Gostaria de saber quais são as implicações da NF1 e da NF2 para a aprendizagem? O que as/os profissionais da Educação precisam saber? AB de Belo Horizonte, MG.
Cara A. Obrigado por tocar num assunto tão importante para as famílias com neurofibromatoses.
Vou começar pela neurofibromatose do tipo 2 (NF2), porque as pessoas com NF2 geralmente não apresentam dificuldades de aprendizado relacionada com a doença. Além disso, os sintomas que poderiam causar dificuldades de comunicação (baixa audição) também começam a se manifestar habitualmente a partir do final da segunda década de vida. Alguns casos mais graves podem apresentar alguns sinais da NF2 (baixa audição, redução da acuidade visual e outros sintomas) mais cedo e assim, de alguma forma, comprometer o aprendizado.
Por outro lado, na neurofibromatose do tipo 1 (NF1), as dificuldades de aprendizado são a principal queixa das famílias e atingem de forma evidente cerca de 70% das crianças com NF1. Além disso, verificamos que 100% das crianças com NF1 apresentam desordem do processamento auditivo (ver postagens anteriores sobre esta questão). Portanto, a maioria das crianças com NF1 apresentará problemas de aprendizado.
Sabendo que 1 em cada 3 mil crianças nasce com a NF1, os profissionais da Educação têm alguma chance de encontrar um menino ou uma menina que precisa de atenção especial para que possa desenvolver seu potencial humano e ser feliz.
Uma vez que os graus de dificuldade de aprendizado variam muito de uma criança para outra, não há como sugerir uma conduta padronizada para todas as crianças com NF1. No entanto, creio que todas elas têm, pelo menos, dois aspectos em comum: todas precisam de mais tempo para realizarem suas tarefas (paciência na hora do para casa, por exemplo) e todas desempenham abaixo do que poderiam quando submetidas à pressão de tempo (provas, testes, apresentação oral, por exemplo).
Outra questão importante que os educadores podem ficar atentos é quanto aos problemas de comportamento das crianças com NF1. Já comentamos aqui que cerca de 1 em cada 3 crianças com NF1 preencheria os critérios para o diagnóstico de autismo e outro terço delas ficaria bem próximo do mesmo diagnóstico (ver postagens anteriores sobre autismo e NF1).

Estas observações acima indicam que a maioria das crianças com NF1 são pessoas com necessidades especiais que precisam ser atendidas pelos educadores de acordo com o perfil psicológico e cognitivo das crianças com NF1 (ver comentários anteriores sobre dificuldades de aprendizado na NF1).
Meu filho tem 3 anos e 2 meses e desde que nasceu tinha algumas pequenas manchinhas acastanhadas, umas 7 no total. Apenas quatro delas com mais de 0,5cm (uma delas bem grande abaixo do umbigo). Agora estão aparecendo outras menores pelo corpo, umas 15 no total (não na região das axilas nem da virilha), um pouco maiores que pintas, mas sem forma definida, e parece que está querendo aparecer uma grande no peito. Tenho dermatologista marcado, mas estou ansiosa. Se puder esclarecer uma dúvida, eu agradeço: até que idade as manchas da doença costumam aparecer? Digo, se até o momento ele não tem 6 manchas com mais de 0,5cm, ainda poderiam aparecer? Poderiam me recomendar algum médico na região de Campinas? Obrigada! G. de Indaiatuba, SP.
Cara G. Obrigado pela sua pergunta relativamente simples, mas que preocupa muitas famílias. No caso do seu filho, com 3 anos e pouco, creio que todas as manchas café com leite que são típicas da neurofibromatose do tipo 1 (ver foto de uma pessao com NF1 atendida no CRNF) já deveriam ter aparecido, pois elas são praticamente congênitas, ou seja, estão presentes ao nascimento ou se tornam visíveis nos primeiros meses de vida das pessoas com NF1.
No entanto, pela sua descrição, não é possível confirmarmos se seu filho tem ou não a NF1, sem o exame de um profissional experiente. A presença de manchas café com leite em qualquer número deve sempre ser avaliada por um profissional com experiência em neurofibromatoses, pois as outras doenças do grupo (NF do tipo 2, Schwannomatose e Síndrome de Legius) também apresentam manchas café com leite, às vezes em menor número.
É preciso também lembrar que pessoas sem qualquer doença podem apresentar uma ou duas manchas café com leite.
Por outro lado, as pequenas manchas acastanhadas que relatou, tanto podem ser efélides (quando nas axilas ou na região inguinal), como geralmente acontece na NF1, mas também podem ser outras alterações cutâneas (nevos ou outras pigmentações). Para isso, nada melhor do que a opinião de um (a) dermatologista, para fazer o diagnóstico diferencial entre estas possibilidades.

Quando são as efélides da NF1, elas podem estar presentes desde os primeiros meses de vida, mas podem aumentar de número ao longo da vida (sem aumentar visivelmente o tamanho), especialmente até a vida adulta.
O agradecimento de ontem foi dirigido às pesquisadoras que têm dividido seu tempo de trabalho com a importante tarefa de criar novos seres humanos sadios, éticos e solidários. 
Meu comentário deu origem a diversas perguntas sobre, afinal, quais as pesquisas em neurofibromatoses que estão sendo realizadas na UFMG?

Acho importante, então, descrever em poucas linhas quais as questões que estão sendo estudadas neste momento. Para descrevê-las, preciso lembrar que o conhecimento científico é construído com uma visão de cada época, utilizando-se os recursos disponíveis e a partir do conhecimento anterior acumulado por outros estudiosos, ou seja, o conhecimento científico é determinado pela sua história.

