“Olá Doutor LOR, me deparei com um grupo de pessoas com NF dos Estados Unidos no Facebook, onde muitas estão comentando e postando sobre o uso de um suplemento alimentar de Curcuma longa, a princípio achei duas fotos de pessoas que estão fazendo uso e que aparentemente parece ter melhorado um pouco o tamanho dos neurofibromas, sou um pouco cético com esse tipo de medicina natural e evito ao máximo qualquer tipo de medicamento, então gostaria de saber a sua opinião sobre, já tinha visto? ” AF, de local não identificado.

Caro A, obrigado pela sua pergunta, que também foi feita a mim por outras pessoas, pois me parece que o assunto dominou as páginas do Facebook recentemente entre as pessoas com neurofibromatoses.

Revi meus arquivos científicos e procurei atualizar as informações que dispunha sobre os possíveis efeitos da curcumina (a substância química diferuloilmetano) sobre as neurofibromatoses.

A meu ver, há apenas dois estudos plenamente confiáveis sobre o tema: um do grupo alemão coordenado pelo Dr. Victor Mautner (ver o artigo completo AQUI) e outro do grupo norte americano coordenado pela Dra. Nancy Ratner (ver o artigo completo AQUI ). Mautner e Ratner são pesquisadores envolvidos com as neurofibromatoses há muitos anos e muito respeitados no meio científico.


Ambos são estudos de laboratório, realizados em cultura de tecidos (Mautner) e enxertos de tecidos em animais (Ratner). Ambos trabalharam apenas com células retiradas de neurofibrossarcomas (tumor maligno da bainha do nervo periférico), que podem acontecer em pessoas com neurofibromatose do tipo 1.

Ambos os estudos mostraram que a adição de curcumina diretamente sobre as células aumentou o efeito de agentes inibidores do crescimento das células cancerosas.

Além desses dois estudos, encontrei outros três, sobre os quais precisamos de manter cautela pois seus autores possuem interesses comerciais em produtos vendidos com a curcumina.

Dois deles são da autoria de Hiroshi Maruta, sobre o qual já comentei neste blog suas ideias sobre o uso de própolis nas neurofibromatoses (ver AQUI ).

O Dr. Maruta é sócio do Instituto NF Cure localizado na Austrália, que produz e vende produtos fitoterápicos à base de curcumina e outras ervas. Dr. Maruta apresenta suas ideias sobre uma causa única para as mais variadas doenças, misturando num pacote estranho e confuso o diabetes, as neurofibromatoses, a asma, a artrite, a epilepsia, a depressão, as infecções viróticas, a esquizofrenia, a dificuldade de aprendizado e etc. e promete tratar todas elas com seus produtos comerciais.

Mais uma vez, penso que o Dr. Maruta busca lucrar com o desespero das pessoas em busca de uma cura para as NF com dois novos artigos envolvendo a curcumina (ver AQUI e AQUI). Sinceramente, não creio ser possível confiar nas afirmativas do Dr. Maruta, pois ele nunca apresenta resultados de estudos cientificamente controlados.


Um último estudo que encontrei no PubMed, que menciona a curcumina relacionada com as NF, foi publicado por um grupo de cientistas sob a coordenação de Razelle Kurzrock, do Departamento de Investigação de Terapias para o Câncer, do Anderson Cancer Center, localizado em Houston, Texas, nos Estados Unidos (ver o artigo completo AQUI).

Este estudo do grupo de Kurzrock foi realizado com cultura de tecido criado a partir de células com mutação para o gene NF2 e os autores encontraram que a curcumina adicionada a um inibidor da formação da proteína do estresse induzida pelo calor (HSP70) reduziu o crescimento das células tumorais.

O estudo também observa que a biodisponibilidade (capacidade de uma substância atingir os tecidos alvo) da curcumina comercializada atualmente ainda é um fator limitante para seu uso em seres humanos e que novos produtos estão sendo testados para superar este problema. Curiosamente, o Dr. Kurzrock possui uma patente e recebe rendimentos dos lucros gerados pelas vendas de um produto que pretende exatamente resolver esta dificuldade.

Em resumo, apesar destes poucos resultados positivos da curcumina em estudos de laboratório, ainda estamos distantes do momento em que poderemos recomendar o seu uso em seres humanos com a segurança de que estaremos prescrevendo um medicamento eficiente.

“Boa noite doutor, gostaria de saber se tem alguma contraindicação em eu fazer cirurgia de silicone nas mamas, já fui em diversos cirurgiões e todos falaram que não tinha problema. E também se posso fazer criolipólise, me falaram que não tinha problema mas queria tirar essa dúvida. E o senhor atende convênio? Gostaria de me consultar com o senhor. ” G, de local não identificado.

