Continuando as informações de ontem, lembro que o acompanhamento clínico para as crianças com NF1 com gliomas ópticos deve ser feito a cada 3 meses, durante os dois primeiros anos a partir do diagnóstico do glioma.



Depois de 2 anos do diagnóstico do glioma, se o tumor estiver estável, realizar o controle anualmente com ressonância magnética até os 12 anos de idade.
A partir dos 7 anos, o exame oftalmológico com a medida do campo visual anualmente pode ser uma boa alternativa para o acompanhamento de crianças com NF1 e glioma óptico: se o campo visual estiver normal ou inalterado, realizar a ressonância de 12 em 12 meses. Se o campo visual se alterar, realizar a ressonância de 6 em 6 meses.
Outras informações importantes:
O tratamento de gliomas ópticos na NF1 deve ser sempre adiado se os sintomas são leves ou ausentes;
O tratamento do glioma óptico na NF1 só deve ser iniciado quando há agravamento da perda da visão e o tumor estiver deformando a face (devido à proptose acentuada) ou ameaçando a vida pela compressão das estruturas nervosas próximas.
Nestes casos mais raros e graves, abaixo dos 3 anos o tratamento de primeira escolha é a quimioterapia (geralmente a carboplastina isolada ou associada à vincristina), lembrando que, além dos efeitos colaterais (toxicidade, esterilidade e outros tumores), em metade dos casos tratados com quimioterapia o glioma óptico retorna nas crianças com NF1.
Quando a quimioterapia não dá resultado naqueles casos mais graves, a radioterapia pode ser uma alternativa paliativa, lembrando que pode também produzir efeitos colaterais importantes. Crianças com NF1 tratadas com radioterapia podem apresentar deficiência intelectual e hormonal (crescimento, tireoide) e doenças vasculares cerebrais (doença de Moya-Moya), assim como aumenta a chance de aparecimento de outros tumores.
A cirurgia tem papel limitado, geralmente é reservada para os casos raros mais extremos de proptose acentuada ou casos graves em que a radioterapia falhou, e a remoção do nervo ótico resulta em perda completa da visão naquele olho.
Portanto, nossa torcida é para que sua filha esteja entre aqueles 85% das crianças com NF1 e gliomas ópticos que não causam qualquer problema. Para os casos mais graves, continuamos torcendo para que seja descoberto algum medicamento que possa melhorar nossos resultados atuais no tratamento dos gliomas ópticos na NF1.

Imprima estas opiniões e leve à pediatra de sua filha. Você pode também indicar para a médica o nosso artigo de 2015 (obtenha o artigo completo clicando aqui), onde ela encontrará mais instruções técnicas para o controle clínico dos gliomas ópticos na nas crianças com NF1. 
Doutor LOR, minha filha de seis anos tem NF1 e o neurologista encontrou um glioma óptico na ressonância do cérebro. Ela não tem nada no exame oftalmológico e também não sente nada, além de dor de cabeça de vez em quando e um pouco de dificuldade na escola. Ela precisa de quimioterapia? O que devemos fazer? JCR, do Rio de Janeiro, RJ.


Cara J, obrigado pela sua pergunta, que será útil a uma em cada dez famílias com NF1.

Para começar, devo afirmar que nas neurofibromatoses as decisões devem ser tomadas em baseadas nas consequências funcionais e não no tamanho dos tumores. Além disso, quero enfatizar que os gliomas ópticos são mais benignos nas pessoas com NF1.

Você verá porque sou contrário a qualquer intervenção (cirúrgica, quimioterápica ou radioterápica) no glioma óptico de sua filha, neste momento, pelas razões que vou apresentar a seguir.

Os gliomas ópticos são o tumor cerebral mais comum nas pessoas com NF1.  Entre 15 e 30% das pessoas com NF1 possuem gliomas ópticos, mas entre aquelas que têm os gliomas, apenas a 5 a 12% apresenta problemas visuais.

Os problemas visuais que podem levar a criança com NF1 ao médico geralmente são: estrabismo e/ou diminuição da visão. Durante o exame, o (a) oftalmologista pode encontrar uma ou mais das seguintes alterações: diminuição da acuidade visual, diminuição da percepção das cores, reflexo pupilar defeituoso, defeitos no campo visual e estes dados são mais confiáveis a partir dos 7 anos. Alguns sinais também podem ser vistos: edema da papila, atrofia do nervo óptico e potencial elétrico da resposta visual alterado.