As condições históricas do nosso grupo de médicos (as), fonoaudiólogas, nutricionistas e psicólogas envolvidos com as NF na UFMG são as seguintes:

1)      Somos um grupo iniciante – apenas 11 anos de criação do Centro de Referência em NF, comparados com os 35 anos do primeiro centro criado pelo pioneiro Vincent M Riccardi nos Estados Unidos em 1978.
2)      Temos poucos recursos financeiros – cerca de 50 mil reais do Conselho Nacional de Desenvolvimento da Pesquisa (CNPq), comparados às centenas de milhões de dólares do Children’s Tumor Foundation nos Estados Unidos, por exemplo.
3)      Nossa formação profissional é mais clínica do que laboratorial – comparada à maioria dos estudos realizados na Europa, Estados Unidos e Austrália.

Mesmo nestas condições, temos levado para a comunidade científica internacional algumas ideias importantes, entre as quais destaco aquelas que já têm reconhecimento (entre parênteses, as pessoas que coordenaram cada pesquisa):

1)      A redução da força muscular, da capacidade física e do controle da temperatura corporal e aumento de quedas nas pessoas com NF1 (Juliana Souza, Luciana Madeira, Maria Helena Vieira).
2)      As alterações na musculatura envolvida na fala e a desordem do processamento auditivo e sua relação com o aprendizado em pessoas com NF1 (Carla Menezes, Pollyanna Batista).
3)      A menor glicemia de jejum e menor chance de haver diabetes tipo 2 e suas relações com o estado nutricional e padrão alimentar em pessoas com NF1 (Aline Martins, Márcio Souza).
4)      O perfil psicológico e cognitivo de pessoas com NF1 avaliado por meio de testes psicológicos especiais (Alessandra Cerello, Daniele Costa).

A partir destes primeiros passos, temos dado continuidade a alguns estudos possíveis dentro das nossas condições históricas (e as pessoas responsáveis entre parênteses):

1)      Efeitos do treinamento auditivo em pessoas com NF1 e desordem do processamento auditivo (Pollyanna Batista).
2)      Exame oftalmológico de pessoas com NF2 e NF1 por meio da tomografia de coerência óptica e sua relação com a gravidade da doença (Vanessa Waisberg).
3)      Análise das imagens dos neurofibromas de pessoas com NF1 por meio da tomografia por emissão de pósitrons e sua relação com a gravidade da doença (Hérika Martins).
4)      Análise de marcadores inflamatórios e biomoleculares no sangue de pessoas com NF1 e sua correlação com a presença de neurofibromas plexiformes e outros tumores (Luíza Rodrigues, Cinthia Santana).
5)      Análise do DNA de pessoas com NF1 para identificação de determinadas mutações e suas relações com a gravidade da doença (Frederico Malta).
6)      Avaliação das habilidades musicais em pessoas com NF1 e NF2 (Bruno Cota).
7)      Uso de videogame especial para avaliação e treinamento simultâneos de controle cognitivo e aptidão física em pessoas com NF1 (Juliana Souza, pós-doutorado na Califórnia, Estados Unidos).


Quem desejar contribuir ou ser voluntário em qualquer uma destas pesquisas (exceto a sétima, que será realizada com voluntários norte-americanos), envie-me um e-mail (rodrigues.loc@gmail.com) que encaminharei ao responsável pelo estudo.
Há uma coisa mais importante do que gerar novos conhecimentos sobre as neurofibromatoses: gerar novos seres humanos!

É isto que algumas pesquisadoras estão fazendo no Centro de Referência em Neurofibromatoses do Hospital das Clínicas da UFMG.

Dra. Vanessa Waisberg, oftalmologista e estudante de pós-graduação em Medicina Molecular, acabou de trazer ao mundo o Rafael. Ela está estudando algumas alterações que acontecem na retina das pessoas com Neurofibromatose do tipo 2 e seu trabalho está bem avançado. Seus resultados poderão nos ajudar muito no diagnóstico e aconselhamento familiar, assim como no acompanhamento das pessoas com NF2. A pausa para cuidar do seu bebê vai trazer muito mais sabedoria à Dra. Vanessa, o que só vai ajudar na construção do conhecimento científico que ela está realizando.

Dra. Hérika Martins, radiologista e também estudante de pós-graduação na Medicina Molecular, também nos trouxe mais uma criança para alegrar o mundo. Dra. Hérika está estudando de que forma as imagens obtidas com a tomografia computadorizada associada à emissão de prótons podem ajudar no diagnóstico e tratamento dos neurofibromas plexiformes na Neurofibromatose do tipo 1. Ao mesmo tempo que estuda a questão, ela tem nos ajudado no atendimento imediato das pessoas que recebemos no CRNF. Desejo à Dra. Hérika que ela aproveite este momento importante com seu bebê, pois ele também faz parte da compreensão do mundo que pretendemos ter.

É interessante lembrar que a Dra. Luíza de Oliveira Rodrigues também estava realizando seu doutorado quando ganhou o Antônio, seu segundo filho e meu quinto neto. Ela estava estudando o metabolismo da glicose e marcadores inflamatórios na Neurofibromatose do tipo 1 e, apesar de ter se afastado do doutorado formal, ela continua participando conosco e nos ajudando em inúmeros momentos no atendimento às pessoas com neurofibromatose. 
Da mesma forma, a fonoaudióloga Carla Silva também teve seu segundo filho na época do seu doutorado conosco, quando estudava problemas fonoaudiológicos na NF1. 
Finalmente, a Dra. Ana Paula Champs, médica na Rede Sarah, que nos ajudou no diagnóstico dos primeiros casos de Schwannomatose, também está de licença maternidade.