Cara G., obrigado pelo seu contato. Busquei informações científicas sobre possíveis problemas de implantes de silicone em pessoas com neurofibromatoses, mas não encontrei qualquer estudo que tenha abordado esta questão.

Assim, não posso responder a você com segurança sobre as possíveis complicações de uma cirurgia de implante de silicone numa pessoa com NF.

Quanto à “criolipólise”, procurei saber do que se trata e descobri apenas dois artigos de revisão (ver AQUI e AQUI) em revistas de cosmética, que nos informam de que se trata de uma técnica de resfriamento de pequenas partes da pele que atingem o subcutâneo e talvez possam reduzir o acúmulo de gordura localizada durante algum tempo.

Mais uma vez, nada encontrei sobre o uso desta técnica nas pessoas com neurofibromatoses. Portanto, novamente não tenho como responder com segurança científica a sua pergunta.

É interessante notar que suas duas perguntas iniciais estão relacionadas com objetivos estéticos, que vão além da remoção de neurofibromas cutâneos ou outras complicações das neurofibromatoses, como geralmente acontece com as pessoas com neurofibromatoses que nos procuram. Creio que suas perguntas demonstram que o fato de possuir algum tipo de neurofibromatose não a impede de sonhar em atingir os padrões estéticos que têm sido estabelecidos em nossa sociedade.

Somente nos últimos 30 dias, duas pessoas próximas a mim tiveram que ser internadas em CTI por causa de embolia pulmonar como complicação (que não é rara) no pós-operatório de cirurgia plástica com finalidade estética. Uma delas veio a falecer e a outra continua internada, recuperando-se. Portanto, é compreensível que eu esteja ainda mais preocupado do que habitualmente em relação aos riscos cirúrgicos.

Então, quem faz a pergunta sou eu: será que vale a pena submetermos nosso corpo a procedimentos às vezes arriscados ou desconhecidos para tentarmos alcançar um ideal de beleza apenas para agradar os outros? Não seria uma forma triste de aceitarmos os padrões machistas de nossa sociedade, que são usados para nos convencer a consumir os produtos lucrativos da indústria da estética?

A terceira e última pergunta que me fez é a única que posso responder com segurança: nosso Centro de Referência em Neurofibromatoses do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais realiza atendimentos apenas pelo Sistema Único de Saúde, um serviço público que Dr. Nilton e eu prestamos como voluntários, pois somos ambos aposentados.

Para agendar uma consulta conosco, basta enviar um e-mail para adermato@hc.ufmg.br e trazer o seu cartão do SUS na primeira consulta.

Recebemos na semana passada a comunicação da Comissão Organizadora do 2016 NF Conference que foram aprovados todos os oito trabalhos científicos enviados pelos nossos pesquisadores do Centro de Referência em Neurofibromatoses do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (CRNF).

O 2016 NF Conference é promovido pela Children’s Tumor Foundation e será realizado neste ano em Austin, no estado do Texas nos Estados Unidos de 18 a 21 de junho de 2016. A CTF NF Conference é o maior congresso científico mundial voltado para as Neurofibromatoses e nossos pesquisadores do CRNF têm participado dele desde 2007 com diversos estudos realizados aqui no Brasil, inclusive com um deles premiado em 2012 como o melhor trabalho do ano (ver http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1002/ajmg.a.35729/abstract).

Para o evento de 2016, enviamos os resultados de pesquisas realizadas no último ano, abrangendo oito diferentes assuntos em NF1 e NF2 e todos foram aceitos. Eles serão apresentados na forma de pôsteres pelo Dr. Nilton Alves de Rezende e pela Dra. Juliana Ferreira de Souza.

Em resumo, os resultados que enviamos mostram o seguinte:

1) Identificação de três novas mutações capazes de produzir a NF1 (IDENTIFICATION OF THREE NOVEL PATHOGENIC MUTATIONS IN NF1 GENE – primeiro autor: Frederico Malta);

2) A deleção completa do gene NF1, que são formas um pouco mais graves da doença, está relacionada com a presença de uma anatomia especial dos pés (segundo dedo mais curto e elevado, excesso de tecidos subcutâneo e unhas pequenas) (GENE DELETION IS ASSOCIATED WITH SECOND TOE SIGNAL PHENOTYPE IN NF1 – Primeiro autor: Luiz Oswaldo Rodrigues);

3) O exame da Tomografia de Coerência Óptica é muito útil na definição da NF2 e de seu prognóstico (RETINAL OPTICAL COHERENCE TOMOGRAPHY CONTRIBUTES TO THE DIAGNOSES OF NF2 – Primeira autora: Vanessa Waisberg, lembrando que ela já conquistou com este trabalho o Prêmio Varilux de 2016 ver aqui http://lormedico.blogspot.com.br/2016/03/noticia-importante-estudo-sobre.html );