Os gliomas ópticos na neurofibromatose do tipo 1 são diferentes daqueles encontrados em pessoas sem NF1. Nos portadores de NF1 os gliomas geralmente são astrocitomas pilocíticos que raramenteaumentam de tamanho de forma agressiva ou se tornam malignos.

Ao contrário, na NF1, quando (e se) eles progridem lentamente, os gliomas ópticos permanecem autolimitados num determinado tamanho e raramente causam perda da visão.

Assim, os gliomas ópticos na NF1 podem ser divididos em dois grandes grupos:
Grupo menos grave – Duas em cada três crianças com NF1 e gliomas ópticos nunca apresentam qualquer sintoma ou sinal, e os gliomas são identificados apenas pelos exames de imagem.
Grupo mais grave – Um em cada três crianças com gliomas ópticos tem um período de crescimento que acaba causando um ou mais dos problemas a seguir (nenhum dos quais está acontecendo com a sua filha neste momento): diminuição da acuidade visual, que na maioria dos casos não piora além de um certo ponto e que pode ser controlada com o uso de lentes e óculos. Em 30% destes gliomas que crescem, pode acontecer proptose (ou seja, projeção do globo ocular para frente da órbita) com perda parcial ou total da visão. Finalmente, 30% deste grupo sintomático apresenta puberdade precoce (antes dos 7 anos nas meninas e antes dos 9 nos meninos).
Geralmente este crescimento do glioma óptico acontece antes dos seis anos de idade e por isto um exame anual pelo oftalmologista é recomendado para toda criança com NF1. Por outro lado, não é necessária a ressonância magnética de rotina para crianças sem sintomas e sem diagnóstico prévio de glioma óptico.

Depois dos 12, anos os gliomas ópticos na NF1 podem permanecer estáveis por tempo indefinido e há relatos confiáveis de remissão espontânea (sem qualquer tratamento) do tumor.

Portanto, precisamos considerar os riscos da quimioterapia na NF1, que pode aumentar a dificuldade de aprendizado e a chance de novos tumores, inclusive malignos. Por isso, consideramos que a conduta no caso de sua filha deva ser semelhante à da maioria das pessoas portadoras de glioma óptico: apenas o acompanhamento, sem qualquer intervenção específica.

Amanhã comentarei como fazer o acompanhamento clínico de crianças com NF1 e glioma óptico.

Levei minha filha a muitos médicos e nenhum deles soube explicar direito o que ela tem. Demorei anos para conseguir saber que ela tem neurofibromatose. Por que é assim? JC, de Manaus.






Cara JC, infelizmente sua queixa é comum entre as pessoas que têm doenças raras, como as neurofibromatoses.
De fato, o pouco conhecimento que nós médicos temos das doenças raras é explicável: como vamos saber corretamente mais de 5 mil doenças? Eu tenho me dedicado apenas às neurofibromatoses nos últimos 12 anos e ainda preciso estudar muito mais para poder compreender bem diversos aspectos destas apenas três doenças. Praticamente nada sei sobre Síndrome do X Frágil, Porfirias, Doença de Fanconi, e outras milhares de doenças raras.
O conhecimento científico vem aumentando de forma impressionante, especialmente depois da Segunda Guerra Mundial, como mostra o vídeo abaixo, do médico Atul Gawande, de tal maneira que precisamos de trabalhar em equipes para darmos conta do conhecimento médico que já temos disponível e que continua a crescer.
O vídeo do Dr. Atul Gawande mostra que diante de situações ou doenças complexas, como as neurofibromatoses, é obrigatório fazermos um roteiro de acompanhamento de cada pessoa, que ele chama de check list, para não esquecermos as diversas condutas necessárias.
Em nosso Centro de Referência em Neurofibromatoses, do Hospital das Clínicas da UFMG, há alguns anos temos adotado este sistema de conferir ao final das consultas tudo o que já foi feito e aquilo que ainda precisa ser feito. Todas as vezes, garanto, a nossa check list tem me lembrado de algo que iria passar desapercebido se não estivesse ali para ser conferido.
Vale a pena ver este vídeo a seguir, com a palestra que o Dr. Atul Gawande fez na série de programas TED. Veremos que mesmo nas doenças conhecidas e comuns, precisamos trabalhar em equipe e ter um sistema de controle de nossos atos médicos.

