No quarto dia da Conferência do CTF em Washington (Estados Unidos), a Dra. Juliana Souza participou de painéis e palestras e nos traz os comentários dos participantes do evento sobre a sessão de posters onde ela apresentou outro trabalho científico desenvolvido em nosso CRNF (ver aqui nos anais do Congresso os resumos em inglês). 

A seguir o resumo do nosso trabalho apresentado (em português).

Título

A terapia com inibidores de MEK pode ser descontinuada com segurança em um neurofibroma plexiforme responsivo? Um relato de caso 

Souza JF (M.D., Ph.D.); Rezende NA (M.D., Ph.D.), Cota BCL (M.D., Ph.D.), Rodrigues LO (M.D., M.Sci.), Rodrigues LOC (M.D., Ph.D.). Centro de Referência Ambulatorial de Neurofibromatose (CRNF), Hospital das Clínicas (HC), Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Brasil, rodrigues.loc@gmail.com 

Introdução

O uso de inibidores de MEK (MEKi) tem sido recomendado para o tratamento de neurofibromas plexiformes sintomáticos inoperáveis (ISPN) em indivíduos com tipo de neurofibromatose (NF1) (1,2). Seguindo nosso protocolo de atendimento clínico para terapia MEKi no tratamento de ISPN (3), iniciamos o tratamento em um paciente do sexo masculino de 9 anos (DBF) com um extenso neurofibroma nodular em formato plexiforme afetando a pelve e o membro inferior direito (Figura 1A), acompanhado de dor neuropática intratável sem resposta à terapia anterior, incluindo imatinibe. O PET-CT pré-tratamento não mostrou transformação maligna. O acesso ao selumetinibe foi concedido por ordem judicial, e a terapia oral começou a ser de 25 mg/m² , duas vezes ao dia em ciclos de 28 dias a partir de dezembro de 2023. 

Objetivo deste resumo

Explorar considerações clínicas sobre a descontinuação da terapia com selumetinibe, com foco no momento mais adequado, critérios e estratégias para interromper o tratamento com segurança sem causar crescimento tumoral ou recorrência da dor neuropática, seja devido à preferência do paciente ou limitações financeiras (4). 

Métodos

Os exames de ressonância magnética foram realizados a cada 6 meses, pois a análise volumétrica de ressonância magnética não estava disponível em nossa instituição. Os níveis de dor foram avaliados usando uma escala de dor padronizada e as medições da circunferência da coxa foram feitas antes e durante o tratamento (dezembro de 2023 a abril de 2025) (Ver gráfico abaixo). 

 

Figura 1 – Fotos dos membros inferiores de uma criança com NF1 acompanhada no CRNF por 8 anos, com ressonância magnética mostrando a extensão do neurofibroma nodular (do tipo plexiforme) e a evolução do perímetro das coxas ao longo dos anos, com e sem selumetinibe.

Resultados

Após 3 meses de tratamento, DBF relatou melhora significativa no controle da dor, uso de analgésicos não opioides de forma intermitente, e melhora na qualidade de vida, incluindo o retorno às atividades físicas na escola. Além disso, a família do paciente relatou uma percepção subjetiva de crescimento lento do ISPN, embora a ressonância magnética não tenha mostrado uma redução no tamanho do tumor (Figura 1B). O Gráfico 1 ilustra as mudanças na circunferência da coxa de 2018 a 2025. Em abril de 2025, as avaliações clínicas indicaram melhora sustentada da dor, qualidade de vida e diminuição da taxa de crescimento do tumor (Figura 1B), com eventos adversos mínimos relatados. 

Conclusão 

A avaliação clínica mais recente levou a uma avaliação entre a família do paciente e a equipe médica sobre os próximos passos do tratamento. Dado que o medicamento é aprovado pela FDA (e pela ANVISA no Brasil) sem protocolo prescrito para descontinuação quando as respostas ao tratamento são favoráveis, a questão de quando e como interromper a terapia permanece obscura. 

Acreditamos que é hora de a comunidade NF se envolver em uma discussão completa sobre os resultados da interrupção da terapia MEKi para neurofibromas plexiformes. Esse diálogo é particularmente importante para apoiar melhor os indivíduos que podem não ser capazes de tolerar os efeitos colaterais, não podem pagar pelo tratamento ou preferem interromper a medicação.

 

Palavras-chave: neurofibromatose, neurofibromas plexiformes, inibidores de MEK, selumetinibe, cuidados clínicos Conflito de interesse: nenhum. Financiamento da AMANF – Associação Mineira de Apoio aos Portadores de Neurofibromatose

 

Referências

  1. Selumetinib in children with inoperable plexiform neurofibromas. Gross AM, Wolters PL, Dombi E, et al. N Engl J Med. 2020;382:1430–1442.
  2. Selumetinib in children with neurofibromatosis type 1 and asymptomatic inoperable plexiform neurofibroma at risk for developing tumor-related morbidity. Gross AM, Glassberg B, Wolters PL, et al. Neuro Oncol. 2022;24:1978–1988.
  3. Clinical Care Protocol to use selumetinib as a treatment for inoperable plexiform neurofibromas – a proposal. Rodrigues LO, Rezende NA, Cota BCL, et al. European Neurofibromatosis Meeting, 2020, Rotterdam. European Neurofibromatosis Meeting Abstracts & Presentations, 2020. https://amanf.org.br/atendimento-medico/selumetinibe/
  4. Challenges of selumetinib therapy for neurofibromatosis in a resource-limited setting. Khalaf T M, Alqadhi A A. 2025. Cureus 17(3): e81071.

 Alguns dos comentários de participantes do evento que compareceram ao poster.

  • Um médico falou sobre o que aconteceu quando ele interrompeu  o uso do selumetinibe numa pessoa com glioma óptico (provavelmente uma paciente de algum estudo clínico) e houve a necessidade de trocar para a quimioterapia tradicional (no caso do glioma há esta opção, mas não nos neurofibromas): a paciente teve efeitos colaterais (dermatológicos) mais intensos após a puberdade (acne) com o selumetinibe e o glioma voltou a crescer com a interrupção da medicação. 
  • Outro médico, norte americano (que já trabalhou em Curitiba), conversou com colegas sobre o mesmo dilema enfrentado com um adolescente usando selumetinibe para um neurofibroma difuso mediastinal e mencionou uma proposta de redução progressiva da dose (desmame), evitando interrupção súbita. Ambos falaram de novo crescimento do tumor após a interrupção da medicação.
  • A maior parte das pessoas compartilhou que este é um grande dilema que elas também têm enfrentado. Todas estão em busca de informações sobre o que acontece com a interrupção dos iMEK. Uma das médicas disse que o título do nosso pôster deveria ser “a questão de um milhão de dólares”. 
  • Houve relatos de pacientes, na maior parte adolescentes, que perguntam quanto tempo mais terão que usar o medicamento. 

No geral, a percepção foi de que este tema é muito importante e está presente em diversos paineis, conferências e temas livres (posters) do evento.

AMANHÃ TRAREMOS A CONTINUAÇÃO DO RELATO DOS PAINEIS E CONFERÊNCIAS DA SEGUNDA FEIRA 23/06/25

 

No terceiro dia da Conferência do CTF em Washington (Estados Unidos), a Dra. Juliana Souza e o Dr. Bruno Cota participaram de painéis e palestras e apresentaram os dois trabalhos científicos desenvolvidos em nosso CRNF aprovados pela comissão científica  (ver aqui nos anais do Congresso os resumos em inglês). 

Na foto, Dra. Juliana diante do pôster do Dr. Bruno (ver abaixo o pôster mais nítido).

