“Minha filha foi diagnosticada no Centro de Referência em Neurofibromatoses do Hospital das Clínicas da UFMG como sendo portadora da Neurofibromatose do tipo 1 na forma segmentar (ou em mosaicismo). Recebi várias explicações na hora da consulta, mas fui orientada a perguntar sobre qualquer dúvida que eu tivesse depois. Então, envio algumas perguntas.” AF, do estado de São Paulo.

Obrigado A, pelas suas perguntas. Já comentamos sobre a forma em mosaicismo antes e convido você a ler  AQUI

Mas suas perguntas são interessantes para outras pessoas e tentarei responder a cada uma delas a seguir.

1 – O nome mosaico é por causa do formato de um mapa com sardinhas dentro?

Resposta: O nome mosaicismo vem do padrão de colocação de azulejos nos mosaicos, uma forma de arte decorativa milenar, geralmente desenhos realizados com pequenas peças de cerâmica, pedras, plásticos papel ou conchas embutidas, em paredes, por exemplo.

Este nome foi adotado para as formas de NF que acometem apenas parte do corpo, formando “desenhos”. São manifestações clínicas que ocorrem porque a mutação que deu origem à variante patológica do gene aconteceu somente depois da fecundação, ou seja, apenas parte das células do corpo da sua filha possuem a doença.

 

2 – Como é o teste para saber se outro ovário não tem NF?

Resposta – Creio que está perguntando isto porque comentamos durante a consulta que provavelmente sua filha teria apenas um dos ovários acometidos pela NF1, porque a doença dela acomete apenas um dos lados do seu corpo.

Se isto for verdade, os óvulos que forem produzidos neste ovário têm 50% de chance de conterem a variante patológica do gene NF1. Ou seja, se um destes óvulos com NF1 for fecundado, a criança teria a manifestação completa da doença.

Para saber se os ovários teriam a NF1, seria necessário realizar biópsias separadas de cada um deles e análise do material genético (sequenciamento de genes). No entanto, temos outras formas seguras e práticas de garantir que seus netos ou netas tenham NF1.

Para termos certeza de que sua filha não terá filhos ou filhas com NF1, a maneira que dispomos no momento é a fertilização in vitro (ou seja, coleta-se em laboratório óvulos e espermatozoides para a fecundação). Em seguida, faz-se a seleção daqueles embriões que NÃO têm NF1, que serão então implantados no útero de sua filha.

Veja mais sobre seleção de embriões AQUI

 

3 – Aquelas pequenas manchas café com leite não vão desenvolver a NF?

Resposta – As manchas café com leite e as sardas (efélides) nunca se transformam em neurofibromas.

Os neurofibromas ocorrem depois da adolescência em qualquer parte do corpo, com preferência para o tronco, e surgem em locais independentes das manchas café com leite e das efélides.

O que pode confundir algumas pessoas são as manchas que já estão presentes ao nascimento, geralmente grandes, com vários centímetros, com mudança na textura da pele, às vezes com pelos, que podem estar associadas a neurofibromas plexiformes (ver  AQUI).

 

4 – No caso da minha filha, os fibromas que podem surgir são provavelmente cutâneos ou subcutâneos?

Resposta – Sim, os neurofibromas podem surgir tanto na pele e sobre a pele (cutâneos), como debaixo da pele (subcutâneos).

 

5 – Pela sua experiência como médico o senhor já viu casos que ficam apenas com as manchas café com leite?

Resposta – São poucos os casos em que não surgem nenhum neurofibroma (cerca de 2%) nas pessoas com a forma completa da NF1. No caso da forma em mosaicismo de sua filha ainda não sei exatamente a percentagem de pessoas que não apresentam neurofibromas cutâneos ou subcutâneos.

 

6 – O senhor conheceu bastante caso de pessoas com o tipo de NF segmentar dela depois de adultas? Eu queria saber como elas estão.

