Texto adaptado para a página da AMANF a partir da edição especial da Neurology por Luiz Oswaldo Carneiro Rodrigues e Sara de Castro Oliveira.

Outro grupo de cientistas está trabalhando na organização dos conhecimentos já existentes sobre a biologia dos neurofibromas cutâneos (NFc). Eles estão reunindo o que já sabemos sobre a história natural dos NFc, ou seja, as origens, os mecanismos genéticos, celulares e temporais na formação dos NFc.

  1. Origem dos neurofibromas cutâneos

As células mais importantes para o desenvolvimento dos NFc são o nervo, as células do sistema imunitário (mastócitos e macrófagos) e fibroblastos. Estas células que existem nos NFc são as mesmas que fazem parte dos tecidos das pessoas sem NF1, com a diferença de que as células nos NFc são mais desorganizadas e as proteínas ao redor são mais abundantes.

Sabe-se que, para haver a manifestação clínica da NF1, mutações patológicas devem estar presentes em pelo menos um dos alelos no gene NF1 no cromossomo 17 de todas as células de uma pessoa. Esta mutação em um dos alelos causa insuficiência da produção da proteína neurofibromina, o que leva à ativação descontrolada dos mecanismos que regulam o crescimento celular (denominado Ras-GTP).

No entanto, para haver a formação do neurofibroma não basta a mutação em um dos alelos, pois é preciso ocorrer uma segunda mutação patológica numa célula de Schwann, ou seja, a perda da função do outro alelo que mantinha a produção de alguma quantidade de neurofibromina normal.

Além disso, esta célula de Schwann que sofre a segunda mutação precisa estar cercada por outras células (mastócitos, fibroblastos e macrófagos) que também apresentam a primeira mutação original, para que surja o neurofibroma (ver figura).

A infiltração dos NFc por mastócitos, que são células do sistema imune que produzem histamina e são relacionadas com a alergia, é uma das características mais típicas dos NFc.

Sabe-se que os macrófagos são indicadores do crescimento tumoral, mas não sabemos ainda seu exato papel nos NFc.

Sabe-se que os fibroblastos estão envolvidos no processo de cicatrização e fibrose, assim como participam da regeneração dos nervos em conjunto com as células de Schwann e os macrófagos. No entanto, os fibroblastos ativados nos NFc parecem ser diferentes daqueles inflamatórios e cicatriciais (Observação pessoal: ao contrário, o processo de cicatrização nas pessoas com NF1 parece deficiente, dando origem a cicatrizes mais flácidas e não conheço casos de pessoas com NF1 com queloide em nossa experiência com mais de 1200 famílias com NF1).

É importante lembrar que o grupo de cientistas da força tarefa ainda está procurando saber se a célula que dá origem ao NFc é somente uma célula de Schwann da terminação nervosa ou se o NFc poderia ter origem numa célula precursora embrionária da pele ou células, como os melanócitos.

Modelo atual para o desenvolvimento dos neurofibromas

Figura que apresenta o possível mecanismo da formação dos neurofibromas plexiformes em modelos animais, talvez aplicável aos NFc humanos.

As células de Schwann (responsáveis pela regeneração e pela camada isolante que envolve os nervos) precisam do estímulo dos nervos para crescerem e se multiplicarem. Algum fator produzido pelo nervo (para a reparação de uma lesão, por exemplo) ativa a célula de Schwann [que já teria sofrido a segunda mutação (Nf1-/-) ] e ela, ao crescer, libera fatores de célula tronco que estimulam os mastócitos, os quais, por sua vez, estimulam de volta o crescimento da própria célula de Schwann. Os mastócitos também produzem o fator de crescimento tumoral (TGF-beta) que ativa o crescimento dos fibroblastos, os quais produzem proteínas da matriz celular (colágeno e muco). Estas proteínas podem estimular as células de Schwann e os próprios fibroblastos a crescerem. O resultado geral é a formação do neurofibroma cutâneo, que é composto por um excesso de células de Schwann, mastócitos, fibroblastos desorganizados e abundante quantidade de proteínas na matriz celular.

Outras células podem estar presentes nos NFc, como pericitos e adipócitos, mas seu papel ainda é desconhecido. Outras podem ser encontradas nas bordas do NFc, como melanócitos, ceratinócitos, glândulas sebáceas e écrinas, folículo piloso), mas não dentro do neurofibroma.