Apresentamos abaixo o relato da Dra. Juliana Souza, pois o Dr. Bruno Cota teve que retornar ao Brasil por problema de saúde em sua família, para quem desejamos pronta melhora.

 

Domingo 22/06

Minha impressão geral é de que foi um dia dedicado aos esforços atuais e às inovações que podem auxiliar no tratamento de manifestações tumorais da Neurofibromatose do tipo 1 (NF1) e Schwannomatoses (SWN), especialmente dos tumores malignos da bainha do nervo periférico (TMBNP) e schwannomas vestibulares. 

  1. Algumas informações podem ser destacadas em estudos com modelos animais
    • As células cancerosas podem se recuperar da senescência induzida por quimioterapia e radioterapia e voltar a se dividir e crescer o tumor. A droga ABT-236 em estudo (ver resumo nos anais) pode promover a apoptose (morte da célula cancerosa).
    • Foram apresentadas diferentes associações de compostos, que atuam em diferentes pontos das cascata RAS/ERK, testados in vitro e em modelos animais, com avaliação do efeito na proliferação e crescimento celular.
    • A inibição da proteína do estresse térmico tipo 2 (iSHP2) no tratamento do TMBNP e a combinação do iSHP2 e CDK4 foi efetiva no modelo animal com TMBNP, parecendo conferir atividade antitumoral mais profunda e duradoura.
    • A inibição da Quinase de Adesão Focal no crescimento dos schwannomas e preservação da audição está sendo estudada, assim como o Brigatinib, mencionado anteriormente.
    • Inibição da via FAK tem relação com inativação dos mastócitos e pode haver sinergismo na inibição FAK e inibidores da via MEK (iMEK)
  2. Alguns destaques foram mencionados na prevenção do câncer foram discutidos, utilizando biomarcadores para detectar mais cedo, o que seria desejável, mas o que temos atualmente é biópsia com limitações e o PET, que é sensível mas inespecífico.Outras possibilidades apresentadas foram:
    • Detectar o DNA tumoral na circulação (biópsia líquida) com múltiplas classes de potenciais marcadores.  
    • Menção a uma abordagem multi-ômica, ou seja, integrando a análise de DNA, RNA, proteínas e outros produtos do metabolismo celular. 
  3. Como anda a terapia gênica na NF1?
    • Pergunta-se: corrigir a expressão gênica da NF1 seria suficiente para corrigir as alterações teciduais da NF1?
    • Um modelo animal está em construção, mas há limitações para a terapia gênica, como o fato de haver muitas variantes patogênicas, ser um gene grande, grande expressão na vida embrionária e outras. 
  4. Inteligência Artificial pode ser usada na definição de biomarcadores?
    • Questões sobre a habilidade de digitalizar a histopatologia;
    • A possibilidade de identificar subtipos histológicos e moleculares, que podem individualizar o tratamento. 
    • Usou o exemplo dos gliomas de baixo grau.
  5. Papel do exercício físico na NF1
    • Exercício voluntário atenua crescimento tumoral em modelo animal (ca de mama) – modelo animal heterozigoto
    • Nf1 4,9 vezes mais chances de ca de mama
    • 30% dos ca de mama têm mutação somática do gene nf1
    • Atividade física de alta intensidade diminui o risco de Ca de mama em 20% ( população geral)
    • No estudo apresentado por ela, animais sedentários e ativos não apresentaram alteração no peso;
    • Perda do gene nf1 não modificou a composição corporal basal (há controvérsias…)
    • A atividade física voluntária atrasou o surgimento dos tumores de mama e atenuaram seu crescimento

 

Abaixo apresentamos a versão em português do trabalho do Dr. Bruno sobre os benefícios da prática musical sobre as dificuldades cognitivas de pessoas com NF1. Amanhã apresentaremos o trabalho apresentado pela Dra. Juliana e os comentários que foram feitos sobre o pôster. 

Em resumo, Dr. Bruno e sua equipe de colaboradores realizaram práticas musicais num grupo de pessoas com NF1 durante seis meses e mediram diversos indicadores cognitivos e da atividade cerebral relacionada ao processamento dos sons. Comparando os testes realizados antes e depois da prática musical, os resultados mostraram melhora significativa das funções cognitivas. Este estudo sugere que a prática musical seja útil no tratamento das pessoas com NF1. 

Veja abaixo o resumo que foi apresentado em Washington (em português). 

Foto do poster do Dr. Bruno exposto no CTF 

 

Título

Efeitos da Prática Musical nas Funções Auditivas e Executivas em Indivíduos com Neurofibromatose Tipo 1

Autores: Bruno Cezar Lage Cota (PhD), Luciana Macedo Resende (PhD), Juliana Ferreira Souza (PhD), Luiz Oswaldo Carneiro Rodrigues (PhD), Julia Lemes de Medeiros, Maila Araújo Pinto, Marina Silva Corgosinho, Vitória Perlin Santiago, Jamile Noeli Andrade, Gabriela Poluceno Pereira, Thais Andreza Oliveira Barbosa, Ana Letícia Ferreira Santos de Ávila, Nilton Alves de Rezende (PhD). 

Instituição: Centro de Referência em Neurofibromatose, Hospital das Clínicas, Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil

Financiamento: AMANF

Conflitos de interesse: nenhum

Introdução

A neurofibromatose tipo 1 (NF1) é um distúrbio genético multissistêmico frequentemente associado a prejuízos nas funções executivas e no processamento auditivo, incluindo a percepção musical. 

Objetivo

Examinar a relação entre déficits de função auditiva e executiva em indivíduos com NF1 e avaliar os potenciais efeitos terapêuticos da prática musical nesses domínios. 

Métodos

Vinte e cinco indivíduos com NF1, com idades entre 13 e 25 anos, foram submetidos a um programa de treinamento musical de seis meses e foram avaliados pré e pós-intervenção por meio de uma bateria abrangente de testes. 

O processamento auditivo foi avaliado com o teste Gaps in Noise (GIN), Pitch Pattern Sequence (PPS) e potenciais evocados auditivos de longa latência (P1-N1-P2 e Mismatch Negativity – MMN). 

A percepção musical foi medida usando a Bateria de Avaliação de Amusia de Montreal (MBEA). As funções executivas foram avaliadas com o Teste de Fluência Verbal Switch (SVFT), Span de Dígitos, Tarefa de Toque de Bloco de Corsi, Teste de Cinco Dígitos (FDT), Teste de Cinco Pontos (T5P) e Teste de Rede de Atenção (ANT). 

Resultados

Foram observadas correlações significativas entre as medidas musicais, auditivas e de função executiva, incluindo: MBEA e T5P (p = 0,013, r = 0,509), latência MBEA e MMN (p = 0,009, r = -0,669), GIN e Corsi (p = 0,017, r = -0,515), PPS e ANT (p = 0,006, r = -0,563) e PPS e Digit Span (p = 0,019, r = 0,506). 

O treinamento musical levou a melhorias nas funções executivas, particularmente flexibilidade cognitiva (FDT: p = 0,015, η² = 0,124), troca de tarefas (FDT: p = 0,030, η² = 0,155) e fluência verbal (SVFT: p = 0,011, η² = 0,158). 

O processamento auditivo também melhorou, evidenciado pelo aumento dos escores do GIN (p = 0,017, η² = 0,042) e redução da latência do MMN (p = 0,001, η² = 0,365). 

Conclusão

Os achados sugerem uma forte relação entre as funções auditivas e executivas em indivíduos com NF1 e indicam que a prática musical pode ter efeitos benéficos sobre esses sistemas cognitivos, apoiando seu uso como estratégia terapêutica complementar.

