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Minha filha AC, de 9 anos, já atendida no CRNF, tem neurofibromatose do tipo 1 (NF1) e transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH). Por causa da irritabilidade acentuada e agressividade um neurologista sugeriu risperidona. Ela não apresenta dificuldade em aprender, já sabe ler desde os 6 anos, mas não quer estudar, porque acha tedioso e só quer brincar. Quando tem foco em algo que gosta é impressionante a rapidez com que aprende. Pode me orientar? M.I, de João Pessoa.

Cara M.I., obrigado pelo seu relato, que abriu uma oportunidade para falarmos sobre algo muito importante: a autonomia das crianças.

Antes, quero lembrar que muitas crianças com NF1 apresentam TDAH e alguma agressividade. A AMANF acaba de publicar uma cartilha com orientações para mães, pais, educadoras e educadores de crianças com NF1 e problemas de comportamento. Clique aqui para obter a cartilha.

Antes de qualquer medicação, acho que todas as pessoas cuidadoras de sua filha devem tentar seguir a nossa cartilha por algumas semanas ou meses.

Se, ao final, a cartilha não for suficiente para melhorar a qualidade de vida de vocês, então os medicamentos podem ser pensados.

Quando há hiperatividade, o medicamento metilfenidato pode ser uma opção ( prescrita pela neurologia) a ser experimentada com a finalidade de diminuir a impulsividade – ações realizadas de forma impensada e às vezes contra a vontade consciente da pessoa. A impulsividade gera ansiedade que contribui para a irritabilidade e, como consequência, para aumentar a agressividade.

Quando não há hiperatividade, mas apenas desatenção, ainda não estou convencido de que o metilfenidato seja eficiente nas crianças com NF1.

Se houver hiperatividade e mesmo com o uso do metilfenidato ainda persistir a agressividade, pode ser experimentada a risperidona sob a orientação da psiquiatria psiquiatra infantil ou neurologia infantil.

 

Mas vamos pensar numa coisa importante, que você falou: sua filha aprende rapidamente quando quer.

 Acho que ela tem razão.

 Acho que todos nós aprendemos de fato somente aquilo que nos interessa.

E talvez qualquer pessoa fique irritada e agressiva se for obrigada a fazer coisas que não deseja, não é?

Há cerca de 50 anos, fiquei impressionado por um experimento educacional famoso na Inglaterra, chamado Summerhill, que deu origem às escolas democráticas, no qual as crianças podiam escolher quando brincar ou estudar. Mesmo as crianças com problemas comportamentais (a maioria naquele colégio especial) acabavam aprendendo aquilo que precisavam para seguirem suas vidas com autonomia quando adultas.

Clique aqui para conhecer mais sobre as escolas democráticas inspiradas em Summerhill.

Talvez a escola convencional atual seja mesmo muito entediante para crianças com hiperatividade.

Talvez possamos ajudar as crianças a se encontrarem e a realizarem seus desejos e sua formação humana por meio de brincadeiras criativas.

Brincar é o jeito mais alegre e eficiente de aprender sobre tudo: sobre o mundo, sobre as pessoas e sobre os afetos. Sobre como viver.

 

Eu, no lugar da sua filha, gostaria de estar numa escola onde brincar fosse levado muito a sério.

Vamos ouvir o que sua filha quer fazer?

Dr. Lor

 

 

 

“Meu nome é J, sou portadora de neurofibromatose do tipo 1 (NF1) e também de transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) do subtipo desatento, como descreve o seu artigo. Gostaria de dar o meu depoimento com o uso da Ritalina. Sou psicóloga, e sempre tive problemas na escola, porém, era taxada de preguiçosa, e o problema foi varrido para debaixo do tapete. Depois de adulta, formada e clinicando, notei que os sintomas de meus pacientes portadores de TDAH eram exatamente os mesmos que os meus. Fiz uma bateria de testes, fui ao neurologista, que comprovou o diagnóstico e receitou a ritalina. A medicação “me abriu os olhos”, foi como dar óculos a um portador de miopia! Hoje tomo quando necessário, e meu desempenho profissional é 1000 vezes melhor! ” JBB, de local não identificado.

Cara J, obrigado pelo seu depoimento, o qual me permite abordar este tema com novas informações que podem ser úteis às pessoas com NF1.

Primeiro, quero lembrar que metade das pessoas com NF1 apresenta transtornos de déficit de atenção, hiperatividade e impulsividade, que são mais visíveis nas crianças, mas também acometem os adultos. Além disso, as meninas parecem sofrer mais o tipo “desatenção” e os meninos mais o tipo “hiperatividade e impulsividade”.

Apesar do grande número de pessoas com NF1 apresentarem TDAH, precisamos tomar cuidado para não utilizarmos de forma errada os medicamentos psiquiátricos, especialmente em crianças, como nos mostra o pediatra Daniel Becker (para ver uma de suas excelentes palestras clicar AQUI ).

Por isso, o primeiro passo deve ser a segurança do diagnóstico de TDAH, que deve ser feito por profissionais experientes. Para nos orientar sobre como fazer o diagnóstico de TDAH, pedi a colaboração da psicóloga e neurocientista Danielle de Costa Souza, que estudou aspectos neuropsicológicos em pessoas com NF1 em nosso Centro de Referência em Neurofibromatoses do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (ver aqui os seus artigos publicados AQUI e AQUI ).

