Caras leitoras e leitores deste blog, mais uma vez agradeço sua participação com perguntas e dúvidas.

O número de acessos de pessoas interessadas em saber mais sobre as neurofibromatoses vem aumentando e com isto as perguntas vão chegando em maior número.

Meus critérios para escolher as perguntas a serem respondidas são: se é um problema comum ou mais raro nas NF, se tem importância para a saúde das pessoas com NF e sua urgência em ser respondida.

Escolhida a pergunta do dia, quase sempre faço uma revisão do assunto antes de responder.

Ultimamente, tenho recebido diversas perguntas semelhantes a outras que já respondi aqui. Fico com a impressão de que algumas destas pessoas não conseguiram encontrar o assunto no sistema de busca, que fica num espaço no lado direito desta página.

Assim, aqueles que ainda não tiveram suas perguntas diretamente respondidas, por favor, confiram se elas já não estão respondidas para outras pessoas.

Por exemplo, já respondi anteriormente os seguintes assuntos que têm sido repetidos nas perguntas recentes:

Onde tratar as pessoas com NF?
Problemas de comportamento na NF1?
Estilo de vida saudável nas NF?
Dúvidas sobre direito a benefícios e legislação?
Problemas de coluna e quando procurar ortopedistas?
Dúvidas sobre fertilidade e herança da doença?
Somente manchas podem ser NF?
Falta de informação dos médicos?

E muitos outros.

Por favor, se você está entre aqueles que perguntaram e não receberam ainda uma resposta direta, confira se seu assunto já está contemplado no blog. 

Se não encontrar o que procura, por favor, envie seu e-mail para mim.


Continuo a conversa de ontem sobre os resultados da pesquisa do Bruno Cota, que encontrou dez vezes mais dificuldades musicais nas pessoas com NF1 do que nos voluntários sem a NF1.

Minha impressão é de que a musicalidade na voz humana é fundamental para o desenvolvimento dos bebês, porque mesmo sem entender o sentido das palavras pronunciadas eles são capazes de compreender o significado emocional dos sons emitidos naquelas conversas que elaboramos com eles.

Pela maneira como expressamos a voz, os bebês percebem se é uma voz conhecida ou estranha, se quem emite a voz é uma pessoa que está ansiosa ou calma, se está agressiva ou cordial, se tem pressa ou se está relaxada e assim por diante. Muito antes de saber o sentido das palavras, como diz o João Gabriel, a criança já entende a voz em sua entonação, em seu volume, em suas variações de ritmo, ou seja, em sua musicalidade.

Por isso, creio que a linguagem por meio da musicalidade vem antes do sentido da linguagem das palavras, o que tem uma finalidade biológica de sobrevivência e pode ter sido a origem da presença da música em todas as culturas e civilizações humanas.

Neste sentido, nós seres humanos somos animais sociais, ou seja, somente sobrevivemos na natureza quando estamos organizados em grupos. Só existimos no plural: nós.

A comunicação pela voz, e em seguida pela palavra, entre os diferentes membros do grupo social é fundamental para a formação da identidade de uma pessoa. 


Por isso a música faz parte desta comunicação, desde o bebê até a vida adulta, quando os grupos humanos se reúnem e se sentem participando do mesmo instante, vivendo um mesmo momento, ao escutarem uma determinada música que fortalece no grupo a sua identidade (“a música” de um casal enamorado, aquele sucesso de uma geração, o hino de uma nação ou de uma torcida, uma canção religiosa, uma marcha militar, e assim por diante).

A nossa consciência é plural, ou seja, não existo sozinho, mas somente tenho consciência de mim pelos sinais que os outros me enviam, então a música compartilhada é um momento de identidade coletiva, em que me sinto “realmente” participando de um grupo que dá sentido à minha existência. Ou seja, a música “é nós”.

Daí o verdadeiro prazer e a ausência de solidão que sentimos quando ouvimos música em grupo (o que talvez não funcione com os fones de ouvido dos celulares…).

Se estas ideias acima forem verdadeiras, a exposição à música deve ser parte fundamental do desenvolvimento cognitivo dos seres humanos. Então, se as pessoas com NF1 têm dificuldades musicais, será que esta “amusia” faz parte de suas dificuldades de aprendizagem? Será que a amusia das pessoas com NF1 prejudica a sua interação social, o que explicaria a timidez e o retraimento afetivo que muitas pessoas com NF1 apresentam, a ponto de serem confundidas com autistas?

São perguntas que precisam ser respondidas no futuro e que podem nos apontar se a maior exposição à música ou a tratamentos baseados no treinamento musical poderiam ajudar as crianças com NF1 a se desenvolverem melhor.


Lembro que quando minha filha Maria Helena nasceu com NF1 nós ainda não sabíamos o seu diagnóstico e nem que ela tinha pouca força muscular. Sem força para sugar o leite do peito de sua mãe, a pobrezinha chorava de fome e não conseguia dormir, chegando a ficar um pouco desnutrida com o passar das semanas. Quando, finalmente, o cansaço a dominava e ela dormia por alguns instantes nós fazíamos de tudo para que nenhum barulho a acordasse, inclusive nenhuma música podia ser tocada (o que antes acontecia com muita frequência, é claro, inclusive pela Ana sua irmã mais velha).

Será que Maria Helena foi exposta a menos música do que precisava?

Vamos continuar estudando.

Na semana passada, o médico e estudante de pós-graduação em fonoaudiologia da UFMG, Bruno Cezar Lage Cota apresentou os resultados iniciais do seu estudo sobre dificuldades musicais nas pessoas com NF1.

Suas conclusões foram expostas aos examinadores do seu mestrado, um grupo formado por pessoas envolvidas com a questão: os médicos (e também músicos) Ana Maria Arruda Lana e João Gabriel Marques Fonseca, a fonoaudióloga (e orientadora) Luciana Macedo de Resende e por mim, responsável pelo acompanhamento das pessoas com NF1.

