas com NF1 e plexiformes inoperáveis, mostrou que a intensa dor neuropática (presente em muitos plexiformes, especialmente os nodulares), que é de difícil tratamento, praticamente foi eliminada com o uso de outro medicamento (sirolimus), sem que houvesse redução apreciável do tamanho dos tumores (ver aqui o trabalho completo). Portanto, o tamanho do tumor não é o único problema a ser resolvido.

De qualquer forma, a pesquisa do Dr. Robertson e colaboradores (2012) constitui uma base segura sobre a qual podemos formular a proposta de um novo estudo multicêntrico no Brasil.

Pretendemos realizar um estudo com 50 pessoas com NF1 (25 crianças e 25 adultos), as quais utilizariam o imatinibe em neurofibromas plexiformes inoperáveis e sintomáticos e em crescimento (avaliado pelo PET CT), medindo-se o tamanho do tumor e os efeitos clínicos sobre as pessoas, além de levarmos em conta as diferenças entre plexiformes difusos e plexiformes nodulares.

Estamos dando os passos necessários para este projeto, como submetê-lo aos Comitês de Ética em Pesquisa e buscar o financiamento (cerca de 400 mil reais) junto à Universidade Federal de Minas Gerais, à FAPEMIG e ao CNPq.

Quem sabe, algum leitor deste blog tem recursos financeiros para patrocinar este projeto?

 

Soube na semana passada que o senador Romário lançou o projeto da construção de um Centro de Referência em Doenças Raras no Estado do Rio de Janeiro. Romário tem sido um apoiador da causa das doenças raras, motivado pela sua filha que nasceu com a Síndrome de Down.

Diante disso, vou apresentar o pensamento que tenho defendido sobre a questão dos centros de especialidades destinados ao atendimento das pessoas com neurofibromatoses. Uma espécie de utopia a ser alcançada.

Primeiro, vamos lembrar que as neurofibromatoses ocorrem em cerca de uma em cada 3 mil pessoas que nascem, independentemente de sua região geográfica, do nível social ou de outras características, porque é um acontecimento totalmente aleatório, casual, como um número qualquer retirado entre 3 mil bolinhas do bingo.

Assim, sabendo que a população brasileira está em torno de 205 milhões, calculamos que existam cerca de 62 mil pessoas no Brasil com neurofibromatoses (NF1, NF2 e Schwannomatose).

Considerando que cada uma delas precisa realizar uma consulta clínica com um (a) médico (a) pelo menos uma vez ao ano, descobrimos que precisamos de 62 mil consultas médicas por ano.

De forma ideal, um (a) médico (a) pode atender uma pessoa por hora, durante seis horas por dia, durante dez meses por anos. Isto indica que cada profissional poderia atender cerca de mil e duzentas consultas por ano, ou seja, precisaríamos da carga de trabalho total de 50 médicos (as) para atender apenas uma vez por ano cada uma das pessoas com neurofibromatoses.

Estas consultas seriam realizadas por médicos que, ainda que não sejam especialistas, conheçam o diagnóstico da pessoa, saibam as principais condutas em cada um dos tipos de neurofibromatose, e possam contar com um centro de referência à distância (internet) para buscar informações e tirar dúvidas.

Então precisamos de pelo menos 50 profissionais médicos (as) dedicados às neurofibromatoses, apenas para cuidarem da parte clínica, não incluindo os neurologistas, cirurgiões, radiologistas e demais especialidades que podem ser necessárias.

Considerando que estes profissionais precisam de férias e podem ter que se afastar ocasionalmente do trabalho, vamos acrescentar mais dez profissionais e teremos cerca de 60 médicos (as) necessários apenas para o acompanhamento clínico das NF no Brasil.

Sabemos que uma em cada quatro pessoas com NF apresenta as formas mais graves das doenças e requer especialistas com conhecimento mais profundo das NF. Assim, daqueles 60 médicos, precisamos que 1 em cada quatro seja especialista em NF, o que nos fornece o resultado final de 15 a 17 especialistas em NF para todo o país.

Como a distribuição das pessoas com NF acompanha a distribuição geográfica da população brasileira, os especialistas deveriam também ser distribuídos de acordo com a quantidade de pessoas a serem atendidas. Então, apenas como sugestão, apresento no quadro abaixo como deveria ser uma possível distribuição destes especialistas pelo Brasil afora.

São Paulo (São Paulo + Sul)
6
Rio (Rio + Bahia + Espírito Santo)
3
Belo Horizonte (Minas + Norte + Centro)
5
Recife (Nordeste)
3
Total
17
No momento, algumas associações de pessoas com NF estão construindo centros de informação à distância e temos 4 médicos especialistas, mas que podem se dedicar ao atendimento clínico das NF apenas em regime parcial de trabalho.

Falta muito, não?

Amanhã, comentarei uma possível saída para esta questão.