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Damos continuidade à divulgação online dos capítulos escritos para a Edição Comemorativa dos 20 anos do CRNF, a ser lançada em novembro de 2024, apresentando hoje o texto excelente de dois nutricionistas, Dra. Aline e Dr. Márcio, que realizaram seus mestrados e doutorados envolvendo pessoas atendidas em nosso CRNF e contribuíram de forma importante e original internacionalmente para nossos conhecimentos sobre os problemas nutricionais nas pessoas com NF1. Agradecemos a sua colaboração neste tema tão interessante em nossa comunidade.

Dr. Lor

 

 

Aline Stangherlin Martins e Marcio Leandro Ribeiro de Souza

Nutricionistas e Doutores

no Programa de Pós Graduação

em Ciências Aplicadas à Saúde do Adulto

da Faculdade de Medicina da UFMG

As características nutricionais na NF1 começaram a ser estudadas recentemente e ainda são pouco conhecidas. Muitos fatores e características relacionadas à nutrição ainda precisam ser investigados nessa doença. A pesquisa de Souza e colaboradores, realizada no Centro de Referência em Neurofibromatoses de Minas Gerais, foi o primeiro estudo publicado que avaliou aspectos da alimentação em indivíduos com NF1, mais precisamente o consumo alimentar e a ingestão de nutrientes em indivíduos com a doença (SOUZA et al., 2015). Segundo os autores, 72% dos pacientes não atingiram suas recomendações de energia, especialmente os homens. Também foi observado uma ingestão inadequada de vitamina D, magnésio, cálcio e vitamina B6, tanto em homens quanto mulheres com a doença, e 100% dos participantes consumiram excesso de sódio. Os pacientes com NF1 não consumiram quantidades adequadas de fibras alimentares, vitamina A e vitamina C e foi observado um consumo excessivo de gordura saturada e lipídios. É importante observar que esse estudo foi apenas descritivo e não houve comparação com indivíduos sem a doença. Os autores discutem que o perfil de ingestão alimentar é ruim na NF1, assim como também é observado na população em geral (SOUZA et al., 2015).

Em uma comparação de ingestão de nutrientes entre indivíduos com NF1 e controles não acometidos pela doença, Souza e colaboradores observaram que o grupo NF1 apresentou um consumo menor de cálcio, ferro e vitamina A e um consumo maior de sódio, ácidos graxos poli-insaturados e ácido linoleico (ômega 6), quando comparado ao consumo do grupo controle. Não houve diferença entre os grupos para o consumo dos demais nutrientes. Nutrientes como cálcio, ferro, vitamina A, sódio e ômega 6 são relacionados normalmente com a saúde óssea, porém nesse estudo não houve correlação entre a ingestão de nutrientes e as características de baixa massa óssea e baixa densidade mineral óssea na NF1, observadas nesse estudo (SOUZA et al., 2020a).

Enquanto os estudos citados anteriormente avaliaram o consumo de nutrientes de forma isolada, Vilela e colaboradores avaliaram o padrão alimentar de adultos brasileiros com NF1. Nesse estudo, os autores observaram que 53,3% dos indivíduos com NF1 apresentaram um padrão alimentar ocidental, caracterizado por um consumo maior de alimentos não saudáveis, como margarina, maionese, sobremesas, frituras, embutidos, bebidas artificiais e alcoólicas. Nesse estudo, os indivíduos com NF1 e padrão alimentar ocidental apresentaram área muscular do braço menor que no grupo com padrão alimentar saudável, indicando que a alimentação ou dieta pode contribuir, mesmo em partes, para o fenótipo muscular comumente observado em indivíduos com NF1 (VILELA et al., 2020).

Enquanto estudos de avaliação da alimentação na NF1 são escassos, a maior parte dos estudos nessa doença apresentam parâmetros antropométricos como índice de massa corporal (IMC), peso, estatura e perímetro cefálico como características do estado nutricional nessa população, porém as prevalências e valores dessas variáveis não apresentam um consenso entre os estudos e, portanto, requerem uma investigação padronizada (SZUDEK; BIRCH; FRIEDMAN, 2000; TROVO-MARQUI et al., 2005; SOUZA et al., 2009; PETRAMALA et al., 2012).

A baixa estatura é mais frequente em indivíduos com NF1 quando comparados com pessoas sem a doença (MARTINS et al., 2016; MARTINS et al., 2018; SOUZA et al., 2019; SOUZA et al., 2020a). Souza e colaboradores encontraram 60% de baixa estatura (percentil menor que 5) e 54% de macrocrania (percentil maior que 95) em seu estudo com 183 pacientes com idades entre 1 e 67 anos comparada com curvas e tabelas para a população não acometida pela doença (SOUZA et al., 2009). Esses valores de baixa estatura e macrocrania diferem um pouco de outras pesquisas na NF1, todas estas realizadas com faixas etárias diferentes. Szudek e seus colaboradores encontraram 13% de baixa estatura e 24% de macrocrania em 569 crianças brancas americanas com NF1, o que resultou na elaboração de curvas de crescimento desses dois parâmetros para essa população (SZUDEK; BIRCH; FRIEDMAN, 2000). Trovó-Marqui e colaboradores também observaram baixa estatura em 40% dos seus pacientes com NF1, considerando valores de percentil menor que 3 e macrocrania em 51% dos indivíduos com a doença (percentil maior que 98) (TROVO-MARQUI et al., 2005). No estudo de Souza e colaboradores (2016), a prevalência de baixa estatura foi de 28,3%.

Na NF1, o IMC também apresenta valores diferentes quando se comparam os estudos. Petramala e colaboradores observaram IMC reduzido em 70 indivíduos com NF1 quando comparados a 40 voluntários sem a doença. As taxas de desnutrição, ou seja, indivíduos com IMC menor que 18,5 kg/m2, não foram descritas no estudo. Esse mesmo estudo mostrou apenas 5% de baixa estatura e 5% de macrocrania nos indivíduos avaliados (PETRAMALA et al., 2012). Rodrigues e colaboradores demonstraram estatura significativamente mais baixa para homens e mulheres com NF1 quando comparados a voluntários sem a doença. Esse mesmo estudo ainda encontrou diferença significativa com relação ao IMC, uma vez que o IMC de mulheres com NF1 foi maior que o IMC de controles saudáveis, contrariando o estudo de Petramala e colaboradores (2012) citado anteriormente, que encontrou IMC reduzido em indivíduos com NF1 comparados ao grupo controle (RODRIGUES et al., 2013).

