Este espaço é destinado a opinião de pessoas com experiência em diversos assuntos relacionados com as neurofibromatoses.

Opinião pessoal

Durante a consulta de uma criança com neurofibromatose do tipo 1 (NF1), sua família perguntou se ela devia usar um medicamento divulgado nas redes sociais e então respondi que há algumas dúvidas sobre a eficiência daquele medicamento, lançado no comércio por um certo laboratório farmacêutico.

Momentos depois, quando sugeri o uso da vacina contra a COVID, a família manifestou sua desconfiança na eficácia da vacina, porque, segundo souberam, fora “inventada muito rapidamente” e, no entanto, foi produzida pelo mesmo laboratório.

Percebi, então, nossa contradição: como podemos confiar (ou desconfiar) das vacinas, mas confiar (ou desconfiar) no tal medicamento, sendo que a vacina e o medicamento são produzidos pelo mesmo laboratório?

Tento compreender.

Por um lado, para confiar nas vacinas, aprendi na faculdade e ao longo de minha prática profissional que as vacinas trazem consigo um histórico de salvar milhões de vidas com baixíssimos riscos. Elas são uma das grandes construções científicas que acompanho desde minha infância, quando ainda havia vítimas em cadeiras de rodas que não foram vacinadas contra a poliomielite entre meus colegas de geração.

Além disso, as vacinas são recomendadas por autoridades em saúde pública, local e internacionalmente, e tenho confiança nelas, acreditando que ministros, secretários e conselhos científicos devem recomendar o melhor para a saúde de suas populações.

Do outro lado, como especialista em neurofibromatoses, há anos acompanho os esforços de diversos laboratórios farmacêuticos para descobrir alguma droga que elimine, reduza ou, pelo menos interrompa o crescimento dos tumores da NF1 de forma eficiente.

Um dos laboratórios nessa corrida tecnológica conseguiu testar uma droga e os pesquisadores (alguns recebendo pagamentos do fabricante) afirmam que a substância reduziu o volume dos neurofibromas plexiformes em até 30% em metade das crianças testadas, com poucos efeitos colaterais. Com este resultado, o laboratório conseguiu a aprovação das autoridades de saúde, nos Estados Unidos e em outros países, inclusive no Brasil, para comercializar o produto.

Considerando o efeito modesto do medicamento (apesar de promissor para estudos futuros) e o custo altíssimo do medicamento (cerca de 1 milhão de reais por ano por paciente, por tempo indefinido), as equipes médicas da AMANF e do CRNF do HC UFMG consideram que há algumas situações em que o medicamento pode ser útil, mas não concordamos com a sua prescrição disseminada como vem acontecendo.

A maioria das pessoas não tem formação suficiente em biologia ou medicina para entender os resultados complexos das pesquisas com medicamentos.

Aliás, a mesma ciência que permitiu o desenvolvimento das vacinas também permitiu a criação das armas nucleares e acelerou a tecnologia predatória do capitalismo e a devastação do planeta.

Da mesma forma, as mesmas autoridades em saúde que aprovam os medicamentos e vacinas também podem, por motivos financeiros ou políticos, recomendar procedimentos criminosos, como aconteceu no ministério da saúde durante a pandemia de COVID no governo de Jair Bolsonaro, que levaram a um excesso de mortes de mais de 300 mil pessoas em relação aos demais países.

Em resumo, temos que ter cautela diante da propaganda do laboratório e também da aprovação das autoridades em saúde para o medicamento.

Como podemos enfrentar esse tipo de dúvida?

Então, precisamos nos organizar melhor em defesa da saúde como um todo, – do SUS – participando dos Conselhos Municipais de Saúde e elegendo representantes comprometidos com a saúde pública.

Mas também precisamos construir ou pertencer a entidades coletivas de defesa das pessoas com determinadas condições de saúde, que procurem influenciar a política de saúde pública, como tentamos fazer na AMANF, por exemplo.