Para as mulheres cientistas, ter filhos durante a época da pós-graduação não é uma raridade: lembro-me de imediato de Maria Angela Moura, Lívia Borges, Giane Amorim e Luciana Napoleão, apenas entre aquelas que fizeram pós-graduação sob minha orientação. Pelo contrário, é uma época de fertilidade biológica e intelectual e isto deve ser levado em conta na construção da carreira científica das mulheres. 

O investimento feminino na tarefa de criar novos seres humanos modifica o ritmo da carreira científica das mulheres e por isso elas não recebem o mesmo reconhecimento acadêmico que os homens. É preciso acabarmos com a competição científica atual, que prejudica a todos, mas em especial às mulheres, para garantirmos a elas a importância da maternidade na construção da humanidade.

As estas cinco profissionais dedicadas e brilhantes, quero agradecer em nome do CRNF a sua colaboração para com nossos pacientes e pesquisas e desejar que usem neste momento vital (para todos nós) a sua criatividade para a construção da felicidade de suas crianças.

No tempo oportuno, tenho certeza de que continuarão a contribuir para o melhor conhecimento das neurofibromatoses. Aqui estaremos com o coração cheio de esperança.

PS: Depois de escrever sobre nossas valorosas mães pesquisadoras, lembrei-me que deixei de fora o Bruno Cota, que está realizando seu mestrado conosco em neurofibromatoses e amusia (ver blog de antes de ontem) e também está esperando um filho para os próximos meses. Meu “esquecimento” é sintomático de como a questão da maternidade não nos preocupa, os homens envolvidos na pesquisa científica.
Alguns comentários sobre a CONFERÊNCIA EM NEUROFIBROMATOSES realizada em MONTEREY, CALIFORNIA, Estados Unidos, de 6-9 DE JUNHO DE 2015, realizados pelos Dr. Nilton Alves de Rezende, Dra. Juliana Ferreira de Souza, fonoaudióloga Pollyanna Barros Batista e o nutricionista Marcio Leandro Ribeiro de Souza.

A conferência anual sobre as neurofibromatoses (NF) acontece sempre no mês de junho desde a sua criação em 1987. É o principal evento científico sobre estas doenças.

Em 2015 estiveram presentes mais de 300 pesquisadores de todo o mundo para mostrar os mais recentes avanços na investigação sobre as NF e os cuidados com os pacientes portadores desta enfermidade.

A conferência incluiu seminários ministrados por renomados especialistas em NF, assim como palestrantes de alto nível que trabalham e realizam pesquisas em problemas afins às neurofibromatoses (como alguns tipos de câncer) e da neurociência, principalmente nos aspectos relacionados aos distúrbios cognitivos, da aprendizagem, e da possibilidade de pacientes com NF1 apresentarem algum comportamento semelhante ao autismo.

A participação destes especialistas tem como objetivo principal estimular o pensamento e construir reflexões e conexões entre as NF e outras doenças semelhantes a elas.

Patrocínio
A conferência anual de NF é patrocinada pela Childrens Tumor Foudation, uma organização sem fins lucrativos dedicados a melhorar a saúde e o bem-estar dos indivíduos e famílias afetadas pelas neurofibromatoses.  A missão da fundação é:
• incentivar e apoiar a investigação e o desenvolvimento de tratamentos e a cura para os vários tipos de neurofibromatoses:  1, 2, schwannomatose e Legius;
• apoiar pessoas com NF, suas famílias e cuidadores, fornecendo informações completas e atuais sobre sua doença;
• auxiliar no desenvolvimento e criação de centros clínicos, sempre baseada nas melhores práticas e outros mecanismos de apoio ao paciente (mas não inclui assistência médica direta) para criar um melhor acesso aos cuidados de saúde de qualidade para os indivíduos afetados;
• expandir a consciência pública sobre as NF nos EUA e obter recursos financeiros para patrocinar as pesquisas tanto  de fontes públicas como privadas.
(Observação do Dr Nilton Alves de Rezende: Creio que estes deveriam ser os objetivos da AMANF).

Prêmio Friedrich von Recklinghausen 2015

Todo ano é escolhido previamente um pesquisador que tenha contribuído de forma significativa para os conhecimentos sobre as NF. Este ano o prêmio foi dedicado ao pesquisador Eric Legius, Diretor do Departamento de Genética Humana da Universidade de Leuven, na Bélgica. Ele tem se dedicado às pesquisas sobre as NF1 nos últimos 25 anos. Sua principal contribuição foi à descrição de uma síndrome até então diagnosticada como NF1, mas que na verdade trata-se de outra doença originada em outro cromossoma, chamada de Síndrome de Legius. 

