Como posso saber mais sobre a NF2, já que seus posts só falam sobre NF1. Tenho muitas dúvidas sobre o futuro. AH de Canoas, RGS.





Cara AH, de fato você tem razão em perceber que a maioria das respostas do meu blog são sobre NF1, porque a NF1 é 8 vezes mais comum que a NF2, o que faz com que, naturalmente, tenhamos mais perguntas sobre NF1.

Sabendo que a prevalência de NF2 na população é de 1 pessoa com NF2 para cada 25 mil pessoas sem a doença, deveríamos ter no nosso Centro de Referência entre as cerca de 800 famílias atendidas pelo menos 100 pessoas com NF2. No entanto, temos apenas 16, ou seja, somos menos procurados pelas pessoas com NF2 ou menos indicados pelos colegas médicos.

Tenho a impressão de que isto acontece porque a maioria dos diagnósticos iniciais da NF2 são feitos diretamente por neurologistas (ou otorrinolaringologistas que encaminham as pessoas aos neurocirurgiões), os quais costumam adotar condutas mais cirúrgicas do que clínicas, o que torna o acompanhamento da NF2 mais restrito aos neurologistas.

No entanto, lamentamos que isto esteja acontecendo, porque que a complexidade da evolução da NF2 precisa muito mais de acompanhamento clínico do que cirúrgico (clique aqui para ver guia de manejo clínico de 2015 publicado na revista Arquivos de Neuropsiquiatria).

Você tem razão também em ficar apreensiva quanto ao futuro, porque embora a NF2 geralmente seja de lenta evolução, esta evolução é imprevisível. Por exemplo, o tempo para um tumor (um schwannoma vestibular, por exemplo) dobrar de tamanho tem sido calculado entre 0,3 e 70 anos, segundo o excelente livro editado pelos médicos Mauro Geller e Aguinaldo Bonalumi Filho, “Neurofibromatose – Clínica, genética e terapêutica” publicado pela Guanabara Koogan no Rio de Janeiro, em 2004.

No entanto, apesar da imprevisibilidade e da ausência de cura definitiva para a NF2, há tratamentos e condutas que podem melhorar qualidade de vida. A expectativa de vida das pessoas com NF2 foi calculada em cerca de 62 anos, mas esta idade foi calculada há mais de uma década com dados antigos e os recursos terapêuticos atuais devem ter melhorado esta expectativa.
Assim, tentarei apresentar abaixo algumas orientações básicas para alguém com o diagnóstico de NF2.
É importante ser avaliado regularmente por médicos (as) com experiência em NF2, porque eles sabem que na NF2 não se deve retirar um tumor apenas porque ele está lá, mas quando existem determinadas razões clínicas para isto (ver guia de condutas da Sociedade Brasileira de Pesquisa em Neurofibromatoses aqui).

É essencial saber se outras pessoas na família também têm NF2. Identificar quem é portador na família pode ser uma tarefa difícil porque algumas pessoas têm sentimentos de raiva ou vergonha por terem uma desordem genética e outras podem ter sinais pouco evidentes da doença.
Apesar desta dificuldade familiar, existem boas razões para saber se alguém mais na família tem NF2, porque todos podem usar estas informações para fazer um planejamento da saúde familiar.
A aceitação de que alguém na família tem NF2 pode levar algum tempo e é importante entender isto. Muitas outras famílias passam por problemas similares e assim os grupos de apoio podem ser uma boa fonte de ajuda. Já existem grupos de suporte em alguns estados brasileiros, como a AMANF em Minas Gerais. Eles são formados por pais ou portadores com o objetivo de oferecer apoio, conselhos e informações para enfrentar as neurofibromatoses.
No entanto, nestas associações de apoio, percebemos que as pessoas com NF1 e NF2 possuem problemas muito diferentes e por isso tenho sugerido que as reuniões sejam separadas para que as demandas de cada grupo sejam melhor discutidas.
As pessoas com NF2 precisam de exames médicos regulares para verificar o estado geral de saúde e acompanhar o crescimento dos tumores, a audição, o equilíbrio e avaliar se surgiram novos problemas. Quaisquer mudanças devem ser notificadas imediatamente ao médico, mesmo antes do prazo para o retorno anual.
Exames de ressonância magnética do cérebro devem ser pedidos por médicos experientes com a NF2 e podem ser necessários no acompanhamento.
A NF2 pode afetar sua audição nos dois lados, por isso você deve estar aberto para todos os meios de comunicação. A leitura dos lábios é uma alternativa interessante para as pessoas com NF2. A linguagem de sinais também abre muitas oportunidades para os deficientes auditivos. Estas condutas são mais úteis quando toda a família aprende os sinais.
As pessoas com NF2 podem precisar de cirurgias complicadas em mais de uma ocasião. Pelo fato de algumas cirurgias poderem levar a deficiências permanentes, como perda de audição, a programação de cirurgias deve ser considerada cuidadosamente. As cirurgias devem ser realizadas por profissionais com experiência em NF2, pois podem levar a complicações.
Em alguns casos, a cirurgia deve ser adiada, pois alguns tumores podem mostrar um crescimento muito pequeno através dos anos e podem ser observados cuidadosamente.
Terapeutas treinados, fonoaudiólogos e oftalmologistas são essenciais no processo de acompanhamento e reabilitação.