No auditório também estavam o médico diretor do Centro de Referência em Neurofibromatoses do HC da UFMG, Nilton Alves de Rezende e a fonoaudióloga Pollyanna Barros Batista, que realizaram a primeira pesquisa que mostrou a desordem do processamento auditivo que pode estar relacionada às dificuldades de aprendizagem nas pessoas com NF1 (ver aqui o artigo aqui).

A partir do trabalho da Pollyanna, e do relato de diversas pessoas com NF1 de que possuíam poucas habilidades com instrumentos musicais, foi idelizado o estudo do Bruno para saber se, de fato, a neurofibromatose do tipo 1 estaria relacionada com a “amusia”, ou seja, uma dificuldade de perceber a música.

E por que a capacidade de compreender música precisa ser estudada? Porque a música, muito mais do que apenas distração, passatempo ou divertimento, é fundamental para o desenvolvimento humano.

Sabendo que o aprendizado musical faz parte do processo de aprendizagem em geral, a nossa pergunta é: qual é a relação entre uma possível amusia com a desordem do processamento auditivo e com o desenvolvimento psicológico e intelectual das crianças com NF1? Ou seja, queremos saber se as pessoas com NF1 possuem alguma dificuldade musical que possa estar relacionada com suas dificuldades na escola, por exemplo.

Nos testes especiais para se medir a amusia, por enquanto com 10 pessoas com NF1 e 10 pessoas sem NF1, Bruno observou que as pessoas com NF1 pontuaram abaixo do grupo controle, formado por pessoas da mesma idade, sexo e nível educacional mas sem NF1.
Assim, a conclusão do Bruno, com a qual todos nós que examinamos o seu trabalho concordamos, é que há cerca de 10 vezes mais chance de uma pessoa com NF1 apresentar amusia do que uma pessoa sem a NF1. Ou seja, há um tipo de amusia relacionada com a NF1.

Amanhã continuo falando dos passos seguintes deste estudo, o porquê de a música ser fundamental no desenvolvimento humano e nossa esperança de podermos usar a música no tratamento das crianças com NF1 e dificuldades de aprendizagem.
Olá, Dr. Sou portador da NF1 há aproximadamente 15 anos.
Pelas pesquisas que realizei, se trata de uma mutação nos genes de origem genética.
Ocorre que, ao pesquisar na família sobre algum caso parecido com o meu, não obtive informações sobre algum membro da família que tenha tido isso. Em minha infância, realizei um procedimento cirúrgico e tive que realizar uma transfusão de sangue em meu corpo.
Sou leigo em ciência biológica, mas essa mutação dos cromossomas poderia ser adquirida através de transfusão de sangue? TCL, sem localidade.
Caro TLC, obrigado pela sua pergunta que pode ser muito útil para compreendermos diversos fatos relacionados com as neurofibromatoses.
Primeira informação: embora você não tenha dito a sua idade, posso garantir que se você tem a NF1, você já nasceu com ela, porque todas as formas de neurofibromatoses são doenças genéticas e congênitas (ver neste blog um post sobre estas diferenças: clique aqui ).
A segunda questão: o fato de não ter encontrado nenhum parente com NF1, indica que, provavelmente, a sua mutação é uma nova mutação na sua família, que ocorreu no espermatozoide de seu pai ou no óvulo de sua mãe que deram origem a você.
Esta nova mutação acontece em metade dos casos com NF e a outra metade são pessoas que herdam a NF de um de seus pais.
A terceira pergunta: é possível adquirir NF por meio de uma transfusão de sangue? Para compreendermos que não é possível, temos que lembrar duas coisas:
1) a mutação genética que causa os sinais e sintomas da NF está presente em todas as células de seu corpo, e não apenas no sangue;
2) o sangue que você recebeu na transfusão foi completamente removido de seu corpo em poucas semanas e nada genético dele restou em seu organismo.
Assim, não me parece possível “adquirir” NF por transfusão de sangue.
Por outro lado, já comentei aqui a pergunta de um leitor com NF1 que sofreu rejeição ao tentar doar sangue.
De fato, qualquer forma de discriminação social é dolorosa e as pessoas com neurofibromatose passam por esta experiência com frequência.
Procurei resposta para sua pergunta nas principais fontes científicas que disponho e não encontrei qualquer estudo que tenha verificado algum risco na doação de sangue por parte de alguém com NF1.
Sabemos que todas as células de uma pessoa com NF1 carregam a mutação, incluindo os leucócitos e outras células que circulam pelo seu sangue.
Desconheço se algumas destas células (especialmente os mastócitos) poderiam sair do leito vascular e se alojar nos tecidos da pessoa que recebeu o sangue, onde poderiam agir de forma diferente do que seria esperado em condições normais.
Portanto, não posso dizer com segurança se há algum risco na doação de sangue por parte de alguém com NF, até que a questão seja respondida cientificamente.







A médica Hérika Martins Mendes Vasconcelos concluiu seu relevante trabalho de mestrado (dissertação) sobre o uso do exame de imagens chamado PET CT na neurofibromatose do tipo 1, o qual foi aprovado pela banca examinadora no dia 27 de outubro de 2015 (ver abaixo o resumo do estudo).

A Dra. Hérika examinou com o PET CT 42 pessoas com NF1 com neurofibromas suspeitos de transformação maligna e seus resultados mostraram que o exame foi muito útil na orientação das condutas a serem tomadas.
Assim, o exame permitiu saber quais os tumores com sinais de pouca atividade metabólica, que podem ser observados clinicamente por algum tempo, e aqueles com atividade no limite ou alta, os quais devem ser removidos por cirurgia se possível.
 
A contribuição deste exame para nosso Centro de Referência é inestimável e esperamos contar sempre com este apoio fundamental para melhorarmos nosso atendimento.
 
A médica Hérika foi orientada pela Professora Dra. Debora Marques de Miranda, que conduziu sua orientação de forma científica e cuidadosa, permitindo que diversas dificuldades de percurso fossem superadas, inclusive a redução do orçamento disponível para a pesquisa em virtude do corte de gastos do governo federal.
 