Na próxima semana continuamos com informações sobre o aparecimento dos primeiros NFc.

 

Segunda parte do texto adaptado para a página da AMANF  da edição especial da Neurology por Luiz Oswaldo Carneiro Rodrigues e Sara de Castro Oliveira.

Um grupo de cientistas e associações de neurofibromatose (VER AQUI ) vem trabalhando para a unificação internacional da definição científica dos neurofibromas cutâneos (NFc). Alguns conhecimentos já possuem consenso:

  1. Cerca de 99% das pessoas com NF1 apresentam NFc e eles crescem ao longo dos anos.
  2. Os NFc são tumores histologicamente benignos (Grau I WHO (ver aqui), compostos de vários tipos diferentes de células, incluindo células de Schwann, fibroblastos, células imunitárias (como mastócitos e macrófagos) e outros elementos dos nervos.
  3. Os NFc são localizados na pele, aqui compreendida como a derme e a epiderme (ver figura acima), não encapsulados, não se transformam em tumores malignos e não apresentam associação evidente com nervos mielinizados.
  4. Os NFc devem ser diferenciados dos neurofibromas que se desenvolvem profundamente e atingem a pele, como neurofibromas difusos e os plexiformes.

Uma pessoa com NF1 pode apresentar um ou mais das formas de NFc relacionadas abaixo (Figura acima).

Nascente/Latente

O NFc latente (ou nascente) não é visível a olho nu e apenas pode ser detectado por técnicas especiais, como Ultrassom de Alta Resolução ou Tomografia de Coerência Óptica.

Plano

Os NFc planos são visíveis e se caracterizam por discreta elevação da pele. A superfície pode parecer mais fina e um pouco pálida comparada com a pele ao redor, ou pode haver aumento da pigmentação e pelos (cerdas). Os NFc planos variam entre 0,5 a 12 milímetros.

Séssil

Os NFc sésseis são elevados em comparação com a pele adjacente e geralmente apresentam um cume. A sua altura pode atingir de 8 a 10 milímetros. A superfície e textura são as mesmas do NFc plano. Pode haver uma coloração mais avermelhada e podem existir pelos. Tipicamente, seu tamanho oscila entre 1 e 12 milímetros. Ultrassom e tomografia podem revelar um pouco do NFc abaixo da superfície da pele.

Globular

Os NFc globulares têm uma base na superfície da pele com cerca de 20 a 30 milímetros de diâmetro, com altura semelhante, causando um formato globular. Movendo-se a parte acima da pele, pode-se constatar a presenta do restante do tumor por debaixo.

Pedunculado

Os NFc pedunculados apresentam uma haste de 1 a 3 milímetros que une a parte acima da pele com a parte abaixo da superfície. O diâmetro da parte acima da haste é em torno de 5 a 25 milímetros.

No próximo post veremos como os NFc surgem e crescem ao longo da vida, ou seja, a história natural dos NFc.

 

 

Depois de 34 anos trabalhando como cientista com Bolsa de Produtividade em Pesquisa do Conselho Nacional de de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), meu pedido de continuidade da bolsa não foi concedido nesta semana.

Apesar desta interrupção acontecer num momento de cortes financeiros governamentais na área da ciência e tecnologia (em decorrência de orientação política que menospreza o papel da ciência no desenvolvimento humano, o que eu lamento profundamente), há outros aspectos desta decisão que merecem algumas palavras.

O lado bom é que é preciso dar lugar aos mais novos para que o conhecimento científico siga adiante. Diz o Steven Pinker que novos paradigmas somente são construídos com a passagem das gerações e por isso a humanidade evolui de funeral em funeral. Neste sentido, vejo com a alegria do dever cumprido as conquistas enormes que estão fazendo aquelas pessoas que orientei no Laboratório de Fisiologia do Exercício da UFMG e no Centro de Referência em Neurofibromatoses e continuam atuando na UFMG e noutras universidades.

Além disso, minha aposentadoria iniciada há oito anos significou o afastamento da sala de aula, que é fonte principal de novos alunos de pós-graduação, reduzindo a participação como orientador formal de mestrandos e doutorandos o que foi considerado relevante para o juízo final sobre meu pedido de renovação da bolsa (ver nota abaixo [i]).

