Ontem vimos o depoimento do Rogério Barbosa sobre a tese do Dr. Daniele Carrieri (foto) sobre como as famílias e os serviços de saúde acompanham as neurofibromatoses do tipo 1, pelo fato de serem doenças genéticas com enorme variabilidade na expressão clínica.


Depois de ler os resultados da tese, encaminhei ao Dr. Daniele, por meio do Rogério Barbosa, uma pergunta que ele prontamente respondeu e o Rogério traduziu para nós.

Dr. Lor: Como você entendeu a resistência das famílias em aceitarem o diagnóstico da NF1?
Dr. Daniele: Sua pergunta é muito importante e transversal a muitas das questões que eu enfrentei durante a minha tese. A resistência depende de vários fatores inter-relacionados. Vou tentar resumir alguns abaixo.
A extrema variabilidade da NF1
Por causa da sua variabilidade, a NF1 não parece estar associada a uma doença de identidade ou ligada a alguma comunidade. Pessoas levemente afetadas, muitas vezes, se recusam a identificar-se com as mais seriamente afetadas e vice-versa.
A tendência para ignorar a NF1
Muitas pessoas diagnosticadas com a NF1 e seus familiares me disseram (explícita e implicitamente) como eles tendem a ignorar, normalizar, ou mesmo rejeitar a NF1, sempre que possível.
Eles falaram que preferem normalizar ou minimizar os transtornos causados pela NF1, evitando pensar nisso, e concentrarem-se nos aspectos positivos ou mais urgentes da vida diária. Esta tendência não parece ser influenciada pela gravidade da NF vivida pela indivíduos e famílias. Esta tendência também pode ser vista como uma forma de gerir a incerteza dos sintomas da NF1.
Ao mesmo tempo, a NF1 pode tornar-se relevante em certos momentos particulares na vida das pessoas, especialmente quando surgem complicações graves ou em relação a escolhas reprodutivas.
Uma identidade fragmentada da doença 
O aparecimento de complicações sérias não necessariamente leva as pessoas a aceitarem o diagnóstico NF1. As identidades dos indivíduos e famílias com NF1 tendiam a ser fragmentadas de acordo com o que eles percebiam ser os sintomas mais graves (por exemplo, tumores, etc.).
Curiosamente, por causa disso, as pessoas passam a procurar formar associações de apoio relacionadas com os sintomas específicos da NF1 (por exemplo, grupos de apoio às pessoas com câncer, escolas para aqueles com necessidades especiais, etc.), ao invés de serem relacionadas com a própria doença. 
Um sistema de saúde fragmentado
As entrevistas que fiz com os profissionais de saúde envolvidos no tratamento de NF1 me permitiram identificar mais uma causa para a resistência das famílias em aceitarem a doença.
A maioria dos profissionais de saúde lamentou a falta de conhecimento geral sobre a doença e de serviços eficazes para a NF1. Eles também observaram que – à semelhança do que eles haviam notado com outras condições complexas e que se desenvolvem ao longo da vida do paciente (por exemplo, síndrome de Marfan, paralisia cerebral, espinha bífida etc.) – os sintomas da NF1 são tratados, normalmente, de maneira separada e por diferentes especialistas médicos, sem ninguém tomar o entendimento da doença como um todo, ou coordenar o serviço de atendimento ao paciente.
Isso me levou a perceber que há uma tendência em criar a identidade do paciente espelhada na estrutura e nas práticas do sistema de saúde que o atende. Interpretei a “tendência a minimizar e não pensar sobre NF1” como uma possível forma de “ajuste” à falta de serviços médicos adequados para a doença.
Eu também sugeri que a abordagem médica predominante, caracterizada pelo tratamento de sintomas específicos, sem uma compreensão global da doença, reflete nos pacientes e nas famílias, a tendência em minimizar a sua condição como um todo, e só considerar os sintomas específicos quando eles se tornam evidentes.

O Rogério Lima Barbosa (foto) é pai da Maria Vitória e por causa dela foi um dos fundadores da Associação Maria Vitória de Doenças Raras (AMAVI) sediada em Brasília.