4) A análise de múltiplos aspectos da Tomografia com Emissão de Pósitrons pode auxiliar a conduta nos casos de suspeita de transformação maligna de neurofibromas plexiformes (18F-FDG PET/CT IN PLEXIFORMES NEUROFIBROMAS IN NF1 – Primeira autora: Hérika Martins);

5) Indicadores metabólicos circulantes no sangue de pessoas com NF1 ajudam a entender sua menor chance de desenvolver diabetes do tipo 2 (EVALUATION OF INSULIN RESISTANCE AND ADIPOCYTOKINES IN NF1 – Primeira autora: Aline Martins);

6) Menor habilidade para cantar ou tocar instrumentos musicais é muito comum nas pessoas com NF1 e pode vir a ser um instrumento de melhora dos déficits cognitivos (AMUSIA IS A COMMON FEATURE IN NEUROFIBROMATOSIS TYPE 1 – Principal autor: Bruno Cota);

7) Aumento dos telômeros (a extremidade dos cromossomos) está presente nas pessoas com NF1, mas não se correlaciona com a transformação maligna dos neurofibromas plexiformes (INCREASED TELOMERE LENGTH IN NEUROFIBROMATOSIS TYPE 1 – Primeira autora: Cinthia Vila Nova Santana);

8) Treinamento fonoaudiológico do processamento auditivo contribui para a melhora das dificuldades de aprendizagem nas pessoas com NF1

(AUDITORY TRAINING: A NEW APPROACH TO LEARNING DISABILITIES IN NEUROFIBROMATOSIS TYPE I – Primeira autora: Pollyanna Batista).

Os pôsteres serão avaliados por uma comissão e os três considerados mais importantes de todo o evento serão apresentados de forma oral numa sessão especial.

Vamos torcer para que continuemos a colaborar para o conhecimento das neurofibromatoses.

“Sou mãe de um jovem de 23 anos que possui neurofibromatose.
Aos 12 anos teve que passar por uma cirurgia para retirar um tumor que crescia muito rápido e estava alojado na parte direita do crânio. Deste então fazemos ressonância e exames diversos com receio. Contudo e apesar de todo o cuidado, recentemente tendo que retirar o dente do siso, perceberam que havia algo errado, procuramos um cirurgião buco maxilar que através de exames nos alertou que Lucas tem um tumor alojado na parte de baixo do maxilar. E isso não é novo, disseram eles, apesar de não conseguir mensurar. Toda a parte óssea está comprometida e sempre que procuramos uma especialista nada de concreto nos falam, preciso de ajuda pois alguns dizem que tem que mexer, outros dizem que melhor não mexer. Ajude-me por favor.” E, de local indeterminado.

Cara E. Obrigado pela confiança. Compreendo sua angústia, mas procure manter a calma para poder ajudar seu filho. Tentei responder seu e-mail diretamente para você, mas como ele retornou, farei alguns comentários publicamente. Espero que você os veja.

Como não examinei seu filho pessoalmente, não posso afirmar nada sobre ele diretamente. Assim, estamos à sua disposição para vê-lo pelo SUS no Centro de Referência em Neurofibromatoses do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais. Basta ligar e agendar: (31) 3409 9560 ou enviar um e-mail para adermato@hc.ufmg.br . Não esqueça de trazer o cartão do SUS na primeira consulta.

O que eu posso fazer hoje neste blog é dar algumas informações gerais, as quais podem ou não ser úteis no caso de seu filho, mas que nos ajudam a pensar de um modo mais organizado sobre as neurofibromatoses. Leve estas informações ao (à) médico (a) que está cuidando dele.

Você diz que ele tem neurofibromatose, mas não posso saber com segurança qual tipo: tipo 1 ou tipo 2? Porque ambos os tipos podem causar tumores no cérebro (astrocitomas na NF1 e meningiomas e schwannomas na NF2).

Como você disse a palavra “crânio”, tanto na NF2 quanto na NF1 podemos encontrar tumores na parte interna ou na externa da cabeça. Na NF1, os tumores internos geralmente são astrocitomas (chamados de gliomas) e na parte externa geralmente são neurofibromas. Na NF2, os tumores mais comuns na parte interna são os schwannomas (no nervo vestibular) e os meningiomas. Na parte externa, na NF2 também podemos encontrar schwannomas.

Você teria algum laudo de biópsia daquele tumor que foi retirado aos 12 anos de idade? Isto nos ajudaria muito.