Alguns destaques das conferências

1)     Renovação do alerta sobre os sinais clínicos de malignização dos plexiformes por meio de um acróstico: HELP: H- hard (aumento da consistência) E- enlarging (aumento de volume) L- limb weakness (fraqueza nas pernas) P- Pain resistence or noturnal ( dor refratária ou  noturna).
2)     Nota-se uma tendência a aumentar as indicações de testes moleculares para diagnóstico de NF1 e diferenciá-la das varias doenças que a mimetizam.
3)     Ao que parece, a abordagem dos plexiformes com o PET-CT tem sido questionada  em decorrência da heterogeneidade dos resultados;  observa-se uma tendência para a indicação cirúrgica precoce em TODOS os plexiformes, quando isto for possível.
4)     O PET, quando realizado com a metionina marcada parece ter maior sensibilidade e especificidade.
5)     O manejo na dor NEUROPÁTICA na Schwannomatose segue o padrão geral para o tratamento da dor. Enfatizaram a importância de sempre associar antidepressivo tricíclico ou carbamazepina com outros analgésicos ou bloqueios neuromusculares.
6)     Foram discutidos aspectos predominantemente radiológicos dos sarcomas na Schwannomatose e massas abdominais, com ênfase para orientação de tratamentos cirúrgico.
7)     Foi falado sobre a neuropatia na NF1, ficando a dúvida se ela é de origem central (cérebro) ou periférica (nervos).
8)     Foram comentados os distúrbios do sono na NF1, e associaram este distúrbio de sono a esta neuropatia progressiva.
9)     Comentaram sobre os problemas nas cordas vocais para melhorar a função vocal nas pessoas com NF2, o que vai ao encontro dos trabalhos realizados no CRNF da fonoaudióloga Carla Silva.
10)  Recomendou-se a análise da função respiratória na NF1, o que já foi realizado aqui no Brasil no doutorado da Dra. Juliana Ferreira de Souza.
11)  A Maria Acosta foi enfática em relacionar os déficits motores com o baixo desempenho escolar e propôs que a atividade física seja encorajada precocemente em todos os pacientes com NF1. No entanto, ainda não existem estudos suficientes prolongados de que esta atividade mude ou não o curso dos distúrbios cognitivos ou da aprendizagem. A maneira como aptidão física e cognição (mais especificamente controle cognitivo) se relacionam e o efeito do treinamento de ambas na NF1 é o objetivo geral do estudo.
12)  Numa excelente palestra magna foram apresentados vários biomarcadores para diversas patologias e enfatizada a importância de se encontrar biomarcadores (radiológicos, bioquímicos ou teciduais) nas neurofibromatoses, que possam ser úteis no acompanhamento dos tratamentos instituídos. Interessante como este termo “BIOMARCADORES” foi muito repetido nesta Conferência. Como a abordagem dos neurofibromas atípicos é uma prioridade, acreditamos que a definição de biomarcadores para os neurofibromas com maior risco de malignização seja o alvo principal no momento.
13)  Noutra conferência, o Dr. Bruce Korf propôs que sejam revistos os critérios atuais para o diagnóstico das NF (pedido e sugestão feitos também pelo Dr. Legius durante o discurso de recebimento do prêmio Von Recklinghausen), considerando a evolução do conhecimento da NF1.
14)  Dr Korf também defendeu mais indicação de testes moleculares em crianças, uma vez que os sinais da doença são dependentes da idade, assim como para diagnóstico pré-natal, para fertilização in vitro e nos casos de mosaicismo para aconselhamento genético.
15)  Foi apresentado pelo Dr. Garett Evans um estudo de 1192 casos de NF2 na Inglaterra, mostrando um pior prognóstico em algumas mutações específicas do gene, na idade abaixo de 20 anos e na presença de meningiomas, sem diferenças entre os sexos.
16)  Foi proposta a utilização de PET-CT utilizando metionina no lugar da glicose marcada, por ser mais específico de malignização dos plexiformes, assim como a RNM volumétrica como biomarcador para verificar a eficácia terapêutica de medicamentos ou de radioterapia. A RNM volumétrica vem sendo utilizada como parâmetro de regressão (ou não) dos plexiformes nos estudos em andamento.
17)  Foi apresentado o estudo randomizado multicêntrico de 24 semanas de utilização da Lovastatina (40 mg/dia), mostrando que esta droga não modifica os aspectos cognitivos e os déficits de aprendizagem na NF1. Este foi um momento de destaque do dia. A Dra. Kathryn North apresentou os resultados do estudo multicêntrico que estava em andamento há alguns anos. O que eles fizeram foi selecionar crianças com NF1, em uma faixa etária determinada, especificamente com déficit de atenção e memória (usaram um teste computadorizado). Os resultados não foram estatisticamente significativos para qualquer das avaliações utilizadas (atenção e memória). Os resultados foram apresentados melancolicamente como um estudo negativo e, quando perguntada, a Dra North disse não acreditar ser válido o investimento em estudos subsequentes com a Lovastatina.
18)  Por outro lado, o grupo do Alcino Silva mostrou melhora da atenção, da memória e aprendizagem verbal com uso da Lovastatina. Para nós, continua o impasse e talvez o tempo de acompanhamento (24 semanas e 14 semanas) seja pequeno para avaliar respostas de longo prazo. Cabe aqui um comentário que ouvimos do Riccardi sobre os testes utilizados para avaliação cognitiva na NF1 e, ao mesmo tempo, sobre os resultados do estudo com a Lovastatina. Ele ressaltou que a transposição da observação no modelo animal (feita pelo Alcino Silva e equipe) para os seres humanos deve, provavelmente, exigir uma avaliação mais próxima das atividades habituais desempenhadas por estas crianças no seu cotidiano e menos baseada em testes de múltipla escolha respondidos dentro de um consultório.
19)  Outra questão interessante, foi o destaque dado para a necessidade de se uniformizar a descrição anatomopatológica dos neurofibromas, utilizando-se a classificação da ASPECTOS RELEVANTES:
20)  Foram mostrados alguns resultados da utilização de uma nova droga (inibidor do MEK, uma das enzimas envolvidas na reprodução das células) para os tumores plexiformes (não necessariamente atípicos, mas que desfiguram, alteram a função ou aumentam o risco de morte ou pioram a qualidade de vida pela localização e/ou volume) e que são inoperáveis. Observou-se redução média de 25-30% do volume, o que não foi considerado algo tão exuberante, mas que resultou em melhora da qualidade de vida destes pacientes. Um conceito importante foi de que não devemos buscar apenas a redução do tamanho dos tumores, mas também a qualidade de vida e outros resultados.
21)  Mostrou-se a utilização da tomografia de coerência óptica (TCO) para verificar a perda de fibras neurais em pacientes com glioma óptico. Segundo os autores, as alterações no exame precedem a perda do campo visual e poderia ser útil na decisão terapêutica dos gliomas ópticos na NF1. Além disso, a TCO permitiria a avaliação daquelas crianças em idade inferior a 6-7 anos que não se prestam ao exame de campo visual tradicional. Achamos muito interessante pois é exatamente o que a oftalmologista Dra. Vanessa Waisberg está estudando conosco em pessoas com NF2 e NF1.
22)  Foram apresentadas as áreas prioritárias para pesquisas nas neurofibromatoses para 2015-2020 segundo o Departamento de Defesa dos EUA. Pareceu-nos que os neurofibromas (cutâneos – pela estética, plexiformes – quando são inoperáveis, atípicos – diante da incerteza do risco de malignização) e os tumores malignos da bainha do nervo periférico – pela extrema agressividade e pequena resposta ao tratamento, são uma prioridade para todos os pesquisadores que participaram desta ótima discussão. Quer seja na área básica ou na pesquisa clínica, que gradativamente, se afunila e se restringe aos estudos com medicamentos, eles são o foco. Talvez por isso as prioridades para as pesquisas futuras seja esta lista abaixo.
a.     Melhorar os serviços de assistência (uniformizar coleta de dados), para pesquisas clinicas em NF1 (nas 44 clínicas americanas especializadas em NF);
b.     Estudo da heterogeneidade dos neurofibromas e de outros tumores relacionados às neurofibromatoses;
c.      Manifestações clínicas da NF1 após a adolescência;
d.     Mecanismo da dor na NF (Schwannomatose);
e.     Marcadores de resposta terapêutica utilizando-se da genômica, epigenômica, outros marcadores biomoleculares entre outros;
f.       Identificação de novas drogas alvo-específico para o tratamento da NF1;
g.      Fatores ambientais e nutricionais que modificam a evolução da NF1.