Em meio ao estudo, nasceu a Luísa, sua terceira e linda criança. Por isso, em homenagem à Dra. Hérika e a todas as mulheres que concluem a sua pós graduação enquanto criam seus filhos, apresento esta charge abaixo, que publiquei em 2012 no Jornal da Associação Médica de Minas Gerais.
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A banca foi composta pelos professores Jonas Jardim de Paula e Maicon Rodrigues Albuquerque, por mim e pela professora Débora. A discussão que se seguiu depois da apresentação inicial foi muito rica em aprendizados para mim.
 
Agradeço, mais uma vez, a oportunidade de trabalhar com esta equipe de pessoas tão dedicadas do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia – Medicina Molecular. 
 
Em nome de todas as pessoas já beneficiadas pelo seu estudo e daquelas que certamente ainda serão beneficiadas, Hérika, o nosso muito obrigado.

Uso do 18F-FDG PET/CT na Suspeita de Transformação Maligna em Indivíduos com Neurofibromatose Tipo 1.

Hérika Martins Mendes Vasconcelos

Dissertação apresentada como requisito para obtenção do título de mestre junto ao Programa de Pós-Graduação em Medicina Molecular da Universidade Federal de Minas Gerais, sob a orientação da Profa. Dra. Débora Marques de Miranda.

RESUMO

Os tumores malignos da bainha do nervo periférico (TMNP) são uma das principais causas de morte entre indivíduos com neurofibromatose tipo 1. As lesões foram classificadas quanto ao aumento de metabolismo, ao aspecto do metabolismo, a presença de hipermetabolismo relacionado ao aumento de densidade radiológica e a presença de hipocaptação central sugestiva de necrose. Os valores do SUVmax, SUVav, bem como o valor médio da escala de Hounsfield próximo ao ponto do SUV máximo na lesão e o maior diâmetro de cada lesão foram discriminados. Nessa dissertação quarenta e dois indivíduos com NF1 foram estudados com o 18F-FDG PET/CT. Parâmetros radiológicos e funcionais foram examinados para 55 lesões (18 neurofibromas difusos e 37 neurofibromas nodulares). Uma correlação altamente significativa foi encontrada entre os valores de SUVmax (p < 0.001), de SUVav (p < 0.001), da relação entre o valor de SUVmax da lesão e o SUVav do parênquima hepático (p < 0.001), do valor médio da unidade de Hounsfield próximo a área de SUVmax (p < 0.011) quanto a presença de transformação maligna (p < 0,001). Foi observada ainda uma correlação significativa entre o tipo de neurofibroma (p < 0.028), a presença de outra lesão em segmento corpóreo diferente (p < 0.038), o aumento de metabolismo (p < 0.001), o aspecto do metabolismo intratumoral (p < <0.001), a presença de hipermetabolismo relacionado a hiperdensidade radiológica intralesional (p < 0.002) e presença de hipocaptação sugestiva de necrose (p < 0.001). O objetivo desse estudo foi o de avaliar o potencial de preditores qualitativos e quantitativos das imagens 18F-FDG PET/CT que possam contribuir para o diagnóstico mais preciso dos pacientes com neurofibromatose tipo 1 (NF1) na suspeita de transformação maligna. Os estudos de 18F-FDG PET/CT representam um avanço na detecção dos TMNP devido a sua alta sensibilidade.

Conclusão: A adição de preditores radiológicos e funcionais proporcionou algum aumento na especificidade do método. Seu uso tem um potencial para reduzir o número casos de falso positivos e procedimentos cirúrgicos desnecessários.

Palavras-chave: Neurofibromatose tipo 1; neurofibroma plexiforme; tumor maligno da bainha do nervo periférico; 18F-fluorodesoxiglicose; tomografia por emissão de pósitrons e tomografia computadorizada

Como prometi ontem, apresento o programa elaborado para a capacitação de todos os interessados no cuidado de pessoas com as diferentes formas de neurofibromatose.

O curso será oferecido em todos os últimos sábados de cada mês em 2016.

O horário será de 14 às 16 horas numa sala a ser informada na portaria da Faculdade de Medicina da UFMG, em Belo Horizonte.

O curso se destina a profissionais da saúde, assim como às pessoas com neurofibromatoses e seus familiares interessados em melhorar os cuidados e qualidade de vida.

Para médicos e médicas interessados, oferecemos estágio prático no ambulatório do Centro de Referência em Neurofibromatoses do Hospital das Clínicas da UFMG. Interessados (as) devem enviar um e-mail para o Prof. Dr. Nilton Alves de Rezende: narezende@terra.com.br
O curso é público e deverá ser oferecido todos os anos, se tudo correr bem. Apesar de não haver custo financeiro para a inscrição, solicitamos que as pessoas interessadas enviem seu nome até o dia 25 de janeiro de 2016 para o e-mail: rodrigues.loc@gmail.com
O programa poderá conter alguma alteração ao longo do curso, mas os temas devem permanecer.