Sabemos que as pesquisas realizadas pelos alunos de pós-graduação são a maioria dos novos conhecimentos a serem publicados. Como consequência, o número de artigos científicos por mim publicados nos últimos anos resultou em cerca de um terço dos artigos publicados anualmente por outros cientistas da área (que são bolsistas do CNPq). Esta minha produtividade reduzida contribuiu para a não concessão da nova bolsa (ver nota abaixo).

Estou citando os artigos publicados porque um dos principais critérios utilizados para a concessão de bolsas continua sendo a produtividade medida em artigos publicados, o que tem recebido críticas internacionais, inclusive de minha parte (ver meu artigo sobre O Tamanduá Olímpico AQUI ). Uma das limitações deste método produtivista de selecionar bolsistas é que ele acaba criando o efeito cíclico de “dar mais àqueles que já muito o têm”, minimizando a análise de mérito do projeto científico, o que pode, eventualmente, desperdiçar projetos inovadores criados por pessoas com pouca publicação anterior.

Por falar em projeto de pesquisa, é paradoxal que o projeto que enviei para o CNPq (mas não foi suficiente para justificar justificar a bolsa) seja um dos mais bonitos (não tenho outro adjetivo) que já ajudei a criar e que está em andamento: o estudo dos possíveis efeitos da dança e do treinamento musical sobre as dificuldades cognitivas de adolescentes com neurofibromatose do tipo 1. Um projeto que contém em si os diversos aprendizados que tive ao longo das quatro décadas dedicadas à ciência.

Como consequência direta do encerramento da Bolsa, a partir de agora deixo de receber a quantia de mil reais por mês para investir em projetos de pesquisa. Estou mencionando a quantia porque, apesar de irrisória comparada às verbas de cientistas de outros países na mesma área, ela foi importante para alguns projetos inovadores que conseguimos realizar. Apenas para citar alguns dos últimos resultados de nossas pesquisas, publicamos oito fenótipos inéditos nas pessoas com neurofibromatose (menor força muscular, menor tolerância à fadiga, desordem do processamento auditivo, amusia, superposição dos dedos na deleção do gene, neuropatia autonômica, padrão nutricional especial, menor sensibilidade à insulina) e criamos uma gaiola especial para animais de laboratório que permite graduar o exercício sincronizado à obtenção de alimentos.

Apesar da maior escassez de recursos, seguiremos adiante com os projetos atuais, se possível com recursos obtidos de outras fontes, entre elas a Associação Mineira de Apoio às Pessoas Com Neurofibromatoses (AMANF).

Portanto, é com tranquilidade que recebo o encerramento das minhas atividades como pesquisador do CNPq, porque continuo sendo cientista. Aliás, nunca minha vida profissional foi tão gratificante como tem sido nos últimos anos, ao conseguir transformar o conhecimento científico adquirido em atendimento médico e informações compreensíveis para as famílias de pessoas com neurofibromatoses (como este blog). Chego a pensar que talvez a minha verdadeira vocação seja a divulgação científica, se, de fato, existe algo chamado vocação ou se apenas somos levados pelas casualidades da vida enquanto justificamos a posteriori os passos dados.

É preciso reafirmar que a aposentadoria não é um privilégio, como sustentam os pensadores econômicos hegemônicos em nosso país, mas um direito adquirido porque a idade cobra a sua conta, reduzindo nossa saúde e disposição para tarefas que enfrentávamos incansavelmente, mas que se tornam cada vez mais exaustivas. Por isso, merecemos menos reuniões, menos relatórios, menos pareceres, menos burocracia, menos horários determinados pelos outros. Merecemos viver mais.

Agradeço à querida companheira Thalma, cuja visão crítica sempre foi importante para os projetos de pesquisa que compartilho com ela e que tem sido conselheira nas questões de foro íntimo que permeiam a vida de um cientista.

Agradeço aos amigos que foram colaboradores permanentes nestes 34 anos como Bolsista do CNPq, os colegas Nilo Rezende Viana Lima, Emerson Silami Garcia e Nilton Alves de Rezende.