Conversa com 
o médico e mestrando 
Bruno Cota 
sobre sua pesquisa 
na qual ele estuda 
as habilidade musicais 
e dificuldades de aprendizado 
em pessoas com NF1 e NF2.







1) Bruno, você é médico e músico. Como você se interessou pelas neurofibromatoses?

Em 2013, conheci a professora Ana Lana e a neurocientista Marília Nunes, em um curso na UFMG sobre Neurociência e música, e desde então direcionei meus esforços para também tornar-me neurocientista da música, sempre com o apoio e incentivo de ambas. Através delas conheci a professora Luciana Macedo, que mais tarde tornou-se importante viabilizadora desse sonho, como orientadora do meu projeto de mestrado, que a princípio consistiria em avaliar os efeitos analgésicos da música.

Convidamos para a co-orientação daquele projeto o professor João Gabriel, de quem fui aluno na graduação em medicina e por quem sempre tive grande apreço. O mesmo aceitou o convite com entusiasmo, mas diante das dificuldades técnicas para o desenvolvimento do projeto anterior, sugeriu pensarmos em algo diferente. 

João Gabriel disse-me então que, num encontro casual, você havia comentado com ele sobre a suspeita de um possível comprometimento do processamento musical em pessoas com Neurofibromatose do tipo 1, doença que até então eu só conhecia pelos livros.

Após uma semana de estudo intensivo sobre os assuntos envolvidos, vi que essa suspeita tinha fundamentos que justificariam essa investigação, até então não documentada na literatura. Ao ser recebido de braços abertos por você, pelo diretor do CRNF Nilton Rezende e pela fonoaudióloga Pollyanna Batista, não hesitei em mudar meus planos e definitivamente colocar em prática o novo projeto sobre dificuldades musicais em pessoas com NF1.

E, seja por essas circunstâncias ou por razões que ainda desconheço, apesar do pouco tempo de convivência e atividades no ambulatório, suspeito que as Neurofibromatoses não mais significam para mim somente algumas páginas de um livro na estante: tornaram-se um novo capítulo na minha história de vida, a ser construído com toda a dedicação que cada grande oportunidade merece.

Portanto, interessei-me pelas neurofibromatoses graças à persistência e à sorte, em uma cadeia de eventos, nos quais se incluem ganhos e perdas, realizações e frustrações, mas acima de tudo, pessoas fundamentais.


2) Então qual é a pesquisa que está realizando no CRNF?


A pesquisa tem como título “Amusia como distúrbio auditivo central na Neurofibromatose tipo 1”. A amusia, que consiste na incapacidade parcial ou total de perceber e reproduzir música, será investigada no meu estudo por meio de um teste que avalia algumas habilidades musicais dos participantes. Além desse teste, será realizada uma avaliação básica da audição, através dos exames audiometria e imitanciometria, e um exame eletrofisiológico da audição, que avalia como o som se processa no cérebro.

Todos os testes são confortáveis e não-invasivos, ou seja, não envolvem instrumentos que rompem a pele ou que penetram fisicamente no corpo. Também não emitem radiação, nem colocam em risco a integridade física ou psíquica dos participantes.
O tempo total dos testes é de aproximadamente 2 horas, sendo que os participantes que já se submeteram à avaliação audiológica básica recentemente não precisam repeti-la, reduzindo esse tempo de avaliação para 1 hora e meia, aproximadamente.