Finalmente, é preciso evitar qualquer tratamento não reconhecido pela medicina científica. 
Minha filha K. hoje com 5 anos está com suspeita de ter a NF, pelo que ando me informando seria a tipo1. Por enquanto, tem manchas pelo corpo todo e algumas são grandes, tem falta de Vitamina D, está no mínimo do peso e do comprimento é uma criança totalmente saudável, esperta, hiperativa. Mas tenho medo do futuro pois as informações que temos são muito assustadoras. Gostaria de saber se ela pode acontecer de ter somente essas manchinhas e ser magra e baixinha sem ter aqueles outros sintomas da doença? E teria alguma coisa que ela possa tomar para crescer e engordar? JR de Santa Catarina.

Cara JR, você tocou em diversos assuntos que preocupam muitas famílias: o futuro das crianças e seu desenvolvimento corporal.

Comentei recentemente que uma das maneiras de enfrentarmos nossas angústias sobre o futuro das nossas crianças é procurar viver o presente da melhor forma possível, buscando a felicidade delas hoje, de forma a tornar o amanhã melhor ainda.

Quanto ao desenvolvimento corporal, de fato, as crianças com NF1 geralmente apresentam baixa estatura e baixo peso, o que comentei neste blog recentemente ao falarmos sobre o uso de hormônio do crescimento (clique aqui).

Lembro então que, por enquanto, não há nenhum medicamento ou dieta conhecida e comprovados cientificamente que possam modificar estas características das crianças com NF1, seja seu peso, sua estatura e a chance de desenvolverem os neurofibromas cutâneos (85%) a partir da adolescência.

Também já temos conversado aqui sobre as dificuldades motoras, que são fundamentais para a as habilidades esportivas, atrapalham a socialização das crianças das crianças com NF1, pois geralmente elas têm baixo desempenho nos jogos, nos esportes e nas brincadeiras que dependam da força muscular, agilidade e rapidez de movimentos.

Por causa disso, os (as) colegas preferem outras crianças mais ágeis e habilidosas para brincar, gerando discriminação e isolamento. Principalmente nos esportes, que são praticados para se estimular o espírito da competição, onde ganhar, infelizmente, se torna mais importante do que brincar. Tristemente constatamos que aqueles que são menos habilidosos costumam ficar de fora.

Tomando estas duas questões em conjunto, a pergunta que fazemos é: então insistir com as crianças com NF1 na prática de esportes poderia ser útil para o seu desenvolvimento corporal e social?
Por enquanto, sabemos que a força muscular e a capacidade aeróbica das pessoas com NF1 está diminuída (clique aqui), o que, provavelmente reduz, em termos gerais, sua chance de serem bons atletas. 

No entanto, ainda são poucos os estudos envolvendo treinamentos físicos especiais para pessoas com NF1 (ver o projeto de pós-doutorado da Dra. Juliana F de Souza neste blog clicando aqui) e no futuro saberemos se elas aumentam sua capacidade física de forma semelhante às demais crianças.

Por enquanto, minha sugestão é que devemos descobrir as atividades físicas que dão prazer às crianças com NF1 e que permitam a elas brincarem com crianças mais novas do que elas mesmas, porque as mais novas não percebem os atrasos cognitivos e motores das crianças com NF1.