Imagine então nas doenças raras e mais complexas.  

Olá. Meu filho apresenta muita dificuldade em aprender e a escola acha que eu deveria deixa-lo numa escola especial. O que devo fazer? MCVB, de São Paulo, SP.
Caro M, obrigado por tocar nesta questão fundamental, que nos faz pensar sobre o que deveria ser o objetivo fundamental da educação escolar na nossa sociedade moderna.
A sociedade brasileira em que vivemos é complexa e organizada em classes sociais, nas quais a elite (menos de 1%) da população é proprietária de grande parte das riquezas sem precisar trabalhar, enquanto o restante tem que trabalhar para sobreviver.
Como existe mais gente precisando trabalhar do que empregos disponíveis, aqueles que têm que trabalhar são obrigados a lutar entre si numa feroz competição para garantir um salário.
Nesta competição, a alfabetização e os conhecimentos técnicos e científicos são transformados em armas, as quais garantem melhor remuneração e qualidade de vida para quem as possui.
Por outro lado, o maior nível de educação das pessoas permite o desenvolvimento tecnológico da população, o que está associado com o seu crescimento industrial e econômico.
Assim, neste modelo de sociedade, um certo tipo de educação escolar interessa tanto aos patrões quanto aos trabalhadores: a formação de mão de obra baseada na competição e na qualificação técnica. No entanto, os seres humanos são mais do que trabalhadores: somos pessoas com um grande potencial de criatividade, de relações afetivas e de felicidade.
A presença de uma criança com algum tipo de deficiência, como pode ocorrer na NF1, é um grande desafio para aquele tipo de escola baseada na competição e na produtividade, nas provas rigorosas contra o relógio, nos concursos permanentes, nas seleções contínuas, nos melhores isto e melhores naquilo, nos esportes de alto nível, nos para-casas intermináveis, nas agendas de atividades sufocantes e na ideologia do “campeão”.
Aí, vem a criança com deficiência, e ela atrapalha a lógica produtivista das escolas para crianças “normais”.
No entanto, na minha opinião, a inclusão de crianças com deficiência nas escolas comuns traz um grande benefício… para AS OUTRAS CRIANÇAS.
Quem sabe as crianças sem deficiênciaspercebam aliviadas que não precisam competir tanto entre si e no mundo a partir da convivência com o diferente, com aquele que não precisa ser o campeão, com aquele que quer apenas estar junto e ser aceito pelos seus companheiros de idade?
Quem sabe todos cresçam juntos em busca de um outro mundo possível, no qual a competição ceda seu lugar para o afeto, para a cooperação e para a solidariedade? Quem sabe, assim, seremos mais felizes?
Então, vamos lá, ocupar as escolas com nossos filhos e filhas com NF1. Para o bem de todos.


Alguns pais têm perguntado sobre o uso de medicamentos, chamados de moduladores do humor, para os problemas de comportamento em crianças com NF1. 

Veja alguns alguns comentários neste blog sobre os problemas de comportamento na NF1, que são bastante comuns.
Hoje, trago minha preocupação com um dos medicamentos que têm sido receitados para algumas crianças com NF1, a PAROXETINA.

Creio que o e-mail abaixo da Dra. Luíza de Oliveira Rodrigues, que é médica e também minha filha, enviado por ela para diversas pessoas, traduz a minha opinião a respeito da PAROXETINA, pois sou contrário ao uso deste medicamento em crianças com NF1. 

Os comentários em itálico são meus, para ajudar a compreensão das pessoas que não são formadas em medicina.
“Caros,
Trabalhando com Avaliação de Tecnologias em Saúde, frequentemente me deparo com o uso indevido da “Medicina Baseada em Evidências” para vender remédios. 

Este caso da PAROXETINA (receitada) para adolescentes e crianças é um exemplo (ver:aqui

(Há 15 anos foi publicada uma pesquisa que indicou o uso de PAROXETINA para problemas de humor em crianças e adolescentes)

Demorou quase 15 anos para se conseguir publicar um estudo com análise metodologicamente correta dos dados coletados, o qual concluiu (exatamente) O OPOSTO do que fora publicado originalmente.