 

Começou hoje, e vai até dia 24 de junho, o Congresso do CTF, um evento internacional que ocorre há muito anos e que nosso Centro de Referência em NF tem participado desde 2008.

Desta vez, quem está lá nos representando (com apoio da AMANF) é a Dra. Juliana de Souza e o Dr. Bruno Cota, ambos Professores da Faculdade de Medicina da UFMG e responsáveis pelo nosso CRNF.

Além de participarem das palestras e conferências, Dra. Juliana apresentará um trabalho científico desenvolvido em nosso CRNF sobre o uso do selumetinibe em crianças e o Dr. Bruno mostrará os resultados positivos da musicoterapia em adolescentes com NF1. Em breve comentarei aqui a repercussão destes dois estudos na comunidade científica presente ao evento.

A partir de amanhã, Dra. Juliana e Dr. Bruno enviarão notícias diárias para postarmos nesta página, comentando as principais novidades do Congresso.

Enquanto isso, como faço todo ano, vou estudando o catálogo do evento com os resumos de todos os trabalhos (cerca de 300) que serão apresentados. Se você quiser ver o catálogo em inglês, basta clicar aqui.

Dra. Juliana e Dr. Bruno, aproveitem bastante e estaremos aqui aguardamos as novidades.

Dr. Lor

Opinião pessoal

 

Tenho observado que muitas crianças e adolescentes com NF1 usam celulares e redes sociais por muitas horas todos os dias e de forma pouco controlada pelas mães e pelos pais.

O uso de celulares e redes sociais são muito perigosos para crianças e adolescentes (ver aqui informações científicas sobre isso): eles e elas estão adoecendo mentalmente, com mais angústia, ansiedade, agressividade, depressão, automutilação e tentativas de suicídio.

Ainda não há estudos científicos sobre celulares e redes sociais em crianças com NF1, mas já sabemos as crianças e adolescentes com NF1 apresentam mais ansiedade, baixa autoestima, isolamento social e depressão do que as crianças sem NF1.

Assim, o bom senso nos faz tomar mais cuidado ainda com os celulares nas mãos das crianças com NF1.

 

Série Adolescência

 

Para compreender melhor a profundidade do problema, recomendo que vejam a série da Netflix “Adolescência”, que mostra o impacto das redes sociais sobre o comportamento de um menino, um garoto comum, numa sociedade machista.

Entre as várias questões importantes despertadas pela série, uma delas poderia ser a falta de modelos de masculinidade não-machista para as novas gerações.

Mesmo nós, os que tentam desconstruir o machismo estrutural no qual fomos constituídos como homens, ainda não somos exemplos do novo homem.

Além disso, pode ser que ainda não haja muitos homens desprovidos dos valores machistas na atual sociedade capitalista, que funciona às custas da meritocracia e das desigualdades estruturadas em gênero, raças e fronteiras.

Mas provavelmente seria mais inspirador para meninos e adolescentes se eles tivessem mais exemplos de homens não-machistas para se espelharem do que somente serem estimulados a não se comportar como os machões atuais.

 

Então, como seriam estes exemplos dos novos homens?

 

Numa conversa, Dra. Luíza de Oliveira Rodrigues e eu ficamos imaginando que este novo homem poderia ser alguém que, por exemplo:

– Considera o trabalho de reprodução da vida o mais importante

– Escuta e não só fala

– Nunca usa da sua força para impor sua vontade

– Sabe que é mortal e reconhece o valor da própria vida e da vida das outras pessoas

– Busca amar e ser amado e não o poder ou status

– ⁠Aprende que não existe bem estar próprio sem a participação das outras pessoas

– Descobre que a competição é solidão e a cooperação é encontro

 

Com isso, esse “novo homem” seria uma pessoa solidária, empática e respeitosa para com todas as demais.

Mas, veja só! – estas qualidades não são exclusivas de qualquer sexo ou gênero.

São as qualidades humanas fundamentais.

Uma sociedade baseada nestes valores será igualitária em termos de gênero.

Viva!

 

PS: Se desejar, mais informações sobre este tema veja aqui Mania de músculos e aqui Precisamos de mais professores homens professores no ensino básico

Avaliação Técnica e Científica do estudo que motivou a aprovação da droga Mirdametinibe para tratamento de neurofibromas plexiformes sintomáticos inoperáveis nos Estados Unidos

 

Realizada pela Dra. Luíza de Oliveira Rodrigues a pedido do CRNF e da AMANF

 

Destinada a fornecer informações a profissionais da saúde, ao Sistema Único de Saúde, aos órgãos públicos reguladores (ANVISA e CONITEC) e planos de Saúde Suplementar.

 

Avaliação Técnica do Ensaio Clínico chamado ReNeu: A Pivotal, Phase IIb Trial of Mirdametinib in Adults and Children With Symptomatic Neurofibromatosis Type 1-Associated Plexiform Neurofibroma (ver aqui o artigo completo – em inglês)

 

Qualidade da evidência: muito baixa, de acordo com os critérios do GRADE (estudo de fase 2b, multicêntrico, não randomizado, de braço único, aberto, desfecho primário substituto, financiado pelos fabricantes do mirdametinibe).

Incluiu 2 coortes: 1 de crianças e 1 de adultos, com NF1 e com PN inoperável, radiologicamente mensurável, causando morbidade significativa.

Não há definição formal de “morbidade significativa” na descrição do método; infere-se, pela introdução, que seja: dor, deslocamento/compressão de órgãos, comprometimento da função física e desfiguração (sem definição formal) e deterioração da qualidade de vida relacionada à saúde (QVRS) de pacientes e cuidadores.

O desfecho primário foi a taxa de resposta objetiva confirmada (ORR), definida como a proporção de pacientes com uma redução ≥20% na ressonância magnética (RM) do volume do PN alvo, da linha de base ao ciclo 24 (fase de tratamento), avaliada por revisão central independente cega em ≥2 exames consecutivos dentro de 2-6 meses. 

Os desfechos secundários de eficácia incluíram duração da resposta (DoR) e mudança da linha de base ao ciclo 13, pré-especificado, para desfecho relatado pelo paciente (PRO) ou medidas de desfecho relatadas por procuração dos pais de pior gravidade da dor do tumor (Escala de Avaliação Numérica-11 [NRS-11]), interferência da dor (Índice de Interferência da Dor [PII]), e HRQOL (Inventário Pediátrico de Qualidade de Vida, versão 4.0 [PedsQL 4.0]).

 

As coortes incluíram pacientes muito heterogêneos, com PNs de volumes muito pequenos até muito grandes:

    • Coorte de crianças (2 a 17 anos, mas mediana de 10 anos) com 56 participantes, com PNs variando de 5 a 3.630 mL. 
      • O volume mediano foi de 99 mL, o que significa que metade dos pacientes na coorte das crianças tinha tumores de menos de 99 mL e metade tinha tumores de mais de 99 mL. 
      • Destes, 62% eram considerados progressivos e 38% não progressivos.
      • 70% tinham dor, 50% desfiguração ou deformidade maior (sem definição destas variáveis), 27% tinham disfunção motora e 12% tinham disfunção de via aérea.
  • 6 destas 56 crianças já tinham recebido inibidor de MEK antes
    • Coorte de adultos (18 a 69 anos, mas mediana de 34 anos) com 58 participantes, com PNs variando de 1 a 3.457 mL.
      • O volume mediano foi de 196 mL. Destes, 53% eram considerados progressivos e 47% não progressivos.
      • 90% tinham dor, 52% desfiguração ou deformidade maior (sem definição destas variáveis), 40% tinham disfunção motora e 5% tinham disfunção de via aérea.
  • 4 dos 58 participantes já tinham recebido inibidores de MEK.