Mais do que competir, ganhar ou ficar com o corpo forte, o mais importante é ser feliz no encontro com outras crianças, criando laços sociais e amorosos.

PS:  você mencionou que sua filha tem baixa de vitamina D. Então, recomendo para ela uma dieta adequada, atividades físicas realizadas no sol e/ou banhos de sol diariamente (clique aqui) e se ainda assim as novas dosagens de Vitamina D no plasma continuarem baixas, consulte o pediatra sobre a necessidade de suplementação de Vitamina D (clique aqui).
Na última reunião da Associação Mineira de Apoio às Pessoas com Neurofibromatoses (AMANF) um casal trouxe a questão se a fé religiosa poderia afetar o desenvolvimento da doença.



Sabemos que boa parte da população brasileira tem algum tipo de fé religiosa e a maioria é formada por cristãos (católicos, protestantes, evangélicos e espíritas), portanto, esta é uma pergunta importante e deve ser considerada. No entanto, é interessante notar que em mais de uma década de participação nestas reuniões mensais da AMANF é a primeira vez que me recordo deste tema ter sido colocado em discussão.
A possibilidade de a fé religiosa afetar a nossa saúde tem sido defendida por pessoas que acreditam que existe algo além da vida material. Por causa disso, alguns cientistas já tentaram estudar de forma objetiva se a fé, orações e procedimentos rituais religiosos poderiam mudar o curso das doenças. Os estudos científicos que pude ler até hoje não conseguiram demonstrar qualquer efeito físico (benéfico ou maléfico) sobre doenças objetivamente diagnosticadas como cânceres, por exemplo.
Por outro lado, não conheço qualquer estudo científico sobre os benefícios ou prejuízos da religiosidade de uma pessoa sobre a evolução natural da sua neurofibromatose, portanto, não posso responder com segurança sobre essa questão que nos interessa mais de perto.
Considerando as doenças em geral, sabe-se que ser diagnosticado com uma doença que ameaça a vida (como um câncer) causa grande estresse emocional e diminui a qualidade de vida. Há evidências de que o estresse excessivo leva a resultados piores no tratamento, por isso, reduzir o estresse mental é um dos objetivos dos tratamentos psicológicos e psiquiátricos. Algumas técnicas alternativas (yoga, meditação, etc.) também podem ser utilizadas. No entanto, uma revisão recente destas práticas alternativas para reduzir o estresse mental não incluiu as atividades religiosas entre elas (ver aqui artigo completo).

Por outro lado, considerando os problemas de comportamento (na NF1, especialmente), podemos indagar se a religiosidade teria algum papel nas doenças mentais. Outra revisão recente publicada pela Associação Brasileira de Psiquiatria (ver aqui o artigo completo) examinou os resultados de mais de 3 mil artigos científicos sobre as relações entre religiosidade e saúde mental. Os autores afirmam que há uma relação complexa entre religiosidade e saúde mental e que não podemos concluir de forma simplificada se a fé é “boa” ou “má”. Eles dizem que uma parte dos pacientes se beneficia enquanto outra parte piora em função sua religiosidade. Ou seja, a preocupações religiosas e espirituais podem tanto fazer parte do tratamento quanto do problema. Eles concluem que são necessários mais estudos científicos para se ter uma visão segura do assunto.
Em nosso Centro de Referência, parece-me que a maioria das pessoas com fé religiosa aceita como “vontade de Deus” o fato de possuírem uma das formas de neurofibromatose. Mesmo que não compreendam e/ou não questionem o motivo divino para terem “recebido” a doença, reagem positivamente na busca de melhor qualidade de vida, seguem os tratamentos necessários e não se culpam demasiadamente.
Outras pessoas com algum tipo de religiosidade percebem a doença como um castigo divino, perguntam-se o que fizeram de errado e acreditam que somente as orações e a fé poderão “resolver” o problema “quando Deus quiser”. Já ouvi, inclusive, a justificativa de que a neurofibromatose seria o resultado de erros em vidas passadas e a reencarnação com aquela doença seria uma forma de expiação do pecado original cometido.
Infelizmente, estas crenças fatalistas, deixando tudo “nas mãos de deus”, têm sido responsáveis por algumas famílias descuidarem do acompanhamento clínico de doença, às vezes perdendo-se o momento certo para fazer intervenções que poderiam modificar a qualidade ou mesmo salvar a vida da pessoa com neurofibromatose.
Como sou ateu, acredito na vida como uma grande maravilha da natureza, onde surgimos como seres humanos que precisam viver em sociedades, para os quais a solidariedade e o respeito ao próximo são fundamentais. Eu acredito que existe vida antes da mortee por isso deve ser vivida hoje, aproveitada para construir um amanhã melhor e respeitada sempre.
Penso, portanto, que os direitos de todos que devem ser garantidos, inclusive o direito de acreditar ou não em religião. Minha função no Centro de Referência e neste blog é apenas a de aconselhar e oferecer informações sobre as neurofibromatoses, e por isso respeito as escolhas de cada pessoa sobre o que deseja fazer com sua própria vida.
No entanto, especialmente quando se trata de crianças, as quais ainda não alcançaram a maturidade para escolher se querem ou não acreditar numa determinada religião, tenho a esperança de que a fé dos seus pais ajude a medicina a cuidar delas e não seja um obstáculo para sua felicidade.