Foram 15 anos vendendo um remédio que não funciona e que oferece mais riscos. E o estudo original (errado) não foi retirado de circulação!

Nas minhas análises críticas, toda vez que incluo “o financiamento do fabricante” como um tipo de erro no método científico e, portanto, um fator importante de redução da qualidade da evidência (ou seja, da confiança que podemos ter nos resultados) especialmente em oncologia, sou duramente criticada:

– Mas não há grandes estudos clínicos sem o financiamento da indústria!

Ao que eu respondo:

– Portanto, não há evidência (científica) de qualidade.

O exemplo da PAROXETINA acima ilustra o quanto é necessário sermos mais rigorosos com os atuais produtores de “evidências”.
A própria Cochrane (um sistema internacional que divulga conhecimentos médicos baseados em evidências científicas) tem utilizado dados publicados (e não mais os dados individuais, pois a indústria não mais os fornece) para realizar suas metanálise (um tipo de estudo que reúne pesquisas realizadas por grupos diferentes de cientistas) de certas drogas.
Por exemplo, o medicamento bevacizumabe (foi avaliado pela Cochrane por meio de metanálises para) o tratamento do câncer de cólon (ver:aquifoi retirado da lista do orçamento do sistema de saúde da Inglaterra neste ano (ver aqui:aqui e aqui)_. Portanto, este acontecimento reduz a qualidade da “evidência” que havia antes.
É reconfortante para todos acharmos que a prática da medicina hoje em dia é sustentada por evidências científicas sólidas.

Infelizmente, a verdade é que a maior parte desta evidência é frágil, quando não deliberadamente fraudulenta para vender remédios e equipamentos.”
Deixo então para todos, especialmente para os profissionais da saúde, estas palavras da Luíza para nossa reflexão neste final de semana.
Podemos confiar na indústria de medicamentos e equipamentos médicos?
Pessoalmente, defendo que precisamos nos organizar melhor para cobrarmos do estado um maior controle de todas as atividades que geram lucros às custas das doenças das pessoas.

Meu sonho é o seguinte: a saúde não deve ser produto, a saúde não deve ser comércio, a saúde não pode dar lucro: a saúde é direito de todos.
Faleceu ontem, aos 23 anos, o Victor Silva Rezende, nosso companheiro da Associação Mineira de Apoio às Pessoas com Neurofibromatoses (AMANF).

Seus pais, Socorro e Ladislau, trouxeram Victor ao nosso ambulatório em 2008 e a partir daquela data pude acompanhar o carinho, a dedicação e o amor profundo que eles dedicavam ao seu filho único, que infelizmente nasceu com uma forma mais grave da NF1.

Socorro e Ladislau empenharam-se de todas formas ao seu alcance para dar ao Victor apoio, educação e segurança. Eles acolheram de forma ativa e construtiva as grandes limitações de aprendizagem que a doença causou ao Victor.

Victor, Socorro e Ladislau foram companheiros assíduos nas nossas reuniões mensais nestes últimos 7 anos, permitindo-nos conviver com a simpatia, a cordialidade, as grandes mãos delicadas e a participação silenciosa e atenta do adolescente Victor, que foi se tornando homem ao longo do tempo, sem perder a candura dos primeiros anos de sua vida.

Sentiremos sua falta, Victor. A falta do seu coração bondoso a nos iluminar nas atividades da nossa AMANF. Continuaremos adiante em seu nome, da Socorro e do Ladislau.