O estudo de Koga e colaboradores buscou avaliar as características antropométricas (estatura e IMC) de 96 adultos japoneses com NF1 comparados a 288 voluntários não acometidos pela doença. A estatura foi menor na NF1 comparada aos controles. Quando estratificado por idade, as diferenças foram estatisticamente significativas para homens com idade entre 20 e 49 anos e mulheres de 30 a 39 anos. Por sua vez, o IMC dos homens com NF1 foi menor que o grupo controle. Não houve diferença entre as mulheres (KOGA et al., 2014). Essas mesmas características também foram confirmadas em outro estudo que buscava avaliar características metabólicas, nutricionais e musculares em japoneses com NF1 (KOGA; YOSHIDA; IMAFUKU, 2016). É interessante observar que existem divergências de resposta quando se analisa homens ou mulheres com NF1 para IMC e a justificativa para essa diferença precisa ser melhor investigada.

Martins e colaboradores encontraram menor peso e menor estatura em indivíduos com NF1 comparados com o grupo controle. Não houve diferenças no IMC, uma vez que os indivíduos foram pareados por essa variável (MARTINS et al., 2018). Outros estudos também não encontraram diferenças no IMC de indivíduos com NF1 quando comparados com pessoas sem a doença (SOUZA et al., 2019; SOUZA et al., 2020a). O estudo de Souza e colaboradores demonstrou que o baixo peso esteve presente em 10% dos voluntários avaliados e o excesso de peso em 31,7%. O IMC médio dos indivíduos com NF1 (23,86 ± 4,73 kg/m2) nesse estudo foi classificado como normal (eutrófico), da mesma forma que foi demonstrado no estudo de Petramala e colaboradores, com IMC médio de 22,5 ± 4,3 kg/m2, também em voluntários com NF1 (PETRAMALA et al., 2012; SOUZA et al., 2016).

De uma maneira geral, percebe-se que peso e estatura baixos são características clínicas comuns na NF1 com bastante variação nas prevalências entre os estudos, porém uma melhor investigação sobre os compartimentos corporais é necessária. Quanto à composição corporal na NF1, os estudos são ainda mais escassos e com resultados discrepantes. O estudo de Souza e colaboradores é um dos poucos estudos que abordaram especificamente a composição corporal na NF1, embora tenha usado métodos mais simples (dobras cutâneas e equações preditivas) para essa avaliação, e não utilizou um grupo controle, o que limita as conclusões. A área muscular do braço foi considerada baixa em 43,3% dos voluntários desse estudo, achado presente em 51,7% dos homens e 35,5% das mulheres. O percentual de gordura foi classificado como alto em 30% da amostra (SOUZA et al., 2016). Stevenson e colaboradores, em estudo realizado na Universidade de Utah, utilizaram a tomografia computadorizada periférica quantitativa para comparar os ossos e a musculatura esquelética de 40 crianças com NF1 e 380 voluntários não acometidos pela doença, com idades entre 5 e 18 anos. Este estudo demonstrou que crianças portadoras de NF1 apresentam menor área de secção transversal muscular que seus controles, porém sem maiores detalhamentos quanto à fisiopatologia deste achado (STEVENSON et al., 2005).

O método considerado padrão-ouro para avaliação da composição corporal é a absorciometria com raios-X de dupla energia (DXA). Estudos usando DXA para avaliação da massa magra ou composição corporal na NF1 não são encontrados facilmente. A maior parte dos estudos que utilizam a densitometria nessa doença avaliam apenas as características ósseas na doença, sem detalhamento dos compartimentos corporais. Dulai e colaboradores usaram a DXA em 23 crianças com NF1 com idades entre 5 e 17 anos, e o objetivo principal era avaliar a densidade mineral óssea que foi menor nestes voluntários. Os autores citam que a massa magra total ajustada pela altura foi normal, mas com uma diminuição do conteúdo mineral ósseo relativo à massa magra (DULAI et al., 2007). O estudo de Souza e colaboradores (2019) avaliou a composição corporal de adultos com NF1 através do DXA e não observou diferenças para percentual de gordura, massa gorda e massa magra quando comparados com indivíduos sem a doença. Porém a massa magra apendicular ajustada pelo IMC foi menor nos indivíduos com NF1. Esse estudo também demonstrou massa óssea e força muscular reduzidas em indivíduos com NF1, características comumente observadas nessa população (SOUZA et al., 2019).

Esses resultados divergentes entre os estudos reforçam a importância de uma investigação padronizada desses achados e de estudos que busquem entender as diferenças. Estudo em modelo animal encontrou os mesmos resultados e reforçou esses achados antropométricos e metabólicos observados nos indivíduos com NF1 (TRITZ et al., 2021).

O estudo de Souza e colaboradores demonstrou um gasto energético de repouso (GER) aumentado em indivíduos com NF1 após ajuste por peso ou massa magra ou massa magra apendicular (SOUZA et al., 2019). A hipótese inicial dos autores era que o GER fosse menor em indivíduos com NF1, uma vez que são indivíduos menores em tamanho (menor peso e estatura) e com menor massa muscular, características também demonstradas neste estudo, porém o GER aumentado foi observado na NF1 quando comparados com indivíduos sem a doença. O GER é influenciado por fatores como massa muscular, massa gorda, peso, idade, sexo, níveis de adipocinas como leptina e adiponectina, alterações metabólicas em processos patológicos, como hipo ou hipertireoidismo, entre outros (NIELSEN et al., 2000; JOHNSTONE et al., 2005; HALL et al., 2012; PSOTA; CHEN, 2013). Esse aumento de GER assemelha-se ao estudo de Leoni e colaboradores, realizado com a Síndrome de Costello, também uma Rasopatia, no qual os autores observaram um aumento de GER em indivíduos acometidos pela doença (LEONI et al., 2016). As causas para esse aumento de GER na NF1 precisam ser melhor investigadas e discutidas.

Pensando na assistência ao indivíduo com NF1 pelos profissionais de saúde, o estudo de Souza e colaboradores comparou 8 equações preditivas comumente usadas na prática clínica para estimar o GER com a calorimetria indireta (padrão-ouro) e observou que todas elas subestimam o GER em indivíduos com NF1 (SOUZA et al., 2020b). Em outro estudo, Souza e colaboradores fizeram uma comparação de equações que usam bioimpedância elétrica ou dobras cutâneas para avaliação da composição corporal com o método padrão-ouro DXA e observaram que as equações de bioimpedância elétrica apresentaram melhor adequação e acurácia, embora todas precisem ser usadas com cautela na NF1 (SOUZA et al., 2020c).