Por falar em 12 anos, naquela idade é pouco comum a manifestação da NF2, portanto, minha tendência é pensar que seu filho teria a NF1 e o tumor operado teria sido um glioma.

Estes tumores na NF1, os gliomas, apresentam uma evolução muito benigna e geralmente não produzem danos, podendo ser observados ao longo da vida. Em nosso Centro de Referência, seguindo os padrões internacionais de tratamento das neurofibromatoses, nós raramente indicamos quimioterapia, rarissimamente indicamos cirurgia e NUNCA indicamos radioterapia para estes gliomas que acontecem na NF1.

Imaginando que seu filho tenha NF1, o tumor percebido na região da boca poderia ser um neurofibroma chamado plexiforme, que também é um tumor benigno e que costuma estar presente desde a vida intrauterina.

Em 85% das vezes, estes tumores não se transformam em malignos, mas numa pequena parte deles sim, e esta transformação pode ser anunciada por dor persistente e forte, associada a crescimento e endurecimento do tumor. Por isso ficamos atentos aos plexiformes, especialmente aqueles muito grandes e profundos.

Veja neste blog, na caixa ao lado de busca de assuntos, outras informações importantes sobre o tratamento dos plexiformes.

Até segunda feira.

Diversas pessoas têm me perguntado por que não divulgo no Facebook estas informações sobre as neurofibromatoses, uma vez que elas teriam maior visibilidade, atingindo mais pessoas do que no formato de postagens neste blog.

Escrevo este blog diariamente, procurando levar informações científicas e respondendo perguntas para pessoas e seus familiares com neurofibromatoses. Assim, quanto mais pessoas acessarem este blog (atualmente cerca de 200 pessoas por dia o fazem), mais famílias poderiam ser beneficiadas, pois, como nas demais doenças raras, a maior demanda atual é por informação científica sobre seu diagnóstico, prognóstico e tratamentos.

Cada post é escrito dentro de critérios científicos que me orientam, respeitando o interesse público das pessoas com neurofibromatose e o cuidado ético para não provocar danos físicos ou morais. Antes de responder qualquer pergunta, mesmo que eu considere a resposta bem conhecida, faço uma busca na literatura médica para saber se há alguma novidade. Isto é uma garantia para meus leitores e uma fonte de aprendizado para mim.

As informações estão organizadas e indexadas no blog de tal forma que aquelas postadas há mais tempo, em dias, meses ou anos anteriores, podem ser acessadas novamente por meio de uma caixa de procura, que fica disponível do lado direito da tela. Além disso, caso ainda persista uma dúvida, a pessoa que está lendo pode me enviar uma nova pergunta na caixa de mensagens que também está disponível na tela de abertura do blog.

Finalmente, aqueles que desejarem receber as postagens automaticamente podem se inscrever no blog, inserindo seu e-mail no espaço imediatamente abaixo do título.

O mais importante é que, quando uma pessoa decide acessar o blog, ela o faz de forma intencional, voluntária e com sua atenção focada naquele assunto, ou seja, ela não recebe a informação passivamente, como se estivesse sentada diante de uma televisão sem qualquer controle da programação.

Ao contrário deste ambiente do blog, no Facebook parece-me que as informações entram de forma desordenada, sem qualquer ordem de prioridade ou relevância, como se fosse um caleidoscópio. Caleidoscópio, como todos sabem, é aquele instrumento óptico formado por espelhos, os quais a cada momento apresentam combinações visuais variadas e interessantes.

“Ambiente caleidoscópico” parece definir o clima do Facebook, onde as coisas se sucedem, mudando continuamente, ainda que, depois de um número de recombinações, as repetições forçosamente venham a ocorrer. Posso estar enganado, mas há grande dificuldade em se localizar uma informação passada no Facebook, pois elas são destinadas a uma vida breve, fugaz, quase instantânea.

Ainda que haja informações ocasionalmente interessantes no Facebook, o caleidoscópio está repleto de gatinhos, gatinhas, piadas e assuntos bizarros e possui uma temática aleatória, ao acaso dos interesses momentâneos da rede social. Este quase caos nos conduz ao estado de passividade, no qual nos resta o direito de clicar ou não em curtir ou não curtir, como se estivéssemos diante de uma revista eletrônica dominical.

A instabilidade e mutação permanente do que se vê a cada instante no Facebook não me parecem apropriadas para a qualidade das informações médicas que pretendo transmitir, pois sua transitoriedade e leviandade seriam um desrespeito acrescido ao sofrimento em que já se encontram as pessoas com neurofibromatoses.

PS: Comentário em 27 4 2016 da fonoaudióloga Pollyanna Batista, que tem desenvolvido um trabalho brilhante no Centro de Referência em Neurofibromatoses do Hospital das Clínicas da Universiadade Federal de Minas Gerais, onde concluiu recentemente seu doutorado.