3) O que é que espera encontrar na pesquisa, ou seja, qual é sua hipótese?

Nossa hipótese é que a ocorrência de amusia seja maior entre os indivíduos com NF1 do que naqueles que não têm a doença, inclusive não esperamos encontrar a amusia nas pessoas que têm NF2 e audição preservada.  

Acredita-se que a amusia seja decorrente de um transtorno do processamento auditivo central. Isso significa que a forma como o cérebro interpreta a música está alterada nos indivíduos chamados “amúsicos”, apesar de não terem nenhum problema nos ouvidos ou em outras estruturas envolvidas na audição.

Em indivíduos com amusia desde o nascimento, foram observadas importantes alterações localizadas na substância branca cerebral, através de pesquisas com métodos de imagem (ressonâncias magnéticas). Sabe-se também que nas pessoas com NF1 são comuns as alterações na substância branca e há estudos que correlacionam esses achados com algumas desordens de linguagem e de aprendizado, também frequentes na NF1.

Além disso, em recente estudo desenvolvido pela Pollyanna no CRNF, constatou-se, de modo inédito, a existência de importante prejuízo do processamento auditivo em portadores de NF1, os quais também podem estar relacionados às alterações descritas.
Portanto, este conjunto de informações científicas constitui a fundamentação teórica que justifica a nossa investigação da amusia na NF1, reforçada pela opinião clínica de experientes profissionais que lidam com as neurofibromatoses. 



4) Você já tem resultados preliminares?

Na maioria das avaliações realizadas até o momento constatamos algumas alterações importantes no processamento musical nos portadores de NF1, quando comparados aos outros indivíduos sem a doença. Mas ainda estamos na fase inicial. É preciso um número maior de avaliações para concluirmos com segurança, baseada em uma criteriosa análise estatística.

Portanto, precisamos muito da ajuda de todos que tenham disponibilidade em participar da pesquisa, sejam pessoas com NF1 ou não. Cada participação é valiosa, pois esperamos que nossos resultados tragam novos conhecimentos em relação à doença.  Quem sabe, com esse estudo poderemos trazer mais esperança de tratamentos para as pessoas com NF1?

Quem tiver interesse em participar e nos ajudar é só entrar em contato pelo e-mail brucezar@hotmail.com.br ou telefones: 31-8806-3535 (Oi) ou 31-9194-2235 (Claro).  
As avaliações são realizadas na Faculdade de Medicina da UFMG, que fica bem próximo ao ambulatório do Centro de Referência em Neurofibromatoses. Agradeço desde já a todos que puderem participar desse projeto!   

Por intermédio do Professor Elcio Neves, da Associação de Vitória (ES), o gabinete do Senador Romário se propôs a fazer cartilhas informativas sobre doenças raras e nos enviou algumas perguntas sobre as neurofibromatoses.

1.
    O que é a doença?

As neurofibromatoses formam um grupo de 4 doenças que têm em comum o aparecimento de manchas café com leite e tumores benignos que se originam dos tecidos neurais (neurofibromas, gliomas, schwannomas, meningiomas) e que podem causar complicações à saúde das pessoas acometidas.
São as doenças chamadas de neurofibromatose do tipo 1, neurofibromatose do tipo 2, schwannomatose e Síndrome de Legius.

2.
    Número de pacientes no mundo e no Brasil?

Cada uma das 4 doenças tem incidências diferentes, mas tomadas em conjunto, teríamos cerca de 1:3000 pessoas nascidas, ou seja, cerca de 68 mil pessoas no Brasil e cerca de 2 milhões de pessoas no mundo.
3.    Ações já tomadas e medidas já existentes em prol da doença?

Atualmente existem algumas associações de pessoas com NF e poucos centros de referência especializados no atendimento às pessoas com neurofibromatoses: Belo Horizonte, Rio de Janeiro, Ribeirão Preto, São José do Rio Preto.
Há páginas na internet e pesquisas científicas sendo realizadas.
Há uma Sociedade Brasileira de Pesquisa em NF de caráter informal que publicou recentemente dois manuais de orientação para profissionais da saúde para o diagnóstico e tratamento das neurofibromatoses.


Uma iniciativa interessante seria a tradução destes artigos de forma compreensível para a maioria das pessoas.

4.
    Medicamentos e seu uso?

Apesar de diversas pesquisas internacionais que buscam medicamentos para os diversos problemas das neurofibromatoses, não existem ainda medicamentos eficazes e específicos para as neurofibromatoses.

5.
    Perspectiva de vida ou sobrevida?

Há uma redução de cerca de 10 a 15 anos de expectativa de vida na neurofibromatose do tipo 1 e do tipo 2. Ainda não se sabe esta informação na schwannomatose e na Síndrome de Legius.

6.
    O que ainda falta em relação aos avanços da doença?

Do ponto de vista da sociedade, falta o reconhecimento de que a doença existe, quais as suas características (representação social) e é mais comum do que se pensa.

7.
 Outros que considera necessário?

Creio que faltam informações para os profissionais de saúde e para as pessoas acometidas pelas neurofibromatoses.

B- Indicação de um médico ou especialista na área que poderá assinar junto aos “organizadores” para que faça a correção do texto.
Ofereço a colaboração de nossa equipe do Centro de Referência em Neurofibromatoses do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais, coordenada pelo Prof. Dr. Nilton Alves de Rezende.

C- Instituições, sites, especialistas citados e outros.