Continuando sua luta pelas pessoas com doenças raras, em especial pelas pessoas com neurofibromatoses, Rogério foi para Portugal, onde realizou seu mestrado em Ciências Sociais estudando as relações entre as indústrias (farmacêutica, médica e de equipamentos médicos) com as associações de defesa das pessoas com doenças raras.

Atualmente, Rogério está na Inglaterra para dar continuidade ao seu doutorado na mesma linha de interesse: as doenças raras e as neurofibromatoses. Ele me mandou seu depoimento sobre sua trajetória até encontrar a tese de seu possível orientador, Dr. Daniele Carrieri, na Universidade de Exeter, publicada em 2011 e intitulada: “Neurofibromatose do tipo 1 (NF1): Experiências das famílias e dos sistemas de saúde no manejo de uma síndrome genética caracterizada por manifestações clínicas altamente variáveis” ( ver a tese completa em inglês clicando aqui ).

Vale a pena ler o seu depoimento a seguir.

“O “mundo” da Neurofibromatose do tipo 1 (NF1), foi-me apresentado em 2010, quando se levantou a suspeita do diagnóstico para a minha filha. 

A partir de então eu conheci tanto o cuidado médico dos especialistas em entenderem a doença e a melhor forma de falar com a família como, também, as notícias um tanto apocalípticas da grande maioria dos profissionais.

Na maior parte dos casos, a suspeita da NF surge de profissionais que não são especialistas na doença. Baseados nas poucas informações que conseguem lembrar do tempo de estudos ou das atualizações que passam durante a vida profissional são eles que, não raro, empurram as famílias para um mundo de dúvidas e incertezas.

Jogados neste mundo, sozinhos, acabam por serem os responsáveis por conseguirem entender o que é a NF. Assim, provavelmente o caminho começará com o “Dr. Google”. É lá que se encontram as horripilantes (desculpem o termo, mas não consigo encontrar algo melhor) notícias sobre o que é a NF. Eles ainda não sabem, mas são notícias desatualizadas e que chegam a assustar qualquer pai/mãe que busca as informações sobre a NF.

Com sorte, essas pessoas conseguem encontrar alguma Associação, como a AMANF ou o CNNF. Quando conseguem esse encontro, muitas questões passam a ser esclarecidas e se inicia um longo processo de aprendizado sobre a doença ou sobre como lidar com os seus sintomas.

Esse caminho foi particularmente vivido por mim. Tenho a plena consciência de que é apenas um dos vários caminhos que surgem para lidar com uma doença tão diversificada quanto a NF. Por ele comecei a traçar um novo projeto de vida que consiste em dedicar-me aos estudos sobre a sociologia e o impacto da NF na família e na sociedade. Consegui o meu mestrado e hoje estou no doutorado. 

Das leituras que eu consegui fazer nesta fase de estudos, sem sombra de dúvidas, a tese de doutorado de Daniele Carrieri, Neurofibromatose do tipo 1 (NF 1): Experiências familiares e a gestão da saúde em uma doença genética com fenótipo altamente diversificado, defendida em 2011 na Universidade de Exeter – Inglaterra, é a mais interessante. Sem contar que, até onde eu sei hoje, é a primeira a lidar com a NF1 em uma perspectiva sociológica.

Em um trabalho permeado com toques pessoais, o autor estrutura a sua tese sobre a imprevisibilidade dos sintomas da NF1. E para um estudo que toma a imprevisibilidade como tema central, surpreendemo-nos com as imprevisíveis emoções que surgem de sua leitura.

Nos primeiros capítulos, somos como estudante que, com ansiedade, aprendem um tanto sobre a Neurofibromatose. As suas particularidades clínicas, o desenvolvimento dos seus conceitos e o aumento do interesse sobre a doença que, com o tempo, consegue separá-la de outras e identificar as suas variações. 
Conhecemos até a interessante sugestão de sua influência na arte, como o quadro “Mulher com a boina vermelha”, de Pablo Picasso.
O decorrer da leitura impele para a mudança da ansiedade para um pensamento militante.  Acompanhamos o debate sobre a influência da genética na construção das identidades e o distanciamento do autor de algumas ideias “mainstream” (dominantes) ligadas a biocidadania e o envolvimento das famílias nas associações.