Alguns nutrientes são estudados de forma isolada na NF1. Um estudo demonstrou que indivíduos com NF1 apresentaram níveis séricos mais baixos de vitamina B12 quando comparados com indivíduos não acometidos pela doença (AYDIN; BUCAK, 2021). Outro nutriente comumente estudado na NF1 é a vitamina D. Alguns estudos observaram níveis reduzidos de vitamina nessa população e alguns estudos estudam discutem a importância dessa vitamina para o indivíduo com NF1, uma vez que pode atuar na saúde muscular e óssea, comumente afetados nos pacientes com essa doença (LAMERT et al., 2006; TUCKER et al., 2009; RICCARDI et al., 2020). Porém uma meta-análise recente não encontrou diferenças estatísticas nos níveis de vitamina D na NF1 e os autores sugerem que as alterações ósseas na NF1 podem ser resultantes de um mecanismo independente de vitamina D (KASPIRIS et al., 2024). Outro estudo demonstrou que os níveis de oito aminoácidos estavam alterados em indivíduos com NF1. Os autores demonstraram que arginina, glutamina, asparagina, serina e aspartato estavam aumentados nos indivíduos com a doença, enquanto cistina e prolina estavam reduzidos (OZ; KOYUNCU; GONEL, 2022).

Associado as características nutricionais já demonstradas, pesquisadores do CRNF observaram uma menor incidência de pacientes com diabetes Mellitus tipo 2 (DM) nos pacientes atendidos. Esse dado chamou a atenção dos profissionais, uma vez que o DM é uma doença altamente prevalente na população brasileira. Em revisão da literatura, verificou-se que dados apontavam para uma menor ocorrência de DM em pacientes com NF1 (ZAKA-UR-RAB; CHOPRA, 2005; OZHAN; OZGUVEN; ERSOY, 2013; MADUBATA et al., 2015).

Foram encontrados dois estudos apresentando relatos de caso envolvendo indivíduos com NF1, mas ambos relatavam que a associação entre DM1 e NF1 é pouco comum (ZAKA-UR-RAB; CHOPRA 2005; OZHAN; OZGUVEN; ERSOY, 2013). Um estudo desenvolvido a partir da análise de banco de dados, mostrou que pessoas com NF1 apresentaram uma chance significativamente menor de ter DM do que pessoas sem a doença (OR:0,4, IC95%: 0,3 – 0,4). Nesse estudo, foram incluídos pacientes com DM tipo1 e DM tipo 2 (MADUBATA et al., 2015).

Com objetivo de esclarecer sobre a menor frequência de diabetes em pacientes com NF1, Martins e colaboradores avaliaram a glicemia de jejum de 57 pacientes atendidos no CRNF. Os pacientes selecionados com NF1 foram pareados com controles não-NF1 selecionados do Estudo Longitudinal Brasileiro de Adultos Saúde de acordo com sexo, idade (35–74 anos) e índice de massa corporal  (IMC) na proporção de 1:3. Em ambos os grupos, foram excluídos indivíduos com DM. O nível mediano de glicemia de jejum no grupo NF1 (86 mg/dl (intervalo, 56-127 mg/dl)) foi inferior ao do grupo de controle não-NF1 (102 mg/dl (intervalo, 85–146 mg/dl)) (P<0,001). A prevalência de glicemia de jejum >100 mg/dl no grupo NF1 (16%) foi menor do que no grupo controle não-NF1 (63%) (P<0,05). A chance de um alto nível de glicemia de jejum foi 89% menor no grupo NF1 (odds ratio, 0,112; IC 95%, 0,067–0,188) (P<0,05). Os autores concluíram que, adultos com NF1 apresentaram menores níveis de glicemia de jejum e menor prevalência de alto nível de glicemia de jejum em comparação com controles não-NF1 (MARTINS et al., 2016).

Diante dos dados que apontavam para menor frequência de DM e menor glicemia de jejum em pacientes com NF1, Martins e colaboradores desenvolveram uma pesquisa com objetivo de comparar a resistência à insulina (RI), que é um preditor para o desenvolvimento de diabetes, e alguns aspectos metabólicos que possuem relação com DM de pacientes com NF1 e indivíduos sem a doença. Foram avaliados 40 pacientes com NF1 pareados por sexo, idade e IMC a 40 controles da comunidade. Amostras de sangue foram coletadas para avaliação bioquímica. Avaliação do modelo de homeostase adiponectina (HOMA-AD), modelo de avaliação de homeostase resistência à insulina (HOMA-IR) e razão adiponectina/leptina (RAL) foram usados ​​para identificar RI. Foram avaliados também os níveis de adipocitocinas leptina, visfatina, resistina e adiponectina. Os pesquisadores observaram que o valor HOMA-AD foi significativamente menor e a RAL significativamente maior no grupo NF1. Os níveis de glicemia de jejum, leptina e visfatina de pacientes com NF1 foram significativamente mais baixos e os níveis de adiponectina foram significativamente mais elevados do que os dos controles. Os autores concluíram que os níveis mais baixos de glicemia de jejum, leptina, visfatina e HOMA-AD, e níveis mais elevados de adiponectina e ALR podem estar relacionados ao aumento da sensibilidade à insulina e menor ocorrência de diabetes mellitus tipo 2 em pacientes com NF1 (MARTINS et al., 2018).

Em 2020, um estudo realizado por Kallionpää e colaboradores com 1410 pacientes, também observou menores taxas de DM2 em pacientes com NF1, corroborando as pesquisas realizadas no CRNF–MG (KALLIONPAA et al., 2021).

Estudos de intervenção nutricional na NF1 ou mesmo estudos que testaram a utilização de dieta ou nutrientes isolados na observação de características clínicas da doença são escassos. Como exemplo, pode-se citar o ômega 3. Mashour e colaboradores demonstraram in vitro que a utilização de ácidos graxos, principalmente ácido docosaexaenoico (DHA) e ácido araquidônico, pode representar possíveis substâncias reguladoras do desenvolvimento de TMBNP, resultantes da malignização de neurofibromas plexiformes (MASHOUR et al., 2005).