(Foto de uma das nossas reuniões mensais, em setembro de 2013, na qual Victor está em primeiro plano)
Ontem comecei a falar sobre um problema que afeta 4% das pessoas com NF1: a hipertensão arterial de início recente em crianças, jovens e adultos jovens. Metade destes casos acontecem por causa do estreitamento da artéria renal que já comentei, a outra metade é decorrente do aparecimento de um tipo de tumor chamado feocromocitoma.
Este nome complicado, feocromocitoma, indica que é um tumor (oma) formado por células (cito) que são coradas (cromo) numa cor escura (feo). Estas células fazem parte do sistema nervoso, e ficam agrupadas na parte central de duas glândulas localizadas sobre os rins: as suprarrenais. Elas produzem naturalmente a adrenalina, uma substância que todos conhecem ligada às emoções, porque ela ativa algumas funções no organismo, como o estado de alerta mental, os batimentos cardíacos e a produção de suor.
Nas pessoas com NF1, a deficiência de neurofibromina aumenta a chance de células do sistema nervoso e da pele crescerem desordenadamente formando tumores, por isso estas células produtoras de adrenalina também podem crescer mais do que o necessário, formando tumores em 2% das pessoas com NF1, em geral a partir dos 15 anos de idade, mas com maior frequência em torno dos 35 anos.
Quando ocorrem, os feocromocitomas geralmente são benignos (90%) e podem se apresentar com sintomas que significam o excesso de adrenalina no sangue. As pessoas com feocromocitomas podem apresentar um ou mais dos seguintes sintomas e sinais:
1)     Crises de aumento da pressão arterial em repouso ou hipertensão sustentada por vários dias;
2)     Palpitações;
3)     Dor de cabeça forte;
4)     Tontura;
5)     Suor abundante sem relação com a temperatura do ambiente;
6)     Crises de vermelhidão da face;
7)     Alteração dos níveis da glicose sanguínea (para mais ou para menos);
É importante lembrar que as crises de ansiedade, que afetam qualquer pessoa, inclusive aquelas com NF1, podem se manifestar exatamente com os mesmos sinais e sintomas, o que às vezes nos faz deixar passar desapercebido um feocromocitoma.
Suspeitando da presença deste tumor, devemos medir a produção dos derivados da adrenalina na urina colhida durante 24 horas, chamadas de catecolaminas urinárias (ácido vanilmandélico, adrenalina, noradrenalina, metanefrina). Este exame é mais confiável quando a urina é colhida durante os sintomas acima.
Se a suspeita existe e o exame de urina é normal, outros exames são necessários. Os mais sensíveis são a ressonância magnética e a tomografia computadorizada com a emissão de pósitrons (PET CT), capazes de descobrir mesmo os menores tumores de até 1 cm. Este último exame pode auxiliar na descoberta de feocromocitomas também localizados fora do local mais comum que são as suprarrenais, como, por exemplo, no intestino, onde são chamados de tumores carcinoides.
A maioria dos feocromocitomas ocorre nas glândulas suprarrenais, mas 10% deles podem ocorrer nos intestinos, na artéria aorta (no arco aórtico ou no órgão de Zuckerkandl) e no mediastino.
Confirmada a presença do feocromocitoma (ou dos carcinoides), estamos diante de uma urgência de tratamento, que deve ser realizado por profissionais experientes neste problema.  O tratamento é cirúrgico e envolve uma preparação de cerca de 7 dias para conter os efeitos da adrenalina em excesso (com bloqueadores alfa e beta) antes da retirada dos tumores, que podem estar presentes em ambos os rins.
É preciso lembrar que os feocromocitomas ignorados podem ameaçar a vida, especialmente durante cirurgias e durante a gravidez.
Os casos mais graves, os feocromocitomas malignos (10%), devem ser tratados com cirurgia e quimioterapia associada.

Mais uma vez, digo que é importante medir a pressão arterial de todas as pessoas com NF1 regularmente.

Uma pessoa com NF1 enviou-me um e-mail lamentando a minha demora em responder sua dúvida. 