Ainda sobre a felicidade de nossas crianças com NF1, lembrei-me de uma família que atendi no nosso Centro de Referência em Neurofibromatoses: a menina de 11 anos (a única com NF1), que vou chamar de Mariana, a mãe (profissional da saúde) e a avó (profissional da educação aposentada).
Notei que todas as perguntas que eu fazia à Mariana, ela olhava para a mãe e para a avó antes de responder. Este é um comportamento bastante comum entre as crianças com NF1 que tenho encontrado, revelando uma certa dependência psicológica para com os pais, ou seja, uma dificuldade em saber o que elas próprias desejam.
Também já observei que os pais (principalmente as mães) se apressam em retirar a roupa das crianças, mesmo daquelas que já podem fazer isto sozinhas, quando peço a elas para ficarem de cueca ou de calcinha para que eu possa pesá-las, ver sua estatura e fazer o exame físico. Geralmente, preciso explicar aos pais que a habilidade em retirar as roupas já faz parte do meu exame neurológico, e por isso preciso ver como a criança se organiza com as próprias roupas. Este comportamento também sinaliza uma certa superproteção comum entre os pais de crianças com NF1.
Outro indicativo da superproteção dos pais se revela nas constantes correções de postura (senta direito, fica bonitinha), de proibições (não mexe no carimbo do doutor, tira a mão daí, fica sentado, etc.), mesmo depois que eu digo que pode mexer, que pode subir na balança, que pode abrir a torneira da pia e brincar com a água. Outro dia, durante a consulta, uma mãe de cerca pouco mais de 60 anos corrigiu com a ponta dos dedos o batom de sua filha de (com NF1) sem pedir permissão à ela, como se a filha fosse ainda uma menina, apesar dela ser uma profissional de 40 anos bem sucedida.
Quando Mariana demorava um pouquinho para responder, a mãe ou a avó respondiam em seu lugar, usando a terceira pessoa: ela gosta disso, ela faz aquilo, ela sente aquilo outro. Diante desta interferência da família, Mariana dizia: – Não! Não é isso! E ficava com os olhos marejados de lágrimas. Praticamente em tudo elas pareciam discordar, inclusive sobre os próprios sentimentos da Mariana. Por exemplo, quando a mãe disse: – Ela morre de medo disso. Mariana retrucou: – Não, não tenho medo!
Ao longo da entrevista e do exame, fui notando que a Mariana se debruçava cada vez mais sobre a mesa em minha direção, se aproximando de mim e olhando-me nos olhos mais diretamente, apesar das primeiras interferências de sua mãe e sua avó para tentarem “corrigir sua postura”.
Num dado momento, comentei diretamente com a Mariana: parece que você não concorda em nada com sua mãe e sua avó. Ela, mais uma vez com os olhos marejados, disse: Elas exigem muito de mim!
Tenho a impressão de que esta é uma resposta chave para a questão da felicidade das crianças com NF1.
Se para as pessoas que não possuem NF1, a sociedade que criamos ao longo de séculos (capitalista, competitiva, elitista e desumana) já gera muita infelicidade e sofrimento, podemos imaginar o que deve ser  uma pessoa com NF1 viver nesta mesma sociedade, pois quem tem NF1 precisa de um pouco mais de tempo para aprender e realizar suas tarefas.
Lembro-me de minha esposa Thalma, andando com nossas duas filhas a caminho da escola. Ana, – a mais velha, ágil, esperta, correndo na frente, e a segunda, – Maria Helena, com NF1, mais lenta e distraída. Thalma dizia: – Espera, Ana… Vamos, Maria Helena!
E por que exigimos tanto de nossas crianças?
Porque preocupamo-nos com seu futuro, esperamos que sejam capazes de trabalhar, de serem independentes como adultos.
Mas como esperar que sejam adultos independentes, se não os deixamos tirar a própria roupas nem responder sobre seus próprios sentimentos, hoje, quando já são capazes de fazer isto sozinhos?
Porque queremos que sejam felizes no futuro.
Mas, as neurofibromatoses são doenças imprevisíveis, não sabemos o que nos espera com certeza. Além disso, com ou sem NF, quem sabe o que acontecerá no futuro?
Por isso, especialmente para quem tem NF, não existe felicidade no futuro: a felicidade é no presente, é hoje. Fazer o que for possível para ser feliz agora, dentro das possibilidades de cada um e de cada dia.
E que a felicidade de hoje nos ajude a construir um mundo melhor para todos no amanhã.