O uso prévio de outro iMEK foi proibido depois de uma modificação do protocolo, durante a execução do estudo.

O ensaio compreendeu uma fase de tratamento de 24 ciclos, uma fase de tratamento opcional de acompanhamento de longo prazo (LTFU) e um período de acompanhamento de segurança de 30 dias após a descontinuação do tratamento. 

Os pacientes podiam continuar recebendo mirdametinibe até que qualquer um dos seguintes ocorresse: progressão da doença radiográfica confirmada centralmente, eventos adversos intoleráveis ​​(EAs), incapacidade de aderir ao protocolo ou descontinuação determinada pelo paciente ou pelo investigador.

 

Desfechos em adultos:

  • ORR: 41% dos adultos teve resposta objetiva (> ou = a 20% de redução do volume do PN alvo após 24 ciclos); E mais 2 adultos (3,4%) tiveram resposta objetiva na fase LTFU (nos ciclos 28 e 32). E 75% dos pacientes que tiveram resposta, ou seja, 18 pacientes, tiveram duração de pelo menos 12 meses de resposta. O tempo mediano para atingir a resposta foi de cerca de 7,8 meses. 
    • A mediana de tempo em tratamento foi de 21,8 meses (variando de 0,4 a 45,6) e a mediana de duração da resposta ainda não havia sido alcançada;
    • A melhor porcentagem mediana de redução no volume foi de –41% (intervalo, –90 a +13); 62% dos adultos (ou seja, 15 de 24) com uma resposta objetiva confirmada atingiram uma redução máxima da linha de base de >50% (ou seja, 26% dos adultos tiveram uma redução de >50% dos seus tumores).
    • 84% dos adultos que concluíram a fase de tratamento optaram por ingressar na LTFU (o estudo não fala quantos concluíram a fase de tratamento; mas como 13 (22%) descontinuaram o tratamento por eventos adversos, esses 84% não podem ser mais que 38 pacientes, mesmo que somente 24 (41% de 58) tenham tido resposta objetiva.
    • Entre os adultos que puderam alcançar uma melhora clinicamente significativa (definida no Suplemento de Dados, Seção I https://ascopubs.org/action/downloadSupplement?doi=10.1200%2FJCO.24.01034&file=DS_JCO.24.01034.pdf):
      • 17 (29% de 58) alcançaram uma melhora clinicamente significativa em Escala de Avaliação Numérica-11 da dor; 
      • 13 (22% de 58) alcançaram uma melhora clinicamente significativa em interferência da dor (Índice de Interferência da Dor [PII]
      • 17 (29% de 58) alcançaram uma melhora clinicamente significativa em Inventário Pediátrico de Qualidade de Vida, versão 4.0 [PedsQL 4.0]
      • Ou seja, em termos de melhora clínica, cerca de ⅓ dos pacientes apresentou alguma melhora clínica (que foi ainda menor que os 41% que apresentaram redução de tamanho do tumor na ressonância).
      • É importante ressaltar que a avaliação de desfechos subjetivos em estudos abertos é significativamente enviesada, pois não pode ser balizada pelo efeito placebo.

Houve bastante toxicidade (98%), sendo que 16% foram de grau maior ou igual a 3. Os eventos adversos relacionados ao tratamento (TRAEs) relatados em ≥20% dos adultos foram dermatite acneiforme (78%), diarreia (48%), náusea (36%), vômito (28%) e fadiga (21%). Dezoito adultos (31%) experimentaram uma interrupção da dose, 10 (17%) foram submetidos à redução da dose e 13 (22%) descontinuaram o tratamento devido a EAs.

Portanto, a magnitude do benefício, no desfecho de taxa de resposta objetiva, segundo os critérios da ESMO (Form 3 Para estudos de braço único em “doenças órfãs” e para doenças com “alta necessidade não atendida” quando o resultado primário é PFS ou ORR https://www.esmo.org/content/download/117393/2059180/1/ESMO-MCBS-Version-1-1-Evaluation-Form-3.pdf), pode ser considerada grau 3 (ORR >20 e <60% e duração de mais de 9 meses), que é moderada. Porém, vale lembrar que essa escala foi desenvolvida para avaliar pacientes com câncer (ou seja, tumores malignos) e pode, portanto, superestimar o benefício no tratamento de neurofibromas plexiformes de histologia benigna, que é uma doença crônica.

 

Em crianças, os resultados foram semelhantes:

  • Vinte e nove crianças (52%; IC 95%, 38 a 65) alcançaram uma resposta objetiva confirmada pelo BICR durante a fase de tratamento
  • Uma criança adicional obteve uma resposta confirmada (início ocorreu no ciclo 32) no LTFU.
  • 22 (76%) respostas objetivas confirmadas permaneceram duráveis, tendo atingido ou excedido 12 meses em resposta.
  • A duração mediana do tratamento foi de 22,0 meses (variação de 1,6-40,0)
  • A melhor variação percentual mediana no volume do PN alvo foi de –42% (intervalo, –91 a +48).
  • 15 crianças (27% das 56 crianças) com uma resposta objetiva confirmada atingiram uma redução máxima da linha de base de >50%.
  • No ciclo 13, uma melhora clinicamente significativa em relação à linha de base foi alcançada em 8 crianças (14,3% de 56) para NRS-11, 5 (9%) para PII relatado pelo paciente, 6 (11% de 56) para PII relatado pelos pais, 13 (23% de 56) para PedsQL Total Score relatado pelo paciente e 15 (27% de 56) para PedsQL Total Score relatado pelos pais (Suplemento de Dados, Fig S5).
    • Ou seja, em termos de melhora clínica, assim como para os adultos, menos de ⅓ dos pacientes apresentou alguma melhora clínica (que foi ainda menor que os 41% que apresentaram redução de tamanho do tumor na ressonância).
    • É importante ressaltar que a avaliação de desfechos subjetivos em estudos abertos é significativamente enviesada, pois não pode ser balizada pelo efeito placebo.
  • O tratamento foi bastante tóxico; 95% tiveram evento adverso, sendo que TRAEs ocorrendo em ≥20% das crianças foram dermatite acneiforme (43%), diarreia (38%), paroníquia (30%), náusea (21%), fração de ejeção diminuída (20%) e aumento da CPK (20%). Dezessete crianças (30%) tiveram uma interrupção da dose, sete (12%) foram submetidas a uma redução da dose e cinco (9%) descontinuaram o tratamento devido a eventos adversos.
  • 85% das crianças que completaram a fase de tratamento escolheram entrar na LTFU (também não fala quantas completaram a fase de tratamento), mas 5 interromperam o tratamento devido a eventos adversos, então, não mais que 43 crianças passaram pra LTFU, mesmo que somente 29 delas tenham tido redução do tumor e no máximo 15 delas tenha tido melhora clínica.

 

A magnitude do benefício para as crianças, no desfecho da taxa de resposta objetiva, segundo os critérios da ESMO também pode ser considerada grau 3 (ORR >20 e <60% e duração de mais de 9 meses), que é moderada. Porém, vale lembrar que essa escala foi desenvolvida para avaliar pacientes com câncer (ou seja, tumores malignos) e pode, portanto, superestimar o benefício no tratamento de neurofibromas plexiformes de histologia benigna, que é uma doença crônica.