As transcrições para a tese de parte das entrevistas, transporta o nosso coração, uma vez que vemos nossas crianças e familiares, ali à nossa frente. Em momentos de angústia, dúvidas e ansiedade lemos as linhas com a perfeita noção do que aqueles entrevistados querem passar, compartilhamos algumas ideias e discordamos de outras. Mas a emoção é a companheira contínua de todos os parágrafos. O debate que nos persegue internamente é: – Vivemos uma maldição?

Na parte final da tese somos tomados pela questão sobre o que fazer. Em uma análise do envolvimento dos diversos atores que circundam a NF, Associações, Profissionais de Saúde, Familiares e Pacientes, percebemos a complexidade do ambiente em que vivemos não somente como familiares ou pacientes, mas como cidadãos.

A tese do Dr. Carrieri é, sem dúvidas, uma fonte interessante para se conhecer a NF1, as questões genéticas sobre a saúde, o envolvimento associativo, das famílias e a disposição do sistema de saúde. O mais importante, ela consegue transpor a frieza do trabalho acadêmico para uma leitura que nos aquece internamente porque, pelo que se percebe, foi escrita de uma maneira sensível e cuidadosa. Boa leitura.”

Caro Rogério, obrigado por compartilhar conosco seu foco de atenção. Quem sabe teremos uma versão traduzida da tese do Dr. Daniele Carrieri no futuro? Boa sorte nos seus estudos e mantenha-nos informados. Abraço do amigo LOR.

Acabo de ler o livro “Porque NÃO somos racionais – como o cérebro faz escolhas e toma decisões” do Ramon M. Cosenza, Médico, Doutor em Ciências e Professor Aposentado do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais.




O livro foi recentemente lançado pela ARTMED e é escrito em termos claros e acessíveis a todas as pessoas interessadas e traz conceitos fundamentais para aqueles que querem entender como pensamos e como tomamos decisões (nem sempre certas ou as melhores).

Tenho a impressão de que este livro vai ajudar a muitas pessoas envolvidas com as dificuldades de aprendizagem na NF1, não só os profissionais da saúde, mas também os pais interessados em compreender melhor o desenvolvimento mental de seus filhos.

Admiro o Ramon há muitos anos pelas suas qualidades como cientista e ser humano, sua honestidade intelectual, sua sensibilidade social e seus múltiplos interesses, que vão da meditação (pura) à meditação regada a bons vinhos.

Sinto-me honrado por ser um de seus amigos há décadas.

O livro pode ser adquirido em livrarias e vi na Livraria da Folha de São Paulo (on line) por 39 reais.

Parabéns Ramon e longa vida para seu livro.
Continuando a resposta de ontem, apresento a seguir um resumo dos estudos científicos que verificaram o efeito do bevacizumabe (Avastin®) sobre schwannomas vestibulares.
A indicação de bevacizumabe vem aumentando e parece-me apoiada numa revisão feita pelo grupo do Dr. Plotkin, de Boston, Estados Unidos (ver aqui, em inglês)

Em 2012, eles reviram um total de 31 pessoas com NF2 e schwannomas vestibulares que receberam bevacizumabe como opção de tratamento.
Vejamos abaixo algumas características das pessoas tratadas, as quais receberam o medicamento durante cerca de 14 meses (6 meses para o tratamento mais curto e 41 meses para o mais longo).

A idade mediana das pessoas foi de 26 anos, no entanto, havia pessoas de 17 e de 73 anos, o que me deixa um pouco na dúvida se haveria entre elas algumas pessoas com schwannomas vestibulares, mas sem NF2.

A taxa média anual de crescimento dos tumores antes do bevacizumabe era de 64% de aumento, ou seja, um tumor de 2 cm havia passado para um pouco mais de 3 cm em um ano.

Depois de pelo menos 3 meses de tratamento com o bevacizumabe, a melhora na audição aconteceu em 13 de 23 pessoas (57%), ou seja, antes de começar o tratamento a chance do bevacizumabe funcionar seria mais ou menos como jogar uma moeda para cima e escolher cara ou coroa.

