Este espaço é destinado a opinião de pessoas com experiência em diversos assuntos relacionados com as neurofibromatoses.
Algumas pessoas têm perguntado se as pessoas com NF correm risco maior de ser infectadas ou de apresentar formas mais graves da doença causada pelo coronavirus (COVID-19).
Devo lembrar que neste site procuramos oferecer informações obtidas por meio de pesquisas científicas. Uma pesquisa científica necessita de tempo e dinheiro para mostrar suas respostas.
O novo vírus começou a existir há poucos meses e cientistas de todo o mundo estão correndo atrás de mais conhecimento científico sobre ele, mas ainda não sabemos algumas coisas, ainda não temos tratamento que elimine o vírus e nem uma vacina eficiente.
Portanto, toda resposta sobre esta nova doença deve ser cautelosa.
Neste tempo tão curto, cientificamente sabemos menos ainda se as pessoas com NF (NF1, NF2 ou Schwannomatose) sofrem a doença de forma diferente, se são mais vulneráveis, se apresentam formas mais graves ou se morrem mais do que a população em geral.
No entanto, independente se o risco das pessoas com NF for maior, menor ou igual ao risco das pessoas sem NF, todos nós estaremos num momento de maior risco, inclusive de morte.
Isto porque durante a epidemia os hospitais poderão estar lotados com pessoas com coronavirus e se você sofrer uma queda, um agravamento de um tumor ou um atropelamento, por exemplo, encontrará muita dificuldade para ser atendida (o).
Assim, o melhor é adotar aqueles comportamentos que JÁ ESTÃO DEMONSTRADOS CIENTIFICAMENTE QUE FUNCIONAM em benefício de TODAS AS PESSOAS, evitando que a epidemia se espalhe rapidamente.
É uma postura COLETIVA: se proteger, protegendo os outros.
E quais são os comportamentos que sabemos que funcionaram em outros países?
O primeiro deles é o chamado AUTO ISOLAMENTO
Ou seja, fique em casa, se possível.
Durante as próximas semanas precisamos evitar ao máximo o contato entre as pessoas e testar e isolar os suspeitos, como fizeram Hong Kong, Taiwan e Cingapura, por exemplo, onde houve menos de 5 mortes e o sistema de saúde conseguiu atender a todas as pessoas que precisaram.
Informo que eu e minha família já estamos em auto isolamento preventivo desde sexta-feira passada. Cada um em sua casa ou apartamento, inclusive uma parte da família que mora no Canadá, sem ir para escola ou trabalho e nos comunicando apenas por internet.
Isso é difícil, é claro, e muitas pessoas não poderão ficar em casa.
Por isso, os governos deveriam decretar medidas que permitissem o maior número possível de pessoas permanecendo em casa, recebendo seu salário, trabalho por internet, cuidando de seus filhos e parentes.
Sabemos que quanto mais famílias puderem ficar em auto isolamento, menor será o número total de infectados, menor o pico de gente doente precisando de hospital ao mesmo tempo e menor o número de mortes (pelo coronavirus ou por falta de hospital para acidentes e outras doenças). (ver um vídeo explicativo muito bom sobre esta questão CLIQUE AQUI )
O auto isolamento é uma decisão que no momento depende DE CADA UM DE NÓS, MAS TAMBÉM DOS GOVERNOS, que ainda não adotaram medidas radicais necessárias e verdadeiramente eficazes para combater a pandemia. É preciso, entre outras coisas, decretar o isolamento das pessoas com salário garantido, proibição de viagens, controle do acesso e distanciamento entre usuários no transporte público, testes para o COVID-19 facilitados para todas as pessoas com manifestações gripais, quarentena obrigatória para suspeitos e infectados e outras medidas que estão sendo apontadas pelos epidemiologistas.
Além disso, dentro ou fora de casa, temos que adotar aquelas medidas que já estão sendo divulgadas: lavar as mãos com cuidado e muitas vezes ao dia, não levar as mãos à boca, nem ao nariz, nem aos olhos, tomar cuidado com espirros e tosse, não beijar nem abraçar ao cumprimentar.
Há pessoas dizendo que esta questão é política.
Sim, é uma questão de política de saúde pública.
Sim, é uma questão política escolher se devo pensar no coletivo ou cuidar da própria vida de forma egoísta (ver excelente artigo sobre isto CLIQUE AQUI )
Precisamos agir para o bem coletivo e negar a gravidade da situação é uma atitude irresponsável.
Esta crise vai passar e temos a chance de sair dela mais fortes como pessoas e mais solidários como sociedade.
Vai depender de nós e daqueles que elegemos como nossos governantes.
Vamos pensar e agir juntos.
Dr LOR
Presidente da Amanf
Observações
- Quem desejar saber mais sobre o porquê do auto isolamento funcionar para diminuir a epidemia, CLIQUE AQUI (em inglês)
- Quem quiser ler sobre como as pandemias podem mudar a história, CLIQUE AQUI (em inglês).
- Em fevereiro de 2021 o Dr. Bruce Korf da Universidade de Alabama (Estados Unidos) e um dos grandes estudiosos da NF, publicou uma nota tentando responder estas mesmas questões. Em linhas gerais, concordamos com ele (ver aqui em inglês: https://www.uab.edu/medicine/nfprogram/blog/165-considerations-for-individuals-with-nf-regarding-the-novel-coronavirus )
Amigas e amigos da AMANF,
Fui convidado para dois eventos neste semestre para falar sobre Neurofibromatose: o II Congresso Brasileiro de Neurogenética (em São Paulo, dia 27 de março) e o Seminário Paranaense sobre Neurofibromatose (em Curitiba, no dia 16 de maio) – clique nos nomes dos eventos para abrir mais informações).
