Foi divulgado recentemente (13/11/23) pela indústria farmacêutica NFlection Therapeutics que o medicamento que ela produziu na forma de gel, o NFX-179 apresentou resultados positivos numa pesquisa com neurofibromas cutâneos em pessoas com neurofibromatose do tipo 1 (NF1). 

Hoje foi divulgada uma palestra gravada pela indústria com apoio da Children’s Tumor Foundation, “prometendo” o lançamento comercial do medicamento para 2026 (ver aqui o link).

Talvez seja o medicamento Bimetinibe que já falamos na página da AMANF – ver aqui.

Vamos comentar abaixo o que cada um dos 4 pontos apresentados pela indústria significa para nossa comunidade NF.

Antes, precisamos dizer duas coisas:

  1. Qualquer medicamento que diminuir em algum grau os neurofibromas cutâneos é bem-vindo e se torna uma esperança, que merece ser estudada mais profundamente, para que seja encontrado o ou os medicamentos eficientes para a maioria das pessoas.
  2. Este resultado é um anúncio da indústria, que tem seus interesses financeiros , mas não é ainda a opinião da comunidade científica. Então os resultados do Gel  apresentados em folheto de propaganda precisam ser avaliados por outros cientistas e serem publicados numa revista científica honesta. Mesmo que este sistema de confirmação, como nos alerta a filósofa Isabelle Stenger, apresente fraudes e problemas de confiança – ele é o que dispomos no momento. Ver aqui mais informações sobre a importância de revisão dos resultados por outros cientistas.

Dito isso, o que significam estes resultados da indústria?

 

Ponto 1. Houve redução significativa no tamanho dos neurofibromas 

O objetivo primário de eficácia do estudo foi a resposta individual dos voluntários. 

O GEL foi considerado eficaz quando houve redução de pelo menos 50% no volume de neurofibroma cutâneo em cinco ou mais dos dez tumores tratados, após 6 meses de aplicação diária de Gel NFX-179.

Por exemplo, numa pessoa em que 6 de seus dez neurofibromas escolhidos diminuíram para a metade com o uso do gel, seu resultado foi considerado positivo.

A indústria diz que as respostas foram dependentes da dose da seguinte forma:

Gel com 1,5% do medicamento  – positiva em 44,2% das pessoas testadas 

Gel com 0,5% do medicamento – positiva em 34,8% das pessoas testadas 

Gel sem nenhum medicamento (placebo) – positiva em 24,1% das pessoas testadas 

Usando testes estatísticos, a indústria afirma que o Gel com 1,5% produziu mais respostas positivas do que o gel sem medicamento. Em outras palavras, o placebo (Gel sem nada) também produziu respostas positivas, mas o Gel com 1,5% diminuiu mais ainda. Então, consequentemente o Gel com 0,5% não é diferente do Gel placebo.

Assim, um pouco menos da metade das pessoas testadas mostrou redução em pelo menos 6 dos dez neurofibromas tratados, o que indica que a substância utilizada tem algum efeito sobre os neurofibromas.

No entanto, 1 em cada 4 pessoas também apresentou resposta positiva com o Gel sem nada, mostrando que o efeito real do medicamento deve ser menor do que aquele observado em 44,5% das pessoas com o Gel mais concentrado.

A indústria não divulgou o tamanho médio dos neurofibromas estudados, mas temos  observado que o tamanho médio da maioria deles é em torno de 3 a 5 mm de diâmetro. Como nenhum neurofibroma desapareceu completamente, o que teria sido comemorado no relato da indústria, um neurofibroma médio de 5 mm tratado com o Gel 1,5% passaria a ter cerca de 2 a 3 mm depois de 6 meses de tratamento. 

Diante desse resultado, nossa pergunta é se é possível a gente distinguir a olho nu esta diferença de 2 a 3 mm e se isto impactaria a aparência das pessoas com NF1 e sua qualidade de vida. 

 

Ponto 2. Seria o primeiro estudo a mostrar efeito de um medicamento sobre neurofibromas cutâneos

Sim, este estudo é o primeiro que encontra uma droga capaz de inibir uma via metabólica nas células (chamada via MEK), reduzindo assim o tamanho dos neurofibromas cutâneos. 

Mas já existe outro medicamento semelhante, o selumetinibe, estudado nos neurofibromas plexiformes. Aliás, gostaríamos de saber o que aconteceu com os neurofibromas cutâneos das pessoas que usaram o selumetinib para o plexiforme?

É importante avisar que o estudo com o Gel NFX-179 foi realizado por seis meses em  199 pessoas com NF1 distribuídas em 24 centros de investigação nos Estados Unidos, para saber a segurança e eficácia do medicamento. A própria indústria reconhece, portanto, que ainda não é o estudo definitivo para recomendar a comercialização do medicamento. 

De acordo com esta informação da indústria, em média, cada uma das 24 clínicas espalhadas pelos Estados Unidos testou apenas 8 pessoas com NF1 voluntárias e elas tiveram que ser distribuídas de forma aleatória entre os três grupos experimentais (Gel 1,5%, Gel 0,5% e Gel sem medicamento). 

Achamos que este é um número pequeno de voluntários em cada clínica, o que dá margem a certos problemas. Por exemplo, se foram escolhidos por sorteio para receberem o Gel para ninguém saber quem estava usando qual das dosagens e se seus médicos também não sabiam as dosagens de cada paciente (estudo duplo-cegado). 

Além disso, estudos realizados por consórcios (multicêntricos) são considerados de baixa qualidade científica (ver sistema GRADE) pois os critérios diagnósticos e os métodos de medida dos neurofibromas podem variar muito de uma clínica para outra. 

Apesar destas limitações, achamos que estes resultados com o NFX-179 justificam novas pesquisas, com um número maior de pessoas, para termos a segurança de que este primeiro resultado não aconteceu por acaso e que o medicamento deve funcionar bem na maioria das pessoas. Como a própria indústria afirma no Ponto 4, abaixo. 

Sobre a segurança do medicamento, que foi a justificativa para o estudo, os resultados indicam que o Gel foi bem tolerado e as concentrações plasmáticas do medicamento foram menores do que aquelas observadas para inibidores orais de MEK, que costumam apresentar efeitos colaterais.

 

Ponto 3. Outros desfechos secundários 

A indústria também diz que a redução do volume dos neurofibromas “foi altamente correlacionada com melhorias significativas relatadas pelos pacientes em seus neurofibromas cutâneos”. 

Gostaríamos de saber quais foram estas melhorias. 

Menor discriminação social porque 5 de dez neurofibromas ficaram menores? 

Menor timidez social das pessoas com NF1? 

Menor taxa de ansiedade? 

Mais autoestima? 

Como estas variáveis foram avaliadas? 

Aguardamos a publicação dos dados completos para sabermos se estes desfechos secundários foram realmente importantes para as pessoas com NF1. 

 

Ponto 4. Segundo a indústria, “os resultados de eficácia e tolerabilidade apoiam o avanço do programa NFX-179 Gel para o desenvolvimento da Fase 3 em 2024”.

Sim, esperamos que isto aconteça com estudos mais robustos cientificamente.

 

Dra. Luíza de Oliveira Rodrigues

Dr. Luiz Oswaldo Carneiro Rodrigues

Dr. Nilton Alves de Rezende

Dr. Bruno Cézar Lage Cota

 

Agradecemos à família que pediu informações sobre um estudo com uma droga chamada trametinibe para os neurofibromas plexiformes, que foi registrado na Suécia em 2019 – e deveria estar apresentando seus resultados em julho de 2023 (ver aqui detalhes do registro do estudo) .

ATENÇÃO – Por favor, leia com atenção o texto abaixo, ANTES DE NOS PEDIR RECEITA para usar este medicamento – como aconteceu com algumas pessoas nas primeiras horas depois que postamos esta informação. 

O trametinibe é uma quimioterapia que age no organismo da mesma forma que o selumetinibe (são inibidores da via metabólica MEK1/2). O selumetinibe, já foi aprovado pela ANVISA, e sobre ele a equipe de médicas e médicos do Centro de Referência em Neurofibromatoses (CRNF) realizou um trabalho de esclarecimento (enviado inclusive para a ANVISA) que pode ser consultado aqui.

Trametinibe

Já existem alguns estudos sobre o uso do trametinibe no tratamento de pessoas com NF1 e neurofibromas plexiformes sintomáticos graves (com risco de vida) e que não podem ser tratados cirurgicamente.

