O que o sistema de saúde precisa oferecer para as pessoas com NF?

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O Dr. Paulo Chiabai, um advogado de Vitória (ES) que generosamente vem auxiliando a construção da Associação de Apoio aos Portadores de Neurofibromatose do Espírito Santo, nos pergunta quais os procedimentos adotados no nosso Centro de Referência em Neurofibromatoses do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais.

Com base nestes procedimentos habituais, o Dr. Paulo pretende estabelecer o quantitativo de verbas que deveriam ser destinadas ao diagnóstico e tratamento das pessoas com NF no Estado do Espírito Santo.

Respondi pessoalmente ao Dr. Paulo e torno pública minha resposta porque ela pode ser útil a outras pessoas.

Primeiro, devo dizer que nosso Centro de Referência é um ambulatório do Hospital das Clínicas da UFMG e, portanto, está inserido no Sistema Único de Saúde e sujeito às normas gerais do SUS, com as quais concordamos. Por outro lado, sofremos também a falta crônica de recursos financeiros do SUS, o que limita profundamente nosso atendimento em termos de rapidez e amplitude de tratamentos, especialmente cirúrgicos.

Ao longo destes 13 anos de atividades no nosso Centro de Referência já foram cadastradas cerca de 1200 famílias com as diversas formas de NF, sendo a imensa maioria de pessoas com NF1, cerca de 20 famílias com NF2 e cerca de 10 com Schwannomatose. Diante disso, é natural que nosso atendimento seja mais voltado para as pessoas com NF1 do que para a NF2 e a Schwannomatose.

Nossa média de casos novos por ano é cerca de 100 casos, o que significa uma grande demanda, representando, por exemplo, um terço de todos os casos novos registrados no Japão, além de atendermos em média 450 retornos ambulatoriais anualmente.

 

Condições para o diagnóstico da NF1

O diagnóstico da NF1 é essencialmente clínico e em cerca de 95% dos casos basta a consulta médica com profissional experiente na doença para que o diagnóstico seja feito com segurança.

O exame clínico oftalmológico também pode ser uma ferramenta importante na complementação do diagnóstico.

A participação da neurologia é importante no diagnóstico quando há convulsões, gliomas ópticos, tumores cerebrais ou neurofibromas espinhais compressivos.

A interconsulta com a ortopedia é fundamental nos casos de displasias ósseas e desvios da coluna vertebral.

A análise de riscos e benefícios pela cirurgia é indispensável nos casos com necessidades cirúrgicas.

Avaliação fonoaudiológica, psicológica e cognitivas são necessárias em cerca de metade das pessoas com NF1, especialmente crianças e adolescentes.

Alguns casos de alterações do comportamento em pessoas com NF1 podem necessitar o auxílio da psiquiatria.

 

Exames complementares

A análise do DNA pode ser necessária para completar o diagnóstico de algumas formas da NF1 em cerca de 10% dos casos.

Exames de imagem podem ser indicados em cerca de 20% dos casos para avaliar a presença de complicações.

Outros exames complementares ocasionalmente são solicitados, como eletroencefalograma, ultrassom de abdome e exames de sangue.

Em casos de suspeita de transformação maligna de neurofibromas plexiformes, a tomografia com emissão de pósitrons (PET CT) é fundamental para a orientação terapêutica.

Portanto, os ambulatórios interligados necessários para o diagnóstico da NF1 são:

  • Medicina geral (clínica médica)
  • Oftalmologia
  • Neurologia
  • Ortopedia
  • Cirurgia
  • Fonoaudiologia
  • Psicologia
  • Psiquiatria

Os laboratórios complementares acessíveis aos pacientes devem ser:

  • Ressonância magnética
  • Análises genéticas
  • Ultrassonografia
  • PET CT com 18FDG

 

Condições para o diagnóstico da NF2 e a Schwannomatose

Tanto os diagnósticos da NF2 como da SCH requerem o exame clínico experiente, o qual solicita o estudo por imagem por meio de ressonância magnética, a audiometria e o exame oftalmológico (de preferência com Tomografia de Coerência Óptica) e o estudo anatomopatológico.

Portanto, as condições para o atendimento para o diagnóstico da NF1, NF2 e Schwannomatose são relativamente semelhantes e necessitam do acesso a uma estrutura ampla como a do Sistema Único de Saúde.

 

Condições para o tratamento das NF

 

Não existem ainda tratamentos medicamentosos cientificamente comprovados para as neurofibromatoses, seja para a NF1, para a NF2 ou para a Schwannomatose.

 Portanto, quando indicados, os tratamentos atuais disponíveis são cirúrgicos, fonoaudiológicos, psicológicos ou sintomáticos (como analgésicos, psicotrópicos, antipruriginosos, anticonvulsivantes, coletes ortopédicos, etc.).

A principal demanda cirúrgica na NF1 é a cirurgia plástica para a retirada de neurofibromas cutâneos e para tratamentos restauradores de deformidades causadas por neurofibromas plexiformes. Ocasionalmente pode ser necessária a intervenção da neurocirurgia para tumores cerebrais ou neurofibromas espinhais compressivos.

A principal demanda cirúrgica na NF2 e na Schwannomatose é a neurocirurgia para a descompressão de schwannomas vestibulares, remoção de meningiomas sintomáticos ou retirada de schwannomas periféricos.

Ocasionalmente a transformação maligna de tumores na NF1 e raramente na NF2 podem requerer quimioterapia além da cirurgia.

Em resumo, para o atendimento pleno das pessoas com NF é necessária uma estrutura ampla de especialidades, a qual somente pode ser conseguida pela inserção no SUS do atendimento especializado em neurofibromatoses.