Resposta – Temos cerca de 50 pessoas cadastradas com a forma em mosaicismo em nosso Centro de Referência, num total de 1440 cadastros. Portanto, são 3,4% das pessoas atendidas. Destas, a metade é formada por pessoas adultas, as quais em geral estão bem.

No entanto, algumas das pessoas que acompanhamos com a forma em mosaicismo apresentam complicações graves como neurofibromas plexiformes (na face, no braço ou em outra parte do corpo). É preciso lembrar que os neurofibromas plexiformes são congênitos, ou seja, se não estão presentes nos primeiros momentos de vida, não aparecerão mais.

 

Amigas e amigos da AMANF, sua presença é muito importante na nossa primeira reunião de 2020 no dia 29 de fevereiro às 16 horas e no local de sempre: Faculdade de Medicina da UFMG (sala informada na portaria).

Nossa pauta de assuntos será:

  • Acolhimento aos novos associados
  • Resultado final do processo no cartório: agora temos Ata registrada e diretoria empossada legalmente;
  • Prestação de contas das finanças da Amanf desde que a nova diretori assumiu;
  • Planejamento do segundo Curso de Capacitação em NF a ser oferecido pela AMANF e Centro de Referência em agosto de 2020;
  • Situação financeira do Hospital das Clínicas.
  • Projetos de ações para a AMANF para 2020.
  • Outros assuntos com a palavra livre.

Por favor, cada um de nós é muito importante em nossos encontros.

Tudo que temos feito em defesa das pessoas com NF tem origem na AMANF.

Venha nos tonar mais forte e saborear um lanche de confraternização.

Abraços

Dr Lor

Presidente eleito 2017-2021

“Minha filha tem Neurofibromatose do tipo 1 (NF1) e apresentou convulsões que foram controladas com medicamentos e recentemente foi indicado para ela o uso de cetotifeno. Li na bula do cetotifeno que ele não deve ser usado em pessoas com história de epilepsia. Devo usar o cetotifeno?” M.N. de Belo Horizonte.

Cara M, obrigado pela sua pergunta, pois ela nos ajuda a esclarecer um pouco mais a questão do uso do cetotifeno nas pessoas com NF1.

Primeiro, vamos lembrar que recomendamos o cetotifeno para pessoas com NF1 quando elas TAMBÉM apresentam coceira (prurido), alergia atópica, rinite alérgica ou bronquite asmática. Cerca de 30% da população com NF1 apresenta estes problemas associados.

Estas manifestações alérgicas geralmente são ligadas ao excesso de uma substância chamada histamina, por isso o tratamento para elas são medicamentos chamados anti-histamínicos, entre eles o cetotifeno.

O que é o cetotifeno? É um antialérgico porque inibe a produção da histamina pelas células chamadas inflamatórias (chamadas mastócitos).

Por que preferimos o cetotifeno a outros antialérgicos (anti-histamínicos) nas pessoas com NF1? Porque surgiram alguns indícios de que o cetotifeno poderia inibir o crescimento dos neurofibromas nas pessoas com NF1 (VER AQUI ).

Nós ainda não temos certeza de que este efeito do cetotifeno sobre os neurofibromas seja cientificamente verdadeiro, por isso o uso do cetotifeno tem que levar em conta sempre os riscos e benefícios.

Ao mesmo tempo, cerca de 10% das pessoas com NF1 apresentam disritmias cerebrais que podem causar convulsões em algum momento de sua vida ( VER AQUIVER AQUI ).

Assim, pode haver a coincidência de indicarmos o cetotifeno para alguém com NF1 que também está em tratamento para convulsões. Nesta situação, que acontece em cerca de 8% dos nossos pacientes, precisamos pensar se devemos ou não usar o cetotifeno, que foi a pergunta da nossa leitora.

Na bula do medicamento está a informação de que convulsões foram relatadas em poucas pessoas usando cetotifeno. Talvez este efeito se deva ao aumento da excitabilidade dos neurônios em algumas pessoas (causando agitação, insônia e irritabilidade).