A comparação indireta da coorte de crianças que recebeu mirdametinibe com uma coorte histórica (ajustada para diversas variáveis) revelou a curva de tempo para evento (Kaplan-Meier) abaixo:

Essas curvas apresentam taxas de censura muito diferentes entre os grupos e, portanto, é uma análise ainda imatura para o grupo mirdametinibe (nem a mediana foi atingida ainda neste grupo). Portanto, é uma comparação espúria, até que a coorte do mirdanetinibe tenha um tempo maior de acompanhamento e menos censuras.

Pontos importantes:

  • Não houve correlação da magnitude da resposta com o volume do PN;
  • Não houve correlação da melhora clínica com a redução do volume do PN;
  • Aparentemente a maioria dos pacientes, incluindo aqueles que mantiveram a resposta, ainda estão em uso da medicação;
  • O estudo não foi projetado para avaliar a durabilidade da resposta fora do tratamento ou os benefícios clínicos sustentados após a suspensão do tratamento;
  • A duração ideal do tratamento não foi avaliada no ensaio clínico;
  • Assim como com outros inibidores de MEK, os potenciais efeitos colaterais de longo prazo ou de surgimento tardio e o benefício potencial da terapia de longo prazo ainda não foram demonstrados, especialmente em crianças.

 

Em resumo:

É uma droga com o potencial de reduzir (em cerca de 40% a 50%) o volume dos plexiformes em cerca de 1 a cada 2 ou 3 pessoas, mas não são necessariamente os maiores plexiformes que têm mais chance de reduzir. Também pode produzir alguns benefícios clínicos em 1 em cada 3 a 4 pessoas (não necessariamente as mesmas que tiveram a redução do tumor). Esses efeitos parecem levar cerca de 8 meses para aparecer, cerca de 13 meses para atingir o pico e mantêm-se estáveis, na maioria das pessoas, enquanto tomam o medicamento. Porém, o medicamento é bastante tóxico, causando efeitos colaterais em quase todas as pessoas, efeitos que afetam o cotidiano e o bem-estar das pessoas, como dermatite acneiforme, diarreia, náusea, vômito e fadiga. Como os neurofibromas plexiformes são crônicos, e o remédio não oferece cura, pode ser que a pessoa tenha que tomar esse medicamento de forma contínua para manter os efeitos, pois não se sabe se os efeitos perduram quando a pessoa para de tomar. Porém, não se sabe ainda como o uso, por mais de 2 anos, desse medicamento pode afetar a saúde das pessoas e o crescimento e desenvolvimento das crianças. Além disso, o medicamento é muito caro e provavelmente não será custo-efetivo para os sistemas de saúde no mundo todo, inclusive para o nosso SUS e a nossa Saúde Suplementar.

 

 

Sim, temos mais um motivo de esperança de que haverá – no futuro – algum medicamento eficiente para os neurofibromas, pois outra droga foi capaz de reduzir parcialmente os neurofibromas plexiformes em quase a metade das crianças e adultos com neurofibromatose do tipo 1 (NF1) que foram tratados com MIRDAMETINIBE (um inibidor de uma das vias – MEK – do metabolismo celular).

Apresentamos abaixo um resumo dos resultados do estudo que justificou a liberação da droga  (ReNeu: A Pivotal, Phase IIb Trial of Mirdametinib in Adults and Children With Symptomatic Neurofibromatosis Type 1-Associated Plexiform Neurofibroma ver aqui o artigo completo – em inglês). e nossos comentários em seguida.

Atenção profissionais da saúde: amanhã postaremos a Avaliação Técnica e Científica do estudo que motivou a aprovação da droga Mirdametinibe para tratamento de neurofibromas plexiformes sintomáticos inoperáveis nos Estados Unidos, realizada pela Dra. Luíza de Oliveira Rodrigues a pedido do CRNF e da AMANF, destinada a fornecer informações científicas aos profissionais da saúde, ao Sistema Único de Saúde, aos órgãos públicos reguladores (ANVISA e CONITEC) e planos de Saúde Suplementar.

 

Os resultados do estudo clínico

Os autores do estudo pertencem a diversos centros de atendimento em NF1 nos Estados Unidos e reuniram informações sobre 58 adultos (de 18 a 69 anos) e 56 crianças (de 2 a 17 anos) com NF1 e com neurofibromas plexiformes (NP) sintomáticos que não podiam ser removidos cirurgicamente.

Os principais sintomas iniciais eram: dor (90% dos adultos e 70% das crianças) e deformidade estética (52% dos adultos e 50% das crianças).

Todas estas pessoas voluntárias receberam cápsulas ou comprimidos para suspensão oral de MIRDAMETINIBE (2 mg por metro quadrado de superfície corporal) duas vezes por dia, máximo de 4 mg duas vezes por dia), independentemente da ingestão de alimentos, em ciclos de 28 dias (sendo 3 semanas com a droga e 1 semana sem a droga).

O objetivo principal foi medir o volume do tumor antes e durante 25 ciclos de tratamento, para saber se a droga seria capaz de reduzir o tamanho do NP em 20% ou mais do volume inicial.

Este resultado foi observado em 24 dos 58 adultos (41%) e em 29 das 56 crianças (52%). Nos demais voluntários, o NP continuou estável ou interromperam o tratamento por efeitos colaterais ou crescimento dos tumores acima de 20% (ver figura acima com os resultados). .

Nos adultos e crianças que responderam positivamente ao MIRDAMETINIBE, a melhor resposta foi a redução de 41% nos NP dos adultos e redução de 42% dos NP nas crianças (mediana). Quer dizer, em 41% dos adultos os tumores reduziram 41% e em 52% das crianças os tumores reduziram 42% no seu volume.

Nas crianças – que responderam ao tratamento, – o volume inicial dos tumores era de 99 ml (ver representação volumétrica na figura abaixo) e passou para 57 ml.

Nos adultos – que responderam ao tratamento, – o volume inicial dos tumores era de 196 ml e passou para 115 ml.

 

Veja abaixo uma figura representativa da mudança no volume dos tumores

 

 

Os autores não encontraram qualquer relação entre o efeito do MIRDAMETINIBE e o tamanho do tumor no início do tratamento. Além disso,  a idade da pessoa também não influenciou a resposta à droga nos adultos e nem nas crianças.

Na escala de dor de 11 pontos, o uso do MIRDAMETINIBE reduziu a dor em 1,3 pontos nos adultos e 0,8 pontos nas crianças.

Os autores consideram seus resultados comparáveis aos resultados do estudo que serviu de base para a aprovação do SELUMETINIBE (ver estudo Sprint) tanto nos Estados Unidos quanto no Brasil.

Todas as crianças e adultos que usaram o MIRDAMETINIBE apresentaram um ou mais dos efeitos colaterais: acne (43 e 78%, respectivamente), diarreia (38 e 48%), náusea (21 e 36%), vômitos (14 e 28%), cansaço (9 e 21%),  pele seca (14% e 14%), queda de cabelos (12 e 12%), redução da função cardíaca (20 e 12%), alteração da CPK sanguínea (20 e 10%), micose nas unhas (30 e 2%) e outros.

A conclusão dos autores é de que este foi o maior estudo (em número de pessoas) multicêntrico sobre NP em pessoas com NF1 e o MIRDAMETINIBE mostrou redução profunda e durável  de volume do NP e melhora da dor e da qualidade de vida, sendo bem tolerado em adultos e crianças.

 

Comentários da equipe do CRNF

Lemos detalhadamente e discutimos este estudo e apresentamos alguns comentários a seguir.