O trametinibe também já foi utilizado em algumas pessoas com NF1 e gliomas sintomáticos graves, ou seja, tumores que estão reduzindo a visão e/ou produzindo puberdade precoce e outros problemas neurológicos.

Alguns casos raros graves de neurofibromas plexiformes podem ser beneficiados por medicamentos como o selumetinibe ou o trametinibe. Por isso, já indicamos para 2 crianças em cerca de 2 mil famílias no CRNF.

No entanto, aguardamos resultados de outros estudos científicos mais amplos sobre a verdadeira eficácia destes medicamentos e ainda não estamos convencides de sua indicação nos gliomas ópticos nas pessoas com NF1.

 

A informação mais objetiva que dispomos sobre o trametinibe, até o presente, é uma metanálise, ou seja, uma revisão de 8 estudos realizada em 2022, envolvendo o total de 92 pessoas com NF1 tratadas com trametinibe (ver aqui o trabalho original em inglês).

Esta revisão mostrou que o trametinibe parece estabilizar o crescimento dos tumores sem diminuir seu volume, e que a segurança do medicamento seria satisfatória, mas a qualidade científica destas pesquisas foi muito baixa ou, no máximo, moderada.

Em conclusão, precisamos de estudos científicos sobre trametinibe realizados com mais cuidados nas pessoas com NF1 para indicarmos o seu uso com segurança.

 

Quer entender por que os estudos com selumetinibe e trametinibe, até agora, são insuficientes?

Para compreendermos por que algumas pesquisas ainda são pouco conclusivas, vamos comentar o estudo sueco enviado pela família, porque ele é muito parecido com outros estudos realizados com o mesmo objetivo.

Começamos reproduzindo as palavras com as quais este novo estudo é descrito:

“Este estudo, Treatment of NF1-related plexiforme neurofibroma with trametinib; um estudo aberto de braço único com os objetivos de remissão parcial volumétrica e alívio da dor (EudraCT 2018-001846-32, protocolo patrocinador número BUS2018-1, número de referência relacionado da Novartis CTMT212ASE01T) é um ensaio clínico pediátrico que investiga o uso potencial de o medicamento trametinibe (Mekinist®) como tratamento para neurofibromas plexiformes (PN) sintomáticos ou com probabilidade de se tornarem sintomáticos relacionados à NF1 em crianças entre 1 ano e 17 anos e 11 meses de idade.”

Vamos entender o significado destas palavras destacadas em negrito, que geralmente são complicadas para a maioria das pessoas.

 

  • Estudo aberto de braço único

 Isto quer dizer que haverá apenas um grupo de 15 pessoas voluntárias, as quais receberão apenas o medicamento trametinibe, mas não haverá nenhum outro grupo de voluntários recebendo um placebo – num comprimido sem nenhum medicamento -, para que possa ser comparado o efeito da droga com o efeito psicológico, o chamado efeito placebo.

Em outras palavras, as pessoas voluntárias e os médicos saberão que elas estão usando o medicamento trametinibe, ou seja, pode haver uma sugestão psicológica que favoreça a resposta positiva das pessoas sobre um dos objetivos do estudo que é aliviar a dor.

Também não haverá a comparação dos possíveis efeitos do trametinibe com os efeitos de outra droga já usada para a mesma finalidade (o selumetinibe, por exemplo). Assim, não saberemos se nas mesmas condições o trametinibe é melhor, igual ou pior do que o selumetinibe.

Portanto, este estudo aberto de braço único é cientificamente fraco.

 

  • Remissão parcial volumétrica é suficiente?

Isto quer dizer que não se espera que o trametinibe possa eliminar o neurofibroma plexiforme, mas apenas reduzir o seu volume.

A redução de volume considerada satisfatória nestes estudos tem sido igual ou maior do que 20% do volume do tumor antes de iniciar a medicação.

Temos chamado a atenção para o fato de que alguns plexiformes gravíssimos podem de fato ameaçar a vida (comprimindo a traqueia e impedindo a respiração, por exemplo).

Nestes casos, raríssimos (apenas 2 pacientes em cerca de 2 mil famílias atendidas no CRNF), sim, a redução de 20% pode salvar a vida.

No entanto, para a grande maioria das pessoas com NF1 e plexiformes a redução de apenas 20 – 30% do volume do tumor (como aconteceu para metade das pessoas com o selumetinibe) isso pode representar um efeito que não muda a sua qualidade de vida.

Portanto, se o resultado for apenas a redução volumétrica parcial não será um desfecho relevante para a maioria dos pacientes.

 

  • Alívio da dor é real?

O objetivo do estudo indica que querem saber se o trametinibe pode reduzir o volume E aliviar a dor? Ou são objetivos separados? Alguém com plexiforme, mas sem dor, pode participar do estudo?

A avaliação da dor, já comentamos acima, é altamente influenciada pelo estado psicológico da pessoa doente (e de sua família).

Se as pessoas envolvidas com o estudo (laboratório fabricante, médico que receita, família da criança e a própria criança com o plexiforme) estiverem TORCENDO para o trametinibe “dar certo”, é possível que aconteça o que observamos com a redução da dor no estudo do selumetinibe (em média um ponto na escala de dor (de 0 a 10), sem que a gente tenha certeza se foi o trametinibe ou se um placebo faria o mesmo efeito.

 

  • Plexiformes sintomáticos ou potencialmente sintomáticos – o que é isso?

Sabemos que os plexiformes podem ser:

  • Assintomáticos, ou seja, a pessoa não relata qualquer problema relacionado com o neurofibroma.
  • Outros podem apresentar dor ao toque ou com o uso de roupas.
  • Outros podem apresentar dor frequente, espontânea (se for forte e persistente, temos que pensar em transformação maligna).
  • Outros causam deformidades ósseas.
  • Outros causam problemas estéticos.
  • Alguns permanecem estáveis a vida toda, outros crescem sem qualquer razão aparente ou param de crescer, e outros até diminuem de tamanho, também sem razão aparente.

Portanto, diante de uma determinada pessoa com um plexiforme, NENHUM MÉDICO DO MUNDO SABE o que irá acontecer nos próximos meses ou semanas.

Assim, como podemos dizer que um plexiforme é POTENCIALMENTE SINTOMÁTICO? Este conceito não possui uma base científica.

Portanto, neste estudo proposto para o trametinibe não estão bem definidos quais os sintomas que são SEGURAMENTE relacionados ao plexiforme e quais serão usados como critérios para inclusão das pessoas no estudo.

 

  • Outro problema: quais serão os plexiformes estudados?

Sabemos que existem neurofibromas plexiformes nodulares e neurofibromas plexiformes difusos e que eles são estruturalmente diferentes e com evolução e sintomas muito distintos.

Este estudo com o trametinibe não deixa claro quais os tipos que serão estudados.

Este é um problema que já denunciamos no estudo com o selumetinibe e que enfraquece ainda mais os resultados com o trametinibe, financiados por laboratórios que fabricam medicamentos de altíssimo custo e efeitos irrelevantes ou duvidosos para doenças raras.

 

Conclusão

 Precisamos de melhores estudos científicos que tragam resultados relevantes para a maioria das pessoas com neurofibromatose do tipo 1, as quais sofrem com seus neurofibromas plexiformes.

 

 

Dra. Juliana Ferreira de Souza

Dra. Luiza de Oliveira Rodrigues

Dr. Luiz Oswaldo Carneiro Rodrigues

Dr. Nilton Alves de Rezende

Enf. Marina Silva Corgosinho

 

Outubro de 2023

 

Saber QUANDO procurar especialistas é uma das questões importantes no acompanhamento das pessoas com neurofibromatoses.

Na maioria das vezes, a primeira consulta com especialistas em NF1 pode identificar os achados, as manifestações e as complicações da NF1 e classificar a gravidade da doença (ver aqui mais informações sobre isto).

 

NF1 com gravidades mínima e leve

Assim, na maioria dos casos, as pessoas com gravidade mínima ou leve devem levar uma vida normal, sem quaisquer restrições de atividades físicas ou alimentares.

 

As pessoas com gravidade mínima ou leve devem levar consigo um laudo da primeira consulta com especialista em NF1 e podem ser acompanhadas APENAS pela equipe multidisciplinar da Atenção Primária à Saúde (APS), junto ao médico(a) de família e comunidade (MFC) (pessoas de todas as idades), pediatra (crianças e adolescentes) ou clínica médica (pessoas adultas).