“Gostei bastante do seu ultimo texto, questionando o uso do facebook e preferindo o uso do blog.
Eu particularmente tenho a mesma impressão que você! As pessoas recebem passivamente as informações, curtem as informações sem saber o que é, e é um “espaço” que as pessoas ficam se promovendo e divulgando cursos e uma vida ideal. No blog você consegue organizar melhor os textos e algo postado tempos atras pode ser resgatado. 

Eu também, com este pensamento, fiz um blog (http://pollyannabatistafonoaudiologa.blogspot.com.br/
no início deste mês e as pessoas podem cadastrar e receber as informações no email. 
Postei informações sobre processamento auditivo, audição, dicas para fonoaudiólogos, treinamento auditivo e neurofibromatoses. 
Aos poucos vou organizando o blog. Suas opiniões são bem vindas.”


“Os gliomas podem surgir em qualquer idade? ” AR de São Paulo.

Caro A, obrigado pela sua oportuna pergunta. Creio que você está se referindo aos gliomas localizados nos nervos ópticos, ou em outras partes do sistema nervoso central, que podem acontecer nas pessoas com Neurofibromatose do Tipo 1 (NF1).

Os gliomas ópticos são tumores benignos na imensa maioria (85%) das pessoas com neurofibromatose do tipo 1 (NF1), não produzindo nem mesmo alteração da acuidade visual ou outros sintomas. Ou seja, em cada 100 crianças com NF1, 15 apresentarão glioma e, destas 15, uma ou duas precisarão de tratamento.

Os gliomas na NF1 geralmente são diagnosticados em torno dos 3 aos 5 anos, e como a maioria deles geralmente é descoberta por acaso, sem sintomas ou sinais evidentes, isto sugere que eles estavam presentes há mais tempo na criança e, talvez, tenham se desenvolvido durante a vida intrauterina.

Interessante saber também que, na NF1, o estado funcional da visão encontrada no momento do diagnóstico do glioma não se altera depois, ou seja, se nada houver de prejuízo da visão no momento que o glioma é percebido, provavelmente nada haverá nos anos seguintes.

Outra coisa muito importante é que não há relação direta entre o tamanho do glioma óptico na NF1 e a acuidade visual, ou seja, as complicações do tumor não são diretamente relacionadas ao seu volume, por isso devemos tratar as pessoas com NF1 e não a sua ressonância magnética.

A partir dos 7 anos de idade, o diagnóstico do glioma óptico na NF1 se torna cada vez menos frequente e cada vez mais raro depois dos 12 anos.

Assim, a fase da vida em que ficamos mais atentos aos gliomas ópticos nas pessoas com NF1 é durante a sua infância.

Aqueles poucos casos (15%) de gliomas ópticos nas pessoas com NF1 que apresentam complicações (diminuição da acuidade visual, puberdade precoce ou crescimento rápido do tumor) precisam ser acompanhados de acordo com um consenso internacional, que pode ser acessado em nosso artigo na Arquivos de Neuropsiquiatria de 2015 (VER ARTIGO COMPLETO AQUI).

Foto do perfil de Rogério Lima

O Rogério Lima Barbosa (foto), um dos fundadores da Associação Maria Vitória de Doenças Raras (Brasília – DF) está realizando seu doutorado em Coimbra, em colaboração com um dos melhores centros de referência em Neurofibromatoses do mundo, a equipe da Dra Susan Huson, em Manchester, na Inglaterra.

O Rogério estará em Brasília durante os dias 6 e 20 de junho e em Belo Horizonte (em data a ser combinada) para realizar entrevistas com pessoas com o diagnóstico de neurofibromatose e seus familiares. O título de sua pesquisa é: “Ninguém nasce doente, torna-se doente! – Itinerários Diagnóstico e Itinerários Terapêuticos no caso da Neurofibromatose tipo 1”.

Seu objetivo é coletar, por meio de entrevistas, histórias de vida relacionadas com a Neurofibromatose do Tipo 1 (NF1), para entender quando e como a NF1 pode impactar na vida do indivíduo e de sua família.

Esse estudo será realizado no Brasil, Portugal e Inglaterra como forma de comparar as diferentes histórias de vida de pessoas com diagnóstico de NF1 e seus familiares em diferentes países.

O trabalho consistirá em combinar entrevistas em profundidade sobre a história de vida do/a entrevistado/a com o uso da foto-elicitação. Serão realizadas entrevistas pessoais e individuais com uma duração média de 1/2h, dependendo da disponibilidade do participante.