Bom final de semana.

Cara VC, separei esta parte da sua pergunta, por achar que ela é fundamental.
A felicidade é um estado de humor determinado por muitos fatores diferentes em cada uma das pessoas. Apesar da felicidade ser individual, creio que uma parte dela vem da nossa maior ou menor adaptação ao nosso próprio meio social.
Para compreendermos um pouco as dificuldades de adaptação social de nossos filhos e filhas com neurofibromatose do tipo 1, vou reproduzir as conclusões de uma tese de doutoramento da pesquisadora C. Dilts, recentemente apresentada na Universidade de Utah, nos Estados Unidos, que foi comentada pelo doutor David Viskochil num artigo de 2013 (ver aqui artigo completo). Dr Viskochil já esteve aqui no Brasil conosco, no Simpósio que realizamos em 2009.
Segundo ele, a adaptação social das crianças com NF1 pode ser influenciada pelos déficits cognitivos, pelas dificuldades de aprendizado, pela desatenção e hiperatividade, além de alguns comportamentos semelhantes aos autistas (já comentados aqui).
A Dra. Dilts observou que entre os déficits cognitivos, as habilidades motoras das crianças com NF1 (pouca força, menor agilidade, baixa habilidade para esportes e brincadeiras físicas, etc.) influenciam os seus comportamentos adaptativos e isto é foi o problema cognitivo mais frequente.
Ela também verificou que o molestamento das crianças com NF1 por parte dos colegas foi o problema social mais comum. Em segundo lugar veio o comportamento mais infantil das pessoas com NF1.
Finalmente, ela observou que a aceitação de uma pessoa adolescente com NF1 por parte das demais crianças é prejudicada pela menor maturidade das crianças com NF1 proporcionalmente à sua idade.
Considerando estas observações, com as quais eu concordo a partir da experiência clínica no nosso Centro de Referência, temos orientado as famílias a estimularem (ou aceitarem) a convivência das crianças e adolescentes com NF1 com grupos de idade um pouco mais jovens (variando em cada caso), onde elas serão mais aceitas em função da sua própria imaturidade causada pela doença, pois terão interesses parecidos com as crianças mais novas.

Talvez seja um dos passos possíveis para tentarmos ajudar nossas crianças com  NF1 a serem mais felizes.
Pesquisando sobre a neurofibromatose, encontrei a Associação Mineira de Apoio às Pessoas com Neurofibromatoses (AMANF) e tomei a liberdade de escrever ao senhor. 

Quando meu filho tinha 6 meses, a pediatra pediu uma ressonância, pois desconfiava de neurofibromatose. Ele tem mais de 6 manchas café com leite e 2 sardas nas axilas e na virilha. Na época, não fiz a ressonância, pois ela disse que a doença não teria cura. Agora, ele tem 03 anos e apresentou queda na curva do crescimento, motivo pelo qual o levei ao endocrinologista. Nos exames de sangue, ele constatou a pouca produção de hormônio do crescimento e pediu a ressonância magnética. Na ressonância, não havia nada na hipófise, mas foram encontrados alguns hipersinais em T2…, algo assim. Não sou da área e, por isto, não entendi direito. A radiologista disse que teria que investigar mais sobre a neurofibromatose e procurar um neuropediatra.