Por enquanto, dispomos de atendimento público especializado em neurofibromatoses nos estados do Rio de Janeiro (cidade do Rio:  www.cnnf.org.br), Minas Gerais (Belo Horizonte, o nosso: ver www.amanf.org.br) e São Paulo (Ribeirão Preto, ver: guimedicina@gmail.com  e São José do Rio Preto (ver: eny.goloni@famerp.br ). Em São Paulo (nas faculdades de medicina da USP e Unifesp) temos geneticistas que atendem às neurofibromatoses também.
Continuando a resposta para IT, de Portugal, vimos que uma das indicações para a identificação das mutações causadoras das neurofibromatoses seria para o diagnóstico pré-implantação, ou seja, no processo de inseminação artificial, para garantir que o embrião implantado não tenha uma das NF. 


Repito então as respostas oferecidas há alguns meses por dois experientes geneticistas: Dra. Eugênia Valadares da Faculdade de Medicina da UFMG, e Dr. Salmo Raskin, da Clínica Genétika, localizada em Curitiba.


Dra. Eugênia Valadares: 

O diagnóstico genético pré-implantação (PGD) de NF1 é uma opção para os casais que já têm identificada a mutação causadora da doença, de acordo com artigos publicados na literatura médica internacional. A fertilização in vitro pode ser feita em alguns hospitais universitários, com algum custo para os pacientes. Mas, em relação ao PGD, posso garantir que no Brasil são raros os laboratórios de genética que realizam este exame e acredito que na rede pública não tenha ninguém trabalhando com isso. 

É fundamental que o médico geneticista e o médico da fertilização in vitro que estão acompanhando o casal trabalhem de forma bem articulada com o laboratório de genética que vai realizar o exame. Os riscos da fertilização in vitro por injeção intracitoplasmática de espermatozoide e os custos de todo o processo devem ser informados diretamente pela equipe executora.


Dr. Salmo Raskin:

O Diagnóstico Genético pré-implantação (PGD) não é a única alternativa, mas sem dúvida é uma alternativa muito interessante para evitar o nascimento de um filho com Neurofibromatose.  
A técnica já foi testada por mais de duas décadas, e em mãos bem treinadas, é bastante confiável. Claro que há de se levar em conta que o procedimento de fertilização in vitro que antecede ao Diagnóstico Genético pré-implantação, é um procedimento complexo, sob todos os aspectos, em especial o emocional, e principalmente para a mulher. 

Todo o processo (fertilização in vitro seguida de Diagnóstico Genético pré-implantação) custa em torno de 20 a 30 mil reais, lembrando que às vezes é necessário repetir o processo (em parte ou integralmente), quando a gestação não se desenvolve. Outra alternativa médica seria a fecundação por meio da doação de gametas (espermatozoides ou óvulos) de uma pessoa sem NF1 para o casal com a doença.

DR LOR: 

É importante lembrar que aqueles casais onde um dos pais tem NF e desejam ser pais é possível a adoção.

Aproveitando que a Dra. Eugênia e o Dr. Salmo comentaram a questão dos custos financeiros para o PGD, lembro que, infelizmente, ainda não existe nenhum centro público de saúde no Brasil oferecendo o PDG pelo SUS, segundo o Dr. Selmo Geber, da Clínica Origen, em Belo Horizonte.

Por outro lado, dispomos agora da Portaria 199 do Ministério da Saúde sobre a obrigatoriedade do Sistema Único de Saúde prestar assistência integral às pessoas com Doenças Raras (o que inclui as neurofibromatoses). Considero que a paternidade e a maternidade sejam um direito de todos e a realização deste direito pode apresentar necessidades especiais no caso de determinadas doenças, como as neurofibromatoses, entre elas a necessidade de contar com a reprodução assistida.
  
No entanto, a Portaria 199 menciona o aconselhamento genético, mas não faz referência à reprodução assistida para portadores de Doenças Raras, o que precisa ser discutido entre as entidades envolvidas com a questão, incluindo o Ministério da Saúde.

A fonoaudióloga Pollyanna Batista e o diretor do Centro de Referência em Neurofibromatoses do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais, diante do trabalho científico sobre treinamento auditivo na NF1, durante o último congresso em neurofibromatoses nos Estados Unidos em 2015.

Entrevistei a Pollyanna sobre seu trabalho em fonoaudiologia na NF1.
Quais os resultados mais importantes que você compartilhou?
Sabemos que a maioria das pessoas com NF1 apresenta dificuldades em processar os sons ouvidos, portanto nossa pesquisa testou se um período de treinamento auditivo por 8 semanas poderia influenciar a desordem do processamento auditivo naquelas pessoas. Nossos queridos voluntários com NF1 realizaram uma vez por semana exercícios auditivos. Os resultados que levamos na Conferência de 2015 apontam melhora na capacidade de compreensão auditiva em ambientes ruidosos, melhor capacidade de compreensão dos sons na presença de sons competitivos, e melhor velocidade de processamento das informações auditivas.
Qual foi a reação da comunidade científica aos seus resultados?
Creio que a maior parte dos cientistas que trabalham com neurofibromatoses ainda não está informada sobre a importância do adequado processamento auditivo para o sucesso na aprendizagem, da cognição e do desenvolvimento da linguagem. A audição é uma das principais portas de entrada do conhecimento. Ao discutir este assunto com a pesquisadora Heather Thompson da Universidade de Sacramento da Califórnia (EUA), vimos que para os distúrbios de aprendizagem, primeiro é preciso intervir na audição (treinamento auditivo), melhorar as habilidades auditivas e posteriormente intervir nas dificuldades de leitura e escrita.
O que foi apresentado e discutido em 2015 no congresso nos Estados Unidos a respeito de temas semelhantes ao que você estuda?
Uma das grandes preocupações dos pais na infância e adolescência é referente ao desenvolvimento da linguagem e aprendizagem. Como consequência, há uma grande preocupação entre os pesquisadores de se tentar minimizar as alterações de aprendizagem e déficits cognitivos. Intervenções terapêuticas para memória de trabalho, aprendizagem viso espacial e atenção tiveram eficácia comprovada em alguns estudos apresentados na Conferência de 2015. Enquanto isso, os estudos com Lovastatina são promissores, mas há uma dificuldade de transpor os estudos realizados com camundongos para a população com NF1, e ainda não há um consenso sobre isso, o que fica evidente com as posições contrárias sobre o assunto entre o grupo liderado pela Dra. Maria Acosta (Children’s National Medical Center – EUA) e o grupo da Dra. Kathryn North, pesquisadora da Murdoch Children’s Research Institute (Austrália).