Programa de 
Coordenação

Professores Nilton Alves de Rezende e Luiz Oswaldo Carneiro Rodrigues

Introdução
As neurofibromatoses são desordens de origem genética denominadas neurofibromatose do tipo1 (NF1), neurofibromatose tipo 2 (NF2) e Schwannomatose. Por serem doenças raras, as pessoas com NF têm grande dificuldade de encontrar informações confiáveis sobre sua enfermidade.
Programa e objetivo:
Este programa tem como objetivo a capacitação de pessoas interessadas no manejo e ampliação do conhecimento sobre as neurofibromatoses. 
Esta capacitação será realizada com a apresentação em dez aulas das principais informações sobre o diagnóstico e tratamentos das neurofibromatoses (NF), em linguagem simples e acessível a todos os profissionais da área da saúde, mas também aberto às pessoas com NF e suas famílias, para que as mesmas possam melhor se organizar, acolher, tratar e acompanhar os problemas de saúde relacionados com as NF, auxiliando os profissionais de saúde no manejo clínico das pessoas com NF.
Este curso tem origem no fato de que as NF sãodoenças raras, genéticas, que não têm CURA, mas têm TRATAMENTOS que evitam as complicações ou melhoram a qualidade de vida das pessoas; que existem mais de 5 mil doenças raras, por isso não devemos esperar que todos os profissionais da saúde saibam tratar corretamente cada uma delas; que a solução para as pessoas acometidas por doenças raras é a organização das famílias para obterem os conhecimentos científicos sobre sua doença; que o conhecimento das questões fundamentais sobre diagnóstico e tratamento das suas próprias doenças, permitirá as organizações familiares informar os profissionais da saúde, facilitando e aprimorando o seu trabalho.
As aulas serão oferecidas nos últimos sábados de cada mês, de 14 às 16 horas na Faculdade de Medicina da UFMG, Avenida Alfredo Balena, Bairro Santa Efigênia, Belo Horizonte, MG, de acordo com o cronograma abaixo. Para os profissionais da área da saúde será oferecido a possibilidade de acompanhar os atendimentos médicos no Centro de Referência ás segundas e quintas feiras
Serão concedidos certificados para aqueles que completarem 8 das 10 aulas.

PROGRAMA DO CURSO DE CAPACITAÇÃO EM NEUROFIBROMATOSES – 2016
Calendário
Data
Assunto
Responsável
27 de fevereiro
Diagnóstico das neurofibromatoses (Neurofibromatose do tipo 1 e Síndrome de Legius)
Dr. Luiz Oswaldo C. Rodrigues (CRNF-HC)
26 de março
Diagnóstico das neurofibromatoses (Neurofibromatose do tipo 2 e schwannomatose)
Dr. Luiz Oswaldo C. Rodrigues (CRNF-HC)
30 de abril
Principais problemas da NF1 – dificuldades de aprendizado e de comportamento- Alterações da fala e da voz
Dr. Nilton Alves de Rezende (CRNF-HC);
Dra. Carla Menezes da Silva (CRNF-HC)
28 de maio
Principais problemas da NF1 – neurofibromas benignos e malignos
Dra. Luiza de Oliveira Rodrigues (UNIMED BH)
25 de junho
Principais problemas da NF2 – cirurgias e audição- Processamento auditivo
Dr. Eric Grossi Morato (Neurocirurgia – HC);
Ms.. Pollyanna de Barros Batista
30 de julho
Abordagem da dor nas NF
Dr. Gustavo Rodrigues Costa Lages (Clínica de Dor – HC)
27 de agosto
Orientação para novos filhos e busca de familiares
Dr. Bruno Cota (CRNF-HC)
24 de setembro
Pesquisas em neurofibromatoses e aspectos nutricionais
Ms. Aline Stangherlin Martins (CRNF –HC);]
Ms.Márcio Leandro
29 de outubro
Como as famílias podem se organizar para o acompanhamento das NF
Maria Danúzia Silva Ribas (Presidente da AMANF)
26 de novembro
As NF e as outras doenças raras
Dra. Vanessa Waisberg (CRNF – HC)
O Congresso Brasileiro de Oncologia, realizado na semana passada em Foz do Iguaçu, permitiu alguns avanços para nós que cuidamos das pessoas com neurofibromatoses. 

Lá estivemos, convidados a falar sobre o rastreamento de tumores nas NF pelo Dr. Joaquim Caetano Aguirre Neto, oncologista de Belo Horizonte, numa mesa redonda coordenada por ele e pela Dra. Alayde Vieira Wanderley (de Belém do Pará), junto com as oncologistas Beatriz de Camargo, Sima Esther Ferman (ambas do Rio de Janeiro) e Claudia Epelman (de São Paulo).

A palestra motivou o convite por parte de médicas ligadas à oncologia infantil para que os nossos artigos sobre diagnóstico, diagnóstico diferencial e manejo clínico das neurofibromatoses (ver aqui o de 2014 e o de 2015) sejam enviados a todos os oncologistas brasileiros, com o que nós concordamos imediatamente.

Além disso, diversos profissionais de outras partes do Brasil solicitaram contato para enviarem pacientes para nosso Centro de Referência em Belo Horizonte. É claro que estamos disponíveis para atendermos no CRNF do Hospital das Clínicas da UFMG (CRNF) todas as pessoas que necessitarem, mas procuramos mostrar às colegas oncologistas que é preciso construirmos outros centros de referência em neurofibromatoses nas demais regiões do país.

Neste sentido, eu e Thalma fomos gentilmente recebidos pelo prefeito de Foz do Iguaçu, Reni Pereira (PSDB), e pela deputada estadual Dra. Claudia Pereira (PSC), com quem conversamos longamente sobre a possibilidade de desenvolvermos um centro de referência em neurofibromatoses naquela cidade.

Neste sentido, o primeiro passo acertado será a indicação pela prefeitura de Foz de um (a) médico (a) interessado (a) que virá participar do nosso curso de capacitação de profissionais da saúde, que será oferecido a partir de fevereiro de 2016.

O curso, que estará aberto a todas as pessoas interessadas, é de responsabilidade do Centro de Referência em Neurofibromatoses do HC-UFMG, em colaboração com a Associação Mineira de Apoio às pessoas com Neurofibromatoses (AMANF) e com a aprovação do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da UFMG como Atividade de Extensão Universitária.


Amanhã falarei sobre a programação do curso de capacitação.









A partir desta quarta-feira, estarei no Congresso Brasileiro de Oncologia, em Foz do Iguaçu, onde farei uma palestra sobre rastreamento de tumores nas neurofibromatoses. Apresentarei o texto abaixo, escrito em colaboração com Nilton, Luíza e Juliana.

Até a próxima segunda.