Bom, o fato é que agora estou sem saber o que fazer e realmente preocupada com o meu pequeno. Quem eu posso procurar para confirmar este diagnóstico? Qual profissional o senhor indica? A mancha café com leite da neurofibromatose é igual à mancha de nascença? O que posso fazer para ajudar meu filho a ser feliz? Abraços, VC.
Cara V, obrigado pela confiança em entrar em contato comigo.
De fato, sua história é bastante parecida com a de muitas famílias que sofrem com o desconhecimento dos profissionais de saúde sobre as neurofibromatoses, porque elas são doenças raras.
A baixa estatura é um sinal comum na neurofibromatose do tipo 1 (NF1), que me parece ser o caso do seu filho pois ele apresenta 2 dos critérios diagnósticos (5 ou mais manchas café com leite, que são manchas de nascença, e sardas axilares nas axilas e virilhas, chamadas efélides pelos dermatologistas). 
Não há necessidade de reposição de hormônio do crescimento nas pessoas com baixa estatura na NF1. Primeiro, porque apesar de não sabermos a causa exata da baixa estatura de cerca de metade das crianças com NF1, sabemos que não é a redução do hormônio do crescimento que provoca o problema. Segundo, porque temos a suspeita de que o tratamento com hormônio do crescimento em pessoas com NF1 pode desencadear ou acelerar o crescimento dos neurofibromas.
Outro sinal comum nas crianças com a NF1 são as hiperintensidades na ressonância magnética do cérebro, que não passam de pequenos aumentos benignos dos tecidos cerebrais, sem qualquer repercussão clínica conhecida até o momento.
A confirmação do diagnóstico de seu filho pode ser feita por um (a) pediatra que comprove nele dois ou mais critérios diagnósticos (clique aqui para obter o artigo em inglês, imprima-o e leve ao profissional de saúde que está cuidado do seu filho).

Outra alternativa é procurar um dos centros de referência como o nosso e de outras entidades públicas de saúde (veja neste blog “onde tratar” o centro de referência mais perto de você).
Nas próximas semanas, vamos imprimir a terceira edição da cartilha sobre NF1 “As Manchinhas da Mariana”, com novas informações e correções.

Três mil exemplares da segunda edição já foram entregues a pessoas e famílias com NF1 e ela foi traduzida para o inglês e o alemão por associações de pacientes dos Estados Unidos e Alemanha. 

Veja (clique aqui) a versão atual e mande suas sugestões e críticas até o dia 10 de setembro de 2015.


Obrigado.
… tenho uma filha de 10 anos com NF1, tem dificuldade de aprendizagem na escola e problemas na fala. Tenho medo que além desses problemas ainda apareçam, com a puberdade, os temidos fibromas apareçam. Fazemos acompanhamento com um neurologista, oftalmologista e pediatra, que até o momento não encontraram nada de muito significativo. Há outra forma de acompanhar melhor ou estamos no caminho certo? Há especialista na minha cidade? MPPO de Vitória, ES.

Cara M, obrigado por levantar esta dúvida.

Começo respondendo pelo final das suas perguntas: sim, em sua cidade já existe uma associação de apoio a pessoas com neurofibromatoses, atualmente coordenada pelo professor Elcio Neves (Rua José Motta Fraga 149, Bairro São Cristóvão, Vitória, ES – CEP 29048-470, elcioneves1602@hotmail.com) Acho que um contato com ele poderá ser enriquecedor para você e sua família.

Quanto aos problemas de sua filha, sim, existe a possibilidade de que ela venha a desenvolver neurofibromas cutâneos (85% aproximadamente), mas quando eles aparecem isto acontece lentamente e eles podem crescer bem devagar ou ficar estáveis por algum tempo. Estes neurofibromas cutâneos podem ser retirados por pequenas cirurgias se incomodarem esteticamente. Não existem ainda medicamentos para evitar ou diminuir os neurofibromas cutâneos, mas nossa esperança é de que um dia eles estejam disponíveis de forma segura.

Parece-me que, neste momento, o mais importante é cuidar da dificuldade de aprendizado de sua filha, procurando socializá-la em seu grupo da mesma idade. Para isto deve exigir seus direitos de atenção especial na escola.