Sou grato também a todas as pessoas que confiaram em se submeter à minha orientação acadêmica. Relembro algumas delas que contribuíram de forma especial para minha evolução científica: Ana Carolina Vimieiro Gomes, Ivana Alice Teixeira Fonseca, Christiano Antônio Machado Moreira, Juliana Ferreira de Souza e Luciana Gonçalves Madeira.

Aos orientandos atuais, que estão desenvolvendo seus projetos científicos para o melhor conhecimento das neurofibromatoses, Vanessa Waisberg, Bruno Cezar Lage Cota e Sara de Castro Oliveira, prometo continuar animado com o futuro.

Dr Lor

Janeiro 2019

[i] Parecer final disponível no CNPq: Projeto promissor que se encaixa dentro da linha do pesquisador e adiciona um grau de inovação à pesquisa em andamento. Capacidade de formação de recursos humanos inconteste; contudo, aparentemente sua última formação de DO ocorreu em 2014 (com 3 DO em andamento). Professor encontra-se aposentado, atuando como voluntário no laboratório da sua instituição. Coordena centro de referência na área e preside associação de apoio a pacientes com condição rara. Produção científica restrita nos últimos anos.

 

 

Texto adaptado para a página da AMANF a partir da edição especial da Neurology por Luiz Oswaldo Carneiro Rodrigues e Sara de Castro Oliveira.

O primeiro passo para encontrarmos o tratamento para os neurofibromas cutâneos (NFc) é compreender a sua estrutura, o que os forma e quais são os diferentes tipos de neurofibromas: os cutâneos, os subcutâneos difusos e nodulares e os plexiformes.

Todos os neurofibromas são tumores compostos por uma mistura de células de diferentes origens: células de Schwann (neoplásicas), mastócitos, fibroblastos, células perineurais, células dos anexos da pele (folículos pilosos, glândulas sebáceas e sudoríparas) e ocasionalmente células de gordura (adipócitos) (ver Figura 1).

Estas células estão envolvidas por proteínas chamadas de colágeno e muco que são abundantes (estroma mixoide).

Os neurofibromas cutâneos (NFc) são semelhantes aos demais neurofibromas do restante do corpo, pois sua composição de células é a mesma. Assim, para sabermos se um neurofibroma é cutâneo é preciso que na biópsia haja uma pequena margem de pele associada.

Estudos com histoquímica e microscopia eletrônica revelam a presença de células de Schwann 100+, EMA+, células perineurais, mastócitos, linfócitos, fibroblastos CD34+, assim como elementos dos axônios. Os NFc pigmentados podem apresentar células melanocíticas.

Ainda há dúvidas sobre qual seria a célula inicial, ou seja, aquela que dá origem ao neurofibroma cutâneo (NFc), podendo ser a célula de Schwann ou uma célula precursora derivada da pele nas proximidades dos folículos pilosos.

Uma hipótese interessante é de que cada célula de origem nas diversas manifestações clínicas nas pessoas com NF1 teria tolerâncias diferentes à falta da neurofibromina. Assim, o melanócito teria maior tolerância à falta da neurofibromina, o que causaria as manchas café com leite; a célula precursora dos NFc teria uma tolerância intermediária, resultando nos neurofibromas cutâneos; as células de Schwann teriam pouca tolerância à falta de neurofibromina, o que resultaria nos neurofibromas plexiformes.

Diferenças entre NFc e outros neurofibromas

Já foram apresentadas muitas classificações dos tipos de neurofibromas propostas por diversos especialistas (ver Tabela 1 na página S7 do artigo  AQUI ), mas elas são contraditórias entre si, o que dificulta a transferência de conhecimento entre os diferentes cientistas clínicos e de laboratório.

À primeira vista, parece haver uma continuidade entre os diversos neurofibromas nas pessoas com NF1.

Esta continuidade ocorreria desde os neurofibromas cutâneos (NFc) (limitados à pele – epiderme e derme – que se movem junto com a pele ver figura abaixo), passando pelos neurofibromas subcutâneos (localizados na hipoderme – sobre os quais a pele se move), até os neurofibromas plexiformes (lesões profundas envolvendo muitos tecidos e feixes de nervos) (ver imagens: AQUI ).