 

Especialistas em NF devem emitir laudos para orientar a equipe da APS e os profissionais médicos (MFC, pediatria e clínica médica) sobre os problemas que devem ser acompanhados nas crianças e adolescentes (geralmente dificuldades de aprendizado,  acuidade visual, pressão arterial, alinhamento da coluna e puberdade) ou nos adultos (geralmente pressão arterial, aconselhamento genético, neurofibromas cutâneos).

 

Quando surgir um sintoma novo ou no caso de alguma dúvida é o momento de ouvir a pessoa especializada em NF1.

 

De um modo geral, exceto nas situações de urgência, é claro, sugerimos aos profissionais da APS que ouçam a médica ou médico especialista em NF1, antes de serem indicados novos exames (ressonâncias, biópsias etc.) ou consultas com outros especialistas (cirurgia, neurologia, dermatologia etc.).

 

NF1 com gravidade moderada

Na primeira consulta, especialistas em NF1 podem identificar algumas complicações da NF1 que classificam a gravidade da doença como moderada.

 

Nestes casos, a pessoa com NF1 também deve retornar aos cuidados gerais da equipe multidisciplinar da APS, junto ao médico ou médica de família e comunidade (pessoas de todas as idades), pediatra (crianças e adolescentes) ou clínica médica (pessoas adultas), com o laudo detalhado e com reavaliações periódicas com especialista em NF1.

 

A situação ideal para os casos de gravidade moderada é aquela em que a APS coordena os cuidados gerais em parceria com a pessoa especialista em NF1 e com outras especialidades como a cirurgia, oftalmologia, neurologia etc.

 

Casos graves de NF1

Mais uma vez, acreditamos no papel de coordenação do cuidado do profissional médico da APS (MFC, pediatria ou clínica médica) na condução médica dos principais problemas existentes.

 

É preciso alguém com a visão de conjunto dos diversos e complexos problemas de saúde que acometem as pessoas com NF1 e maior gravidade.

Geralmente, os casos mais graves necessitam de consultas mais frequentes com especialistas em NF1.

Schwannomatoses

As Schwannomatoses (SCH) são mais raras do que a NF1 e geralmente se manifestam a partir da segunda década de vida.

Nas primeiras consultas com especialistas em NF, deve ser confirmado o diagnóstico do tipo de SCH (ver aqui mais informações sobre isto) e laudos devem ser entregues para ajudar a equipe da APS, no acompanhamento dos problemas gerais de saúde e daqueles agravados pelas SCH.

No entanto, as características neurológicas dos problemas clínicos nas SCH (baixa audição, dor, convulsões etc.) exigem a participação mais frequente da neurologia, neurocirurgia, fonoaudiologia, clínica de dor etc., além de especialistas em NF.

Conclusão

Apesar das NF serem doenças genéticas raras, a equipe multidisciplinar da APS, junto aos profissionais médicos da MFC, pediatria e clínica médica, devem coordenar o cuidado das pessoas com NF1 ou SCH e especialistas em NF devem seguir como consultores para o apoio permanente depois das primeiras consultas.

 

Dra. Juliana Ferreira de Souza

(Professora do Departamento de Pediatria, Coordenadora do Centro de Referência em Neurofibromatoses, Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais)

 

Dr. Luiz Oswaldo Carneiro Rodrigues

Médico, Professor Aposentado da UFMG, Diretor Administrativo da AMANF.

 

 

Ilustração: Dr Lor

 

Cientistas franceses estão estudando uma nova substância (cujo nome é binimetinibe) que pode vir a ser um tratamento para os neurofibromas cutâneos.

Eles publicaram recentemente (ver aqui) os resultados de sua pesquisa que é o primeiro passo sabermos se ele funcionará ou não. Eles criaram um camundongo geneticamente modificado que apresenta neurofibromas cutâneos e utilizaram o binimetinibe como uma pomada na pele dos camundongos. Os cientistas observaram que a nova droga inibiu o crescimento de novos neurofibromas cutâneos, mas não reduziu o tamanho dos neurofibromas existentes com o crescimento estabilizado.

As pesquisas seguintes precisam testar a segurança do uso do medicamento em seres humanos e se eles funcionam de forma eficiente.

Estamos torcendo para que este futuro se realize com este ou com outros medicamentos.

Veja abaixo o que eles publicaram (tradução livre minha).

Dr Lor

 

Título

A administração tópica de binimetinibe (inibidor de MEK) previne o desenvolvimento de neurofibromas cutâneos em camundongos mutantes com neurofibromatose tipo 1

Autores

F Coulpier , L Oubrou, L Fertitta , J-M Gregoire, A Bocquet , A-M , P Wolkenstein , K J Radomska ,  P Topilko

Instituições científicas

Instituto Mondor de Pesquisa Biomédica, Departamento de Dermatologia, Centro de Referência em Neurofibromatoses, Hospital Henri-Mondor, Pierre Fabre Dermatology, França.

Endereço eletrônico: katarzyna.radomska@inserm.fr

Resumo

Os neurofibromas cutâneos (nfc) são uma característica das pessoas com a doença genética neurofibromatose tipo 1 (NF1). Esses tumores benignos da bainha nervosa, que podem chegar a milhares, desenvolvem-se a partir da puberdade, podem causar dor e são considerados pelos pacientes como a principal carga da doença.

A causa dos nfc são variantes patogênicas que surgem por acaso – ou são herdadas – no gene NF1, um gene coordena diversas atividades nas células por meio da proteína neurofibromina.

Quando a proteína está insuficiente, a célula fica com dificuldade para controlar o crescimento das células de Schwann, que são consideradas a origem dos neurofibromas. Os mecanismos que regem o desenvolvimento dos neurofibromas ainda são pouco compreendidos e faltam tratamentos eficazes.

Uma das dificuldades para encontrarmos uma medicação eficiente é a falta de modelos animais apropriados. Para resolver isso, projetamos um camundongo geneticamente modificado que desenvolve neurofibromas cutâneos.

Usando esse modelo, descobrimos que o desenvolvimento neurofibromas cutâneos passa por três estágios sucessivos: iniciação, progressão e estabilização.

Descobrimos também que o trauma cutâneo acelerou o desenvolvimento de neurofibromas nos camundongos.

Por fim, usamos estes camundongos modificados para explorar a eficácia do inibidor de MEK chamado binimetinibe na cura desses tumores.

Verificamos que, enquanto o binimetinibe administrado topicamente tem um efeito seletivo e menor sobre os neurofibromas maduros (estabilizados), a mesma droga impediu o seu desenvolvimento por longos períodos.

Declaração de conflito de interesses

Declaração de Interesse Concorrente Os autores declararam não haver conflito de interesses

 

 

Bom dia.

Considerando que atualmente estou protegido pela vacina contra COVID, decidi retomar as consultas presenciais no consultório particular.

Manterei o atendimento virtual gratuito (2ª, 3ª e 4ª) para a orientar as famílias que moram distantes de Belo Horizonte e que não podem vir até nosso CRNF por diversos motivos. Este agendamento por videoconferência continuará com a secretária da AMANF Giorgete Viana pelo telefone (e WhatsApp) 31 99074 3011.

O atendimento particular (nas quintas) será agendado pelo telefone (e WhatsApp) (31) 99722 1122.

Ligar na parte da tarde (ou enviar mensagem) de segunda a sexta para saber datas, horários, endereço do consultório e custos.

Atenciosamente,

Dr. Lor

5/6/2023

 

Tratamento da dor nas pessoas com NF

 Informações atualizadas pelos médicos Renato Viana e Luiz Oswaldo Carneiro Rodrigues para orientação do tratamento da dor em pessoas com Neurofibromatoses (NF).

Estas orientações estão apresentadas em duas partes:

  1. Pessoas com NF e suas famílias
  2. Proffissionais da saúde

Em ambas as partes, sempre que você clicar nas letras em vermelho você poderá obter mais informações sobre o assunto e/ou referências científicas.

 

Parte A – Para pessoas com NF e suas famílias

As pessoas com qualquer uma das doenças genéticas conhecidas anteriormente como neurofibromatoses (NF) podem sentir dor, às vezes por longos períodos (ver aqui os novos nomes para as NF a partir de 2022).

 

Mais da metade das pessoas com Neurofibromatose do tipo 1 (NF1) se queixa de algum tipo de dor.

