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“Tenho 24 anos e moro em Brasília. Sou portadora da neurofibromatose tipo 1 e faço acompanhamento desde uns 5 anos de idade. A NF1 já vem de carga hereditária da minha família. Em setembro do ano passado descobri que estava grávida, o que me trouxe preocupações pois, tenho um neurofibroma de 16 cm no meu abdômen próximo ao útero. Fiz o acompanhamento com o pré-natal de alto risco e cheguei a solicitar consulta com meu neurologista, mas o hospital se recusou a marcar um retorno para mim só pelo fato de eu estar gestante. Faço uso da medicação cloridrato de duloxetina há mais de um ano e permaneci o uso da mesma na gestação. Com 28 (7 meses) semanas de gestação minha filha faleceu na barriga. Após o óbito dela descobri que ela havia parado de desenvolver com 24 semanas (6 meses) e esse fato me trouxe muitas dúvidas pois não recebi uma explicação em relação ao falecimento dela. Gostaria de saber se o óbito dela e ela ter parado de desenvolver pode estar ligado à NF1? ” T, de Brasília.

Cara T., obrigado pelo seu contato.

Lamento a perda de seu bebê e tentarei ajudar você neste momento repassando-lhe as informações científicas que disponho até o momento sobre problemas na gestação em pessoas com NF1.

Como você já sabe, há uma chance de 50% de que um bebê venha a herdar a mutação no gene NF1 de sua mãe. Se isto de fato aconteceu com seu bebê, então se torna possível que ele tenha tido algum problema de desenvolvimento e falecido por causa da mutação genética que atrapalhou seu crescimento. Sabemos que a proteína neurofibromina é fundamental no desenvolvimento do embrião em diversos momentos e esta proteína está deficiente nos bebês com NF1.

Por outro lado, se um bebê não herdou a mutação no gene NF1, ainda assim ele pode ter problemas de desenvolvimento como qualquer outro bebê sem NF1, como acontece numa percentagem de gestações da população em geral.

Além disso, sabemos que as gestantes com NF1 apresentam mais complicações do que as mulheres sem NF1, como aborto espontâneo e eclâmpsia e a presença de grandes neurofibromas próximos do útero podem exercer alguma compressão atrapalhando o parto.

Finalmente, vamos pensar no uso da duloxetina durante a gestação.

A duloxetina é um medicamento do grupo dos inibidores seletivos da receptação da serotonina (ISRS), que é utilizado no tratamento da depressão.

Veja o que as próprias bulas deste tipo de medicamento (ISRS) nos alertam:

Gravidez:

1) Não houve estudos bem-controlados e adequados em mulheres grávidas. Devido ao fato dos estudos de reprodução animal nem sempre predizerem a resposta em humanos, este medicamento deve ser usado em gestantes somente se o benefício potencial justificar o risco para o feto.

2) Trabalho de parto e no parto: O efeito da duloxetina sobre o trabalho de parto e no parto em humanos é desconhecido. Duloxetina deve ser usada durante o trabalho de parto e no parto somente se o benefício justificar o risco potencial para o feto.

3) Este medicamento não deve ser utilizado por mulheres grávidas ou amamentando sem orientação médica ou do cirurgião-dentista.

4) Recém-nascidos expostos a ISRS no final do 3º trimestre desenvolveram complicações, exigindo hospitalização prolongada, suporte respiratório e alimentação via sonda. Tais complicações podem surgir imediatamente após o parto.

5) Portanto, o médico deve considerar cuidadosamente a relação entre riscos e benefícios do tratamento com duloxetina em gestantes no 3º trimestre.

Assim, cara T., há uma possibilidade de que seu bebê tenha sido vítima deste conjunto de situações: a herança da mutação no gene, a sua própria condição como gestante com NF1, o uso de duloxetina durante a gestação ou estas três condições combinadas.

Creio que não saberemos com certeza o que aconteceu de fato, mas sua história é mais um importante aprendizado para todos nós.