Um fenótipo comumente observado na NF1 é a força muscular reduzida, observado também no estudo de Souza e colaboradores (SOUZA et al., 2019). Segundo Sullivan e colaboradores, em um estudo com modelo animal, a perda da neurofibromina no músculo esquelético resulta em uma miopatia metabólica associada com acúmulo de gordura intramiocelular, aumento de triglicerídeos e aumento da atividade da ácido graxo sintase, e desregulação da função mitocondrial nesses músculos (SULLIVAN et al., 2014). Ainda pensando em prováveis mecanismos para explicar esse fenótipo de força muscular reduzida na NF1, Summers e colaboradores analisaram biópsias musculares de 6 crianças com NF1 e observaram fibrose e infiltração de células mononucleares, além de um considerável acúmulo de lipídio intramiocelular em todas as amostras, que apresentou correlação com redução da expressão da neurofibromina. A partir dessas observações, os autores testaram modelos animais que reproduziram todas as características patológicas observadas nas biópsias musculares humanas. Os animais apresentaram também acúmulo de lipídio intramiocelular que foi fortemente correlacionado com uma fraqueza muscular. Os autores, na sequência, testaram uma dieta enriquecida com ácidos graxos de cadeia média, reduzida em ácidos graxos de cadeia longa (AGCL) e aumentada em carnitina na dose de 300mg/kg/dia nesses modelos animais. Após 8 semanas, no grupo que recebeu AGCM e carnitina, houve um aumento de 45% na força muscular e redução de 71% no acúmulo de lipídio intramiocelular (SUMMERS et al., 2018). Essa associação da L-carnitina com ácidos graxos de cadeia média confirmou esses achados em um estudo clínico de fase 2 com crianças com NF1 e os autores sugerem que mais estudos em humanos testem essa estratégia para recuperação da força muscular (VASILJEVSKI et al., 2020; VASILJEVSKI et al., 2021). E um estudo em modelo animal observou que essa estratégia pode contribuir para melhorar a qualidade e porosidade óssea na NF1, o que precisa ser confirmado em humanos (O’DONOHUE et al., 2024).

Por fim, existem ainda estudos, por exemplo, associando constipação com a NF1, o que requer mais estudos (SRIDHAR et al., 2013; PEDERSEN et al., 2013; EJERSKOV et al., 2017). Outro estudo avaliou a presença de transtornos alimentares, como bulimia e anorexia, em indivíduos com NF1, uma vez que alterações dermatológicas da doença podem contribuir para distorções ou insatisfações com a imagem corporal (CHIAVARINO et al., 2023). Provavelmente no futuro novos achados e associações entre a doença e aspectos nutricionais podem aparecer e mais estudos se fazem necessários.

 

REFERÊNCIAS

 

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VILELA, D.L.S. et al. Dietary patterns of Brazilian adults with neurofibromatosis type 1. Revista Chilena de Nutrición, v. 47, n. 5, p. 772-781, 2020.

 

ZAKA-UR-RAB, Z.; CHOPRA, K. Diabetes mellitus in neurofibromatosis I: an unusual presentation. Indian Pediatrics, v. 42, n. 2, p. 185-186, 2005.

 

 

Recentemente, nosso grupo de pesquisa no CRNF publicou 3 artigos científicos, que fazem parte da pesquisa de doutorado do nutricionista Márcio Leandro Ribeiro de Souza.

Desde 2012, nosso grupo de pesquisa realiza pesquisas na área de Nutrição na NF1, tentando entender características nutricionais que possam contribuir para uma melhor qualidade de vida e saúde dos indivíduos com NF1.

Um desses trabalhos publicados agora em maio de 2020 na Revista da Associação Médica Brasileira avaliou as características ósseas na NF1 (densidade mineral óssea e conteúdo mineral ósseo). Foi o primeiro estudo brasileiro a investigar os aspectos ósseos em indivíduos brasileiros com a doença.

Os autores observaram que indivíduos com NF1 apresentaram menor massa óssea e menor altura quando comparados com indivíduos sem a doença. Além disso, a densidade mineral óssea no corpo total e na coluna também foram menores nos voluntários com NF1. A prevalência de indivíduos com massa óssea abaixo do esperado para a idade foi maior na NF1 (34,6%) do que na população sem a doença (7,7%). Esses dados confirmam as observações de estudos internacionais que demostraram que a NF1 pode afetar as características ósseas.

Ainda nesse estudo, nosso grupo de pesquisa avaliou se essas alterações ósseas poderiam estar associadas com o consumo alimentar. Hoje em dia sabemos que mais de 20 nutrientes são importantes para a saúde óssea, como cálcio, vitamina D, magnésio, vitamina K, entre outros. Os voluntários com NF1 da pesquisa apresentaram menor consumo de cálcio, ferro e vitamina A, e um consumo maior de sódio e ômega 6, todos nutrientes importantes para a saúde óssea quando consumidos em quantidades adequadas. Porém em nosso estudo não houve associação entre o consumo de nutrientes com a massa óssea ou com a densidade mineral óssea na NF1.

Veja o estudo completo no link a seguir:

https://www.scielo.br/pdf/ramb/v66n5/1806-9282-ramb-66-5-0666.pdf

Além disso, a pesquisa de doutorado do nutricionista Márcio Souza avaliou o gasto energético de repouso usando a calorimetria indireta e a composição corporal através da absorciometria com raios-X de dupla energia (DXA), considerados os métodos padrão-ouro para essas avaliações. Esse estudo foi publicado na Clinical Nutrition ESPEN em 2019. Veja o estudo no link a seguir:

https://clinicalnutritionespen.com/article/S2405-4577(19)30135-4/pdf

Porém, como esses métodos padrão-ouro apresentam custo mais elevado, nosso grupo de pesquisa buscou comparar esses métodos com outros de acesso mais fácil, com o objetivo de avaliar o melhor método para ser usado na prática clínica em indivíduos com NF1, facilitando a assistência aos indivíduos com a doença. Ambos os estudos foram publicados na Journal of Human and Clinical Genetics.

O primeiro estudo comparou o gasto energético de repouso, ou seja, a energia que nosso corpo gasta para manter suas funções vitais, através da calorimetria indireta com 8 equações preditivas comumente usadas por profissionais de saúde para estimar o gasto energético. Todas as equações testadas subestimaram o verdadeiro gasto energético de repouso em indivíduos com NF1, o que demostra que essas equações precisam ser usadas com cautela nessa população. O estudo pode ser acessado através do link abaixo.

https://www.humangeneticsjournal.com/articles/resting-energy-expenditure-in-neurofibromatosis-type-1-indirect-calorimetry-versus-predictive-equations.pdf

O outro estudo comparou o percentual de gordura dos indivíduos com NF1 avaliados através da DXA (considerado o melhor método para essa avaliação) com 4 equações usando a bioimpedância elétrica e 5 equações usando as dobras cutâneas avaliadas com o adipômetro. O estudo mostrou que o uso da bioimpedância elétrica é melhor na NF1 do que as dobras cutâneas, principalmente para os homens com NF1. O estudo pode ser acessado através do link abaixo:

https://www.humangeneticsjournal.com/articles/assessment-of-adiposity-in-neurofibromatosis-type-1-comparison-between-dual-energy-x-ray-absorptiometry-and-conventional-methods.pdf

Ainda sabemos menos do que gostaríamos sobre os aspectos da Nutrição na NF1, mas aos poucos vamos conhecendo algumas características importantes na doença que podem estar associadas com a Nutrição.