Rastreamento ou vigilância de tumores nas neurofibromatoses?
Luiz Oswaldo C Rodrigues
Com a colaboração de
Luíza de Oliveira Rodrigues
Juliana Ferreira de Souza
Nilton Alves de Rezende
Centro de Referência em Neurofibromatoses do Hospital das Clínicas
Universidade Federal de Minas Gerais
2015-10-23
Introdução
Aceitei com grande satisfação o convite para realizar esta palestra no Congresso Brasileiro de Oncologia, em Foz do Iguaçu em novembro de 2015, porque para nós, que trabalhamos com as diversas formas de neurofibromatoses, os oncologistas são profissionais fundamentais no manejo clínico deste grupo de doenças genéticas raras.
Com grande probabilidade, apenas entre os brasileiros, metade das 60 mil pessoas com Neurofibromatose do Tipo 1 (NF1) e a maioria das pessoas com Neurofibromatose do Tipo 2 (NF2) e Schwannomatose em algum momento de suas vidas necessitam dos conhecimentos da oncologia para enfrentarem a sua doença.
Para esta palestra, foi proposto o título: “Rastreamento de tumores nas neurofibromatoses”. Como clínico geral, tentarei aplicar às NF aquilo que entendi como o conceito de rastreamento empregado pelos oncologistas e em seguida sugerir algumas especificidades para as doenças com as quais trabalhamos no nosso CRNF.
Rastreamento
Parece-me que o termo rastreamento seriam os esforços realizados na tentativa de identificar tumores suficientemente prevalentes numa determinada população, os quais seriam capazes de causar danos à saúde ou ameaçar a vida caso não sejam precocemente diagnosticados. Além disso, devem ser tumores assintomáticos, mas que, uma vez identificados, possam ser tratados de forma relativamente eficiente, melhorando a qualidade de vida ou a sobrevida das pessoas portadoras do tumor rastreado. Todo este esforço deve apresentar uma relação custo/benefício favorável às pessoas submetidas ao rastreamento, em termos de riscos colaterais e financeiros.
Compreendemos que o termo “rastreamento”, portanto, aplica-se adequadamente a muitos dos tumores que são objeto da atenção dos oncologistas: ou seja, encontrar tais tumores e tratá-los cirurgicamente ou por meio da quimioterapia.
No entanto, nas pessoas com neurofibromatoses precisamos adaptar este conceito de rastreamento, porque: a prevalência de tumores na NF é naturalmente alta; o comportamento natural da maioria deles é benigno; os tumores podem ser sintomáticos ou não; nem sempre há tratamentos disponíveis ou não são necessários para os tumores encontrados; e quando estamos diante de tumores mais agressivos os tratamentos disponíveis não parecem mudar o curso da doença.
Observamos assim que a disposição predominante entre os especialistas em NF diante dos tumores encontrados é mais conservadora, de espera atenta (“watchful waiting”) e principalmente orientada pelos aspectos funcionais e pela qualidade de vida das pessoas com NF.
Isto porque em todas as três formas de NF, além da maioria dos tumores se comportar de forma benigna, sua evolução é imprevisível ao longo da vida. Nas NF, há tumores congênitos e assintomáticos, há aqueles que permanecem décadas sem qualquer manifestação, há aqueles que crescem por algum tempo e se estabilizam por períodos indeterminados, há alguns que regridem espontaneamente sem qualquer tratamento, mas há também uma parte deles que se torna maligna por causas ainda desconhecidas.
Tumores mais comuns nas NF
Os principais e mais comuns tumores nas NF são: neurofibromas e gliomas ópticos na Neurofibromatose do tipo 1 (NF1); schwannomas vestibulares e meningiomas na Neurofibromatose do tipo 2 (NF2); e schwannomas dolorosos na Schwannomatose (SCH).
Na NF1, a maioria dos tumores (85% das pessoas os possuem) é formada por neurofibromas cutâneos que crescem lentamente e que precisam ser removidos apenas por razões estéticas, pois jamais se tornam malignos ou ameaçam a vida.
Também na NF1, cerca de 30 a 50% das pessoas têm neurofibromas plexiformes, que são congênitos e histologicamente benignos, mas que podem causar deformidades. Os plexiformes, assim como os cutâneos, podem exigir correção cirúrgica estética ou funcional, e sempre que possível devem ser retirados, mesmo quando benignos.
Uma parte dos plexiformes (10 a 20%) se transforma em tumores malignos da bainha do nervo periférico (TMBNP), que são agressivos e de difícil tratamento. A maior parte dos estudos sobre tratamentos do TMBNP constitui-se de séries de casos, nos quais a sobrevida de 5 anos está em torno de 30%. Assim, a atenção sobre estes tumores concentra-se na identificação de sinais e sintomas precoces que sejam sugestivos de sua possível malignização, como veremos adiante.
Os gliomas ópticos nas pessoas com NF1 são astrocitomas pilocíticos grau I (WHO) e acometem cerca de 15% das pessoas com NF1, mas 85% deles não produzem quaisquer sintomas e requerem apenas acompanhamento clínico. Mesmo os gliomas ópticos que afetam a visão não parecem ser reduzidos pelos tratamentos quimioterápicos atuais nas pessoas com NF1, sendo, portanto, preferível uma atitude mais conservadora e voltada para os aspectos funcionais e não para o tamanho dos tumores. Apenas uma minoria dos gliomas ópticos na NF1 (1,5%) requer abordagens mais agressivas (cirurgia e/ou quimioterapia).
Na NF2, a qualidade de vida e os aspectos funcionais da audição e equilíbrio são os fatores determinantes do momento mais adequado para a tentativa cirúrgica de redução dos schwannomas vestibulares bilaterais (SVB) quando apresentarem aumento na sua velocidade de crescimento. A abordagem cirúrgica deve ser conservadora, buscando-se a redução do tamanho dos SVB muito mais do que a remoção completa do tumor, para se evitar danos colaterais sobre outros nervos cranianos, como o facial e o ramo do próprio oitavo par condutor da audição.