Da mesma forma, a redução (20%) do tamanho dos schwannomas na ressonância magnética aconteceu em 17 de 31 pessoas (55%), ou seja, antes do tratamento temos a metade da chance de dar certo.

Mesmo assim, a pequena redução do volume (20%) pareceu mais relacionada com o edema (líquidos ao redor do tumor) do que com a diminuição da parte sólida do schwannoma.

Depois de um ano do tratamento, 90% das pessoas tratadas permanecia com a audição estável. Não entendi bem como compararam com a possibilidade de,se não fossem tratadas, como estaria a audição?

Segundo os autores da pesquisa, o medicamento havia sido “bem tolerado” pelas pessoas.
No entanto, o tratamento com o bevacizumabe não é simples e seus efeitos colaterais podem ser importantes. Por isso, por exemplo, na Inglaterra, duas equipes médicas independentes entre si devem atestar que a pessoa precisa do tratamento com bevacizumabe para que ele seja iniciado.
O bevacizumabe deve ser administrado às pessoas por infusão venosa a cada 15 dias em ambiente hospitalar, o procedimento dura algumas horas e não pode ser dado a pessoas um mês antes ou depois de uma cirurgia ou durante a gravidez e amamentação.
  
A ressonância magnética do cérebro deve ser repetida a cada 3 meses para controle.
Dias ou semanas depois de iniciado o tratamento, podem acontecer quaisquer destes sinais e sintomas: náuseas, febre, alergia cutânea, inchação dos lábios e obstrução da garganta, falta de ar, tontura, tosse contínua, dor no peito e em diversas partes do corpo, fadiga geral, perda do apetite, diarreia ou constipação, aumento da pressão arterial, úlceras na boca, dificuldade de cicatrização, sangramento, embolia pulmonar, baixa resistência às infecções, insuficiência cardíaca, problema no funcionamento renal e infertilidade.
A minha conclusão é que, infelizmente, o bevacizumabe ainda não é uma BOA opção de tratamento. Por enquanto, creio que devemos seguir o tratamento padrão (ver o post de ontem) e torcer para que outra alternativa melhor seja descoberta.
Outras informações podem ser obtidas em inglês sobre schwannomas (aqui) e ineficácia do bevacizumabe em diminuir os meningiomas (aqui) em pessoas com NF2.