Esta nova droga indica que inibir a via MEK do metabolismo celular pode ser um caminho promissor para a descoberta de medicamentos eficientes no futuro, mas o MIRDAMETINIBE ainda não é o medicamento ideal – com o qual nós e todas as pessoas com NF1 sonhamos – para melhorar o sofrimento das pessoas com NF1 e neurofibromas plexiformes (ver aqui mais informações sobre os neurofibromas plexiformes).

Por que o MIRDAMETINIBE ainda não é o medicamento ideal?

1 – Houve pouca redução no tamanho dos tumores

A melhor redução do volume dos NP foi de cerca de 40% em menos da metade das pessoas (adultos e crianças) que conseguiram completar o estudo por dois anos.

Nossa dúvida é se esta redução do tumor – nas pessoas em que ele ocorreu – traria realmente benefício para a qualidade de vida das pessoas com NF1?

2 – Em cerca de 20% das crianças e 5% dos adultos o NP continuou crescendo mesmo com a quimioterapia

Nestas pessoas a droga não foi capaz de agir nos NP, fazendo com que o tratamento fosse suspenso.

3 – Em cerca de 20% das crianças e 15% dos adultos o NP permaneceu do mesmo tamanho

Isto significa que somando estes tumores que permaneceram estáveis com aqueles que continuaram crescendo, em mais da metade das pessoas a droga não fez nenhum efeito nos tumores.

Isto indica que os fatores biológicos que promovem o crescimento dos NP são diferentes entre as pessoas e o MIRDAMETINIBE não foi capaz de inibir todos eles.

4 – Todas as pessoas apresentaram efeitos colaterais

Mesmo que os efeitos não tenham sido fatais, foram graves o suficiente para cerca de 20% das crianças e 40% dos adultos abandonarem o tratamento.

Assim, o uso clínico desta quimioterapia seria limitado pelos efeitos colaterais que a pessoa com NF1 seria capaz de tolerar em troca de uma redução parcial do seu NP.

5 – A redução da dor foi de cerca de 1 a 2 pontos numa escala de 0 a 10 pontos

Isto quer dizer que se a dor antes era de 5, por exemplo, ela passou para 3 no grupo que recebeu o MIRDAMETINIBE. Será que foi mesmo o MIRDANETINIBE o responsável pela diminuição da dor?” 

6 – A redução do volume não apresentou relação com a melhora da dor

Não houve relação entre a redução no tamanho do tumor com a mudança da dor e da qualidade de vida. Portanto, apenas tentar reduzir o volume do NP não trouxe benefício obrigatoriamente para as pessoas que usaram o MIRDAMETINIBE.

Nossa interpretação, portanto, é que esta droga ainda não é o medicamento ideal, pois apresenta pouco benefício em relação aos seus riscos e o provável custo elevado, considerando-se as drogas semelhantes que já têm preço no mercado. 

 

Outras dúvidas

Além disso, nossa análise do estudo nos trouxe algumas dúvidas.

1 – Qual foi a indicação para o tratamento dos NP nas pessoas que se tornaram voluntárias?

As razões pelas quais os NP não podiam ser removidos parcial ou completamente por meio de cirurgia não foram informadas pelos autores, nem nos anexos disponíveis na internet.

Por exemplo, o volume dos tumores variou de 1 ml a 3,4 litros nos adultos e de 5 ml a 3,6 litros nas crianças. É difícil imaginar uma situação clínica na qual um tumor periférico (como são todos os NP) de 1 a 5 ml não possa ser retirado cirurgicamente quando apresenta algum sintoma intratável.

2 – O crescimento ou não dos tumores antes do tratamento

Em 53% dos adultos e 62% das crianças os NP estavam em crescimento antes do uso do MIIRDAMETINIBE.

Isto quer dizer que nos demais voluntários os NP apresentavam estabilidade, portanto, a indicação de tratamento nestes casos se torna menos evidente, ou seja, não deveriam apenas ser observados clinicamente por mais tempo?

3 – Foi mesmo o MIRDAMETINIBE que reduziu 1 a 2 pontos na escala de dor? 

Nos questionários sobre a qualidade de vida, cerca de 70% dos adultos e parentes das crianças relataram melhora com o uso da droga.

Isso indica que mais pessoas apresentaram melhora da qualidade de vida do que aquelas que tiveram redução no volume dos NP (cerca de 40 a 50%), ou seja, não haveria relação entre qualidade de vida e tamanho do tumor.

Em outras palavras, o simples fato de estarem “recebendo um medicamento” poderia reduzir a dor e melhorar a qualidade de vida, ou seja, seria o chamado efeito placebo?

5 – Por que não apresentaram as variantes genéticas encontradas nas pessoas voluntárias? 

Teria sido uma contribuição muito importante deste estudo se tivessem incluído uma análise da variante patogênica como um possível determinante de quais pacientes respondem melhor ao tratamento, uma recomendação que foi debatida no Congresso do de 2024 no Arizona, e que seria outro ponto para direcionar melhor o uso de quaisquer novas drogas. 

4 – Haveria interesses financeiros motivando os pesquisadores?

Algumas informações trazem alguma insegurança quanto a possíveis conflitos de interesse, pois muitos dos pesquisadores possuem vínculo com o laboratório fabricante do MIRDAMETINIBE.

O estudo que resumimos acima foi publicado na revista Journal of Clinical Oncology por 40 pesquisadores de várias instituições científicas norte-americanas, dos quais 13 deles têm relações comerciais com o Laboratório Spring-Works, fabricante da droga e financiador do estudo (ver aqui o artigo completo – em inglês).

Ficaríamos mais seguros sobre a isenção dos pesquisadores se TODOS eles não tivessem conflitos de interesse com a bilionária indústria de medicamentos.

A liberação rápida pela FDA

A agência norte-americana FDA (Food and Drug Administration) – semelhante à ANVISA no Brasil – liberou a droga MIRDAMETINIBE para ser usada no tratamento de neurofibromas plexiformes SINTOMÁTICOS E INOPERÁVEIS (ver aqui o comunicado) com base no estudo resumido acima e publicado em novembro de 2024 (ver aqui o artigo completo – em inglês).

O processo de liberação ocorreu de forma rápida (menos de 2 anos) porque o Laboratório inscreveu a droga na FDA como destinada a doença rara e doença órfã, o que facilita sua aprovação com menos exigências e comprovações de eficiência e segurança (ver ao final estudo Silvana e col.).

Um sinal de certa pressa na aprovação está na afirmação da FDA de que a droga MIRDAMETNIBE está aprovada para tratamento dos “neurofibromas plexiformes sintomáticos não passíveis de ressecção completa”.

Esta condição (ressecção completa) não faz parte do estudo que justificou a liberação e, além disso, sabemos que a imensa maioria dos neurofibromas não pode ser retirada cirurgicamente de forma completa  (ver informações sobre os plexiformes).

Se aplicada rigorosamente esta recomendação da FDA ela tornaria o MIRDAMETINIBE indicado para praticamente TODOS os neurofibromas plexiformes.

Ou seja, ampliaria o mercado de venda do produto de cerca de 5% dos pacientes com NF1 (que, de fato, apresentam NP sintomáticos e inoperáveis) – segundo nossa avaliação – para 50% da população com NF1. Uma simples palavra que pode resultar em lucros significativos.

 

Conclusão da equipe do CRNF

A principal questão diante de uma pessoa com NF1 e NP é saber se, quando e por quais motivos, devemos ou não realizar um tratamento, seja cirúrgico ou medicamentoso (Ver aqui mais sobre esta questão).