Ontem, a escola da minha filha de 9 anos nos informou que ela não conseguiu atingir as mesmas competências dos colegas. 

Assim, apesar de transitá-la para o segundo ano, ela continuará com os livros do primeiro. Isso quer dizer que, no segundo ano:
– Ela verá o conteúdo da turma para o segundo ano enquanto ela vê o mais atrasado;
– Sairá de sala de aula para o acompanhamento especial, para a fonoterapia e, talvez, terapia ocupacional. Enquanto está neste atendimento, o restante da turma recebe novos conteúdos.
Não sou pedagogo, mas penso que mesmo com a professora particular acompanhando-a, dificilmente ela conseguirá chegar ao nível da turma.
Você passou por situação semelhante? O que podemos fazer para minimizar o impacto da diferença e ajudá-la no aprendizado?
Uma coisa que eu não consigo entender. Minha filha é muito antenada, entende tudo a sua volta, tem o pensamento rápido, mais até do que os irmãos, mas não consegue assimilar os conteúdos da escola. Será que o conteúdo deve ser dado de uma forma diferente?
Ela possui as manchas no cérebro. Segundo minha esposa, estas manchas são na área do aprendizado, pode ser isso mesmo? BPC, do Rio de Janeiro.
Resposta.
Sim, passei por situação semelhante à sua e creio que as dificuldades de aprendizado na NF1 afetam profundamente inúmeras famílias neste momento. Minha filha com NF1 já está com 36 anos, conseguiu se formar em Fisioterapia e leva uma vida praticamente normal. No entanto, como em grande parte das crianças com NF1, seu processo de aprendizado se deu de forma mais lenta do que para os demais colegas e algumas habilidades específicas ainda não foram alcançadas por ela, como a habilitação para dirigir automóveis.
Por causa das suas dificuldades, especialmente de memória, – e a capacidade de guardar informações é muito cobrada nos sistemas atuais de ensino, – ela repetiu algumas séries, o que acabou por forçá-la a completar o ensino de forma supletiva. Na faculdade (particular) ela continuou com as dificuldades de memória, necessitando de mais tempo do que os (as) colegas para adquirir o conhecimento médio de sua turma.
Então, a segunda questão que você levanta é se o conteúdo poderia ser ensinado de forma diferente. Também não sou pedagogo, mas tenho a impressão que a socialização deveria ser a maior tarefa da escola, ou seja, preparar as novas pessoas para viverem em sociedade, cuidando dos lações afetivos e das relações sociais.
No entanto, a ideologia da escolarização é formar indivíduos produtivos para o mercado de trabalho. Assim, não só para as crianças com NF1, a maneira de ensinar na maioria das escolas é produtivista, pouco interessante, desconectada da vida social real, excessivamente formal e muito baseada na memória, além de estimular de forma doentia a competição, a qual leva a comportamentos individualistas. Veja as crianças japonesas, tão tristes em seu produtivismo, educadas para se matarem de trabalhar e que são modelo para muitos países, inclusive o Brasil.
Minha opinião é de que sim, precisamos lutar por conteúdos escolares diferentes dos atuais, que deveriam ser voltados para o desenvolvimento dos afetos, da socialização, da inclusão de todos e do espírito comunitário e solidário. Menos campeões e mais corações. É difícil? Sim, mas saber que as falhas não estão na sua filha, mas no sistema educacional que a exclui como pessoa, impedindo-a de realizar seu potencial humano.
Concordo com você que os cuidados complementares que sua filha recebe retiram dela uma parte do tempo que poderia ser destinado aos chamados conteúdos escolares. Mas o efeito principal, a meu ver, é que estas atividades terapêuticas a afastam ainda mais da socialização com os colegas e criam uma situação especial, a qual pode, inclusive, ser fonte de discriminação e maus tratos. Portanto, devemos indicar atividades terapêuticas, que sejam cientificamente comprovadas como eficazes na NF1, apenas para os horários fora do período escolar.
Finalmente, sobre as manchas no cérebro, que, provavelmente devem ser hiperintensidades encontradas na ressonância magnética do encéfalo, geralmente decorrentes de pequenos hamartomas inofensivos. Houve uma época em que se suspeitou que estas manchas estariam relacionadas com as dificuldades de aprendizado, mas depois isto não foi comprovado.
Em conclusão, creio que nosso papel, como pais, deva ser a criação de entidades civis de defesa das pessoas com NF e a partir destas associações promovermos mudanças nas estruturas de ensino, tornando-as mais inclusivas, ou seja, menos competitivas e mais amorosas.