Dr. Márcio Ribeiro de Souza

Nutricionista

Um grupo de cientistas do Centro de Referência em Neurofibromatoses, do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais, descobriu que mulheres com neurofibromatose do tipo 1 (NF1) apresentam aumento do metabolismo corporal em repouso, ou seja, o seu consumo de energia está aumentado em relação às pessoas sem a NF1 do mesmo sexo, idade, estatura e peso.

Junto com este metabolismo aumentado, elas têm menor estatura, redução da massa muscular e força muscular diminuída, concordando com estudos anteriores realizados em nosso Centro (VER AQUI )

As causas deste aumento do metabolismo nas mulheres com NF1 ainda estão sendo investigadas. Uma das explicações prováveis seria a ativação exagerada de certas vias metabólicas dentro das células (via RAS), por causa da deficiência de neurofibromina causada pela mutação no gene NF1.

A importância destes resultados está na melhor compreensão do desenvolvimento corporal das pessoas com NF1, uma linha de pesquisa iniciada por este grupo de cientistas, o que poderá, no futuro, contribuir para novos tratamentos da neurofibromatose do tipo 1.

O artigo científico foi publicado na revista internacional “Clinical Nutrition” (Nutrição Clínica) e recebeu o título “Increased resting metabolism in neurofibromatosis type 1” (Aumento do metabolismo de repouso na neurofibromatose do tipo 1) ( ver aqui o link para o artigo completo ).

Até o dia 6 de agosto de 2019 o artigo completo pode ser baixado deste link: CLIQUE AQUI

Os autores e autoras da pesquisa foram Márcio Leandro Ribeiro de Souza, Ann Kristine Jansen, Luiz Oswaldo Carneiro Rodrigues, Darlene Larissa de Souza Vilela, Adriana Maria Kakehasi, Aline Stangherlin Martins, Juliana Ferreira de Souza e Nilton Alves de Rezende.

A equipe científica recebeu apoio financeiro de três agências públicas de financiamento: CAPES, CNPq e FAPEMIG.

 

Abaixo a tradução do resumo

Neurofibromatose tipo 1 (NF1) é uma doença de genética autossômica dominante que é caracterizada por alterações neurocutâneas com envolvimento multissistêmico. Um estudo anterior com adultos com NF1 revelou que mudanças no gasto de energia total estavam relacionadas com a composição corporal e consumo de alimentos. O gasto de energia de repouso (REE), uma medida de energia que o corpo gasta para manter as funções vitais, ainda não foi avaliado em populações de NF1. Este estudo objetivou avaliar REE em indivíduos com NF1 utilizando calorimetria indireta (IC) e avaliar sua correlação com a força muscular e a composição do corpo.

Vinte e seis adultos com NF1 (14 homens) de idade entre 18 – 45 anos submeteram-se a IC para avaliar REE, quociente respiratório (RQ) e a utilização de substrato. A composição corporal foi avaliada por absorção de raio-x de dupla energia. Peso, altura e circunferência da cintura (WC) também foram medidos. Força muscular máxima (Smax) foi mensurada pelo teste de apreensão usando um dinamômetro. Os pacientes do grupo de NF1 foram comparados com 26 controles saudáveis no grupo controle, que foram combinados por sexo, idade, índice de massa corporal (IMC) e nível de atividade física.

Não houve diferença no peso, WC, massa gorda e percentual de gordura corporal (BFP). Apendicular massa magra (ALM) ajustado pelo IMC (ALMBMI) (0.828 ± 0.161 a versus 0.743 ± 0,190; P = 0,048) e Smax (37,5 ± 10,6 a versus ± 31,1 12.2; P = 0,035) foi menor no grupo de NF1 do que no grupo controle. Não há diferenças na composição corporal, força e parâmetros antropométricos foram observadas em homens, mas mulheres com NF1 apresentaram a menor área de superfície corporal (BSA), massa corporal magra (MCM), ALM, ALMBMI e Smax. REE ajustada pelo peso, LBM ou ALM foi maior no grupo de NF1 do que no grupo controle (medianas, 21,9 contra 26,3, P = 0,046; 36,5 versus 41.1, P = 0,012; e 82,3 contra 92,4, P = 0,006, respectivamente), e essas diferenças foram observadas somente entre as mulheres. RQ foi menor no grupo de NF1 do que no grupo controle (0,9 ± 0,1 a versus 0,8 ± 0,1; P = 0,008), revelando que os indivíduos com NF1 oxidado mais lípidos e hidratos de carbono menos do que controles. REE correlação negativa com o BFP e positivamente com peso, estatura, BMI, WC, BSA, LBM, ALM, ALMBMI, densidade óssea mineral e Smax.

 

Conclusão

Indivíduos com NF1, particularmente as mulheres, apresentaram aumento do REE (ajustado pelo peso, LBM ou ALM) e redução do RQ em comparação com controles saudáveis. Esses achados estavam associados com baixa ALMBMI e Smax, indicando possivelmente sarcopenia prematura nesta população. Investigação adicional sobre metabolismo energético em NF1 e diferenças de gênero pode ser útil para explicar os mecanismos destas alterações.

 

Abaixo o resumo em inglês.

Background & aims

Neurofibromatosis type 1 (NF1) is an autosomal dominant genetic disease that is characterized by neurocutaneous changes with multisystem involvement. A previous study with adults with NF1 revealed that changes in total energy expenditure were related to food consumption and body composition. Resting energy expenditure (REE), a measure of energy that the body expends to maintain vital functions, has not been assessed in NF1 populations. This study aimed to assess REE in individuals with NF1 using indirect calorimetry (IC) and evaluate its correlation with body composition and muscle strength.

Methods

Twenty-six adults with NF1 (14 men) aged 18–45 years underwent IC for assessing REE, respiratory quotient (RQ), and substrate utilization. Body composition was assessed by dual energy X-ray absorptiometry. Weight, height, and waist circumference (WC) were also measured. Maximum muscular strength (Smax) was measured by handgrip test using a dynamometer. Patients in the NF1 group were compared to 26 healthy controls in the control group, who were matched by sex, age, body mass index (BMI), and physical activity level.

Results

There were no differences in weight, WC, fat mass, and body fat percentage (BFP). Appendicular lean mass (ALM) adjusted by BMI (ALMBMI) (0.828 ± 0.161 versus 0.743 ± 0.190; P = 0.048) and Smax (37.5 ± 10.6 versus 31.1 ± 12.2; P = 0.035) was lower in the NF1 group than in the control group. No differences in body composition, strength, and anthropometric parameters were observed in men, but women with NF1 presented lower body surface area (BSA), lean body mass (LBM), ALM, ALMBMI, and Smax. REE adjusted by weight, LBM, or ALM was higher in the NF1 group than in the control group (medians, 21.9 versus 26.3, P = 0.046; 36.5 versus 41.1, P = 0.012; and 82.3 versus 92.4, P = 0.006, respectively), and these differences were observed only among women. RQ was lower in the NF1 group than in the control group (0.9 ± 0.1 versus 0.8 ± 0.1; P = 0.008), revealing that individuals with NF1 oxidized more lipids and fewer carbohydrates than controls. REE correlated negatively with BFP and positively with weight, height, BMI, WC, BSA, LBM, ALM, ALMBMI, bone mineral content, and Smax.