Vejo também que você realiza, como muitos outros pais de crianças com NF1, a chamada “via médica”, passando de um especialista para outro, ano após ano. Infelizmente, devido às neurofibromatoses serem doenças raras, a maioria dos profissionais da saúde conhece de forma superficial os problemas gerais destas doenças (alguns costumam dizer, isto é genético, o tumor é benigno e NÃO HÁ NADA A FAZER, etc.).

Na verdade, as neurofibromatoses não têm CURA, mas têm TRATAMENTOS, os quais melhoram muito a qualidade de vida das pessoas acometidas e diminuem o sofrimento das famílias. Mas a maioria dos profissionais sem experiência com neurofibromatoses desconhece estas condutas (ver nosso manual de condutas publicado este ano, por enquanto em inglês, clicando aqui, que você pode imprimir e levar para o médico de sua filha).

Por medida de segurança diante da sua pouca familiaridade com a doença, muitos médicos solicitam a opinião de outros especialistas (geralmente neurologistas, dermatologistas, oftalmologistas), os quais, por sua vez, também conhecem pouco as neurofibromatoses e pedem exames complementares (ressonâncias, tomografias, biópsias, exame de DNA, etc.).

Diante dos resultados dos exames, geralmente normais ou com alterações pouco compreendidas por aqueles que não conhecem as NF, por exemplo, algumas “manchinhas” na ressonância do cérebro (chamadas tecnicamente de hiperintensidades ou hamartomas), os médicos pedem outros exames ou recomendam controles periódicos, nos quais tudo começa de novo.

Pior é quando os médicos indicam tratamentos agressivos para problemas que não precisam deles, como no caso dos gliomas ópticos que na imensa maioria das vezes são benignos, não causam qualquer problema e há inclusive casos documentados de desaparecimento espontâneo do tumor com o passar dos anos.

A maneira de enfrentarmos esta questão é investirmos na capacitação das famílias para lidarem com a doença, porque somente elas podem conhecer a sua doença de forma mais profunda e assim ajudarem os próprios médicos a conduzirem cada caso corretamente.

Para isto é preciso as famílias se organizem e lutem para que toda a informação científica construída sobre as neurofibromatoses esteja disponível em termos compreensíveis para as pessoas que não têm formação em biologia e medicina.

Como parte desta luta, o professor Nilton Alves de Rezende apresentou e foi aprovado na semana passada no Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais um curso de capacitação em neurofibromatoses para familiares e profissionais da saúde, o qual começará a ser oferecido regularmente a partir de 2016.

Esperamos que as famílias venham e se habilitem para cuidar melhor de si mesmas, reduzindo a via médica e seu sofrimento desnecessário.
Sou portadora de neurofibromatose do tipo II, tenho várias manchas café com leite espalhadas pelo corpo, um glioma no quiasma no nervo óptico que não atrapalha minha visão, dificuldade de concentração moderada. Faço acompanhamento com neurologista e oftalmologista. Recentemente li uma reportagem sobre o enquadramento da enfermidade como deficiência física para fins de concurso público. Gostaria de saber se existe essa previsão, se meu caso pode ser considerado dessa forma e os motivos que justificariam esse enquadramento. Grata pela atenção MPC Belo Horizonte, MG.
Cara M, obrigado por trazer sua dúvida, que me parece comum a muitas pessoas, inclusive profissionais da saúde.
Até o final da década de 1980, não sabíamos que a NF1 e a NF2 eram duas doenças genéticas completamente diferentes entre si. Acreditávamos que havia apenas uma única doença, chamada de Doença de von Recklinghausen, que se apresentava de diferentes formas ou tipos. Isto porque todas as neurofibromatoses têm em comum o fato de apresentarem múltiplos tumores benignos ligados ao sistema nervoso e manchas cutâneas.
A questão só ficou compreendida, quando se descobriu que o problema genético da NF1 está num gene localizado no cromossomo 17 e o problema genético da NF2 está noutro cromossomo, o 22. Por isso, não usamos mais o termo Doença de Recklinghausen, pois ele pertence a um momento histórico diferente do conhecimento científico sobre as neurofibromatoses.
Como esta descoberta tem menos de 30 anos, há muitos médicos que ainda não foram informados sobre ela e continuam misturando os problemas da NF1 com os da NF2. Por exemplo, hoje sabemos que a presença de um glioma óptico (um tumor benigno do nervo óptico) e cinco ou mais manchas café com leite são dois critérios suficientes para fazermos o diagnóstico de NF1.
Por outro lado, de forma resumida, para o diagnóstico de NF2 é preciso encontrarmos tumores bilaterais no nervo vestibular (do equilíbrio), chamados de schwannomas. Ou então um schwannoma vestibular associado a dois ou mais meningioma (outro tumor benigno que acontece nas meninges do cérebro).
Também sabemos que os gliomas ópticos, muitas manchas café com leite e dificuldades de atenção praticamente não fazem parte da NF2, e sim da NF1. Assim, minha impressão é que você deve ter a NF1 e não a NF2, como mencionou.
Quanto aos direitos dos portadores de necessidades especiais, de fato, uma lei estadual reconheceu as necessidades especiais também para as pessoas com neurofibromatoses (veja que na lei eles ainda chamam de Doença de Recklinghausen). 
Esta lei trouxe, principalmente, mais uma forma de reconhecimento público para as neurofibromatoses, aumentando a sua representação social, o que tanto precisamos.