Bom final de semana.
Tenho a NF2. Faço acompanhamento com um neurologista no Rio, Dr. JGD. Em nosso último encontro ele me falou sobre o Avastin ®. O que o senhor tem a me dizer sobre o remédio? Sei que tenho que conseguir a receita e ser assistida por um oncologista. Aqui na minha microrregião não consegui, por desconhecerem sobre NF e sobre o uso de tal medicamento, que ainda não é regulamentado. Aí em BH alguém faz uso? Senhor teria algum oncologista para me indicar? PCSM, da Zona da Mata, MG.
Cara P, obrigado pela sua pergunta.
Como você disse que tem NF do tipo 2, imagino que seu neurologista esteja pensando em utilizar o medicamento bevacizumabe (Avastin ®) para tentar reduzir ou parar o crescimento de seus tumores benignos localizados nos nervos vestibulares (schwannomas vestibulares) de ambos os lados da cabeça.
De fato, o bevacizumabe é um agente quimioterápico que tem sido testado, especialmente na Inglaterra, em pessoas com NF2 e com schwannomas vestibulares que, por alguma razão, NÃO PODEM SE SUBMETER AO TRATAMENTO PADRÃO.
Então, vamos lembrar que o tratamento padrão é o acompanhamento clínico para se decidir o momento mais adequado para a redução cirúrgica de um dos tumores e, depois de avaliado o resultado da primeira cirurgia, a redução ou não do segundo tumor.
É fundamental lembrar que nas neurofibromatoses NÃO RETIRAMOS TUMORES APENAS PORQUE ELES EXISTEM: é preciso haver uma indicação de que o resultado da cirurgia será melhor do que a convivência com o tumor.
E quais são os critérios clínicos para indicarmos a redução cirúrgica? A sociedade Brasileira de Pesquisas em Neurofibromatoses publicou em 2015 uma orientação sobre a conduta nos schwannomas vestibulares da NF2 que você pode encontrar clicando aqui.
Resumidamente, realizamos o acompanhamento clínico anual (ou semestral, se surgirem novos sinais ou sintomas) e indicamos a cirurgia quando há evidências de que a qualidade de vida da pessoa está piorando: 1) sua audição está reduzindo rapidamente, 2) aparecem novos sinais ou sintomas neurológicos, como desequilíbrio, (especialmente aqueles sugestivos de compressão do tronco cerebral) e 3) um ou ambos os schwannomas vestibulares estão crescendo mais rapidamente do que 1 milímetro por ano.
Se estas condições forem preenchidas e a pessoa deseja ser operada, deve ser tentada a redução do tamanho de um dos schwannomas (geralmente o menor), sem o objetivo de remover radicalmente todo o tumor, para se evitar a perda auditiva total e a lesão do nervo facial. O nervo acústico e o nervo facial devem ser monitorizados continuamente por meio de sensores eletrofisiológicos para que seja evitada a sua lesão.
Quando as pessoas não podem ser submetidas a esta redução cirúrgica, na Inglaterra tem sido testado o medicamento bevacizumabe em pessoas com taxa de crescimento do schwannoma geralmente acima de 50% em um ano.
O bevacizumabe é um quimioterápico do grupo dos anticorpos monoclonais, ou seja aqueles que se ligam a determinadas partes das células, aumentando a possibilidade de reação imunológica contra o tumor. No caso do bevacizumabe, ele foi desenvolvido para inibir o crescimento de novos vasos sanguíneos num tumor que está aumentando rapidamente, o que reduz o suprimento de oxigênio e nutrientes para o tumor e ele acaba encolhendo.
Geralmente, o objetivo do tratamento tem sido reduzir o tamanho do tumor em pelo menor 20% e melhorar a audição.

Amanhã veremos se este resultado está sendo atingido e quais os efeitos colaterais do bevacizumabe.
Durante uma consulta em nosso Centro de Referência, uma família perguntou se pessoas com NF podem fazer tatuagens. 

Naquele momento, respondi que eu não conhecia informações científicas e seguras sobre isto, então o Dr. Bruno Cota, que estava presente, interessou-se por estudar o assunto e responder. 

Abaixo, a resposta dele.

“Procurei bastante, mas não encontrei nenhum estudo cientifico a respeito da realização de tatuagens em pessoas com neurofibromatose, seja tipo 1 ou 2. Portanto, não podemos afirmar que exista alguma recomendação específica para esse caso.

De qualquer forma, apenas baseados no bom senso, imaginamos que não é uma boa ideia estimular artificialmente com a tatuagem a pele de uma pessoa que possui problemas de controle do crescimento das células da própria pele. Além disso, sugerimos que se evite realizar a tatuagem em áreas aonde existam neurofibromas.

Mesmo assim, pode ser que no futuro possa surgir algum neurofibroma na área da tatuagem, podendo deformá-la. Salientamos que isso pode deformar a tatuagem aumentar as chances de arrependimento. 

Sugiro então que, após refletir com cautela e decidir por realmente fazer uma tatuagem, que sejam seguidas as recomendações da ANVISA expostas abaixo.

A tatuagem está presente em diversas civilizações desde milhares de anos. Consiste na realização de minúsculos orifícios na pele, pelos quais a tinta é introduzida até a derme, sua camada intermediária. Embora seja comum na atualidade, principalmente entre os jovens, a realização da tatuagem está longe de ser uma prática isenta de riscos para a saúde.

Antes de fazê-la, deve-se ter em mente que, embora existam técnicas para a sua remoção em caso de arrependimento, tirar a tatuagem é geralmente muito mais complicado, caro e doloroso do que fazer. Mesmo após várias sessões, que podem chegar a mais de dez, o laser pode não ser capaz de eliminar a tatuagem totalmente, e a pele pode nunca mais voltar a ser o que era antes. Portanto, por maior que seja a importância ou admiração pelo desenho, ou o amor à pessoa da qual queira tatuar o nome, é importante saber que nossas opiniões mudam ao longo da vida, e talvez no futuro esse desenho ou nome não represente mais algo tão agradável.