Nessas entidades precisamos de pessoas capazes de compreender e explicar a ciência para as demais, tomando a ferramenta poderosa da ciência das mãos do capitalismo e utilizando-a em benefício do bem estar de toda a humanidade.

Aí, poderemos confiar nas respostas da ciência.

Neste caso da família atendida, é uma resposta a favor do uso das vacinas e da cautela com o tal medicamento.

Dr Lor

Nos posts anteriores falamos sobre o possível excesso de diagnósticos de transtornos do comportamento, sobre o papel da família e da sociedade nestes transtornos e sobre a incerteza que existe nos manuais de diagnóstico de transtornos mentais.

Hoje concluímos nossa apresentação sugerindo algumas abordagens para as crianças com o TDDH.  Ainda não há um tratamento específico para esse transtorno, mas as sugestões dos Manuais  são:

  • A avaliação psicológica e psicoterapia deve ser a primeira abordagem da criança com suspeita de TDDH;
  • Os pais e mães (e quem mais for responsável por criar a criança) também devem participar de psicoterapia (para aprender a manejar seus próprios impulsos e raiva) e receber treinamento adequado para serem instrutores de suas crianças, e ajudarem no desenvolvimento do autocontrole e de manejos dos gatilhos que desencadeiam as crises;
  • A abordagem da hiperatividade com medicamentos pode ser útil, mas não é sempre eficaz (e nas crianças com NF1 a eficácia desses tratamentos é ainda menos estabelecida cientificamente: ver um estudo aqui e outro aqui).
  • Não há ainda estudos científicos que justifiquem o uso de estimulantes do sistema nervoso (por exemplo, metilfenidato) associados a antipsicóticos (risperidona, por exemplo).

Por fim, mas não por último, todas estas medidas serão pouco eficientes se não transformarmos a estrutura familiar, a escola e a sociedade num mundo com menos competição, menos foco em obediência e mais guiado pela felicidade humana e não pelo lucro e produtividade.

Crianças e adolescentes precisam de liberdade sem medo, de corpos e mentes livres, pelo menos um pouco longe das telas e das redes sociais, com atividades físicas lúdicas e prazerosas. Precisam também de alegria de viver e de esperança num futuro melhor, em um mundo menos desigual, mais justo e inclusivo.

Há muitos movimentos, de grupos da sociedade que estão preocupados com o futuro, que podem nos ajudar a mudar nossas ações hoje, apontando novos caminhos, como o Movimento Desconecta (https://www.movimentodesconecta.com.br/), o Movimento Infância Livre de Consumismo (https://milc.net.br/) e a Aliança pela Alimentação Adequada e Saudável (https://alimentacaosaudavel.org.br/).

E nós, pais e mães dos tempos atuais, precisamos encontrar mais leveza e mais alegria na nossa convivência em família e na educação de nossos filhos e filhas, pois eles crescem rápido demais, especialmente se estivermos muito ocupados trabalhando, alheios ao presente, muito distraídos pelos nossos celulares e muito preocupados com o futuro adulto que um dia eles serão (veja um livro interessante sobre gestão do tempo aqui https://a.co/d/8DvIxR6).

Talvez, nesse novo mundo, que podemos construir com as ações de hoje e de cada dia, serão mais raras as crianças e adolescentes (e talvez os adultos) com TDDH, depressão, TDAH, TOD etc… ?

Dra. Luiza De Oliveira Rodrigues

Dr. Luiz Oswaldo C. Rodrigues

Agradecemos as leituras atentas e sugestões de Fabiana Amélia Reis Pantuzza, Felipe Pantuzza Santana , Maria Helena Rodrigues Vieira, Marcos Vinícius Soares Vieira e Rafael Cosenza.

 

Nos posts anteriores falamos sobre o possível excesso de diagnósticos de transtornos do comportamento, sobre o papel da família e da sociedade nestes transtornos e sobre a incerteza que existe nos manuais de diagnóstico de transtornos mentais.