Pessoas com Schwannomatose relacionada ao gene NF2 (SRNF2) (antes chamada de NF2) algumas vezes sentem dor.

Pessoas com Schwannomatoses relacionadas aos genes SMRCB1 e LZTR1 (antes chamadas apenas de Schwannomatose) apresentam dor como a principal complicação da doença.

Para tratarmos corretamente as dores destas pessoas, precisamos compreender o que é a dor e como nosso cérebro percebe o que é doloroso.

 

O que é a dor?

Segundo a última convenção internacional, a dor é uma experiência sensitiva e emocional desagradável associada, ou semelhante àquela associada, a uma lesão verdadeira ou potencial dos tecidos.

Ou seja, a dor é uma sensação ruim e carregada de emoção que é percebida por uma pessoa como se uma certa parte do seu corpo tenha sido, esteja sendo ou possa vir a ser machucada.

A dor é uma percepção individual, ou seja, somente quem a sente pode dizer sobre sua intensidade e como ela afeta a sua qualidade de vida. Ninguém é capaz de medir a dor e o sofrimento da outra pessoa, nem mesmo profissionais de saúde.

Para saber mais sobre este aspecto pessoal e intransferível da dor, veja o depoimento da associada da AMANF, engenheira e professora Ana de Oliveira Rodrigues em seu post: “Mas isso não dói” (clique no título).

Além de ser individual, a dor pode ser aguda, ou seja, de início recente, ou crônica, quando a sua duração ultrapassa mais de 3 meses.

A dor pode ter uma causa simples e evidente, por exemplo, um trauma, ou ter causas complexas e de difícil diagnóstico.

Quando a dor surge por causa da lesão de um órgão, de um tecido ou parte do corpo, ela é chamada de nociceptiva (essa palavra quer dizer percepção da lesão).

Quando a dor surge por causa de alterações no funcionamento do próprio sistema nervoso, ela é chamada de neuropática (a palavra quer dizer originada de um problema neurológico).

Às vezes, a dor pode ser mista, quer dizer, causada tanto por lesões nos tecidos quanto por mal funcionamento do sistema nervoso. Ver abaixo os tipos de dor definidas internacionalmente.

É preciso conhecer a dor para que possa ser tratada de forma eficiente. Por isso, é fundamental profissionais da saúde utilizarem um sistema de diagnóstico e avaliação da intensidade da dor, que possa expressar o sentimento da pessoa que sofre com ela.

Adiante mostraremos os questionários e métodos científicos que podem ser usados para esta finalidade.

Antes, vamos rever brevemente como nós percebemos a dor

 

 

A Figura 1 ilustra como a dor é percebida. Imagine que um alfinete furou a pele e atingiu o ramo de um nervo especializado em perceber a dor (neurônio do nível 1).

O sinal elétrico provocado pelo alfinete percorre a fibra nervosa (como se fosse um fio) até a medula, onde estimula outro neurônio sensitivo (neurônio do nível 2).

O neurônio da medula repassa novo sinal para outros neurônios (do nível 3), com cópias desse estímulo para outras estruturas do cérebro (neurônios do nível 4), onde a pessoa toma consciência da picada do alfinete e localiza exatamente onde ela aconteceu.

 

Em cada uma dessas etapas, do neurônio 1 ao neurônio 4, diversos fatores podem modificar a transmissão da dor até o cérebro e a mesma picada de alfinete pode ser percebida de formas diferentes, dependendo das condições em que estão as comunicações entre os diversos níveis.

Por exemplo, o estado emocional pode aumentar (na ansiedade, por exemplo) ou diminuir (na meditação, por exemplo) a percepção da dor.

Os medicamentos anestésicos e analgésicos funcionam interrompendo ou dificultando a passagem do estímulo desde a picada do alfinete até a consciência da pessoa e modulando os neurônios inibidores e excitadores.

Esta variação da percepção da dor acontece porque existem outros neurônios e substâncias que modulam (inibem ou excitam) os neurônios envolvidos em cada etapa da transmissão da dor da periferia até o cérebro.

Quem desejar mais detalhes destas etapas, ver outra Figura e sua explicação no final deste texto.

 

Quais os tipos de dor?

Existem  quatro tipos de dor:

  • Provocadas por uma lesão ou pelo risco de lesão em tecidos corporais, por exemplo, um corte inflamado ou infeccionado na pele.
  • Provocada por uma lesão ou disfunção do próprio sistema nervoso. (Esse tipo é a dor Neuropática, que nos interessa mais).
  • Provocada por alterações no processamento da dor no próprio cérebro, mas sem lesão verdadeira nos tecidos.
  • Provocada por combinações de lesões nos tecidos e alterações no sistema nervoso.

As pessoas com neurofibromatoses podem apresentar qualquer um dos tipos de dor e o seu tratamento é semelhante ao das pessoas sem NF. No entanto, considerando que muitas pessoas com NF apresentam dor crônica e dor neuropática, vamos nos aprofundar neste tipo de dor.

 

A dor neuropática é uma doença?

Sim, a dor neuropática é considerada uma doença em si. A dor neuropática é causada por lesões ou alterações na função dos próprios nervos e do sistema nervoso central.

A dor neuropática pode ser percebida como dor, queimação, picada, choque, beliscão, calor e frio em ondas que vêm e vão, às vezes relacionadas com fatores ambientais, emocionais e físicos.

Outras vezes, a dor neuropática pode surgir sem qualquer estímulo evidente ou até mesmo num membro que já foi amputado, como a chamada dor fantasma.

 

O primeiro passo para tratar, é quantificar a dor

Geralmente utilizamos uma escala visual, uma régua marcada de 1 a dez, sendo 0 nenhuma dor e 10 a maior dor que a pessoa já sentiu. Pedimos para a pessoa apontar na escala qual a intensidade da dor que ela está sentindo ou sentiu.

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

 

A nota deve ser registrada em cada reavaliação.

 

O segundo passo é definir se a dor é do tipo neuropática.

Um questionário bastante simples pode ser usado, basta responder sim ou não.

Cada resposta positiva representa 1 ponto. Some os pontos.

Sensação de dor:

  • Em queimação
  • Frio doloroso
  • Como choque elétrico

Sintomas na mesma área da dor:

  • Adormecimento
  • Formigamento
  • Alfinetadas
  • Coceira

Exame físico:

  • Menor sensibilidade ao toque?
  • Menor sensibilidade à ponta de agulha?
  • Dor provocada ou aumentada pelo atrito?

Resultado da soma: maior do que 3 pontos sugere dor neuropática

 

O terceiro passo é procurar uma causa para a dor neuropática.

Exemplos de causas da dor neuropática:

  • Lesão crônica envolvendo o nervo (inflamação, compressão, corte e cicatrização) produz substâncias inflamatórias que estimulam as terminações nervosas e fazem com que elas enviem estímulos exagerados ao cérebro. Por isso, os antinflamatórios, o gelo e alguns analgésicos atuam neste ponto, reduzindo o processo inflamatório e aliviando a dor.
  • Compressão mecânica, por exemplo, um neurofibroma comprimindo o nervo, causando irritação ou mesmo amputando o nervo. Por isso, a remoção cirúrgica de neurofibromas compressivos pode aliviar algumas formas de dor neuropática.
  • Destruição ou o corte do nervo podem causar cicatrização anormal, que produz uma espécie de tumor na ponta do nervo cortado, que chamamos de neuroma. Esse enovelado irregular e disfuncional de fibras nervosas pode produzir estímulos excessivos, que são percebidos como dor fantasma, como acontece nas amputações.
  • Dor não tratada por muito tempo pode alterar a expressão genética de proteínas que controlam a dor (como a neurofibromina, inclusive) aumentando a sensibilidade dolorosa da pessoa. Por isso, sinais de compressão nervosa devem ser tratados com rapidez. Uma dor não tratada hoje pode ser uma dor aumentada amanhã.
  • Problemas na medula espinhal podem alterar a sensibilidade dolorosa. A noradrenalina é importante nesse processo e por isso observamos aumento da sensibilidade dolorosa durante situações de estresse.
  • Modificações no sistema nervoso central podem aumentar a sensibilidade dolorosa.
  • Fatores emocionais e pelo estado de humor afetam a sensibilidade à dor.
  • Experiência, história de vida e cultura afetam a percepção da dor. A memória, o conhecimento e o aprendizado da dor participam da regulação de como percebemos a dor e o medo que ela nos causa. Também sabemos que a depressão e a ansiedade podem aumentar a sensação de dor. Por isso, antidepressivos e ansiolíticos podem ajudar a controlar a dor, inclusive nas neurofibromatoses.
  • As características genéticas afetam a percepção da dor. Boa parte (40%) da sensibilidade à dor pode ser atribuída a fatores genéticos. Neste sentido, parece que as pessoas com NF1 têm a sensibilidade dolorosa aumentada de um modo geral.
  • Outras causas – é possível haver outros mecanismos de dor nas neurofibromatoses que desconhecemos por enquanto.