Os resultados apresentados acima com o MIRDAMETINIBE parecem, – a nós e, inclusive, aos autores do estudo, – que são semelhantes aos encontrados com o SELUMETINIBE.

Portanto, nossa sugestão é que – se e – quando o MIRDANETINIBE estiver disponível no Brasil, o seu uso seja orientado pelos mesmos passos clínicos que apresentamos anteriormente em nossa página (ver aqui).

 

Aguarde:

Amanhã postaremos a Avaliação Técnica do estudo que motivou a aprovação da droga Mirdametinibe para tratamento de neurofibromas plexiformes sintomáticos inoperáveis nos Estados Unidos realizada pela Dra. Luíza de Oliveira Rodrigues a pedido do CRNF e da AMANF, destinada a fornecer informações a profissionais da saúde, ao Sistema Único de Saúde, aos órgãos públicos reguladores (ANVISA e CONITEC) e planos de Saúde Suplementar.

 

 

A Diretoria da AMANF e a equipe do Centro de Referência em Neurofibromatoses do Hospital das Clínicas da UFMG estão estudando os documentos científicos publicados sobre o novo medicamento aprovado pela FDA dos Estados Unidos para tratamento dos neurofibromas plexiformes.

Nossas análises e conclusões estarão disponíveis aqui, em breve.

AGUARDE.

 

Diferenciar um neurofibroma plexiforme de um neurofibroma atípico ou de um tumor maligno da bainha do nervo periférico é sempre um desafio clínico (ver aqui).

Esta distinção é importante porque o neurofibroma plexiforme (NP) pode ser observado clinicamente sem intervenções ou tratado com cirurgia ou medicamentos (ver aqui), enquanto o neurofibroma atípico (NA) precisa ser removido cirurgicamente e o tumor maligno da bainha do nervo periférico (TMBNP) requer cirurgia imediata com ressecções com margens de segurança amplas para evitar recorrência e algumas vezes já apresentam metástases no diagnóstico.

Para tentar melhorar nossa capacidade diagnóstica, um grupo de cientistas publicou recentemente os resultados de um estudo (ver aqui o artigo completo – em inglês) utilizando um exame de laboratório para a  detecção precoce de TMBNP que ocorrem em cerca de 10% das pessoas com Neurofibromatose do tipo 1 (NF1). O objetivo foi investigar se este exame seria capaz de ajudar na tomada de decisão clínica, permitindo o tratamento precoce e assim evitar resultados mortais.

Foi utilizado um método sofisticado de biologia molecular (fragmentômica) que analisa fragmentos do material genético (DNA) e o número de cópias de determinados genes circulantes no plasma – sem as células sanguíneas – para distinguir se uma pessoa apresenta um NP ou NA ou TMBNP.

Foram estudadas 101 pessoas com NF1 e 21 pessoas saudáveis (como controles), e todas elas foram submetidas ao sequenciamento do genoma completo, à análise das alterações no número de cópias de determinados genes e à reprodução in silico dos perfis de fragmentos genéticos.

Os resultados mostraram que a alteração no número de cópias de alguns genes identifica os casos de TMBNP, mas não consegue distinguir entre tumores benignos (NP) e pré-malignos (NA). No entanto, a análise de fragmentos do DNA foi capaz de diferenciar os NA dos NP e orientaram a conduta em casos suspeitos de TMBNP.

As autoras e autores concluíram que a análise de fragmentos do DNA no plasma permitiu separar NP (benignos) de TMBNP, auxiliando o diagnóstico clínico e o tratamento de forma mais precisa.

Este estudo é pioneiro na detecção precoce de lesões malignas e pré-malignas na NF1 e pode ser um modelo de abordagem não invasiva e descentralizada para a identificação da transformação maligna em pessoas com NF1 e também em outras doenças hereditárias com predisposição ao câncer.

Os detalhes técnicos estão além da minha compreensão de biologia molecular, especialmente sobre as características dos fragmentos de DNA e sua relação com a malignidade, mas pude compreender que este estudo representa um avanço na capacidade de diferenciarmos laboratorialmente de forma não invasiva os NP dos NA e dos TMBNP.

Esta nova abordagem diminui nossas incertezas sobre a biópsia tradicional e permite o cuidado individualizado das pessoas com NF1.

A utilidade do método pode ser vista num dos exemplos citados no estudo, no qual o resultado de uma biópsia comum mostrou neurofibroma atípico (por isso a cirurgia foi feita com pequena margem de segurança), mas a análise histológica do tumor revelou TMBNP, o qual recidivou no local. A fragmentômica, no entanto, já  indicava TMBNP desde o momento da biópsia comum até a recidiva meses depois.

Além disso, a fragmentômica foi capaz de distinguir os controles saudáveis dos neurofibromas plexiformes, o que se reveste de significado clínico importante, pois pode indicar a carga tumoral, ou seja, a quantidade e volume dos plexiformes de uma pessoa com NF1, o que atualmente se obtém apenas com a ressonância magnética de corpo inteiro.

As possíveis fragilidades do estudo são: 1) o tamanho relativamente pequeno da amostra; 2) o fato de não ter sido um estudo prospectivo; 3) pouca documentação clínica seriada e padronizada com estudos de imagem, especialmente em pessoas com múltiplos neurofibromas plexiformes.

As autoras e autores já estão estudando a mesma técnica em outros tumores comuns nas pessoas com NF1, como gliomas, feocromocitomas e tumores gastrointestinais.

Em conclusão, este estudo constitui um avanço importante na nossa capacidade de diagnosticar e tratar uma das mais graves complicações da NF1.

Esperamos que os laboratórios brasileiros sejam capazes de realizar este procedimento o mais breve possível para que possamos orientar melhor as pessoas com NF1 que atendemos no CRNF.

Dr. Lor

 

Uma das perguntas que recebemos em nossos atendimentos clínicos é:

  • Quando devemos tratar um neurofibroma plexiforme? 

No momento, temos apenas uma regra geral: quando houver suspeita de transformação maligna (dor forte, disfunção neurológica, crescimento acelerado e endurecimento) os neurofibromas plexiformes (NP) devem ser removidos cirurgicamente (ver aqui mais informações sobre essa possibilidade).

Além dessa orientação acima, temos dificuldade para tomar a decisão de quando (e como) tratar os NP porque em todo o mundo ainda não há uma regra geral que possa ser aplicada com segurança, porque não sabemos exatamente como evoluem os NP. Quer dizer, ainda não conhecemos bem a história natural dos NP: 

  1. quando e quanto eles vão crescer?
  2. quando podem dar sintomas?
  3. quando se transformam em tumores malignos? 

 

Recentemente, uma equipe de cientistas da Holanda tentou responder a estas perguntas revendo os prontuários de 10 anos de acompanhamento clínico de 90 pessoas com Neurofibromatose do tipo 1 (NF1) e neurofibromas plexiformes (NP). Os resultados foram publicados na revista Cancers (ver aqui artigo completo em inglês). 

Apresento abaixo o resumo adaptado do estudo (entre parênteses uso palavras menos técnicas para facilitar a leitura).  

Justificativa para o estudo

Os NP são tumores benignos (no exame histológico) da bainha dos nervos periféricos associados à NF1 e muitas vezes levam à morbidade significativa (complicações que reduzem a qualidade de vida) devido ao crescimento. O tratamento inclui espera vigilante (observação atenta), cirurgia para redução parcial e, recentemente, tratamento sistêmico com inibidores de MEK (como o selumetinibe, um quimioterápico novo aprovado pela ANVISA). 

No entanto, devido à escassez de estudos de história natural, a nossa compreensão da progressão natural dos NP para orientar os médicos na decisão de quem e quando intervir é insuficiente. 