Conclusions

Individuals with NF1, particularly women, presented with increased REE (adjusted by weight, LBM, or ALM) and lower RQ compared to healthy controls. These findings were associated with lower ALMBMI and Smax, possibly indicating premature sarcopenia in this population. Further investigation concerning energy metabolism in NF1 and gender differences may be helpful in explaining underlying mechanisms of these changes.

 

Hoje trazemos as impressões sobre o congresso enviadas pelo Professor Marcio Leandro Ribeiro de Souza, Nutricionista, Doutor e Mestre em Saúde do Adulto pela Faculdade de Medicina da UFMG.

A Joint Global Neurofibromatosis Conference, conferência mundial sobre as neurofibromatoses, que aconteceu em novembro de 2018 em Paris, foi o maior evento realizado com pesquisadores sobre a doença. Já tive oportunidade de participar em anos anteriores nos Estados Unidos, mas essa foi diferente, com mais participantes e mais trabalhos científicos apresentados.

Como nutricionista, eu fiquei ainda mais feliz em ver que cada vez mais outras áreas da saúde, além da Medicina, também se destacam no evento, como Fonoaudiologia, Odontologia, Psicologia e, claro, a Nutrição.
Os aspectos nutricionais começaram a ser estudados aqui no Brasil em 2011-2012 por nosso grupo de pesquisa e hoje percebemos que é uma área que passou a receber a atenção de outros pesquisadores. Pude ver trabalho científico testando nutrientes ou alterações dietéticas na doença. Ainda são trabalhos em modelo animal, mas que reforçam que a Nutrição é uma área a ser melhor explorada nas neurofibromatoses, especialmente a NF1, que é a doença que estudei em meu mestrado e doutorado.
Essa conferência teve uma importância ainda maior para mim, pois pude apresentar os resultados finais do meu doutorado. Levei dois trabalhos científicos.
Um deles verificava a associação entre consumo alimentar dos indivíduos com NF1 com as características ósseas, comumente alteradas na doença e também demonstradas na minha pesquisa de doutorado.
O outro trabalho avaliou a taxa metabólica de repouso na NF1 e sua associação com a composição corporal e força muscular. Essa taxa metabólica de repouso corresponde à energia que o nosso corpo gasta para manter as funções vitais, como respiração, circulação, entre outras.
Em nossa pesquisa, encontramos menor força muscular e menor massa magra apendicular na NF1 e, pensando nisso, esperava-se que a taxa metabólica de repouso fosse menor na doença. Porém o que encontramos foi o contrário: maior taxa metabólica de repouso em indivíduos com NF1. Os mecanismos dessa alteração precisam ser estudados daqui para frente.
Mas esse resultado aparentemente contraditório e intrigante chamou a atenção dos pesquisadores da doença de diferentes países, com os quais pude conversar durante a apresentação do trabalho. Além disso, esse trabalho foi selecionado como finalista para concorrer ao prêmio de Melhor Trabalho Clínico da conferência, o que torna esse evento ainda mais especial para mim. Fazer pesquisa no Brasil não é algo simples, pois temos algumas limitações financeiras, mas ter um trabalho brasileiro e de Nutrição dentre os melhores do congresso, é algo para se comemorar.
Foi uma ótima forma de fechar esse ciclo do doutorado. Em breve teremos os artigos científicos publicados sobre esses temas. Esse evento nos mostrou que estamos no caminho certo e que muitas pesquisas ainda precisam ser realizadas sobre Nutrição na Neurofibromatose. Ainda temos muitas dúvidas para serem respondidas.
Abraços a todos.

Muitas pessoas nos perguntam se alguns alimentos podem aumentar ou diminuir o crescimento dos neurofibromas.

Circulam pela internet informações de que comer carnes aumentaria os neurofibromas porque elas conteriam hormônios injetados pela indústria de alimentos.

Outras pessoas dizem que certos alimentos poderiam reduzir o crescimento dos neurofibromas.

 

Nutricionistas do nosso Centro de Referência em Neurofibromatoses do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais, como a Aline Stanguerlin Martins e o Marcio Leandro Ribeiro de Souza estão empenhados em conhecer os aspectos nutricionais das pessoas com NF1, publicando resultados de seus trabalhos, por exemplo (AQUI) e (AQUI) e aqui (AQUI), mas até o momento eles não estabeleceram qualquer relação entre o crescimento dos neurofibromas e alguma forma de alimentação.

Aliás, mais um passo neste sentido será dado nesta próxima quarta-feira (11/7/2018), quando o nutricionista Márcio Leandro Ribeiro de Souza defenderá sua tese de doutorado intitulada “Estudo do gasto energético de repouso e total em indivíduos com Neurofibromatose tipo 1 e sua correlação com força muscular, composição corporal e consumo alimentar”. Mais um brilhante trabalho do Márcio, no qual ele encontrou alguns aspectos nutricionais importantes para as pessoas com NF1, que apresentam gasto maior de energia, menor força e massa musculares, menor densidade óssea e menor consumo de ferro e cálcio, entre outras conclusões.

A defesa é pública e está aberta a quem desejar assistir.

 

Volto às informações sobre alimentação e neurofibromas.

Em 2017, um estudo publicado pela italiana Teresa Spozito e colaboradores  informou que a chamada Dieta do Mediterrâneo associada com suplementação de curcumina teria reduzido o número de neurofibromas depois de seis meses de uso (VER AQUI EM INGLÊS). No entanto, o estudo foi realizado com um número muito pequeno de pessoas com NF1 e o método de contagem de neurofibromas que ela usou não está comprovado cientificamente. Minha impressão é de que este estudo precisa ser repetido com um número maior de pessoas e com métodos mais confiáveis.

Portanto, até o presente momento, não há nenhum estudo científico que comprove efeito importante da alimentação sobre os neurofibromas. Nem para melhorar, nem para piorar.

Pode ser que, no futuro, algum estudo científico bem feito venha a mostrar que determinado alimento ou alimentos podem aumentar ou diminuir os neurofibromas, mas, por enquanto, isto não existe.

Já comentei nesta página da AMANF outros assuntos relacionados com esta dúvida, como, por exemplo, sobre suplementos alimentares (AQUI) sobre força e dieta (AQUI) e tratamentos alternativos para os problemas das neurofibromatoses (AQUI).