 

Em resumo, dores de diferentes intensidades e causas podem estar agindo ao mesmo tempo numa pessoa com neurofibromatose e por isso o tratamento da dor crônica e da dor neuropática geralmente é complexo e multidisciplinar.

 

Tratamentos para dor crônica (ESPECIALMENTE NEUROPÁTICA)

 

O primeiro passo para o tratamento adequado é diagnosticar e quantificar a dor e medir seu impacto na qualidade de vida, por meio de questionários estruturados e escalas para medir a dor e a realização de exame físico clínico por profissional experiente. Exames complementares podem ser necessários.

Está claro que o tratamento ideal será tentar remover a causa da dor.

Enquanto a causa está sendo removida (ou quando não é possível sua remoção) devemos usar outros procedimentos.

Em nosso Centro de Referência em NF do HC UFMG costumávamos recomendar a chamada escada analgésica, baseada em orientação da Organização Mundial da Saúde, que foi reavaliada em 2010.

A partir de agora, nossos profissionais da saúde utilizarão uma adaptação dos procedimentos indicados pela extensa revisão realizada por Bates e colaboradores, 2019.

Depois de diagnosticada e quantificada a dor, podem ser utilizados os passos apresentados adiante.

É muito importante saber que o tratamento da dor neuropática é quase sempre MULTIDISCIPLINAR, envolvendo profissionais da saúde que orientem para a reabilitação física, apoio psicológico, higiene do sono, exercícios físicos regulares e outras ações complementares.

Em conclusão, diante da dor, especialmente dor crônica, é fundamental procurar profissionais da saúde para a orientação adequada.

 

 

Parte B – Para profissionais da saúde

 

Lembre-se que ao clicar nas letras em vermelho você poderá obter mais informações sobre o assunto e/ou referências científicas.

As pessoas com qualquer uma das doenças três genéticas conhecidas anteriormente como neurofibromatoses (NF) podem sentir dor, às vezes por longos períodos (ver aqui os novos nomes para as NF a partir de 2022).

Mais da metade das pessoas com Neurofibromatose do tipo 1 (NF1) se queixa de algum tipo de dor.

Pessoas com Schwannomatose relacionada ao gene NF2 (SRNF2) (antes chamada de NF2) algumas vezes sentem dor.

Pessoas com Schwannomatoses relacionadas aos genes SMRCB1 e LZTR1 (antes chamadas apenas de Schwannomatose) apresentam dor como a principal complicação da doença.

Para tratarmos corretamente as dores destas pessoas, precisamos compreender o que é a dor e como nosso cérebro percebe o que é doloroso.

 

O que é a dor?

Segundo a última convenção internacional, a dor é uma experiência sensitiva e emocional desagradável associada, ou semelhante àquela associada, a uma lesão verdadeira ou potencial dos tecidos.

Ou seja, a dor é uma sensação ruim e carregada de emoção que é percebida por uma pessoa como se uma certa parte do seu corpo tenha sido, esteja sendo ou possa vir a ser machucada.

A dor é uma percepção individual, ou seja, somente quem a sente pode dizer sobre sua intensidade e como ela afeta a sua qualidade de vida. Ninguém é capaz de medir a dor e o sofrimento da outra pessoa, nem mesmo profissionais de saúde.

Para saber mais sobre este aspecto pessoal e intransferível da dor, veja o depoimento da associada da AMANF, engenheira e professora Ana de Oliveira Rodrigues em seu post: “Mas isso não dói” (clique no título).

Além de ser individual, a dor pode ser aguda, ou seja, de início recente, ou crônica, quando a sua duração ultrapassa mais de 3 meses.

A dor pode ter uma causa simples e evidente, por exemplo, um trauma, ou ter causas complexas e de difícil diagnóstico.

Quando a dor surge por causa da lesão de um órgão, de um tecido ou parte do corpo, ela é chamada de nociceptiva (essa palavra quer dizer percepção da lesão).

Quando a dor surge por causa de alterações no funcionamento do próprio sistema nervoso, ela é chamada de neuropática (a palavra quer dizer originada de um problema neurológico).

Às vezes, a dor pode ser mista, quer dizer, causada tanto por lesões nos tecidos quanto por mal funcionamento do sistema nervoso. Ver abaixo os tipos de dor definidas internacionalmente.

É preciso conhecer a dor para que possa ser tratada de forma eficiente. Por isso, é fundamental profissionais da saúde utilizarem um sistema de diagnóstico e avaliação da intensidade da dor, que possa expressar o sentimento da pessoa que sofre com ela.

Adiante mostraremos os questionários e métodos científicos que podem ser usados para esta finalidade.

 

Breve revisão de como nós percebemos a dor

 

 

Na Figura 2 estão representados diversos fatores que influenciam a transmissão da dor, os pontos X, Y, Z, M, B e G que nos ajudarão a compreender os diferentes tipos de dor.

Começando de baixo para cima, no (ponto X na Figura 2) temos, por exemplo, uma lesão em torno do nervo (inflamação, compressão, corte e cicatrização) que produz substâncias inflamatórias que estimulam as terminações nervosas e fazem com que elas enviem estímulos exagerados ao cérebro.  Por isso, os antinflamatórios, o gelo e alguns analgésicos atuam neste ponto, reduzindo o processo inflamatório e aliviando a dor.

 Outras vezes a lesão é causada pela compressão mecânica, por exemplo, um neurofibroma comprimindo o nervo (ponto Y na Figura 2), causando irritação ou mesmo amputando o nervo, o que é percebido como estímulo doloroso. Por isso, a remoção cirúrgica de neurofibromas compressivos pode aliviar algumas formas de dor neuropática.

Outras vezes, a destruição ou o corte do nervo (no ponto Y) podem causar cicatrização anormal, que produz uma espécie de tumor na ponta do nervo cortado, que chamamos de neuroma. Esse enovelado irregular e disfuncional de fibras nervosas pode produzir estímulos excessivos, que são percebidos como dor fantasma, como acontece nas amputações.

No ponto Z da Figura 2, a persistência da dor não tratada pode alterar a expressão genética de proteínas que controlam a dor (como a neurofibromina, inclusive), produzindo mais receptores de glutamato e NMDA, por exemplo, e aumentando a sensibilidade dolorosa da pessoa.

Por isso, sinais de compressão nervosa devem ser tratados com rapidez. Ou seja, um pequeno estímulo que não provocaria dor, pode se transformar em dor forte por causa da sensibilidade aumentada, causada pela dor crônica não tratada. Por isso, não devemos deixar sem tratamento uma pessoa com dor. Uma dor não tratada hoje pode ser uma dor aumentada amanhã.

No ponto M da Figura 2 estão as conexões na medula espinhal entre os nervos que trazem o estímulo doloroso da periferia do corpo e os nervos que conduzem estes estímulos até os centros superiores no cérebro.

Na dor neuropática, neste ponto M pode haver menor inibição da sensibilidade dolorosa, ou seja, o filtro realizado pelos neurônios na medula estariam menos ativos, permitindo a passagem da dor com mais facilidade para os centros superiores, ou seja, sinalizando uma dor amplificada. A noradrenalina é uma das substâncias moduladoras e por isso observamos aumento da sensibilidade dolorosa durante situações de estresse.

Alguns analgésicos e a cortisona também podem agir nesse ponto M, reduzindo a dor, como, por exemplo, nos chamados bloqueios com cortisona injetada ao redor da medula.

No ponto B da Figura 2, novos filtros (modulações) dos estímulos podem ocorrer, aumentando ou diminuindo a sensibilidade dolorosa. Neste ponto, algumas drogas chamadas neurolépticas e os anticonvulsivantes podem ajudar a reduzir a passagem dos estímulos dolorosos, diminuindo a dor que chega à consciência.