Também na NF2, apenas 40% dos meningiomas apresentam sintomas suficientes para a sua remoção cirúrgica. No momento, ainda não dispomos de tratamentos medicamentosos comprovados tanto para os SVB como para os meningiomas, apesar de alguns estudos em andamento estarem avaliando os efeitos do bevacizumabe sobre os SVB, cujas respostas preliminares ainda não são animadoras. [i]
As pessoas acometidas pela forma mais rara de neurofibromatose, a Schwannomatose, podem apresentar múltiplos schwannomas (exceto vestibulares), dos quais um ou mais pode se tornar doloroso, momento em que está indicada a sua remoção cirúrgica, quando possível.  Caso não seja possível sua exérese, existe a opção medicamentosa para o tratamento da dor neuropática.
Princípios fundamentais nas NF
Portanto, podemos compreender que uma regra fundamental nas NF é NÃO SE DEVE RETIRAR OU TRATAR UM TUMOR APENAS PORQUE ELE FOI ENCONTRADO.
Outra postura importante diante de uma pessoa com NF é reconhecermos que apesar de não haver CURA para este grupo de doenças, há diversos TRATAMENTOS E CONDUTAS que melhoram a qualidade e aumentam a expectativa de vida das pessoas acometidas.
Diagnóstico diferencial entre NF1, NF2 e Schwannomatose
A primeira conduta IMPORTANTE é realizar o diagnóstico diferencial entre as três formas: NF1, NF2 e Schwannomatose, para que possamos buscar a presença dos tumores mais comuns em cada uma delas. A identificação adequada do tipo de NF evita que as pessoas a procurem neurofibromas na NF2 ou schwannomas na NF1, o que pode prejudicar os tratamentos.
Realizado o diagnóstico com segurança, o passo seguinte é a identificação dos tumores mais comuns em cada um dos tipos de NF: neurofibromas e gliomas ópticos na NF1, schwannomas vestibulares e meningiomas na NF2 e schwannomas dolorosos na SCH.
Em seguida, devemos avaliar a repercussão clínica e funcional dos tumores. Sugerimos a consulta aos fluxogramas que nos orientam sobre cada um dos principais tumores em cada uma das NF e que estão detalhados e disponíveis em nossa publicação recente no periódico Arquivos de Neuropsiquiatria, de 2015. [1]
Condutas em comum nas NF
A avaliação clínica cuidadosa e anual, acompanhada dos estudos de imagem quando necessários, constituem as ferramentas indispensáveis para o bom acompanhamento dos tumores em todas as formas de NF.
Os estudos de imagem nas NF são preferencialmente realizados com ressonância magnética, mas ocasionalmente a tomografia computadorizada com emissão de pósitrons (PET CT) pode ser necessária na NF1.
É preciso salientar que a PET CT com 18FDG constitui um avanço na diferenciação entre neurofibromas benignos e TMBNP na NF1. Num estudo recente[2], numa série de 42 pessoas com NF1 em nosso ambulatório, a utilização de indicadores quantitativos, semi-quantitativos e qualitativos na avaliação de neurofibromas (geralmente plexiformes ou profundos e mais volumosos) aumentou a sensibilidade para 91%, a especificidade para 90% e o valor preditivo positivo para 98% e o valor preditivo negativo para 69% para a transformação maligna, o que nos tem ajudado imensamente nas condutas terapêuticas.
Tanto na NF1 quanto na NF2 encontramos mais raramente outros tumores, além daqueles expostos acima, que são mais frequentes do que na população em geral, como epiteliomas e astrocitomas encontrados em maior frequência na NF2 e que necessitam de abordagem específica, caso a caso.
Alguns deles necessitam da avaliação de profissionais com experiência no seu tratamento específico e as condutas não diferem daquelas tomadas para indivíduos sem as NF. Por exemplo, 1% das pessoas com NF1 apresentam feocromocitomas, que precisam ser urgentemente tratados dentro dos rígidos protocolos destinados às pessoas sem NF1.
Em pessoas com NF1, o câncer de mama (4 a 6 vezes mais comum nas mulheres com NF1 entre 30 e 50 anos de idade), o tumor sólido gastrointestinal (GIST) em adultos e a leucemia mieloide em crianças são mais prevalentes do que na população em geral, o que nos impõe avaliações regulares para sua detecção precoce.
Outro aspecto a ser considerado na conduta diante dos tumores na NF é o tipo de alteração genética (genótipo) que pode estar relacionado com a gravidade geral do quadro (fenótipo). Por exemplo, numa pessoa com NF1 e com suspeita de deleção do gene, devemos aumentar nossa vigilância sobre os plexiformes, neurofibromas espinhais e profundos por causa de sua maior propensão para a malignização.
Também na NF1, as meninas com glioma óptico parecem evoluir de forma mais grave do que os meninos com NF1 e o mesmo tumor.
No mesmo sentido, na NF2 esperamos mais sintomas e evolução menos favorável dos schwannomas vestibulares e meningiomas quando estamos diante de uma pessoa com a forma sistêmica (herdada ou resultante de mutação em célula germinativa) do que diante de uma pessoa com a forma segmentar (ou em mozaicismo).
Conclusão
As neurofibromatoses exigem de nós, especialistas e oncologistas, a postura de vigilância e acompanhamento diante da evolução imprevisível e um pouco diferente dos seus tumores.
As NF nos fazem reformular aquele conhecido pensamento: que tenhamos recursos para identificar e tratar o que deve ser tratado, que tenhamos capacidade de melhorar e acompanhar o que não deve (ou não pode) ser tratado e que tenhamos sabedoria para distinguir uma coisa da outra.