Dentre os riscos para a saúde, destaca-se o risco de alergia em relação ao pigmento, que pode durar anos, infecções na pele e a transmissão de doenças infecciosas graves, causadas por exemplo pelos vírus da hepatite C ou HIV. Para evitar essas complicações, é importante seguir algumas recomendações que se encontram no site da ANVISA, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ver aqui) 

Observe:
Se o local está limpo e organizado.
Se o local fornece aviso por escrito quanto aos riscos causados pelo material e/ou substâncias.
Se o profissional lava as mãos com água e sabão, seguido de aplicação de álcool a 70%.
Se é realizada a limpeza da pele do cliente com água potável e sabão líquido, seguida de aplicação de antisséptico (álcool a 70%, PVPI) entre outros.
Se o profissional utiliza luvas descartáveis e máscara no momento da realização do serviço.
As agulhas para aplicação da tinta de tatuagem, lâminas ou aparelhos para raspagem de pelos devem ser descartáveis.
Outros materiais que não são descartáveis deverão estar limpos e desinfetados com álcool 70%.
A tinta utilizada na tatuagem não pode ser tóxica e os materiais utilizados devem estar guardados em local limpo, organizado, fechado e sem umidade.  
Menores de idade só podem fazer tatuagem com autorização dos pais.”

Por enquanto, é isso. 
Certamente, no futuro, saberemos responder esta questão cientificamente.
Vimos ontem que avaliar o resultado dos tratamentos nas neurofibromatoses com base apenas no tamanho do tumor não é adequado porque nas NF os tumores podem crescer ou não, podem estar presentes há décadas e podem continuar ao longo de toda a vida sem causar grandes problemas.

Assim, nas NF temos que avaliar o resultado de um possível tratamento (medicamentoso ou cirúrgico) pensando nas consequências do tumor sobre a qualidade de vida da pessoa.

Um grupo de cientistas em NF discutiu esta questão (ver aqui ) e tentarei adaptar abaixo os 7 novos critérios para avaliarmos se um tratamento deve ou não ser utilizado por pessoas com NF.

Resultado do tratamento sobre o tamanho do tumor – é claro que também nas NF o tamanho do tumor é um dos fatores importantes, pois está relacionado com os sintomas, com o risco de transformação maligna, com deformidades e com a estética.

Resultado do tratamento sobre a capacidade funcional – como o tratamento altera ou não a capacidade da pessoa para conviver, estudar, se divertir e trabalhar.

Resultado do tratamento sobre a capacidade visual – em alguns casos, a manutenção ou recuperação da visão é o objetivo fundamental.

Resultado do tratamento sobre o relato da pessoa – o significado emocional, social e físico do tumor para a própria pessoa tem que ser levado em conta. Nem sempre o que os médicos consideram o mais importante coincide com a opinião das pessoas com NF.

Resultado do tratamento sobre a capacidade cognitiva – especialmente na NF1, as dificuldades de aprendizagem são o principal problema e devem ser levadas em consideração nos tratamentos propostos.

Resultado do tratamento sobre a ressonância magnética de corpo inteiro– esta é uma medida necessária nas pesquisas sobre efeitos de drogas sobre o conjunto de tumores em pessoas com NF.

Efeitos do tratamento sobre marcadores sanguíneos – existem diversas substâncias relacionadas com o crescimento dos tumores, que são dosadas no sangue e que precisam ser consideradas dentro dos objetivos das pesquisas sobre tratamentos nas pessoas com NF.
Portanto, ampliamos bastante o nosso olhar sobre o significado dos tratamentos nas pessoas com NF, indo muito além do tamanho do tumor.

Estes critérios aumentaram a complexidade dos estudos em NF, o que requer que as pesquisas sejam feitas em cooperação entre muitos centros de atendimento e profissionais de diversas áreas do conhecimento.