Com estas perguntas em mente, vamos tentar compreender melhor o Transtorno Disruptivo de Desregulação do Humor (TDDH) (ver artigo aqui em inglês), a partir da leitura de uma revisão sobre esse transtorno.

Lembramos que esta é uma revisão do tipo”narrativa” e não “sistemática” (quem desejar saber a diferença, veja aqui  o que isso quer dizer).

É importante ressaltar que, o Manual Americano de Desordens Mentais (DSM) agrupou o (TDDH) junto com os transtornos do humor (dentro do grupo de Transtornos Depressivos) e não com os transtornos do Neurodesenvolvimento (como o TDAH ou TEA) ou os Transtornos de conduta, disruptivos e de controle de impulsos (como o TOD).

O diagnóstico do TDDH pode ser feito a partir dos critérios apresentados na tabela abaixo.

 

Tabela  – Sinais e sintomas para o diagnóstico de Transtorno Disruptivo de Desregulação do Humor (American Psychiatric Association. Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders, 5 edição, Washington, DC, 2013).

  • Surtos frequentes e graves de raiva (verbais ou comportamentais) desproporcionais à provocação.
  • Os surtos são inadequados para a idade da criança.
  • Ocorrem 3 ou mais vezes por semana.
  • O comportamento habitual entre os surtos é continuamente irritado ou raivoso a maior parte do dia, quase todos os dias e são percebidos por outras pessoas.
  • Este problema tem duração maior que 12 meses, sem intervalo..
  • Estes comportamentos estão presentes em dois ou mais destes ambientes: em casa, na escola e com crianças da mesma idade) e são graves, pelo menos em um destes ambientes.
  • O início dos problemas está presente desde antes dos dez anos de idade.
  • O diagnóstico não é feito antes dos 6 e nem depois dos 18 anos.
  • Sintomas de comportamento bipolar típico (mania ou depressão) não duram mais do que um dia.

Observação: para se fazer o diagnóstico de TDDH, a criança não pode apresentar outros diagnósticos já definidos, como depressão grave, distimia, transtorno no espectro do autismo, desordem de estresse pós-traumático, desordem de ansiedade de separação, transtorno bipolar, desordem explosiva intermitente ou transtorno desafiador opositor e os sintomas não são decorrentes de efeitos de uso de drogas ou problemas neurológicos.

 

Lembrar que os sintomas de TDDH podem estar presente em outros problemas, por exemplo: com o diagnóstico de transtorno depressivo maior (TDM), transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), transtorno de conduta (TC) e transtorno por uso de substância (TUS). Aliás, o manual informa que é raro o diagnóstico isolado dessa condição.

Quantas crianças têm TDDH?

Como o transtorno só foi descrito recentemente, as informações não são muito precisas. Por exemplo, há relatos de que poderia estar presente em 1 a cada 100 crianças na população em geral, mas poderia acontecer em até 1 em cada 4 crianças atendidas por problemas de comportamento.

O que causa o TDDH nas crianças?

Ainda não sabemos exatamente. Os estudos genéticos ainda não encontraram hereditariedade definida, embora a presença de outras doenças mentais na família poderiam contribuir para o aparecimento do TDDH.

Ainda não foram realizados muitos estudos específicos (incluindo ressonância magnética funcional) em crianças classificadas com o TDDH. Dados preliminares sugerem que há uma resposta excessiva aos estímulos emocionais numa parte do cérebro chamada “amígdala”. Por exemplo, uma expressão facial neutra pode ser interpretada como sendo agressiva pela criança com transtorno de humor importante (ver estudo sobre isso aqui).

 

Amanhã, concluiremos nossa apresentação apresentando sugestões para o tratamento das crianças com o possível TDDH.

 

Dra. Luiza De Oliveira Rodrigues

Dr. Luiz Oswaldo C. Rodrigues

Agradecemos as leituras atentas e sugestões de Fabiana Amélia Reis Pantuzza, Felipe Pantuzza Santana , Maria Helena Rodrigues Vieira, Marcos Vinícius Soares Vieira e Rafael Cosenza.