[2]Hérika Martins Mendes Vasconcelos, 2015. Uso do 18F-FDG PET/CT na suspeita de transformação maligna em indivíduos com Neurofibromatose do tipo 1. Dissertação de Mestrado, Programa de Pós-Graduação do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Medicina Nuclear da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG.


[i] Bevacizumabe na NF2A indicação de bevacizumabe vem aumentando e parece-me predominantemente baseada numa revisão feita pelo grupo do Dr. Plotkin, de Boston, Estados Unidos (ver aqui  http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/22805104 ).
Em 2012, eles reviram um total de 31 pessoas com NF2 e schwannomas vestibulares que receberam bevacizumabe como opção de tratamento. Vejamos abaixo algumas características das pessoas tratadas, as quais receberam o medicamento durante cerca de 14 meses (6 meses o tratamento mais curto e 41 meses o mais longo).
A idade mediana das pessoas foi de 26 anos, no entanto, havia pessoas de 17 e de 73 anos, o que me deixa um pouco na dúvida se haveria entre elas algumas pessoas com schwannomas vestibulares, mas sem NF2.
A taxa média anual de crescimento dos tumores antes do bevacizumabe era de 64% de aumento, ou seja, um tumor de 2 cm havia passado para um pouco mais de 3 cm em um ano.
Depois de pelo menos 3 meses de tratamento com o bevacizumabe, a melhora na audição aconteceu em 13 de 23 pessoas (57%), ou seja, antes de começar o tratamento a chance do bevacizumabe funcionar seria mais ou menos como jogar uma moeda para cima e escolher cara ou coroa.
Da mesma forma, a redução (20%) do tamanho dos schwannomas na ressonância magnética aconteceu em 17 de 31 pessoas (55%), ou seja, antes do tratamento temos a metade da chance de dar certo.
Mesmo assim, a pequena redução do volume (20%) pareceu mais relacionada com o edema (líquidos ao redor do tumor) do que com a diminuição da parte sólida do schwannoma.
Depois de um ano do tratamento, 90% das pessoas tratadas permanecia com a audição estável. Não entendi bem como compararam com a possibilidade de, se não fossem tratadas, como estaria a audição?
Segundo os autores da pesquisa, o medicamento havia sido “bem tolerado” pelas pessoas.
No entanto, o tratamento com o bevacizumabe não é simples e seus efeitos colaterais podem ser importantes. Por isso, por exemplo, na Inglaterra, duas equipes médicas independentes entre si devem atestar que a pessoa precisa do tratamento com bevacizumabe para que ele seja iniciado.
O bevacizumabe deve ser administrado às pessoas por infusão venosa a cada 15 dias em ambiente hospitalar, o procedimento dura algumas horas e não pode ser dado a pessoas um mês antes ou depois de uma cirurgia ou durante a gravidez e amamentação.
A ressonância magnética do cérebro deve ser repetida a cada 3 meses para controle.
Dias ou semanas depois de iniciado o tratamento podem acontecer quaisquer destes sinais e sintomas: náuseas, febre, alergia cutânea, inchação dos lábios e obstrução da garganta, falta de ar, tontura, tosse contínua, dor no peito e em diversas partes do corpo, fadiga geral, perda do apetite, diarreia ou constipação, aumento da pressão arterial, úlceras na boca, dificuldade de cicatrização, sangramento, embolia pulmonar, baixa resistência às infecções, insuficiência cardíaca, problema no funcionamento renal e infertilidade.
A minha conclusão é que, infelizmente, o bevacizumabe ainda não é uma BOA opção de tratamento. Por enquanto, creio que devemos seguir o tratamento padrão (ver o post de ontem) e torcer para que outra alternativa melhor seja descoberta.
Outras informações podem ser obtidas em inglês sobre schwannomas ( http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4518745/pdf/jmedgenet-2015-103050.pdf ) e ineficácia do bevacizumabe em diminuir os meningiomas (ver aqui, em inglês outro artigo  http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3605344/ ) em pessoas com NF2. 
O amigo Rogério Lima, fundador da Associação Maria Vitória de Doenças Raras, que realiza neste momento parte do seu doutorado na Inglaterra, está sempre trazendo novas questões interessantes: desta vez, ele nos propõe discutirmos como se aplicam às neurofibromatoses os conceitos ingleses de doença (“disease”) e enfermidade (“illness”).
Rogério antecipa sua impressão de que o termo doença representa a visão médica e biológica, enquanto enfermidade significaria a percepção do ponto de vista da pessoa com um problema de saúde. Concordo com ele.
Não é apenas uma questão de jogo de palavras, não é somente uma questão semântica. Compreender a enorme diferença de visão entre os profissionais de saúde e as pessoas atendidas por eles pode nos ajudar a enfrentar os diferentes desafios para as famílias acometidas por uma das formas das neurofibromatoses.
Do meu ponto de vista como médico, as NF são “doenças” genéticas, ou seja, problemas de saúde causados por mutações aleatórias no DNA (genótipo), defeitos estes capazes de prejudicarem a síntese de uma proteína de uma determinada função biológica, o que resulta em sinais físicos e sintomas (fenótipo).
Como médico, minha formação científica exige que eu defina o tipo da “doença”, classifique sua gravidade, procure saber se os problemas apresentados têm ou não tratamento, quais as melhores alternativas e qual o impacto da doença sobre a qualidade de vida e sua duração. Além disso, devo levar em conta as condições sociais, psicológicas e econômicas relacionadas com a “doença”, assim como o aconselhamento genético e os custos financeiros para o seu acompanhamento.
Como médico, vejo uma pessoa com a “doença” por pouco tempo, no ambiente do ambulatório ou do hospital, e às vezes nosso contato dura menos de uma hora. Meus pensamentos são guiados por estatísticas, informações científicas e expectativas dentro de determinadas possibilidades baseadas em evidências.
Minha postura como médico costuma aparentar segurança, embora as neurofibromatoses estejam repletas de incertezas. As famílias, por sua vez, estão acostumadas ao sistema tradicional de autoridade médica e esperam que eu decida por elas o que é melhor a ser feito pela pessoa doente, mesmo que eu a tenha visto por breves momentos!
Por outro lado, como pai, a história de vida da minha filha é, na verdade, o que importa: sua felicidade, seu bem-estar, seus sonhos e realizações, assim como tudo o que aconteceu com minha família desde o momento em que ela nasceu. Nesta história, estão incluídos aqueles problemas que faziam (ou ainda fazem) sofrer a ela ou a todos nós, por exemplo, sua dificuldade para mamar, o choro de fome em seguida, a desnutrição crônica, a insônia e irritabilidade nos primeiros meses de vida, suas dificuldades de aprendizagem, a triste discriminação na escola ou seus neurofibromas cutâneos em crescimento.  
Como pai, sei o quanto sofremos em busca de respostas para as diversas manifestações da sua “enfermidade” ainda sem diagnóstico. Sabe-se que é muito mais fácil lidar com uma “enfermidade” quando sabemos sua causa e como as coisas vão evoluir, do que quando estamos numa busca desesperada por soluções no escuro. É nesse ponto que os médicos e as famílias se encontram, no diagnóstico, e ele é um momento crítico: as palavras ditas pelo médico podem ser gravadas de forma duradoura e trazerem tranquilidade ou causarem mais sofrimento.
Ao contrário do médico, que passa alguns minutos com a pessoa doente, como pai devo viver todos os dias de vida de minha filha (ou da minha) junto a ela e sua “enfermidade”. Acompanhando cada passo dela, descubro que o cotidiano não permite que seu problema de saúde venha a ser maior do que sua própria pessoa, do que sua vida em toda sua complexidade. A “enfermidade” é uma parte dela, e que pode demandar mais ou menos atenção e cuidados, dependendo da época.
A enfermidade é muito mais complexa do que a doença. A enfermidade envolve a doença e seus afetos e desafetos. A enfermidade pode ser uma parte importante da vida de uma pessoa, mas nunca substitui a pessoa. Por isso, hoje dizemos que minha filha é uma pessoa com neurofibromatose e não uma “neurofibromatótica”. Como também não dizemos mais que fulano é “Down”, ou “esquizofrênico”, ou “anão”. É fundamental lembrar que estamos diante de uma pessoa com Síndrome de Down, uma pessoa com esquizofrenia, ou uma pessoa com nanismo.
Antes de tudo vem a pessoa, que é sempre muito mais do que a sua doença ou enfermidade.