Danielle enviou-me alguns artigos científicos sobre o assunto (ver um deles AQUI) e respondeu-me que em seus estudos com NF1 os voluntários responderam a questionários especializados (chamado SNAP-IV) para quantificar a presença e intensidade de sintomas do TDAH.

No entanto, se você suspeita que você, ou seu filho ou filha com NF1 também tem TDAH, vale a pena fazer uma visita à página da internet da Associação Brasileira de Déficit de Atenção (clicar aqui: ABDA ). 

Esta associação é a melhor referência que pude encontrar para orientação sobre TDAH e certamente ela poderá ajudar você a saber se deve procurar um especialista e onde encontrar apoio.


E depois do diagnóstico de NF1 + TDAH?

As crianças com NF1 + TDAH têm resultados escolares e cognitivos piores do que aquelas com NF1 sem TDAH e apresentam mais chance de problemas comportamentais. Assim, seria importante obtermos um medicamento que pudesse melhorar os sintomas de TDAH na NF1.

Alguns resultados de pesquisas na Alemanha (ver AQUI ) e na França (ver AQUI) têm mostrado que o metilfenidato (cujo nome comercial é Ritalina®) usado cuidadosamente melhorou os testes cognitivos, assim como o nível de atenção e os problemas de comportamento das crianças com TDAH e NF1.

Em conclusão, creio que a ritalina, isoladamente ou associada a antidepressivos, deve ser experimentada de forma criteriosa e em doses baixas em crianças com NF1 que apresentem dificuldades de atenção, hiperatividade e problemas comportamentais.

No entanto, os medicamentos sozinhos podem não ser capazes de diminuir os efeitos prejudiciais da TDAH sobre as crianças com NF1, pois o problema é complexo e envolve a história de vida da pessoa, sua família e o ambiente em torno dela.

Outra fonte de informação

Para adultos e parentes de crianças com TDAH e NF1 também sugiro um livro interessante que pode ajudar as pessoas a enfrentarem o grande desafio da TDAH que se chama “Mentes Inquietas”, de Ana Beatriz Barbosa Silva, publicado em 2014.


A autora, que é médica psiquiatra e não tem NF1, mas tem TDAH, apresenta outras orientações úteis no resgate do autocontrole, da autoestima e de uma vida mais feliz para as pessoas acometidas pelo TDAH. 

Apesar do livro não tratar diretamente de pessoas com NF1, a sua leitura é fácil, não usa termos complicados e também nos ajuda a compreender a TDAH.


PS: Minha filha Dra. Luíza de Oliveira Rodrigues enviou-me um link muito interessante (CLIQUE AQUI) com diversos estudos (em inglês) sobre o excesso de diagnóstico de TDAH e tratamento medicamentoso em crianças no mundo inteiro (sem NF1).
Se considerarmos que os problemas comportamentais e cognitivos estão relacionados entre si e que são a principal queixa das pessoas com NF1, especialmente na infância, compreendemos porque estes transtornos são um dos principais alvos das pesquisas que buscam tratamentos, especialmente a busca de remédios,para a Neurofibromatose do Tipo 1.


A partir de 2005, tomamos conhecimento de alguns resultados iniciais de pesquisas com a Lovastatina em camundongos. Foram estudados camundongos geneticamente modificados para apresentarem a NF1 e eles também apresentam dificuldades de aprendizado, as quais podem ser comparadas às dificuldades das pessoas com NF1. 

Observou-se que o tratamento com a Lovastatina corrigia as dificuldades de aprendizado dos camundongos e por isso este medicamento começou a ser testado também em seres humanos. Os resultados destas pesquisas em crianças com NF1 ainda não são conclusivos, pois alguns encontraram melhora da memória verbal e não verbal nas crianças estudadas, assim como em outras habilidades cognitivas, mas outros pesquisadores não encontraram os mesmos efeitos.

No momento, creio que dispomos de informação suficiente para experimentarmos cuidadosamente a Lovastatina em algumas pessoas com NF1 e com dificuldades de aprendizado que estejam limitando sua competência social. Para informações mais detalhadas sobre a Lovastatina na NF1, veja a página ao lado dedicada especialmente a este assunto.

Ritalina e NF1.

A ritalina (ou metilfenidato) é outro medicamento que tem sido estudado em crianças com NF1 e dificuldade de atenção e hiperatividade. Cerca de metade das crianças com NF1 apresenta um quadro semelhante ao Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), que me parece mais dificuldade de atenção do que hiperatividade. As crianças com NF1 + TDAH têm resultados piores do que aquelas com NF1 sem TDAH e apresentam mais chance de problemas comportamentais. Assim, seria importante obtermos um medicamento que pudesse melhorar os sintomas de semelhantes ao TDAH na NF1.


Alguns resultados de pesquisas na Alemanha (Mautner e colaboradores em 2002 e 2013 – ver artigo completo aqui) e na França (Lion-François em 2014 – ver artigo completo aqui) têm mostrado que a ritalina usada cuidadosamente melhorou os testes cognitivos, assim como o nível de atenção e os problemas de comportamento das crianças com TDAH e NF1. Assim, creio que a ritalina pode ser experimentada de forma criteriosa em crianças com NF1 que apresentem dificuldades de atenção, hiperatividade e problemas comportamentais.