Compreendo sua reclamação, mas geralmente tenho uma lista de cerca de 20 perguntas que me foram enviadas, as quais vou respondendo uma a uma a cada dia, de acordo com alguns critérios: se é um problema comum a muitas pessoas, a gravidade do problema e se posso dar alguma orientação útil à distância, pela internet.
Assim, quanto mais comum e mais grave e mais eficaz possa ser a orientação, mais cedo respondo à pergunta. Hoje, por exemplo, vou comentar um problema que afeta apenas 4% das pessoas com NF1, mas que pode ser tratado com grande eficiência e que basta apenas uma ação muito simples para salvar a vida: medir a pressão arterial regularmente.
O aumento relativamente recente da pressão arterial em pessoas com NF1, especialmente em crianças, jovens e adultos jovens, deve fazer o médico pensar em duas causas importantes: 1) a estenose da artéria renal e 2) um tumor chamado feocromocitoma.
Vamos ver primeiro a estenose da artéria renal.
As artérias renais são vasos sanguíneos que levam o sangue aos rins, para que o sangue seja filtrado e algumas substâncias em excesso sejam eliminadas (por exemplo, ácidos e nitrogênio) na urina. Para que o sangue seja filtrado, é preciso que ele chegue aos rins com uma determinada pressão, que é fornecida pelo bombeamento do coração.
Em cerca de 2% das pessoas com NF1 pode ocorrer um defeito (chamado de displasia fibromuscular) na tubulação das artérias renais, que causa um estreitamento, o qual faz com que a pressão do sangue fique menor naquele rim que recebe o sangue da artéria estreitada. Como o sangue chega com menor pressão do que a necessária para a filtração, o próprio rim produz substâncias que forçam o coração a aumentar a pressão de bombeamento.
O resultado desse estreitamento, então, é que a pressão arterial, aquela que deve ser medida com os aparelhos de pressão comuns durante os controles regulares anuais, aumenta acima dos limites normais para a idade, a estatura e o sexo da pessoa.
Se a pressão arterial permanecer aumentada durante muito tempo, o coração, os rins e as artérias cerebrais podem ser danificadas e problemas graves podem acontecer, como infarto no coração, incapacidade de os rins filtrarem o sangue ou derrames cerebrais. Por isso, a hipertensão arterial deve ser tratada.
Felizmente, na NF1, há a possibilidade de tratarmos o defeito na artéria renal e assim a hipertensão pode ser curada em cerca de 75% das pessoas. O tratamento consiste na realização de uma angiografia, ou seja, num exame de imagem para visualizarmos o calibre e o formato das artérias renais, para comprovação do estreitamento e sua localização. Geralmente, faz-se um cateterismo por meio de anestesia local e passagem da sonda por uma das artérias das pernas.
Em seguida, durante o próprio procedimento do exame de imagem, coloca-se um anel metálico especial de dilatação (stent) na região estreitada, recuperando-se o calibre normal da artéria renal. 

Este tratamento, a angioplastia transluminal, deve ser o primeiro a ser tentado, pois apresenta  60% de bons resultados. 

Quando o anel de dilatação não é possível ou não funciona, ou o estreitamento retorna, pode ser necessário o autotransplante do rim, ou seja, uma cirurgia que desconecta o rim da sua artéria obstruída e o reconecta a outra artéria sadia. Infelizmente, em alguns poucos casos pode ser necessária a remoção de um dos rins para tratar a hipertensão.
Portanto, segundo o grupo da Dra. Ferner, de Manchester (2011), o tratamento da hipertensão arterial secundária à estenose da artéria renal na NF1 é uma combinação de medicação anti-hipertensiva, angioplastia transluminal e cirurgia.

Por isso tudo, insisto que a medida da pressão arterial é obrigatória, indispensável, fundamental e pode salvar uma vida em 2% dos pacientes com NF1 durante os controles anuais.

Amanhã falarei do feocromocitoma.

Este post foi traduzido e adaptado pelo Dr. Nikolas Mata Machado em Chicago e publicado na NFMidwest (ver AQUI).

Abaixo o post em inglês:

A Simple, Life-Saving Action for NF1

Posted By NF Midwest | On May 31st, 2017
The following is a blog by Dr. Luiz Rodrigues . Originally posted in Portuguese on September 15, 2015. Additions and translation were provided by Dr. Mata-Machado from the NF Clinic at Amita Health/St. Alexis.
I am going to comment on a problem that affects only 4% of people with NF1, but it can be treated with great efficiency and that just a very simple action to save the life: measuring the blood pressure regularly.
The relatively recent increase in blood pressure in people with NF1, especially in children, young people and young adults, should make the doctor think of two important causes: 1) renal artery stenosis and 2) a tumor called pheochromocytoma.
Let’s first see the stenosis of the renal artery.
The renal arteries are blood vessels that carry the blood to the kidneys, so that the blood is filtered and some excess substances are eliminated (eg, acids and nitrogen) in the urine. For the blood to be filtered, it must reach the kidneys with a certain pressure, which is provided by pumping the heart.
In about 2% of people with NF1 a defect (called fibromuscular dysplasia) can occur in the tubing of the renal arteries, which causes a narrowing, which causes blood pressure to decrease in that kidney that receives blood from the narrowed artery . As blood arrives with less pressure than is necessary for filtration, the kidney itself produces substances that force the heart to increase the pumping pressure.
The result of this narrowing, then, is that blood pressure, which must be measured with ordinary pressure devices during regular annual check-ups, rises above normal limits for the person’s age, height, and sex.
If blood pressure stays increased for a long time, the heart, kidneys, and cerebral arteries can be damaged and serious problems can occur, such as a heart attack, inability of the kidneys to seep through blood or strokes. Therefore, high blood pressure should be treated.
Fortunately, in NF1, there is the possibility of treating the defect in the renal artery and thus the hypertension can be cured in about 75% of the people. The treatment consists in the accomplishment of an angiography, that is, in an image examination to visualize the caliber and the format of the renal arteries, to prove the narrowing and its location. Generally, a catheterization is done by local anesthesia and passage of the catheter through one of the arteries of the legs.
Then, during the imaging procedure itself, a special metal dilatation (stent) ring is placed in the narrowed region, recovering the normal caliber of the renal artery.
This treatment, transluminal angioplasty, should be the first to be tried, as it presents 60% of good results.
When the dilatation ring is not possible or does not work, or the narrowing returns, the kidney autotransplant may be necessary, ie surgery that disconnects the kidney from its obstructed artery and reconnects it to another healthy artery. Unfortunately, in a few cases it may be necessary to remove one of the kidneys to treat hypertension.
Therefore, according to the group of Dr. Ferner, from Manchester (2011), the treatment of hypertension secondary to renal artery stenosis in NF1 is a combination of antihypertensive medication, transluminal angioplasty and surgery.


For this reason, I insist that blood pressure measurement is mandatory, indispensable, fundamental and can save a life in 2% of NF1 patients during an annual exam.
Como tenho recebido algumas perguntas parecidas e não gostaria de deixar nenhuma sem resposta, vou apresentar abaixo dois conjuntos conjunto delas, com os links para as respostas já fornecidas neste blog.


Se ainda permanecerem as dúvidas, digam-me.

Perguntas sobre “cura” e crescimento dos neurofibromas

Há pouco descobri que minha sobrinha tem neurofibromatose, gostaria de saber essa doença é proveniente de que, tem cura e qual o tratamento. Obrigada. MPD, de local não identificado.

Olá, minha filha tem trinta anos e aumenta cada dia os fibromas. Nada ainda que evite a continuidade? Obrigada DMH, de Bagé, RGS.

Tenho 41 anos algum neurofibroma gostaria de saber se eles podem aumentar de número e/ou tamanho com o passar dos anos. MF, Salvador – BA
Respostas
As doenças genéticas geralmente não têm “cura”, mas podem ter muitos tratamentos que melhoram a qualidade de vida (clique aqui).
Os neurofibromas são de diferentes tipos e seu crescimento varia de acordo com o tipo e a idade das pessoas (clique aqui).
Perguntas sobre diagnóstico da NF1 e direito a benefícios no INSS
Tenho uma filha de 13 anos que foi diagnosticada com neurofibromatose tipo 1. Ela sente muita dor de cabeça, tem um pequeno desvio na coluna e apresenta atraso mental, a ponto de não conseguir atravessar a rua direito. Cheguei a matricula-la em alguns cursos para ver se melhorava o aprendizado, mas não resolveu. Gostaria de saber se minha filha teria direito a algum benefício do INSS. RG, Guarujá
Meu filho foi diagnosticado com neurofibromatose tipo 1 aos 8 anos de idade e hoje está com 22 anos. Atualmente ele vem sentindo dores na coluna e nas pernas, apresenta alguns neurofibromas pelo corpo, e sente muita falta de ar. Existe algum exame que confirme o diagnóstico da doença? Além disso, na cidade onde moro não tem assistência e penso em sair daqui para procurar tratamento adequado. O meu filho teria direito a algum benefício? M, Cabo Frio – RJ
Respostas

O diagnóstico da NF1 pode ser feito com bastante segurança na grande maioria dos casos apenas com o exame clínico (clique aqui).
Em alguns casos pedimos exames complementares, especialmente quando suspeitamos de deleção do gene (clique aqui).
Sim, existem benefícios previstos na legislação para pessoas com NF1 (clique aqui).
Se ainda restar alguma dúvida, voltem a fazer contato comigo.

Ontem comentei sobre o tratamento dos neurofibromas em resposta à pergunta da PNP de Botelhos, MG. 