No ponto T da Figura 2 a dor também é aumentada ou diminuída por fatores emocionais e pelo estado de humor. Por exemplo, uma mesma lesão física pode parecer muito mais dolorosa à noite, quando nosso estado de humor aumenta as percepções da fadiga, do cansaço e dos perigos, porque somos seres diurnos, selecionados para viver durante o dia e repousar à noite.

No cérebro existem diversas regiões onde armazenamos informações sobre tudo aquilo que acontece conosco. Então, a memória, o conhecimento e o aprendizado da dor participam da regulação de como percebemos a dor e o medo que ela nos causa.

A dor crônica pode modificar estas estruturas por meio da plasticidade cerebral. Por isso, a psicoterapia, o acompanhamento psicológico, técnicas de meditação e controle cognitivo podem auxiliar o controle da dor neuropática nas neurofibromatoses.

Também sabemos que a depressão e a ansiedade podem aumentar a sensação de dor. Por isso, antidepressivos e ansiolíticos podem ajudar a controlar a dor, inclusive nas neurofibromatoses.

Para completar, o ponto G na Figura 2 indica a expressão genética – em todo o sistema nervoso – da herança maior ou menor sensibilidade para a dor. Parte (40%) da suscetibilidade à dor pode ser atribuída a fatores genéticos. Neste sentido, parece que a ausência da neurofibromina nas pessoas com NF1 aumenta a sensibilidade dolorosa de um modo geral.

É preciso lembrar que pode haver outros mecanismos de dor nas neurofibromatoses que desconhecemos por enquanto. Por exemplo, na NF1 não sabemos exatamente por que os neurofibromas cutâneos raramente são dolorosos, enquanto plexiformes e nodulares muitas vezes o são. Além disso, os schwannomas raramente são dolorosos na NF2, mas são muito dolorosos na Schwannomatose. E todos estes tumores se originam da mesma célula de Schwann, na bainha dos nervos periféricos!

Finalmente, sabemos que vários dos mecanismos neste esquema da Figura 2 podem estar atuando ao mesmo tempo numa pessoa com neurofibromatose e por isso o tratamento da dor neuropática geralmente é complexo e multidisciplinar.

 

Quais os tipos de dor?

Existem  quatro tipos de dor:

  • Provocadas por uma lesão ou pelo risco de lesão em tecidos corporais, por exemplo, um corte inflamado ou infeccionado na pele. Esse tipo de dor é chamado por profissionais da saúde de dor Nociceptiva.
  • Provocada por uma lesão ou disfunção do próprio sistema nervoso, por exemplo, a alteração dos nervos nos pés das pessoas com diabetes. Esse tipo de dor é a dor Neuropática.
  • Provocada por alterações no processamento da dor no próprio cérebro, mas sem lesão verdadeira nos tecidos onde a dor é sentida, por exemplo, na fibromialgia. Esse tipo de dor é a dor Nociplástica.
  • Provocada por combinações de lesões nos tecidos e alterações no sistema nervoso. É chamada de dor Mista.

Profissionais da saúde também usam alguns outros termos técnicos para falarem da dor. Por exemplo, quando a sensibilidade está exagerada aos estímulos dolorosos, chamamos de hiperalgesia. Quando um estímulo não doloroso, o toque das mãos, por exemplo, é percebido como dor, chamamos de alodinia. Quando a dor é percebida em região diferente do local onde está ocorrendo a lesão, por exemplo, a dor do infarto agudo do miocárdio sendo percebida no braço, chamamos de dor referida.

As pessoas com neurofibromatoses podem apresentar qualquer um dos tipos de dor acima descritos e o seu tratamento é semelhante ao das pessoas sem NF. No entanto, considerando que muitas pessoas com NF apresentam dor crônica e dor neuropática, vamos nos aprofundar neste tipo de dor.

 

A dor neuropática é uma doença?

Sim, a dor neuropática é considerada uma doença em si. A dor neuropática é causada por lesões ou alterações na função dos próprios nervos e do sistema nervoso central.

A dor neuropática pode ser percebida como dor, queimação, picada, choque, beliscão, calor e frio em ondas que vêm e vão, às vezes relacionadas com fatores ambientais, emocionais e físicos.

Outras vezes, a dor neuropática pode surgir sem qualquer estímulo evidente ou até mesmo num membro que já foi amputado, como a chamada dor fantasma.

 

O primeiro passo para tratar, é quantificar a dor

Geralmente utilizamos uma escala visual, uma régua marcada de 1 a dez, sendo 0 nenhuma dor e 10 a maior dor que a pessoa já sentiu. Pedimos para a pessoa apontar na escala qual a intensidade da dor que ela está sentindo ou sentiu.

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

 

A nota deve ser registrada em cada reavaliação.

 

O segundo passo é definir se a dor é do tipo neuropática.

Um questionário bastante simples (chamado de DN4 – Douleur Neuropathique Quatre) pode ser utilizado (abaixo) e ele possui sensibilidade razoável (72%) e alta especificidade (97%).

Pode ser necessário esclarecer com cuidado os sintomas para as pessoas com a dor.

Basta responder sim ou não.

Cada resposta positiva representa 1 ponto. Some os pontos.

Sensação de dor:

  • Em queimação
  • Frio doloroso
  • Como choque elétrico

Sintomas na mesma área da dor:

  • Adormecimento
  • Formigamento
  • Alfinetadas
  • Coceira

Exame físico:

  • Menor sensibilidade ao toque?
  • Menor sensibilidade à ponta de agulha?
  • Dor provocada ou aumentada pelo atrito?

Resultado da soma: maior do que 3 pontos sugere dor neuropática

 

O terceiro passo é procurar uma causa para a dor neuropática.

Exemplos de causas da dor neuropática:

  • Lesão crônica envolvendo o nervo (inflamação, compressão, corte e cicatrização) produz substâncias inflamatórias que estimulam as terminações nervosas e fazem com que elas enviem estímulos exagerados ao cérebro. Por isso, os antinflamatórios, o gelo e alguns analgésicos atuam neste ponto, reduzindo o processo inflamatório e aliviando a dor.
  • Compressão mecânica, por exemplo, um neurofibroma comprimindo o nervo, causando irritação ou mesmo amputando o nervo. Por isso, a remoção cirúrgica de neurofibromas compressivos pode aliviar algumas formas de dor neuropática.
  • Destruição ou o corte do nervo podem causar cicatrização anormal, que produz uma espécie de tumor na ponta do nervo cortado, que chamamos de neuroma. Esse enovelado irregular e disfuncional de fibras nervosas pode produzir estímulos excessivos, que são percebidos como dor fantasma, como acontece nas amputações.
  • Dor não tratada por muito tempo pode alterar a expressão genética de proteínas que controlam a dor (como a neurofibromina, inclusive) aumentando a sensibilidade dolorosa da pessoa. Por isso, sinais de compressão nervosa devem ser tratados com rapidez. Uma dor não tratada hoje pode ser uma dor aumentada amanhã.
  • Problemas na medula espinhal podem alterar a sensibilidade dolorosa. A noradrenalina é importante nesse processo e por isso observamos aumento da sensibilidade dolorosa durante situações de estresse. Alguns analgésicos e a cortisona também podem ser úteis, reduzindo a dor, como, por exemplo, nos chamados bloqueios com cortisona injetada ao redor da medula.
  • Modificações no sistema nervoso central podem aumentar a sensibilidade dolorosa, por isso algumas drogas chamadas neurolépticas e os anticonvulsivantes podem ajudar a reduzir a passagem dos estímulos dolorosos, diminuindo a dor que chega à consciência.
  • Fatores emocionais e pelo estado de humor afetam a sensibilidade à dor. Por exemplo, uma mesma lesão pode parecer muito mais dolorosa à noite, quando nosso estado de humor aumenta as percepções da fadiga, do cansaço e dos perigos, porque somos seres diurnos, selecionados para viver durante o dia e repousar à noite.
  • Experiência, história de vida e cultura afetam a percepção da dor. A memória, o conhecimento e o aprendizado da dor participam da regulação de como percebemos a dor e o medo que ela nos causa.

A dor crônica pode modificar estas estruturas por meio da plasticidade cerebral.

Por isso, a psicoterapia, o acompanhamento psicológico, técnicas de meditação e controle cognitivo podem auxiliar o controle da dor neuropática nas neurofibromatoses.

Também sabemos que a depressão e a ansiedade podem aumentar a sensação de dor. Por isso, antidepressivos e ansiolíticos podem ajudar a controlar a dor, inclusive nas neurofibromatoses.