No entanto, para ser beneficiária da lei, a partir de um laudo médico, a pessoa com NF tem que se submeter a uma perícia no INSS que comprove a sua necessidade especial. Procure neste blog, no assunto Leis para ter mais informações sobre como proceder num concurso público. 
Minha filha foi diagnosticada com pseudoartrose congênita da tíbia com 1 ano depois de uma fratura, e com dois anos o médico disse que ela tem a NF também. Ela tem 3 anos, mas o médico não deu nenhum prazo para cirurgia, isso é o que me deixa mais angustiada. Ela poderia começar algum tratamento? Tem alguma faixa etária para cirurgia? J de Canoas, RGS.

Cara J. Obrigado por tocar neste assunto, um dos problemas raros nas crianças com NF1, mas que trazem grandes preocupações para pais e profissionais da saúde: a pseudoartrose.

Cerca de 2% das crianças com NF1 nascem com um defeito de formação e crescimento de um ou mais ossos longos (geralmente uma das tíbias), chamado de displasia óssea, que torna mais frágil uma parte do osso.

Esta maior fragilidade do osso provoca fraturas espontâneas, ou seja, mesmo sem qualquer tipo de traumatismo: o simples ficar de pé pode ocasionar a primeira fratura.

Como a região da fratura apresenta a displasia, o osso não se consolida, permanecendo a fratura como se fosse uma outra articulação, daí o nome “pseudo” (falsa) “artrose” (articulação alterada).

Por enquanto, não existe um medicamento que cure definitivamente a pseudoartrose da NF1, mas dispomos de tratamentos para melhorar a qualidade de vida das crianças, que buscam torna-las capazes de realizar suas tarefas do dia a dia.

Por exemplo, se a displasia for identificada antes que ocorra a primeira fratura, pode-se tentar aparelhos ortopédicos que procuram proteger o osso frágil.

Depois, quando ocorrem a primeira ou a segunda fraturas espontâneas, podem ser realizadas cirurgias de reparação com enxertos ósseos para a formação de uma estrutura mais firme para o osso, assim como fixadores metálicos para que a fratura cicatrize.

Infelizmente, a maioria destas tentativas não resolve o problema. Assim, a recorrência das fraturas espontâneas acaba fazendo com que a criança seja submetida a internações repetidas, à colocação de aparelhos ortopédicos que causam dor e limitam suas atividades, ao afastamento das outras crianças e da escola, levando a grande sofrimento da criança e sua família.

Devido ao frequente insucesso destas cirurgias, muitos especialistas em neurofibromatoses recomendam a substituição daquela parte da perna por uma prótese mecânica, porque os resultados mostram que em pouco tempo a criança está adaptada e com mais liberdade e menos sofrimento para viver.

Sei que é tremendamente difícil para os pais aceitarem a amputação de parte da perna de sua criança querida, mas a qualidade de vida imediata e a longo prazo pode compensar os sofrimentos repetidos que a criança teria com múltiplas cirurgias ineficazes.

Novos tratamentos estão sendo estudados, como, por exemplo, o desenvolvimento de uma proteína que aumente a formação do osso, mas todos eles ainda precisam de comprovação de que funcionam de fato.