Este estudo teve como objetivo descrever as características dos pacientes com NF1 com NP e comparar as pessoas com alto risco de progressão do NP ou com morbidade significativa por NP (chamados de NP complexa) com as pessoas com NF1 com NPs de menor complexidade.

Métodos

Foi um estudo retrospectivo utilizando dados clínicos de registros hospitalares de pacientes com NF1 com NP atendidos no Hospital Infantil Sophia, na Holanda, entre 2012 e 2023. Foram avaliados os fenótipos clínicos (como a doença se apresenta em cada pessoa) e características dos NP que pudessem prever sua evolução, incluindo sua complexidade e o momento em que houve uma intervenção (cirúrgica ou clínica). Os resultados foram submetidos a testes estatísticos apropriados

Resultados

Foram incluídos 90 pacientes com idade mediana na última avaliação de 15,7 anos e duração mediana de acompanhamento de 9,8 anos. Dos 90 indivíduos com NP benigna, 37 desenvolveram morbidade por NP durante o acompanhamento. 

A morbidade dos NP aumentou de acordo com o passar do tempo, ou seja, quanto maior a idade da criança ou adolescente, mais morbidade foi encontrada, especialmente na cabeça e tronco.  

Não houve efeito do tipo de variante genética sobre a morbidade.

Conclusão

Esse estudo piloto mostrou que o aumento da idade e a localização do NP estão associados a uma maior chance de morbidade e maior risco de intervenção. Isto pode contribuir para decisões sobre em quem e quando iniciar o tratamento em pacientes com NF1 com NP.

Meus comentários

O estudo trouxe algumas informações que precisamos analisar. 

  1. Entre as 90 crianças e adolescentes com NP, 37 delas (41%) apresentaram alguma complicação que motivou o tratamento pela equipe médica. Ou seja, a maioria dos NP não apresentou grandes problemas durante 10 anos de acompanhamento.
  2. A conclusão dos autores é que quanto maior a idade da criança maior a chance de receber a indicação de tratamento. Mas isto seria mesmo o esperado, pois a NF1 é sabidamente uma doença progressiva (ver aqui). Então, à medida que o tempo passa, maior a chance de surgir alguma complicação que necessite tratamento.
  3. É uma pena que o estudo não tenha medido o volume dos NP por meio da ressonância magnética porque eles não tinham imagens em 3D (o que seria o ideal, segundo os autores). Na maioria das clínicas em todo o mundo nós medimos o volume dos NP com ressonâncias e imagens em 2D. Assim, o resultado deixa de nos apresentar uma medida objetiva do tamanho dos tumores. 
  4. O estudo não separou os NP difusos dos NP nodulares, mas já sabemos que eles são muito diferentes na origem e no comportamento clínico (ver aqui mais informações sobre essa diferença importante). Assim, o estudo deixa de nos oferecer outra informação objetiva que poderia nos orientar na decisão de quando devemos tratar os NP.
  5. Outra fragilidade do estudo foi terem usado indicadores subjetivos (como dor e qualidade de vida) para avaliar o desfecho dos tratamentos, pois eles podem ser influenciados por fatores psicológicos, o chamado efeito placebo. Por exemplo, no estudo com o inibidor MEK  que deu origem à liberação do quimioterápico selumetinibe nos Estados Unidos, a dor reduziu 2 pontos numa escala de 10 pontos nas crianças que usaram a droga, o que parece um efeito pequeno. 
  6. O estudo não comparou a morbidade pós-operatória das crianças operadas com a morbidade das crianças que ficaram sem tratamento na mesma faixa etária, que parecia ser o objetivo inicial. 
  7. Apesar de terem observado 4 pessoas (4,2%) que apresentaram transformação maligna dos seus NP, os autores não incluíram estes casos entre os 90 estudados como parte da evolução natural, pois consideraram a amostra pequena. Lamento, novamente, pois esta é uma das evoluções mais temidas dos NP e correspondem a 10% de todos os NP ao longo da vida. 
  8. Finalmente, a conclusão do estudo me parece inadequada, pois é um pensamento circular, ou seja: usaram o momento  no qual os médicos decidiram (no passado) tratar o NP (sem critérios científicos estabelecidos – que foi justamente a justificativa para eles realizarem o estudo) como critério para dizer que devemos tratar os NP o mais cedo possível

Isto seria verdade se os autores tivessem encontrado melhor qualidade de vida nas crianças que foram tratadas mais cedo do que naquelas que foram tratadas mais tarde. 

Ou tivessem comparado a qualidade de vida das crianças que foram operadas com a qualidade de vida das crianças que não foram operadas na mesma idade. 

Mas eles não mostram esses dados.

 

Minha conclusão é que, infelizmente, ainda não temos uma regra geral para decidir o momento em que devemos tratar (com cirurgia ou medicamento) um neurofibroma plexiforme nas pessoas com NF1. 

Portanto, continua valendo a decisão caso a caso, conforme nossa orientação geral para o tratamento dos NP disponível em nossa página: ver aqui

 

Dr Lor

 

Pessoas com Neurofibromatose do tipo 1 (NF1) podem apresentar diversos problemas emocionais, psicológicos e psiquiátricos, como bem descreveu a psicóloga Alessandra Craig Cerello neste site (ver aqui). Entre estas condições, encontramos pessoas com NF1 e retraimento social e solidão, por isso, achei relevante um estudo no qual cientistas encontraram o gene NF1 entre os genes pesquisados que poderiam estar relacionados à solidão e isolamento social.

O estudo denominado “Sequenciamento do exoma identifica variantes codificadoras de proteínas associadas à solidão e ao isolamento social” de Yi-Xuan Wang e colaboradoras e colaboradores, foi publicado em janeiro de 2025 na revista Journal of Affective Disorders (ver aqui artigo completo em inglês).

A equipe de cientistas considera que solidão e isolamento social são problemas de saúde pública sérios, porém subestimados, e suas bases genéticas permanecem desconhecidas. Por isso, resolveram explorar o papel das variantes genéticas codificadoras de proteínas que pudessem ser correlacionadas com as manifestações da solidão e do isolamento social.

A equipe realizou cerca de 700 mil análises de exomas completos com marcadores de solidão e isolamento social e os resultados mostraram seis novos genes de risco (ANKRD12, RIPOR2, PTEN, ARL8B, NF1 e PIMREG) associados à solidão e dois (EDARADD e GIGYF1) associados ao isolamento social.

O estudo mostrou que no cérebro houve 47 associações entre os genes identificados e alguns fenótipos de estrutura cerebral, muitos dos quais são críticos para o processamento social e interação. Além disso, observaram ligações significativas entre esses genes e fenótipos em cinco categorias de alterações, principalmente biomarcadores sanguíneos e medidas cognitivas.

Vários desses genes têm papéis estabelecidos no transtorno do espectro autista (TEA) e nas funções cognitivas. O PTEN foi associado ao aumento das regiões frontal e temporal, que desempenham um papel fundamental no processamento social.

Autoras e autores reconhecem que este estudo é inicial e limitado, pois utilizou apenas a um banco de dados ingleses, mas fornece uma base para estudos futuros que visam explorar os mecanismos funcionais desses genes e suas potenciais implicações para intervenções de saúde pública visando a solidão e o isolamento social.

Em conclusão, a presença do gene NF1 entre os 13 genes de risco associados à solidão e 6 ao isolamento social, ampliam nossa compreensão da base genética dessas duas características clínicas e abrem as portas para investigações futuras sobre as causas do retraimento social nas pessoas com NF1.