De nossa parte, no Centro de Referência em Neurofibromatoses do HC-UFMG, estamos tentando nos inserir na rede internacional de pesquisas em NF com este olhar mais cuidadoso. No momento, temos várias linhas de pesquisa em andamento (ver aqui ). Em todas elas procuramos ver e cuidar das pessoas e não apenas de seus tumores.
Porque as pessoas são muito maiores do que sua doença.
Retomo hoje a questão importante que me foi formulada na semana passada: por que as pesquisas realizadas em busca do tratamento das neurofibromatoses ainda não deram grandes resultados práticos nestes últimos 30 anos?


Primeiro, é preciso lembrar que a maioria (14) dos estudos em andamento (15) são voltados para a NF1 e apenas um deles para a NF2. Em oito destes estudos, jovens e crianças são as pessoas com NF1 envolvidas nas pesquisas. 

Excluindo-se os dois estudos sobre dificuldades de aprendizagem na NF1 (um deles com LOVASTATINA e o outro com SINVASTATINA), os objetivos das pesquisas foram encontrar medicamentos capazes de diminuírem (ou mesmo pararem) o crescimento dos tumores(neurofibromas, gliomas, schwannomas) ou reduzirem o seu tamanho (volume).

Ora, estes dois objetivos usados nas pesquisas apresentam dois problemas que podem explicar um pouco a nossa dificuldade na descoberta de um medicamento eficaz para melhorar a vida das pessoas com neurofibromatoses.

O primeiro problema é que NUNCA sabemos, num dado momento e numa determinada pessoa com neurofibromatose se aquele tumor vai crescer ou continuar do mesmo tamanho. Esta afirmação vale para neurofibromas cutâneos, subcutâneos e plexiformes e gliomas ópticos na NF1, assim como para schwannomas vestibulares e meningiomas na NF2, e também para os schwannomas dolorosos na Schwannomatose.

Assim, como ter certeza que um medicamento impediu o crescimento de um tumor, por exemplo, durante seis meses de tratamento experimental, se não sabemos se ele cresceria ou não naquele período?

O segundo problema é a grande importância dada pelos cientistas ao tamanho dos tumores nestas pesquisas. Na maioria das doenças tratadas pela oncologia, ou seja, as neoplasias benignas ou malignas, os tumores VÃO CRESCER e por isso a conduta geral dominante é retirar o tumor e, se isto não for possível, reduzir seu tamanho. Assim, é claro que reduzir o tamanho do tumor deve ser o principal objetivo de todos os tratamentos em oncologia.

No entanto, este objetivo não se aplica adequadamente às neurofibromatoses. Nas NF, ao contrário dos cânceres, os tumores podem crescer ou não, podem estar presentes desde a vida intrauterina (plexiformes e gliomas, por exemplo), podem levar décadas para provocar algum sintoma (schwannomas vestibulares, por exemplo) ou nunca causarem problemas (parte dos meningiomas e gliomas, por exemplo).

Assim, temos que buscar outros alvos nas pesquisas sobre tratamentos para as neurofibromatoses.

Amanhã comentarei uma opinião inovadora sobre quais devem ser os verdadeiros alvos para tratamento nas neurofibromatoses.
Esta é uma pergunta muito frequente por parte de quase todas as pessoas que possuem neurofibromatoses e suas famílias.




Geralmente entendo a pergunta com o seguinte significado: existem medicamentos sendo estudados para a cura das neurofibromatoses? Percebo, então, a mistura que geralmente fazemos entre “cura” e “tratamento”.

É importante lembrar que existem diversos tratamentos para alguns problemas decorrentes dos defeitos genéticos que estão na origem das neurofibromatoses, mas os defeitos genéticos em si não podem ser reparados definitivamente.

Ou seja, mesmo que possamos controlar ou remover um determinado problema (um neurofibroma, por exemplo), a pessoa continuará levando consigo em todas as suas células o defeito genético que originou sua doença.

Portanto, o que podemos fazer são estudos científicos em busca de melhor solução de alguns problemas, a partir daqueles mais comuns. 

Por exemplo, na NF1: como melhorar as dificuldades de aprendizagem, como evitar o crescimento dos neurofibromas, como tratar o glioma óptico etc.?  Na NF2: como parar o crescimento dos schwannomas e meningiomas, como tratar a catarata juvenil, etc.? Na Schwannomatose: como eliminar a dor nos schwannomas ou como evitar o seu aparecimento?