Em conclusão, vamos torcer para que as pesquisas científicas venham a esclarecer esta questão de uma forma mais definitiva.

No entanto, mesmo na ausência de estudo científicos relacionando um ou outro alimento ou nutriente a crescimento de neurofibromas, uma alimentação saudável e variada evitando excesso de alimentos industrializados, de sal, de açúcar e de gordura saturada é importante para qualidade de vida das pessoas com NF1, pois esta alimentação pode não ter um efeito direto no crescimento dos neurofibromas mas tem efeito cientificamente comprovado sobre a saúde cardiovascular, a composição corporal o desenvolvimento de câncer e outras doenças.

 

(*) Agradeço as sugestões da Professora Ann Cristine Jansen e do Professor Nilton Alves de Rezende.


A nutricionista Aline Stangherlin Martins apresentou publicamente as conclusões de sua pesquisa mostrando que a resistência à insulina é menor nas pessoas com Neurofibromatose do Tipo 1 (NF1), ou seja, elas têm menor chance de se tornarem diabéticas do que a população em geral (ver AQUI a notícia no site da Faculdade de Medicina da UFMG).

A pesquisa é parte do doutoramento da Aline Stangherlin Martins, que foi aprovada na sua defesa, recebendo o título de Doutora pelo Programa de Pós-Graduação em Ciências Aplicadas à Saúde do Adulto da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

Fizeram parte da banca examinadora pessoas com grande experiência em nutrição, clínica médica, diabetes, neurofibromatose e pesquisa científica, como os professores da UFMG Nilton Alves de Rezende, Ann Kristine Jansen, Maria de Fátima Haueisen Sander Diniz e Henrique Oswaldo da Gama Torres, a professora Karin Gonçalves Soares Cunha da Universidade Federal Fluminense, a professora Joana Ferreira do Amaral da Universidade Federal de Ouro Preto, o professor Bruno de Melo Carvalho da Universidade de Pernambuco e o professor Luiz Guilherme Darrigo Júnior da Universidade de São Paulo em Ribeirão Preto.

O trabalho da Aline foi realizado no Centro de Referência em Neurofibromatoses do Hospital das Clínicas da UFMG e foi orientado pelo Dr. Nilton Alves de Rezende e pela professora Ann Kristine Jansen.

Em resumo, a Aline lembrou que já se sabe que o diabetes mellitus tipo 2 é a forma mais comum de diabetes na população em geral (90% dos casos) e é uma doença associada à chamada “resistência à insulina”, ou seja, as células do organismo com diabetes têm dificuldade de transportar a glicose da corrente sanguínea para dentro da célula, onde ela é metabolizada.

Aline partiu de alguns dados clínicos e laboratoriais anteriores à sua tese, os quais levantaram a suspeita de que o diabetes mellitus do tipo 2 ocorreria com menor frequência em pessoas com NF1. Com isto, ela decidiu convidar um grupo de pessoas com NF1 para serem voluntárias em sua pesquisa, na qual ela mediu a resistência à insulina e a glicemia em jejum e estudou outras características metabólicas destes voluntários.

Para comparar com a população em geral, a Aline recorreu a um grupo de pessoas que participam como voluntárias do grande projeto chamado ELSA, as iniciais do Estudo Longitudinal da Saúde do Adulto realizado em conjunto por algumas universidades brasileiras, entre elas a UFMG.

Todos os participantes com e sem NF1 foram submetidos a uma entrevista sobre suas condições de saúde, avaliação nutricional e dietética e coleta de amostras de sangue para medida dos níveis de glicemia, insulina, hemoglobina glicada, perfil lipídico e as substâncias chamadas adipocitocinas.

Foram aplicados em todas as pessoas os três tipos diferentes do teste HOMA (do inglês Homeostasis Model Assessment) que medem a resistência à insulina e a função das células do pâncreas produtoras da insulina. Além disso, outros testes laboratoriais completaram a visão do metabolismo dos voluntários, como a relação entre as substâncias Adiponectina e Leptina.

Os resultados da primeira etapa foram obtidos de 57 pessoas com NF1 e 171 controles do projeto ELSA. Aline encontrou glicemia de jejum menor nas pessoas com NF1 (NF1: 86,0 mg/dL contra 102,0 mg/dL para os controles) bem como uma menor prevalência de diabetes (NF1: 16%; controles: 63%, p < 0,001) e menor chance de desenvolver glicemia de jejum elevada no grupo NF1.

Na segunda etapa, foram avaliados 40 indivíduos com NF1 e 40 controles. O HOMA-AD foi significativamente menor no grupo NF1 (NF1: 1,0 e controle: 1,9; p = 0,003). A Relação Adiponectina e Leptina foi maior no grupo NF1 (NF1: 3,8 e controles:1,2; p = 0,003). Não foram observadas diferenças entre os grupos em relação nos demais testes. Além disso, todas as medidas antropométricas e nutricionais do grupo NF1 foram menores do que nas pessoas sem NF1: peso, estatura, massa livre de gordura, percentual de gordura, massa gorda e a água corporal.

Na discussão, os resultados do estudo sugerem que a menor massa gorda, os menores níveis de glicemia de jejum, de visfatina e HOMA-AD e maiores níveis de adiponectina e da relação Adiponectina/Leptina podem estar relacionadas à menor resistência à insulina e menor ocorrência de diabetes mellitus do tipo 2 em indivíduos com NF1.

Uma parte destes resultados já havia sido publicada na revista científica internacional “Endocrine Connections” (ver AQUI ) e na semana passada a Aline e seus orientadores receberam uma carta da editora da revista agradecendo a publicação e parabenizando os autores pelo artigo ter sido um dos mais lidos no ano de 2016 (968 downloads!) (ver carta abaixo).

Parabéns Aline, Nilton, Ann e demais colaboradores. Fico contente que estejamos dando mais um passo para ajudarmos na compreensão mais ampla dos problemas das pessoas com NF1.

“Dear Dr Rezende,

I am writing to congratulate you as your paper, “Lower fasting blood glucose in neurofibromatosis type 1”, was one of the most read articles during 2016. Endocrine Connections is committed to maximising the dissemination and impact of your work, and throughout the year, your article was downloaded 968 times.

As a thank you, we would like to offer you a ‘Highly Downloaded’ certificate via email. To claim your free certificate, simply reply to this email to let me know.

With an Impact Factor scheduled for 2017, now is a great time to submit your work to Endocrine Connections. What’s more, the Society for Endocrinology and European Society of Endocrinology are pleased to offer free Open Access publishing to their members throughout 2017!