As fotos ou imagens pretendem apoiar o/a entrevistado/a a relatar a sua história. O doutorando Rogério Lima Barbosa é o responsável por realizar as entrevistas.

Podem participar maiores de 18 anos, com o diagnóstico de NF1 ou ser familiar de uma pessoa que tenha o diagnóstico. Podem ser entrevistadas mais de uma pessoa da mesma família. Contudo, todas as pessoas serão entrevistadas separadamente. As entrevistas serão conduzidas em um local de escolha do entrevistado (preferencialmente um lugar silencioso).

A participação é totalmente voluntária e o indivíduo pode deixá-la a qualquer momento.

Os benefícios da pesquisa para o Sistema de Saúde será identificar lacunas no Sistema de Saúde que possam auxiliar a melhoria do cuidado às pessoas com o diagnóstico da NF e seus familiares.

Os resultados também poderão ser úteis para as Associações de pessoas com NF, por melhorar o entendimento sobre a realidade (experiência entre saúde/doença) das pessoas com o diagnóstico de NF e seus familiares.

Além disso, a pesquisa pode fortalecer os laços entre as Associações de NF do Brasil, Inglaterra e Portugal.

A pesquisa do Rogério conta com o apoio da Associação Mineira de apoio às pessoas com Neurofibromatose (AMANF: www.amanf.org.br) da Universidade de Exeter, Departamento de Sociologia, Filosofia e Antropologia (Prof. Dra. Susan Kelly, s.e.kelly@exeter.ac.uk ) e da Universidade de Coimbra, Centro de Estudos Sociais e Faculdade de Economia. Prof. Dra. Sílvia Portugal, (sp@fe.uc.pt ) e da Associação Portuguesa de Neurofibromatoses (APNF – www.apnf.eu ).

Clique aqui para o link da pesquisa

Quem desejar colaborar, por favor, envie um e-mail para o Rogério que ele fará contato: rogerio.limab@gmail.com


“Soube que em São Paulo, uma oncologista/geneticista está fazendo tratamento com bloqueadores. Este tratamento é similar a uma quimioterapia. Informaram-se que na maioria das vezes a pessoa fica curada da NF. Os fibromas param de crescer e até diminuem. Gostaria de saber a real veracidade dessa notícia”. MISC, de São Paulo.

Cara MI, obrigado pelo seu contato. Diversas pessoas têm me enviado perguntas sobre este possível tratamento que estaria sendo realizado em São Paulo e alguns dos leitores dizem que ouviram falar que há 100% de sucesso com o tal medicamento bloqueador dos neurofibromas.

Todos nós torcemos para que algum dia tenhamos um medicamento capaz de evitar o crescimento dos neurofibromas e dos demais tumores que podem acontecer nas pessoas com neurofibromatoses (especialmente os neurofibromas cutâneos, os plexiformes, os gliomas, os schwannomas, os meningiomas – quais destes estão sendo tratados com o suposto medicamento?).

No entanto, sua pergunta (e dos demais leitores) não me permite saber do que se trata exatamente, pois não há o nome da pessoa responsável, ou da instituição de saúde ou do medicamento utilizado. Portanto, não tenho como enviar informações seguras sobre esta questão.

Devo lembrar o eu já escrevi neste blog (VER AQUI) sobre as dificuldades existentes para a descoberta de um medicamento capaz de impedir o crescimento dos tumores nas pessoas com NF.

Diante da maioria dos problemas de saúde e seus possíveis tratamentos, creio que é preciso desconfiarmos de quaisquer promessas de “100% de cura” ou tratamento garantido “sem efeitos colaterais”, porque isto praticamente não existe em medicina.

Um médico que prometa 100% de bons resultados pode estar numa das seguintes condições:

1) Ou ele ainda não tem experiência suficiente para ver aqueles casos que não respondem ao tratamento (porque acontecem erros inevitáveis e as pessoas são diferentes entre si);

2) Ou ele não consegue ver os resultados negativos, porque não está preparado cientificamente para trabalhar com a medicina baseada em evidências;

3) Ou ele sabe que há resultados negativos, mas não os revela para não perder clientes, prestígio ou dinheiro.

Em quaisquer destas condições, é sempre prudente ouvir uma segunda opinião.

Bom final de semana.

Atualizado em 18/10/2021

“Ontem li uma reportagem que me deixou intrigado, falando da cura das doenças raras em um método chamado de CRISPR. … como curar a doença genética? Mudar todas as células da pessoa? Li alguns artigos. Bem, estou certo em pensar que quando se falam desta cura é a modificação genética, ainda como óvulo? Ou seja, não é possível fazer isso em adultos? Veja o link para a reportagem AQUI “. RLB de Coimbra, Portugal.