Neste sentido, as pesquisas tanto poderiam ser a busca por tratamentos cirúrgicos, fisioterápicos, fonoaudiológico, nutricionais ou psicológicos quanto por medicamentos.

No momento, nossa cultura médica é grandemente influenciada pela indústria de medicamentos e equipamentos médicos. Assim, a maioria das pesquisas em andamento têm como objetivo descobrir medicamentos que permitam o controle das principais complicações das neurofibromatoses.

Num encontro entre especialistas em neurofibromatoses promovido pelo Children’s Tumor Foundation, os principais estudos em andamento que procuram medicamentos para as neurofibromatoses foram discutidos (CLIQUE AQUI para ver  a publicação em inglês de 2013). Suas conclusões parecem válidas, por enquanto.

Eles consideraram um total de 15 estudos, quase todos buscavam tratamento para NF1 (14). A maioria (10) pesquisava algumas drogas para diminuir o tamanho dos neurofibromas plexiformes, dois tentavam melhorar as dificuldades de aprendizagem, um procurava reduzir o tamanho dos gliomas ópticos e apenas um tentara  diminuir o crescimento dos neurofibromas cutâneos (Riccardi em 1993).

Finalmente, um dos estudos tentava diminuir o tamanho dos schwannomas vestibulares na NF2.

Na segunda feira, volto a este tema com novas conclusões importantes.

Bom final de semana.
Continuando as informações de ontem, lembro que o acompanhamento clínico para as crianças com NF1 com gliomas ópticos deve ser feito a cada 3 meses, durante os dois primeiros anos a partir do diagnóstico do glioma.



Depois de 2 anos do diagnóstico do glioma, se o tumor estiver estável, realizar o controle anualmente com ressonância magnética até os 12 anos de idade.
A partir dos 7 anos, o exame oftalmológico com a medida do campo visual anualmente pode ser uma boa alternativa para o acompanhamento de crianças com NF1 e glioma óptico: se o campo visual estiver normal ou inalterado, realizar a ressonância de 12 em 12 meses. Se o campo visual se alterar, realizar a ressonância de 6 em 6 meses.
Outras informações importantes:
O tratamento de gliomas ópticos na NF1 deve ser sempre adiado se os sintomas são leves ou ausentes;
O tratamento do glioma óptico na NF1 só deve ser iniciado quando há agravamento da perda da visão e o tumor estiver deformando a face (devido à proptose acentuada) ou ameaçando a vida pela compressão das estruturas nervosas próximas.
Nestes casos mais raros e graves, abaixo dos 3 anos o tratamento de primeira escolha é a quimioterapia (geralmente a carboplastina isolada ou associada à vincristina), lembrando que, além dos efeitos colaterais (toxicidade, esterilidade e outros tumores), em metade dos casos tratados com quimioterapia o glioma óptico retorna nas crianças com NF1.
Quando a quimioterapia não dá resultado naqueles casos mais graves, a radioterapia pode ser uma alternativa paliativa, lembrando que pode também produzir efeitos colaterais importantes. Crianças com NF1 tratadas com radioterapia podem apresentar deficiência intelectual e hormonal (crescimento, tireoide) e doenças vasculares cerebrais (doença de Moya-Moya), assim como aumenta a chance de aparecimento de outros tumores.
A cirurgia tem papel limitado, geralmente é reservada para os casos raros mais extremos de proptose acentuada ou casos graves em que a radioterapia falhou, e a remoção do nervo ótico resulta em perda completa da visão naquele olho.
Portanto, nossa torcida é para que sua filha esteja entre aqueles 85% das crianças com NF1 e gliomas ópticos que não causam qualquer problema. Para os casos mais graves, continuamos torcendo para que seja descoberto algum medicamento que possa melhorar nossos resultados atuais no tratamento dos gliomas ópticos na NF1.

Imprima estas opiniões e leve à pediatra de sua filha. Você pode também indicar para a médica o nosso artigo de 2015 (obtenha o artigo completo clicando aqui), onde ela encontrará mais instruções técnicas para o controle clínico dos gliomas ópticos na nas crianças com NF1.