  • As características genéticas afetam a percepção da dor. Boa parte (40%) da sensibilidade à dor pode ser atribuída a fatores genéticos. Neste sentido, parece que a ausência da neurofibromina nas pessoas com NF1 aumenta a sensibilidade dolorosa de um modo geral.
  • Outras causas – é possível haver outros mecanismos de dor nas neurofibromatoses que desconhecemos por enquanto. Por exemplo, na NF1 não sabemos exatamente por que os neurofibromas cutâneos raramente são dolorosos, enquanto plexiformes e nodulares muitas vezes o são. Além disso, os schwannomas raramente são dolorosos na NF2, mas são muito dolorosos na Schwannomatose. E todos estes tumores se originam da mesma célula de Schwann, na bainha dos nervos periféricos!

 

Em resumo, dores de diferentes intensidades e causas podem estar agindo ao mesmo tempo numa pessoa com neurofibromatose e por isso o tratamento da dor crônica e da dor neuropática geralmente é complexo e multidisciplinar.

 

Tratamentos para dor crônica (ESPECIALMENTE NEUROPÁTICA)

 

Está claro que o primeiro tratamento sempre será tentar remover a causa da dor.

Enquanto a causa está sendo removida (ou quando não é possível sua remoção) devemos usar outros procedimentos.

Costumávamos recomendar nesta página a chamada escada analgésica, baseada em orientação da Organização Mundial da Saúde, que foi reavaliada em 2010.

A partir de agora, utilizaremos uma adaptação dos procedimentos indicados pela extensa revisão realizada por Bates e colaboradores, 2019.

O primeiro passo para o tratamento adequado é diagnosticar e quantificar a dor e medir seu impacto na qualidade de vida, por meio de questionários estruturados e escalas para medir a dor e a realização de exame físico clínico por profissional experiente. Exames complementares podem ser necessários.

Depois de diagnosticada e quantificada a dor, podem ser utilizados os passos apresentados adiante.

É muito importante saber que o tratamento da dor neuropática é quase sempre MULTIDISCIPLINAR, envolvendo profissionais da saúde que orientem para a reabilitação física, apoio psicológico, higiene do sono, exercícios físicos regulares e outras ações complementares.

Legenda:

Antidepressivos tricíclicos (exemplos: Amitriptilina e Nortriptilina)

IRSN: inibidores da recaptação da serotonina e noradrenalina (exemplos: Duloxetina e Venlafaxina)

GABA: gabapentinoides (exemplos Pregabalina e Gabapentina)

Tópicos (exemplos: Lidocaína e Capsaicina)

Reservados aos especialistas no tratamento da dor

ISRS: inibidores seletivos da recaptação da serotonina (por exemplo, Citalopram, Escitalopram. Fluoxetina, Fluvoxamina, Paroxetina, Sertralina)

Anticonvulsivantes (por exemplo: Lamotrigina, Carbamazepina, Topiramato, Valproato)

ARNMDA: antagonistas dos receptores NMDA (por exemplo,  Cetamina (ou ketamina), Tramadol e Metadona )

Intervenções, incluindo neuromodulação, opioides e drogas de liberação direta.

 

Observações

AntinflamatóriosNão há evidência científica de uso de antinflamatórios (não esteroides) na dor neuropática.

Canabidiol – O uso de medicamentos derivados da cannabis tem sido recomendado algumas vezes em nosso CRNF para a dor crônica, mas alguns estudos recentes (ver aqui e aqui) indicam que precisamos de mais pesquisas científicas bem controladas para afirmarmos que estes medicamentos são eficientes.

Tratamentos adjuvantes

Outros tratamentos são oferecidos, inclusive em clínicas de dor, e podem ajudar no controle da dor neuropática e da dor fantasma.

Veja abaixo alguns tratamentos propostos e sua eficiência no tratamento da dor crônica (clique nos textos em azul para abrir as referências científicas).

Atividades físicas – quando realizadas de modo regular e em intensidade adequada possuem efeito benéfico moderado, embora ainda seja baixa a qualidade das evidências científicas.

Meditação – baixa evidência sobre a dor diretamente, mas podem melhorar a depressão e a qualidade de vida.

Estimulação elétrica transcutânea (TENS) – possui evidência moderada para efeitos locais.

Terapia com espelho e realidade virtual – sem evidências científicas.

Biofeedback  – efetivo para determinadas condições dolorosas.

Eletroconvulsoterapia – baixa qualidade das evidências científicas.

Acupuntura  – parece ter um efeito placebo, ou seja, a pessoa ficaria sugestionada a sentir menos dor.

Massagem – apesar de muita expectativa sobre seus efeitos, ainda não temos evidências científicas de que as massagens afetem a dor neuropática.

Estimulação cerebral profunda – poucos estudos

Estimulação da medula espinhal – estudos insuficientes

 

Tratamentos cirúrgicos específicos para a dor crônica

Há dor crônica que pode ser curada com a cirurgia, por exemplo, por exemplo, o tumor glomus. Há maior frequência de tumor glomus em pessoas com Neurofibromatose do tipo 1 , que é um tumor geralmente benigno que surge nos corpos glomus, e pode ser removido na maioria das vezes por cirurgia (ou ser usada a ketamina quando a cirurgia é impossível).

Nas demais formas de dor crônica, sempre que a cirurgia puder remover a causa da dor, ela será prioritária. Outras vezes, técnicas cirúrgicas podem, ser usadas quando medicamentos e terapias adjuvantes falharam.

Mais informações sobre os tratamentos para a dor crônica podem ser obtidas com profissionais da saúde especialistas no tratamento da dor crônica.

 

 

Belo Horizonte, 4 de abril de 2023

 

 

 

 

 

 

Uma pessoa com neurofibromatose do tipo 2 (NF2), que foi atendida por nós no CRNF, enviou-nos um estudo científico publicado recentemente (clique aqui para ver o artigo em inglês) (2021), que sugere que o medicamento Losartana (usado habitualmente no tratamento da hipertensão arterial) poderia reduzir a perda de audição causada pelos tumores (schwannomas vestibulares) que surgem na NF2.

Em resumo, as informações do artigo foram:

  • os schwannomas apresentam fibrose no interior do tumor e esta fibrose está relacionada com a baixa da audição;
  • a fibrose reduziria a circulação do sangue, que poderia ser a causa da redução da audição;
  • a losartana poderia reduzir a fibrose, melhorando a audição;
  • usando camundongos com a NF2, observaram que a losartana, de fato, reduziu a fibrose e preveniu a perda auditiva;
  • relataram também um estudo retrospectivo no qual pessoas com schwannomas vestibulares usando losartana (para tratar sua pressão alta) mostraram melhor função auditiva do que os demais sem losartana;
  • então concluíram que o estudo fornece a justificativa e os dados críticos para um ensaio clínico prospectivo de losartan em pacientes com schwannomas vestibulares.

Diante disso, pedimos à Dra. Luíza de Oliveira Rodrigues, médica clínica e especialista em avaliação de novas tecnologias em saúde, que analisasse o estudo científico. Agradecemos a pronta resposta da Dra. Luíza e a publicamos abaixo.

“A pesquisa realizada por Wu e colaboradores é um estudo pré-clínico, com modelo animal, portanto, do ponto de vista da análise crítica em Medicina Baseada em Evidências é uma evidência científica de muito baixa qualidade, no que diz respeito à sua utilidade na tomada de decisão na clínica para seres humanos.

Do ponto de vista metodológico, parece um estudo bem-feito. A plausibilidade biológica, ou seja, a justificativa do estudo pareceu sólida, mas, por não ser exatamente a minha área, posso estar enganada. Os animais foram randomizados (cerca de 8 animais em cada grupo), es examinadores eram cegues quanto à intervenção, os experimentos foram repetidos 3 vezes. Então, parece um bom estudo pré-clínico.

No entanto, não ficou claro qual a dose da losartana seria equivalente para produzir o mesmo efeito em seres humanes e se o seu uso seria sistêmico.