Caro R, sua pergunta é muito interessante e foi feita também por outras pessoas que leram este blog. Para responder com segurança sobre esta questão, convidei a doutoranda Cinthia Vila Nova Santana, que submeteu suas respostas ao seu orientador Renan Pedra de Souza, do Programa de Pós-Graduação em Genética do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais. Veja abaixo o que eles responderam.

Além disso, vejam a reportagem que foi publicada em 2018 Clicar Aqui

Veja também novas informações experimentais de 2021 CLIQUE AQUI

Cinthia e Renan também enviaram referências de artigos e livros sobre cada etapa do seu pensamento e elas estão disponíveis comigo para quem se interessar, basta solicitar por e-mail.

Cinthia – O desenvolvimento da técnica de DNA recombinante em 1970 marcou o início de uma era importante na Biologia. Pela primeira vez, pesquisadores foram capazes de manipular moléculas de DNA (ativando e desativando, ou seja, editando os genes – Figura ilustrativa acima), o que tornou possível o estudo de genes de interesse medicinal e biotecnológico. Desde então, muitos avanços aprimoraram as técnicas de biologia molecular, possibilitando o estudo dos genes não apenas isolados, mas também no organismo como um todo.

Muitas das ferramentas para edição do genoma são baseadas no princípio da complementariedade de bases: a base Adenina é complementar à Timina e a Citosina é complementar à Guanina. Isto possibilitou o desenvolvimento de técnicas para multiplicação de fragmentos de DNA (chamada de reação da polimerase em cadeia, PCR), permitiu o silenciamento de genes (knockout) ou diminuição da expressão gênica (knockin) e também inserção de mutações em um gene, por exemplo.

Apesar das tecnologias disponíveis, nem sempre se consegue a recombinação desejada. Além disso, o genoma de eucariotos (como nós, seres humanos) contém milhões de bases de DNA, tornando difícil a sua manipulação.

A fim de superar estes desafios, novas técnicas para edição do DNA são constantemente desenvolvidas e, recentemente, o sistema CRISPR-Cas ganhou merecida atenção. Apesar de descrito em 1987, este sistema foi somente empregado como ferramenta biotecnológica em 2012 e em 2013 já foi eleito um dos destaques do ano pela revista científica Nature.

LOR – Mas o que vem a ser esta nova técnica CRISPR-Cas?

Cinthia – CRISPR é uma sigla em inglês que significa: Repetições Palindrômicas Curtas Agrupadas e Regularmente Interespaçadas.

Aparentemente é algo complicado, mas se analisarmos com atenção não é tão difícil quanto parece. Como o próprio nome indica, CRISPR trata de sequências de bases palindrômicas, assim como ARARA, que é uma palavra palindrômica, ou seja, pode ser lida de trás para frente sem mudar o sentido. Elas são curtas e agrupadas e se repetem com espaços regulares entre elas, por exemplo, a cada 20 nucleotídeos há uma repetição (Figura 2).


Figura 2: Representação do sistema CRISPR-Cas. Em azul mais à esquerda estão os genes associados a CRISPR (“cas genes”) e mais à direita, os losangos pretos representam as repetições (“repeat”), enquanto que os quadrados coloridos são os espaçadores regulares (“spacer”). A este conjunto dá-se o nome de locus da CRISPR (Figura adaptada de http://rna.berkeley.edu/crispr.html).

O sistema CRISPR-Cas foi primeiramente descrito em bactérias como um mecanismo de defesa contra vírus.

Esta defesa acontece da seguinte forma: durante uma infecção virótica, o DNA do vírus é liberado dentro da célula bacteriana e é integrado ao sistema CRISPR como um novo espaçador (como se fosse um dos quadrados coloridos da Figura 2) (Figura 3, estágio 1). A sequência CRISPR é então transcrita (isto é, a informação é passada de DNA para RNA) e processada para gerar os CRISPR RNAs (crRNAs), cada um codificando a informação de uma sequência espaçadora específica (Figura 3, estágio 2). Cada crRNA associa-se com uma proteína Cas que usa o crRNA como molde para silenciamento de elementos genéticos externos (Figura 3, estágio 3).

 
Figura 3: Mecanismo de ação do sistema CRISPR-Cas9. Conferir corpo do texto para maiores detalhes. Fonte: http://rna.berkeley.edu/crispr.html

Em resumo, com o uso do CRISPR, a bactéria consegue impedir que o vírus seja bem-sucedido em sua infecção através de modificações do material genético do vírus. 


Se quiser entender um pouco melhor sobre CRISPR-Cas9, veja o vídeo https://www.youtube.com/watch?v=2pp17E4E-O8.