No entanto, diante da pandemia do novo coronavirus, estou sendo obrigado a rever minha participação naqueles eventos, pois tenho 71 anos e estou incluído num grupo mais vulnerável à doença.
De acordo com o Professor Unaí Tupinambás (VER AQUI), da Faculdade de Medicina da UFMG, especialista em doenças transmissíveis, o impacto do coronavirus (COVID-19) se fará sentir no Brasil a partir das duas próximas semanas. Segundo ele, a morbidade desta doença será grande (ou seja, impedindo as pessoas de trabalhar, de sair de casa, lotando os hospitais com os casos graves e parando a economia) e sua letalidade é maior do que o H1N1 (número de pessoas que vão morrer será maior). Esta é uma situação de grande gravidade que não pode ser minimizada pelas autoridades, como certos governantes estão fazendo.
Se desejar, assista à aula do Professor Unaí Tupinambás sobre esta questão VER AQUI
Por causa da pandemia do coronavirus, muitos eventos esportivos, culturais, congressos médicos, comícios e manifestações de rua estão sendo cancelados.
De minha parte, já comuniquei à coordenação do Congresso de Neurogenética que não poderei ir no dia 27 de março a São Paulo e estou reavaliando a minha participação em Curitiba em maio.
A melhor forma de enfrentarmos o coronavirus é nos unirmos em torno dos cuidados recomendados pela Organização Mundial de Saúde. Mais informações científicas corretas e preciosas sobre como se prevenir VER AQUI
Procure sempre fontes confiáveis de informação. Cuidado com notícias falsas.
Saudações
Dr Lor
Presidente da AMANF 2017-2021
“Minha filha tem Neurofibromatose do tipo 1 (NF1) e apresentou convulsões que foram controladas com medicamentos e recentemente foi indicado para ela o uso de cetotifeno. Li na bula do cetotifeno que ele não deve ser usado em pessoas com história de epilepsia. Devo usar o cetotifeno?” M.N. de Belo Horizonte.
Cara M, obrigado pela sua pergunta, pois ela nos ajuda a esclarecer um pouco mais a questão do uso do cetotifeno nas pessoas com NF1.
Primeiro, vamos lembrar que recomendamos o cetotifeno para pessoas com NF1 quando elas TAMBÉM apresentam coceira (prurido), alergia atópica, rinite alérgica ou bronquite asmática. Cerca de 30% da população com NF1 apresenta estes problemas associados.
Estas manifestações alérgicas geralmente são ligadas ao excesso de uma substância chamada histamina, por isso o tratamento para elas são medicamentos chamados anti-histamínicos, entre eles o cetotifeno.
O que é o cetotifeno? É um antialérgico porque inibe a produção da histamina pelas células chamadas inflamatórias (chamadas mastócitos).
Por que preferimos o cetotifeno a outros antialérgicos (anti-histamínicos) nas pessoas com NF1? Porque surgiram alguns indícios de que o cetotifeno poderia inibir o crescimento dos neurofibromas nas pessoas com NF1 (VER AQUI ).
Nós ainda não temos certeza de que este efeito do cetotifeno sobre os neurofibromas seja cientificamente verdadeiro, por isso o uso do cetotifeno tem que levar em conta sempre os riscos e benefícios.
Ao mesmo tempo, cerca de 10% das pessoas com NF1 apresentam disritmias cerebrais que podem causar convulsões em algum momento de sua vida ( VER AQUI e VER AQUI ).
Assim, pode haver a coincidência de indicarmos o cetotifeno para alguém com NF1 que também está em tratamento para convulsões. Nesta situação, que acontece em cerca de 8% dos nossos pacientes, precisamos pensar se devemos ou não usar o cetotifeno, que foi a pergunta da nossa leitora.
Na bula do medicamento está a informação de que convulsões foram relatadas em poucas pessoas usando cetotifeno. Talvez este efeito se deva ao aumento da excitabilidade dos neurônios em algumas pessoas (causando agitação, insônia e irritabilidade).
De fato, em estudos experimentais com camundongos observou-se que o cetotifeno atrapalha um pouco os efeitos dos medicamentos anticonvulsivantes ( VER AQUI e VER AQUI )
Diante disso, o Dr. Bruno Cezar Lage Cota fez uma pesquisa no Uptodate e Medscape sobre os efeitos colaterais do cetotifeno e, em ambos os sistemas de informação médica, entre as reações adversas não foi descrita a ocorrência de crises convulsivas (nem na faixa de <1%).
Há apenas uma recomendação de uso monitorado, ou cauteloso, em pessoas com epilepsia, pelo potencial efeito de redução do limiar epiléptico, mas, por outro lado, descreveram que o aumento de convulsões ocorreram em raros casos (o que não necessariamente seria efeito do cetotifeno).
Quanto às interações medicamentosas com anticonvulsivantes, a única encontrada foi com o topiramato, por potenciar os efeitos anticolinérgicos (sedação, boca seca, alterações digestivas, pouca sudorese, etc.). Dr. Bruno também não encontrou redução do efeito dos anticonvulsivantes pelo cetotifeno.
Em conclusão, considerando que ainda não temos certeza do benefício do cetotifeno sobre os neurofibromas e havendo uma pequena possibilidade do cetotifeno atrapalhar o controle das crises convulsivas, nossa opinião é que o uso do cetotifeno em pessoas com NF1 e histórico de crises convulsivas deve ser monitorado pelo médico e o cetotifeno deve ser suspenso se for observada uma piora no controle das crises.
Dr. Lor e Dr. Bruno Cezar Lage Cota