No entanto, esta continuidade pode ser apenas aparente, pois os neurofibromas são diferentes entre si na sua origem, ou seja, no momento em que aparecem durante a vida e na sua estrutura anatômica (ver as diferenças entre os neurofibromas, segundo o Dr. Riccardi: AQUI).

Por exemplo, os NFc são clinicamente muito diferentes dos plexiformes: os NFc se restringem à derme e à epiderme, se tornam aparentes a partir da puberdade, crescem ao longo de toda a vida e nunca se tornam malignos; os plexiformes, ao contrário, estão presentes desde o nascimento, atingem diversos tecidos, crescem durante a infância e puberdade e podem se transformar em tumores malignos da bainha do nervo periférico.

Portanto, uma classificação racional dos neurofibromas precisa levar em conta todos os aspectos relacionados com seu aparecimento e evolução, como:

  • Aparência clínica e achados histológicos: padrão de crescimento (localizado, difuso ou infiltrativo);
  • Relação com os nervos: intraneural ou extraneural;
  • Localização anatômica: cutâneos ou subcutâneos.

A partir destes critérios chegou-se a uma subdivisão dos neurofibromas que está sendo proposta internacionalmente e vem sendo testada cientificamente:

  1. Neurofibromas cutâneos (geralmente são isolados, discretos, pequenos e envolvem apenas a derme e a epiderme); neste grupo se encontram as variantes clínicas dos NFc: os nascentes, os planos, os sésseis, os globosos e os pedunculados (ver Figura 2)
  2. Neurofibromas extensos (geralmente são difusos, grandes, envolvem diversos tecidos e podem apresentar ou não formas celulares atípicas); neste grupo se encontram as variantes histológicas dos NF: os difusos com ou sem diferenciação celular evidente, os difusos associados a plexiformes e os plexiformes intraneurais.

Nesta série de posts daremos atenção apenas aos neurofibromas cutâneos (NFc).

No próximo post (Parte 2) veremos quais são os tipos de neurofibromas cutâneos.

 

 

Ontem postei uma notícia sobre o comentário da UNIMED BH sobre nosso trabalho no Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais e forneci equivocadamente o link para um artigo da jornalista Eliane Brum.

Desculpem-me o engano.

O link correto é este: CLIQUE AQUI

Dr Lor

É com grande satisfação que recebemos a nota publicada ontem pela UNIMED BH sobre o trabalho que estamos desenvolvendo no Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais e nesta página. Ver a notícia completa aqui.

O resumo do trabalho comentado pela UNIMED BH pode ser visto abaixo.

 

Resumo do Tema Livre apresentado no Congresso Mundial de Neurofibromatoses em Paris 2018

Título: O que as pessoas com NF procuram? – Análise de cerca de 250 mil visitantes a um blog de informações médicas.

Autores:

Luiz Oswaldo Carneiro Rodrigues (1, 6)

Juliano Junio Viana (2)

Luiz Otávio Fernandino Tinoco (3)

Nikolas Mata-Machado (4)

Rogério Lima Barbosa (5)

Bruno Cezar Lage Cota (1, 6)

Juliana Ferreira de Souza (6)

Nilton Alves de Rezende (1, 6)

Instituições participantes

1 Presidente da Associação Mineira de Apoio às Pessoas com Neurofibromatoses – AMANF – Rua Roberto Lúcio Aroeira 40, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil, CEP 31710-570. amanf.org.br

2 Cientista da Computação na Empresa Kunumi – BHTEC – Rua Professor José Vieira de Mendonça, 770 – sala 208 – Engenho Nogueira, Belo Horizonte – MG, 31310-260. http://kunumi.ai/

3 Presidente da Argument – Empresa de Comércio Exterior e Tecnologia da Informação – Avenida Cristiano Machado 640, sala 601, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. (https://www.argumentcomercioexterior.com.br/)

4 Neurologista pediatra na Universidade de Illinois, em Chicago, nos Estados Unidos.

5 Doutorando em Sociologia na Universidade de Coimbra, Portugal.

6 Médicos do Centro de Referência em Neurofibromatoses (CRNF) do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais – Alameda Álvaro Celso 55, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil, CEP 30150-260. E-mail: loc@gmail.com

 