Hoje vou apresentar o que podemos fazer se ocorrer uma transformação maligna de um neurofibroma plexiforme, pois neste caso estamos diante do chamado “tumor maligno da bainha do nervo periférico”, um nome complicado que resumimos para a sigla TMBNP (antigamente chamado pelos médicos de sarcoma, neurofibrossarcoma e outros nomes).
Vou contar a história de uma pessoa de 27 anos, com NF1, que chamarei de João, e que me procurou há dois anos por causa de dor no ombro e crescimento de um tumor na região esquerda do seu pescoço. Ele e sua dedicada família perceberam que o tumor aumentara de volume em pouco mais de uma semana, ao mesmo tempo que aparecera a dor e a dormência em seu braço esquerdo, além de redução da força em ambas as pernas.
Juntando estes sintomas, a consistência dura de um tumor de mais ou menos 8 centímetros no pescoço e o resultado da ressonância magnética, que mostrava que João tinha diversos neurofibromas pelo corpo, principalmente perto da coluna, concluí que ele apresentava a forma espinhal da NF1, com possível transformação maligna de um dos neurofibromas no pescoço.
Solicitei imediatamente uma tomografia computadorizada com emissão de pósitrons (PET CT), a qual mostrou grande captação de glicose em diversos neurofibromas, o que indica grande atividade metabólica. O tumor doloroso no pescoço do João era justamente aquele com altíssima captação de glicose, indicando sua transformação maligna. Diante disso, solicitei a remoção cirúrgica urgente do tumor, que deveria ser feita com boa margem de segurança e com exame anatomopatológico durante e após a cirurgia.
João retornou para seu estado natal e foi operado onze dias depois e a o estudo anatomopatológico confirmou que se tratava mesmo do TMBNP. Como o cirurgião afirmara que removera completamente o tumor do pescoço e não havia sinais de metástases, não foi iniciada a radioterapia complementar.
No entanto, três meses depois, João voltou a sentir dor no mesmo local e a ressonância magnética mostrou que o TMBNP havia retornado. Por motivos que desconheço, infelizmente, aquele primeiro tumor maligno não havia sido removido totalmente.
À distância acompanhei o tratamento do João: sessões de radioterapia e diferentes quimioterapias com vários medicamentos, mas o TMBNP mostrou-se resistente a todas as tentativas. Na semana passada, João faleceu depois de quase dois anos de luta contra sua doença. Neste período, sua família, especialmente sua mãe dedicada e carinhosa, garantiu a ele o máximo conforto possível.
É com grande tristeza que todos sentimos a perda precoce de uma vida, como a do João. Esta dor é agravada pela dúvida do porquê o tumor não foi completamente retirado na primeira cirurgia.
Conto a história do João porque estou triste, porque ele acabou de falecer e, principalmente, porque ela nos ensina algumas lições.
A experiência científica internacional mostra que o TMBNP geralmente surge na vida adulta a partir de um neurofibroma plexiforme já existente desde o nascimento, mas pode ocorrer sem a presença prévia do plexiforme.
Na NF1, toda dor recente, especialmente espontânea, contínua e forte, acompanhada de crescimento do neurofibroma e mudança na sua consistência, especialmente com a perda de função (como a perda de força do João) tem que ser investigada urgentemente.
O TMBNP deve ser tratado imediatamente com retirada cirúrgica, deixando-se uma boa margem de segurança, pois o sucesso do tratamento depende da remoção completa do tumor.
A radioterapia auxiliar deve ser aplicada sempre que possível, especialmente nos TMBNP maiores e mais complexos, pois ela pode atrasar a volta do tumor, apesar de não modificar o tempo de sobrevivência. 
As quimioterapias, até o momento, não têm mostrado benefícios, a não ser como tratamento paliativo para os casos de metástases.
Portanto, no caso do TMBNP, especialmente com metástases, infelizmente estamos diante de um tumor muito agressivo. Apenas cerca de metade das pessoas tratadas atualmente sobrevivem mais de 5 anos depois do diagnóstico do TMBNP.
Nossa esperança é a remoção cirúrgica total do TMBNP nos casos diagnosticados a tempo, assim como nas diversas pesquisas em andamento em todo o mundo, as quais buscam algum medicamento eficaz para este tipo de tumor, que é a principal causa da redução de cerca de 8 anos na expectativa média de vida nas pessoas com NF1.
Até a próxima segunda.