Como estimular o desenvolvimento de nossas crianças com NF1?
Muitas famílias me perguntam como podem ajudar suas crianças com NF1 a superarem suas dificuldades cognitivas.
Diversas equipes de cientistas estão procurando esta resposta e temos feito grandes progressos na compreensão dos principais problemas neurológicos causados pela NF1.
Por exemplo, neste ano de 2025, Gamze Kaplan e colaboradores publicaram seu estudo sobre a interação entre os pais e a criança com NF1 e TDAH (Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade) numa revista científica (ver aqui artigo completo em inglês).
Os resultados mostraram que a NF1 e o TDAH são problemas diferentes, mas que apresentam semelhanças no curso do desenvolvimento. Os processos neuro divergentes em ambas as condições começam no primeiro ano, alterando tanto o comportamento do bebê quanto a maneira como os pais respondem a ele, porque os pais vão reduzindo as oportunidades sociocomunicativas para o desenvolvimento social do cérebro.
Este estudo comparou as interações pais-bebês em três grupos de crianças de 10 a 14 meses de idade:
- crianças com NF1
- crianças com TDAH
- crianças com desenvolvimento típico (DT)
A hipótese dos autores era de que os bebês com NF1 (Grupo 1) e bebês com TDAH (Grupo 2) mostrariam menos atenção dirigida aos seus pais e menos interação mútua entre pais e bebês, comparados aos bebês com desenvolvimento típico (Grupo 3). A suspeita era de que a atenção aos pais seria mais baixa em bebês com NF1 e que a vivacidade e o afeto negativo seriam maiores em bebês com NF1 e TDAH.
Os pais e seus bebês com NF1, TDAH e DT foram filmados durante as interações de brincadeiras livres e codificados usando escalas de classificação validadas.
Os resultados mostraram, que a interação pais-bebês dos bebês com NF1 e TDAH foram diferentes entre si e diferentes das crianças com desenvolvimento típico (DT).
O grupo NF1 mostrou relativamente menos interações mútuas (pais-bebês) do que o grupo TDAH, e respostas muito mais baixas às ações dos pais do que o grupo DT, enquanto os bebês TDAH eram mais animados e mostraram menos afetos negativos em relação aos outros grupos.
A maioria dos efeitos principais persistiu ao longo do tempo.
Embora seja necessário um acompanhamento de longo prazo em amostras maiores, estes resultados mostram como crianças com condições de neurodesenvolvimento alteradas apresentam experiências sociais distintas no primeiro ano de vida, o que pode impactar todo seu desenvolvimento cognitivo, psíquico e social ao longo da vida.
Na minha opinião, estes resultados reforçam a necessidade de que pais e cuidadores de crianças com NF1 fiquem atentos para esta baixa interação social provocada pela doença e tentem estimular estas crianças de forma planejada e consistente ao longo do seu desenvolvimento.
E a neuromodulação?
Com esta intenção em mente, algumas famílias têm perguntado se as técnicas de “neuromodulação” poderiam ser eficientes para estimular o desenvolvimento de suas crianças com NF1.
Sob o nome “neuromodulação” existem técnicas diferentes (ver anexo abaixo). Todas elas enfrentam dificuldades para padronização dos protocolos, para a quantificação de dose-resposta, e para a identificação de biomarcadores eficazes, assim como o estímulo em áreas extensas pode dificultar a localização exata dos efeitos.
E na NF1?
Até o presente, existe um grupo de pesquisadores testando a eletroestimulação transcutânea em crianças com NF1 e este grupo vem publicando seus resultados.
Em 2022, publicaram um artigo “Non-invasive brain stimulation modulates GABAergic activity in neurofibromatosis 1 — Scientific Reports (2022), com 31 adolescentes com NF1 (11–18 anos), no qual não houve melhora comportamental sustentada ao final da estimulação (desempenho durante a estimulação chegou a piorar).
Em 2025, publicaram “Non-invasive brain stimulation reorganises effective connectivity during a working memory task in individuals with NF1 — NeuroImage: Reports (2025), que não mostrou ganho cognitivo clinicamente relevante.
Finalmente, no congresso do CTF deste ano ( 2025), apresentaram um resumo que a Dra. Pollyanna Barros Batista comentou neste blog: ver aqui.
Na minha opinião, estas técnicas ainda são experimentais nas pessoas com NF1 e não há evidência de que já possam ser utilizadas como terapias efetivas.
Em conclusão, o melhor tratamento que dispomos ainda é a atenção cuidadosa de mães, pais e cuidadores para as necessidades diárias de cada criança com NF1.
Uma atenção que supere o retorno afetivo menor que as crianças com NF1 podem devolver a seus pais.
Uma atenção permanente e amorosa que procure ajudar cada uma delas a atingir seu potencial de felicidade, bem-estar e realização pessoal em sua vida.
Dr LOR
Anexo
Técnicas de neuromodulação
- Estimulação Magnética Transcraniana Repetitiva (rTMS) – Usada no tratamento de depressão resistente, TOC, e TEPT;
- Estimulação Transcraniana por Corrente Contínua (tDCS ou ETCC) – Evidências apontam benefícios em condições diversas como depressão, esquizofrenia, dependência química, além de melhora cognitiva — atenção, memória, fala pós-AVC, etc;
- Neurofeedback (NFB) – Indicado para TDAH e epilepsia, com evidência crescente para uso em autismo, insônia, ansiedade e dor de cabeça.
- Estimulação Cerebral Profunda (DBS) — técnica invasiva – Aprovada pela FDA para tratamentos como Parkinson, tremor essencial (desde meados de 1997), distonia, e algumas epilepsias em 2010. Apresenta também potencial terapêutico para depressão, TOC, demências e obesidade mórbida.
- Estimulação da Medula Espinhal (SCS) – técnica implantável, aprovada para dor crônica relacionada a cirurgia nas costas, síndromes regionais complexas e angina intratável.