Introdução

A busca por informações médicas na internet é um comportamento comum, especialmente para pessoas com doenças raras, que pode auxiliar na identificação de profissionais da saúde, tratamentos e recursos terapêuticos. As neurofibromatoses são doenças raras, com grande diversidade de sinais, sintomas e complexidade clínica, e por isso dispõem de poucas pessoas com conhecimento adequado para o seu diagnóstico e acompanhamento. Diante disso, a AMANF e o CRNF criaram um blog denominado “Neurofibromatoses – Dr LOR” (https://amanf.org.br/blog/) para oferecer regularmente informações médicas baseadas em evidências científicas e responder perguntas dos usuários. O blog está ativo desde 2015 e tem recebido cerca de 15 mil visitantes por mês e esta análise pretende avaliar os 30 meses iniciais (de 8/5/2015 a 7/11/2017) da sua existência.

Objetivo

Foram analisadas 262.679 sessões de visita, por meio do sistema de análise do Blogger, para identificar quais os temas mais procurados entre os 405 temas publicados, assim como algumas características e perfil dos usuários.

Uma sessão corresponde ao conjunto de ações que o visitante realiza dentro de um site ou blog. Usuário corresponde a pessoas únicas que geraram as sessões.

Os posts foram publicados na língua portuguesa e alguns deles foram traduzidos por um de nós (4) para o inglês e reproduzidos no site da associação NF Midwest[1].

 

Resultados

A maioria das visitas foi realizada por pessoas localizadas no Brasil (83%), utilizando a língua portuguesa (92%) e a partir de smartphones (54%). As cidades mais frequentes de onde surgiram os acessos foram: São Paulo (10,8%), Belo Horizonte (9,7%) e Rio de Janeiro (5,8%), que estão entre as mais populosas do país.

Os temas mais procurados foram informações sobre Neurofibromatose do Tipo 1 (NF1 – OMIM #162200), especialmente sobre o diagnóstico da doença (50,9%) e expectativa de vida (20,3%). Outros temas que despertaram interesse estão apresentados no Gráfico 1.

Discussão

 Os dados sugerem que a busca por informações sobre a NF1 seja uma necessidade básica das famílias com pessoas acometidas pela doença, porque se trata de uma doença relativamente rara (1:3000), o que dificulta o conhecimento das várias manifestações clínicas e complexidade da doença pelos profissionais da saúde e educação.

Além disso, as cerca de 250 mil visitas constituem um número maior do que a população estimada de pessoas com NF1 no Brasil (cerca de 80 mil). Considerando que 63% das casas no Brasil[2] têm acesso à internet, podemos supor que muitas pessoas visitaram o blog mais de uma vez, mantendo-se a taxa de 31,9% de retornos ao longo dos meses.

Outro achado, que reforça a carência de informação sobre a NF1 entre os profissionais de saúde, foi a busca por informações sobre diagnóstico (50,9%), especificamente sobre manchas café com leite, que são os sinais mais comuns e precoces da NF1. Ao contrário do que se imaginava, a busca por informações sobre tratamentos (3,9%) foi relativamente pequena, o que merece novas análises.

Os meios de acesso utilizados foram predominantemente Android (44%) e IOS (10%), ou seja, metade das pessoas usaram celulares para acessar o site. Este dado nos fez reformular a apresentação e a lógica do blog, inserindo-o na página oficial da AMANF.

A duração média das visitas foi de 3 minutos e este tempo sugere três possibilidades:

  1. Baixo interesse despertado pela maioria dos temas publicados, fazendo com que as pessoas tenham permanecido pouco tempo na página, o suficiente apenas para a leitura do título ou das primeiras linhas.
  2. Pouca profundidade na leitura da maioria dos temas, porque grande parte deles necessitaria de mais tempo para serem compreendidos adequadamente.
  3. Inadequação da linguagem do blog ao nível de instrução formal dos internautas, fazendo com que tenham desistido de ler na íntegra a maioria dos temas.

Este achado mostra a necessidade de revisão da seleção de temas de maior interesse, assim como mais simplificação didática na apresentação inicial do texto, permitindo que o internauta decida se deseja ou não ler o texto completo. Estes recursos já foram implantados na nova plataforma do post na página da AMANF.

Em paralelo ao grande número de acessos, o blog tem recebido manifestações de satisfação por parte dos usuários, que dizem ter encontrado informações científicas e seguras, além do tratamento respeitoso para com as pessoas com neurofibromatoses.