LOR – Mas como um mecanismo de defesa bacteriano contra vírus pode se tornar uma ferramenta biotecnológica em seres humanos?
Cinthia – A resposta vem em duas partes. Primeiro, o processo de defesa acontece por alteração genética que é controlável, ou seja, teoricamente é possível decidir qual a alteração que será realizada no material genético.

Segundo, embora outras técnicas de mutação regulada (ou dirigida) sejam conhecidas, o sistema CRISPR-Cas9 é consideravelmente mais simples em relação às técnicas anteriores.

LOR – Então, a técnica CRISPR-Cas9 pode ser usada em seres humanos?

Cinthia – Esta hipótese está em teste. Resultados experimentais ainda preliminares indicam que grupos de poucas células podem responder a esta metodologia de maneira satisfatória, mas ainda não se sabe qual é o efeito do CRISPR em um ser humano. Várias das metodologias anteriores capazes de gerar alterações no código genético de maneira regulada mostraram-se funcionais em grupos de poucas células, mas sem efeitos no ser humano.

Até abril de 2016 já foram publicados cerca de 1.200 artigos científicos citando o sistema CRISPR-Cas9, segundo o site de pesquisas biomédicas PubMed (disponível no endereço eletrônico http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed).

Diversos estudos já utilizaram esta técnica para edição do DNA em linhagens celulares, plantas (trigo, arroz, tabaco), fungos, Drosophila, peixes (zebrafish), camundongos, sapos e até mesmo macacos, nas mais diversas aplicações: agricultura (aumentar resistência a pragas nas lavouras de trigo), reprodução de modelos de câncer em camundongos para estudos de vias biológicas e de efeitos de medicamentos, identificação de genes essenciais para viabilidade celular especialmente em câncer, alteração de mutações responsáveis por doenças genéticas em modelos experimentais.

No entanto, estudos em seres humanos são praticamente inexistentes e o principal foco dos estudos neste momento é entender melhor como certas características são determinadas.

LOR – E em relação às neurofibromatoses? Existe algum trabalho publicado?

Cinthia – Em pesquisa feita no site do PubMed com os termos “CRISPR neurofibromatosis” (em inglês), apenas dois estudos são exibidos: Shalem e colaboradores (2014) e Beauchamp e colaboradores (2015). Os dois trabalhos utilizam a técnica CRISPR para regular os genes NF1 e NF2, somente em modelos experimentais, novamente com o objetivo de compreender melhor o desenvolvimento da neurofibromatose.

LOR – A técnica CRISPR-Cas9 poderia ser usada para alterar as mutações nos genes das neurofibromatoses? Caso afirmativo, qual seria o tempo de expectativa?

Cinthia – O primeiro problema desta questão é conceitual. O que representaria alterar o código genético de um paciente com neurofibromatose, assumindo que isto fosse possível? Seria possível recuperar a produção de neurofibromina?

No seu blog, você já abordou a dificuldade em se fazer um medicamento para reposição da neurofibromina (ver aqui). As mesmas dificuldades são pertinentes neste caso do CRISPR. Como você explicou, a neurofibromina é uma proteína necessária especialmente durante o desenvolvimento do bebê dentro do útero. Logo, não se espera que a alteração do código genético em pacientes fosse capaz de reverter uma série de sintomas associados à inexistência de neurofibromina ainda em estágios iniciais de desenvolvimento.

Bom, mas e se considerarmos então uma intervenção do código genético ainda durante a vida intrauterina? Essa questão nos leva a outra linha de raciocínio. Em cerca de metade dos casos de NF1 a mutação é nova, o que significa dizer que nenhum dos pais possuía em seu código genético aquela alteração e muito provavelmente não ficarão sabendo de sua existência antes do nascimento. Para os casais em que se conhece um histórico familiar da doença uma possibilidade seria o aconselhamento genético para que todas as opções sejam consideradas.

LOR – Mas então, neste momento, a técnica CRISPR-Cas9 não poderia ter utilidade para pacientes com neurofibromatoses?

Cinthia – Esta técnica é realmente uma revolução no campo da ciência e já é referida como uma possível “cirurgia do genoma”, mas ainda há muito que se descobrir quanto ao seu funcionamento.

Primeiro há de se entender como seria o resultado desta técnica em um indivíduo sem neurofibromatose para depois estudá-la como um tratamento. Grupos de pesquisadores também estão atrás de respostas para várias das perguntas feitas neste texto.

A ciência avança rapidamente, as técnicas estão aprimorando a cada dia e nós, pesquisadores das neurofibromatoses, investigaremos todos as técnicas que tenham um potencial, mesmo que mínimo, de melhorar a vida dos pacientes com neurofibromatoses.