Do ponto de vista de aplicação dos resultados a seres humanes temos as seguintes dúvidas:

  • Qual a dose necessária em humanos para produzir o mesmo efeito?
  • Em pacientes não hipertensos, os efeitos colaterais seriam toleráveis? Qual seria a duração do efeito em humanos, se houver?
  • Seria usada somente como prevenção ou também para retardar perdas já instaladas?
  • A losartana é um medicamento de baixo custo, mas os autores do estudo insinuam que possa ser usada com outro medicamento, o bevacizumabe (anticorpo monoclonal) de alto custo, e que não teve efeito bom no tratamento dos tumores vestibulares na NF2.
  • Como o bevacizumabe causa hipertensão, poderia ser um pretexto para tentar recuperar o uso do bevacizumabe junto com a losartana (é sugerido no estudo que losartana possa ter efeito sinérgico tanto com o bevacizumabe quanto com a radioterapia).
  • No entanto, é bom lembrar que os consensos internacionais não indicam radioterapia nas pessoas com NF2!

Em conclusão, como recomendação possível, diante desse estudo, sugiro que:

  • A losartana seja indicada para pacientes com NF2 que TAMBÉM precisam de anti-hipertensivos por qualquer outra causa – não vejo impedimentos de que a primeira linha de tratamento desses pacientes seja a losartana.
  • Para outros pacientes com NF2, mas sem indicação primária para a losartana, é muito cedo pra indicarmos a losartana para tratar ou prevenir perda auditiva relacionada aos schwannomas vestibulares.

Belo Horizonte, 10 de março de 2023

Dra. Luíza de Oliveira Rodrigues

 

Observação: 

O Dr. Jorge Sette, cardiologista, também leu o artigo acima e acrescentou que, na sua impressão, observando o seu uso em certas doenças cardíacas, a Losartana não seria tão eficiente para reduzir a fibrose em seres humanos quanto aparentou ser nos camundongos utilizados na pesquisa.

 

 

Minha filha AC, de 9 anos, já atendida no CRNF, tem neurofibromatose do tipo 1 (NF1) e transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH). Por causa da irritabilidade acentuada e agressividade um neurologista sugeriu risperidona. Ela não apresenta dificuldade em aprender, já sabe ler desde os 6 anos, mas não quer estudar, porque acha tedioso e só quer brincar. Quando tem foco em algo que gosta é impressionante a rapidez com que aprende. Pode me orientar? M.I, de João Pessoa.

Cara M.I., obrigado pelo seu relato, que abriu uma oportunidade para falarmos sobre algo muito importante: a autonomia das crianças.

Antes, quero lembrar que muitas crianças com NF1 apresentam TDAH e alguma agressividade. A AMANF acaba de publicar uma cartilha com orientações para mães, pais, educadoras e educadores de crianças com NF1 e problemas de comportamento. Clique aqui para obter a cartilha.

Antes de qualquer medicação, acho que todas as pessoas cuidadoras de sua filha devem tentar seguir a nossa cartilha por algumas semanas ou meses.

Se, ao final, a cartilha não for suficiente para melhorar a qualidade de vida de vocês, então os medicamentos podem ser pensados.

Quando há hiperatividade, o medicamento metilfenidato pode ser uma opção ( prescrita pela neurologia) a ser experimentada com a finalidade de diminuir a impulsividade – ações realizadas de forma impensada e às vezes contra a vontade consciente da pessoa. A impulsividade gera ansiedade que contribui para a irritabilidade e, como consequência, para aumentar a agressividade.

Quando não há hiperatividade, mas apenas desatenção, ainda não estou convencido de que o metilfenidato seja eficiente nas crianças com NF1.

Se houver hiperatividade e mesmo com o uso do metilfenidato ainda persistir a agressividade, pode ser experimentada a risperidona sob a orientação da psiquiatria psiquiatra infantil ou neurologia infantil.

 

Mas vamos pensar numa coisa importante, que você falou: sua filha aprende rapidamente quando quer.

 Acho que ela tem razão.

 Acho que todos nós aprendemos de fato somente aquilo que nos interessa.

E talvez qualquer pessoa fique irritada e agressiva se for obrigada a fazer coisas que não deseja, não é?

Há cerca de 50 anos, fiquei impressionado por um experimento educacional famoso na Inglaterra, chamado Summerhill, que deu origem às escolas democráticas, no qual as crianças podiam escolher quando brincar ou estudar. Mesmo as crianças com problemas comportamentais (a maioria naquele colégio especial) acabavam aprendendo aquilo que precisavam para seguirem suas vidas com autonomia quando adultas.

Clique aqui para conhecer mais sobre as escolas democráticas inspiradas em Summerhill.

Talvez a escola convencional atual seja mesmo muito entediante para crianças com hiperatividade.

Talvez possamos ajudar as crianças a se encontrarem e a realizarem seus desejos e sua formação humana por meio de brincadeiras criativas.

Brincar é o jeito mais alegre e eficiente de aprender sobre tudo: sobre o mundo, sobre as pessoas e sobre os afetos. Sobre como viver.

 

Eu, no lugar da sua filha, gostaria de estar numa escola onde brincar fosse levado muito a sério.

Vamos ouvir o que sua filha quer fazer?

Dr. Lor

 

 

 

Recebemos uma cópia do capítulo escrito pelo Dr. James H. Tonsgard e pelo médico brasileiro Dr. Nikolas Mata-Machado, radicado há muitos anos nos Estados Unidos, intitulado “Crianças com síndromes neurocutâneas” (entre elas as neurofibromatoses), como parte de um novo livro de pediatria lançado agora (2023) chamado “Neurologia Pediátrica Baseada em Sintomas”.

Foi com grande satisfação que li o capítulo e constatei que nossas orientações médicas científicas na página da AMANF estão de acordo com a revisão realizada pelo Dr. James e pelo nosso amigo e brilhante neurologista pediátrico Nikolas Mata-Machado.

Duas observações feitas pelos autores chamaram minha atenção, para dois aspectos clínicos que precisamos enfatizar mais em nossos atendimentos: a possibilidade de alterações cardiopulmonares na Síndrome de Legius e a necessidade de investigarmos doença vascular cerebral nas crianças com NF1 e displasia de artéria renal.

Agradeço a gentileza do Dr. Nikolas e parabenizo os autores e desejo que o livro seja lido por colegas de todo o mundo para que as neurofibromatoses continuem recebendo cada vez mais atenção médica e científica.

Dr Lor

 

Temos a alegria de informar que a versão impressa da nova cartilha sobre dificuldades cognitivas nas pessoas com neurofibromatose do tipo 1 (NF1) está pronta e ficou muito prática.

É uma versão da cartilha canadense que foi adaptada às condições da população brasileira.

Esta cartilha é um guia que pode ser usado pelas próprias pessoas com NF1, pela família, professoras e professores, por cuidadoras e cuidadores e demais pessoas que participam do atendimento a pessoas com NF1 (assistência social, fonoaudiologia, psicologia, enfermagem, fisioterapia, terapia ocupacional e medicina).

A Diretoria da AMANF dá os parabéns à equipe liderada pela associada e psicóloga Letícia Lindner, na tradução e adaptação da cartilha canadense (Ana Rodrigues que traduziu a versão canadense, Daiane Lindner que fez o projeto gráfico e Adriana Venuto e Luiz Oswaldo Rodrigues que colaboraram no conteúdo).

A cartilha impressa será distribuída nas consultas presenciais ou online, realizadas pela equipe médica no Centro de Referência em NF (Dra. Juliana Souza, Dr. Bruno Cota, Dr. Nilton Rezende e Dr. LOR) sempre que for indicada.

Uma versão online da nova cartilha adaptada para a população brasileira pode ser baixada livremente e basta clicar aqui.

A versão anterior – traduzida da cartilha canadense – continua disponível, basta clicar aqui.

Quem desejar receber pelo correio um exemplar impresso da nova cartilha adaptada, basta realizar uma doação para a AMANF de, pelo menos, 15 reais (para cobrir a taxa do correio). Doações mais generosas do que este valor também são muito bem vindas de quem quiser e puder fazê-las.

Mande seu endereço para nossa secretária Josiane Rezende – com o comprovante de depósito da sua doação – para o e-mail: josinery1@gmail.com

Em uma ou duas semanas deverá receber seu exemplar.

 

Se você deseja fazer uma contribuição ou doação, a conta da AMANF é:

BANCO CREDICON
Nome: AMANF ASSOCIAÇÃO MINEIRA DE APOIO AOS PORTADORES D
Banco:756
Agência: 4027
Conta Corrente: 20261001 dígito 2 
CNPJ: 05.629.505/0001-33

PIX +55 (31) 99971-0622

 

Feliz 2023!!!

Dr Lor