Uma nova análise, por meio do Google Analytics, das visitas realizadas ao blog de setembro de 2017 a janeiro de 2018, quando o blog já estava incorporado na plataforma digital da AMANF, revelou um padrão de comportamento semelhante aos dados desta primeira análise, sugerindo a veracidade do conjunto de dados que dispomos.

Como limitação deste estudo, devemos considerar a existência de mecanismos automáticos de busca na internet, o que nos faz manter cautela quando ao total de acessos considerando também a possibilidade de acesso por robôs. No entanto, as ferramentas que capturam visitantes conseguem distinguir acessos realizados por pessoas daqueles realizados por máquinas.

Conclusão

 A criação de um blog com informações médicas científicas sobre neurofibromatoses atraiu milhares de visitantes, que estavam interessados especialmente no diagnóstico da doença, mas que permaneceram pouco tempo na leitura da maioria dos temas.

Agradecimento: À engenheira Ana de Oliveira Rodrigues pela inspiração e orientação no desenvolvimento inicial do blog.

 

[1] Ver, por exemplo: https://www.nfmidwest.org/blog/spinal-neurofibromas-in-nf1/

[2] Ver https://g1.globo.com/economia/noticia/mais-de-63-dos-domicilios-tem-acesso-a-internet-aponta-ibge.ghtml

Embora muito já tenha sido dito sobre o último Congresso Mundial sobre Neurofibromatoses pelos diversos colegas brasileiros que lá estiveram, tentarei comentar os aspectos genéticos, oncológicos e terapêuticos relacionados à NF1 que foram abordados no evento.

Destaco em relação à parte genética a interessante aula da Professora Karen W Gripp da Filadelfia, dos Estados Unidos, que trouxe informações sobre as distintas doenças que compõem o grupo das Rasopatias. Este grupo é composto por doenças do desenvolvimento associadas a mutações da via RAS/MAPK. Dentre as diversas doenças que formam este grupo destacam-se a NF1, Síndrome de Legius, Síndrome de Watson, Síndrome de Noonan e a Síndrome de Costello entre outras. Ter estes conceitos claros em mente torna-se essencial para o correto diagnóstico da NF1, uma vez que estas doenças compartilham várias semelhanças.

Outra parte que ocupou grande espaço do evento foram as diversas aulas demonstrando os resultados existentes utilizando diferentes drogas. Destaco os resultados de fase I/II do estudo Sprint (Selumetinib in Pediatric Neurofibroma Study, ver AQUI ). Até o momento 50 pacientes com neurofibromas plexiformes já participaram do estudo. Neste primeiro momento, acredita-se que o remédio foi bem tolerado e aceito pelos pacientes. Houve em alguns casos redução do volume dos neurofibromas e algumas crianças citaram melhora da dor. Os autores também chamam a atenção para os principais efeitos colaterais como diarreia, ganho de peso e alteração de alguns eletrólitos e alteração na função renal.

Outros agentes farmacológicos que foram apresentados como drogas promissoras foram o Brigatinib (para tratamento de meningiomas) e o Crizotinib (tratamento de Schwannoma). Porém, os estudos estão em uma fase inicial e não podemos ainda fazer conclusões exatas sobre o real benefício que estes remédios oferecerão.

De qualquer forma concordo com o Professor Nilton Rezende sobre o importantíssimo fato de que cada vez mais algumas novas opções terapêuticas estão sendo discutidas no evento, algo que outrora não imaginávamos.

Por fim destaco e parabenizo as excelentes aulas ministradas pela Dra. Karin Cunha (Niteroi) e pela Dra. Juliana Souza (Belo Horizonte) que suscitaram interessantes debates durante suas apresentações

Dr. Luiz Guilherme Darrigo Junior é Doutor em Pediatria pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP Ribeirão Preto). Médico Assistente do Serviço de Transplante de Medula Óssea Pediátrico do Hospital das Clínicas da USP de Ribeirão Preto.Tem experiência na área de Medicina, com ênfase em Pediatria, atuando principalmente no seguinte tema: Pediatria Geral, Hematologia Pediátrica, Oncologia Pediátrica e Transplante de Medula Óssea Pediátrico.