Vamos continuar pensando juntos.
Boa tarde. Sou mãe de um menino de 6 anos e 11 meses, ele trata no HC de Ribeirão Preto desde os 8 meses de vida pois acredita-se tratar de neurofibromatose. Ele tem centenas de manchas café com leite, três nódulos de Lisch do olho direito, é nervoso, super ansioso, não tem concentração, sua coordenação motora é péssima e tem muita dificuldade de aprendizagem, faz tratamento com deformidades da face pois tem dificuldade respiratória. Dr, como mãe eu me sinto aflita, inútil de não poder ajudá-lo a ter uma melhor qualidade de vida. Além do mais, o hospital nunca o encaminhou para um neurologista nem ortopedista. Por favor, me ajude, me oriente, me esclareça por favor. Moro em Cajuru/SP, mas gostaria de saber se poderia levá-lo até BH para consulta, o que preciso para conseguir uma vaga com vocês. Desde já muito obrigada.
Cara R, compreendo sua angústia. Gostaríamos que nossos filhas e filhas vivessem dentro dos sonhos de felicidade que imaginamos para eles. Infelizmente, a vida nos traz imprevistos e tentamos reconstruir o que é possível, mas muitas vezes temos a sensação de que nosso esforço é inútil e não está funcionando como esperávamos.
Pela sua descrição, seu filho deve ter nascido com a neurofibromatose do tipo 1 e se ele está sendo acompanhado no HC de Ribeirão Preto, talvez tenha tido contato com o Dr. Luiz Guilherme Darrigo Junior, que é uma pessoa com excelente conhecimento das neurofibromatoses. Se ainda não o conheceu, procure por ele.
De qualquer forma, você trouxe uma pergunta que pode ser importante para outras pessoas que leem este blog: por que seu filho ainda não foi indicado para ortopedistas e neurologistas?
Quanto ao ortopedista, provavelmente, a avaliação clínica que ele já realizou não identificou nenhum dos principais (mas raros) problemas ortopédicos da NF1. Estas complicações são: uma perna torta (chamada de displasia da tíbia, com ou sem pseudoartrose); ou um dos globos oculares mais saliente para a frente (a chamada displasias da asa menor do osso craniano esfenoide); ou tortuosidades graves da coluna cervical e torácica (chamada cifoescoliose distrófica).
As displasias da tíbia e do esfenoide são problemas congênitos (já estão presentes ao nascimento) e a cifoescoliose geralmente se desenvolve na infância. Portanto, parece-me que estes problemas não foram detectados em seu filho e, portanto, provavelmente não aparecerão nele nunca mais e assim não há necessidade, por enquanto, pelo menos, de consultas com ortopedistas.
Quanto ao neurologista, os principais problemas neurológicos das pessoas com NF1 são os seguintes, em ordem de frequência:  a dificuldade de aprendizagem (mais de 70% das crianças), tumor benigno do nervo óptico (15%), convulsões (10%).
As convulsões geralmente evoluem de forma benigna e respondem bem aos medicamentos prescritos por neurologistas. Os gliomas ópticos precisam de acompanhamento com neurologista durante os primeiros anos, até demonstrarmos que estão estáveis, o que acontece com 85% deles. Uns poucos casos evoluirão com algum prejuízo visual e raros deles precisarão de intervenções cirúrgicas.
Já as dificuldades de aprendizagem, que incluem a baixa coordenação motora de seu filho, não são necessariamente tratadas pelo neurologista, mas sim com apoio psicopedagógico e outras medidas (ver neste blog).
Em conclusão, provavelmente seu filho não precisa da intervenção de um neurologista e está sendo bem acompanhado do ponto de vista clínico no HC de Ribeirão Preto. Além disso, creio que poderiam ser ofertadas a ele outras medidas de apoio para a aprendizagem, incluindo atividades físicas regulares.
Talvez, o que nossas filhas e filhos com NF1 mais precisam é o mais difícil: que transformemos nossa própria tristeza pelo sonho partido em energia para cuidarmos deles, dizendo: amo você como você é.

Até a próxima semana.