Thank you for your contribution to the journal. I hope you will continue to keep Endocrine Connections in mind as a resource for the latest research and as a home for your future work.

Yours sincerely,

Alison”

No último blog (sexta passada), comecei a responder as perguntas do LC de Cataguases, MG. Uma das informações que repassei foi sobre a necessidade de níveis adequados de Vitamina D nas pessoas com NF1.

Para nos compreendermos melhor como podemos obter uma dieta saudável para manter os níveis adequados de Vitamina D, pedi ajuda ao nutricionista Marcio Leandro Ribeiro de Souza, que está fazendo seu doutorado sobre questões nutricionais nas pessoas com NF1, sob orientação do Dr Nilton Alves de Rezende, diretor do nosso Centro de Referência em Neurofibromatoses do Hospital das Clínicas da UFMG.


Caro Márcio, poderia nos ajudar a entender melhor o que seria uma alimentação boa para que as pessoas com NF1 tenham níveis adequados de Vitamina D?

Dentre as principais fontes alimentares de vitamina D, temos os óleos de fígado de peixes, como o óleo de fígado de bacalhau, que hoje em dia é facilmente encontrado como suplemento, além de estar presente em peixes, ovos e fígado. Leites e derivados enriquecidos também podem ser considerados fontes de vitamina D.

Pensando no melhor aproveitamento dessa vitamina D, alguns cuidados nutricionais são importantes. Como é uma vitamina lipossolúvel, ou seja, que depende de uma fonte de gordura para ser absorvida, é importante que esses alimentos fontes sejam consumidos junto com uma fonte de gorduras boas, como azeite extra-virgem, óleo de coco, óleo de abacate. Ao consumir o ovo, por exemplo, é interessante comer a gema, já que na gema temos gorduras boas chamadas fosfolipídios, que facilitarão a absorção da vitamina D.

Se o alimento está sendo consumido pensando na vitamina D, ou na forma de suplemento, não é bom que este seja consumido junto com grandes fontes de fibras, como aveia, linhaça, produtos integrais, pois as fibras ajudam a eliminar gorduras pelas fezes, e junto com essa gordura podemos ter perdas de vitamina D. O mesmo vale para medicamentos e suplementos que inibem a absorção de gordura: basta consumir os alimentos fontes de vitamina D longe desses produtos.

Refeições com muito ferro, por exemplo, refeições que tenham muita carne, também diminuem um pouco a absorção da vitamina D, então se for necessário fazer uso do suplemento, não ingerir o suplemento próximo dessas refeições.

E outro ponto importante para comentar é que idosos apresentam menor eficiência na síntese da Vitamina D, então nesses indivíduos a atenção precisa ser redobrada.

A época do ano também é importante, pois no inverno, a síntese de vitamina D é diminuída, e as deficiências dessa vitamina aumentam, reforçando o cuidado com o consumo dos alimentos fontes, principalmente nessa época.
A recomendação de vitamina D, segundo as DRIs (Dietary Reference Intakes), é de 15 microgramas por dia para adultos e crianças a partir de 9 anos. Para idosos acima de 70 anos, essa recomendação é de 20 microgramas por dia. Essas são as recomendações propostas pelo Instituto de Medicina dos Estados Unidos.

Como a maioria dos suplementos são apresentados em UI (unidades internacionais), a regra para conversão é de 1 UI = 0,025 microgramas de vitamina D3, logo 40 UI = 1 microgramas de D3.
Para exemplificar, um ovo cozido tem em média 0,65 mcg de vitamina D. Já um salmão e outros peixes tem em média 3,5 mcg. O fígado de galinha tem em média 1,1 mcg. O óleo de fígado de bacalhau tem em média 34 mcg em uma porção de 13,5g, o que já seria acima da recomendação.


Quando os níveis estão muito baixos, a suplementação pode ser necessária. Para isso, é necessária a opinião de um (a) médico (a) ou nutricionista.
Conversei com Márcio Leandro Ribeiro de Souza, Nutricionista e Doutorando no Programa de Ciências aplicadas à Saúde do Adulto na Faculdade de Medicina da UFMG sobre o Congresso em Neurofibromatoses nos Estados Unidos, do qual ele acabou de chegar.


Dr. LOR – Caro Márcio, qual foi a sua contribuição científica para o congresso, ou seja, quais os resultados mais importantes que você compartilhou?
Márcio – Assim como no ano passado, quando levamos dois trabalhos de nutrição na NF1 referentes ao meu mestrado, agora levamos mais avanços obtidos nessa área. As pesquisas em nutrição na NF1 ainda estão começando e temos muito o que avaliar.
No congresso, o Children’s Tumor Foundation Conference de 2015, levamos um pôster sobre os níveis de açúcar mais baixos apresentados pelas pessoas com NF1. Esse estudo reforça a importância de investigar os aspectos metabólicos nas neurofibromatoses.
Essa pesquisa foi realizada pela colega doutoranda e nutricionista Aline Stangherlin Martins, e surgiu de observações clínicas durante os atendimentos no CRNF, no qual os médicos do centro desconfiaram que a diabetes tipo 2 parecia ser menos frequente nas pessoas com NF1. De fato, nossa pesquisa comprovou esta suspeita e este resultado é importante. Atualmente, continuamos estudando para verificar outros sinais clínicos do metabolismo da glicose e da frutose na NF1.
Quero lembrar que temos contado com a participação do Dr Vincent Riccardi, que é um dos grandes estudiosos em neurofibromatoses, e que está colaborando ativamente comas pesquisas em nutrição.
Dr LOR – Qual foi a reação da comunidade científica aos seus resultados?
Márcio – Durante a apresentação do nosso pôster, tive a oportunidade de conversar com pesquisadores de diferentes países que acharam muito interessantes os resultados e discutiram possibilidades e hipóteses para novas pesquisas.
Alguns desses pesquisadores comentaram inclusive terem lido o nosso artigo de consumo alimentar publicado em 2015, na importante revista científica Nutrition (Veja aqui o artigo publicado), e que foi o primeiro estudo sobre padrões alimentares em pessoas com NF1.
Como já citei anteriormente, as pesquisas em nutrição na NF1 estão apenas começando, e somos o único grupo desenvolvendo pesquisas clínicas sobre aspectos nutricionais na doença.

E um ponto me deixou extremamente empolgado: no último dia de congresso, as últimas palestras sempre são feitas apresentando perspectivas de estudos futuros nas neurofibromatoses, e na palestra sobre o futuro da NF1 eles chamaram a atenção para a Nutrição como uma das áreas a serem melhor estudadas na doença, mostrando que estamos no caminho certo. 

Dr LOR – Obrigado Márcio e vejam abaixo o poster apresentado e até segunda!