De fato, em estudos experimentais com camundongos observou-se que o cetotifeno atrapalha um pouco os efeitos dos medicamentos anticonvulsivantes ( VER AQUIVER AQUI )

Diante disso, o Dr. Bruno Cezar Lage Cota fez uma pesquisa no Uptodate e Medscape sobre os efeitos colaterais do cetotifeno e, em ambos os sistemas de informação médica, entre as reações adversas não foi descrita a ocorrência de crises convulsivas (nem na faixa de <1%).

Há apenas uma recomendação de uso monitorado, ou cauteloso, em pessoas com epilepsia, pelo potencial efeito de redução do limiar epiléptico, mas, por outro lado, descreveram que o aumento de convulsões ocorreram em raros casos (o que não necessariamente seria efeito do cetotifeno).

Quanto às interações medicamentosas com anticonvulsivantes, a única encontrada foi com o topiramato, por potenciar os efeitos anticolinérgicos (sedação, boca seca, alterações digestivas, pouca sudorese, etc.). Dr. Bruno também não encontrou redução do efeito dos anticonvulsivantes pelo cetotifeno.

Em conclusão, considerando que ainda não temos certeza do benefício do cetotifeno sobre os neurofibromas e havendo uma pequena possibilidade do cetotifeno atrapalhar o controle das crises convulsivas, nossa opinião é que o uso do cetotifeno em pessoas com NF1 e histórico de crises convulsivas deve ser monitorado pelo médico e o cetotifeno deve ser suspenso se for observada uma piora no controle das crises.

Dr. Lor e Dr. Bruno Cezar Lage Cota

 

“No caso da minha filha, ela tem as manchas café com leite e quando foi avaliada com aproximadamente 6 (seis) meses não existia nenhum outro sintoma da doença (avaliação neurológica, oftalmológica e ultrassom abdominal todos normais). Entretanto… o painel genético para neurofibromatoses deu positivo para NF1.  Nesse caso a doença necessariamente irá se manifestar no futuro?” L.B. de Fortaleza, Ceará.

Cara LB, obrigado pela sua pergunta.

Existem cerca de 3 mil variantes patológicas já identificadas no gene NF1, ou seja, milhares de mutações que causam a doença conhecida como neurofibromatose do tipo 1 (NF1).

Dentre estas, apenas duas variantes causam apenas manchas café com leite, mas não apresentam outras manifestações da doença.

Estas duas variantes são identificadas nos laudos como:

  • Deleção em p.Met992del
  • Missense afetando p.Arg1809

Se não for uma destas duas variantes patológicas, todas as demais apresentam outras manifestações clínicas da NF1, além das manchas café com leite e efélides, como neurofibromas e outras complicações.

No entanto, nem todas as pessoas apresentam todas as manifestações da doença.

A maioria apresenta neurofibromas cutâneos, dificuldade cognitivas (aprendizado e sociais) e redução da força.

Algumas apresentam neurofibromas plexiformes e/ou tumores dos nervos ópticos. Umas poucas apresentam displasias dos ossos, alterações da puberdade ou tumores malignos.

Portanto, a doença se manifesta de forma completamente diferente de uma pessoa para outra e ainda não temos como saber de que maneira será o desenvolvimento da doença numa determinada pessoa.

Se sua filha não apresenta uma das duas variantes patológicas especiais acima, então a chance é de que ela venha a apresentar outras manifestações da doença, as quais podem ser benignas ou mais preocupantes.

Há diferentes níveis de gravidade da doença, podendo ocorrer desde a gravidade mínima (sem qualquer complicação) até os casos mais graves.

No entanto, é importante lembrar que a maioria das pessoas com NF1 leva uma vida normal.

Para orientarmos com segurança sobre o nível de gravidade da doença em sua filha, precisamos examinar pessoalmente.

Estamos à sua disposição.